Acórdão nº 891/21.1T8AVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 21 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelJOÃO VENADE
Data da Resolução21 de Outubro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 891/21.1T8AVR.P1 Sumário.

……………………………… ……………………………… ………………………………*1). Relatório.

B…, residente na Rua …, n.º …, …, Sever do Vouga, intentou Procedimento cautelar comum contra C… e D…, residentes na Rua …, n.º …, Sever do Vouga, pedindo que: seja prorrogado o seu direito de usufruto até trânsito em julgado do processo principal (ação de impugnação pauliana, a intentar); caso assim não se entenda, . deve o mesmo bem ser retido na sua posse, até trânsito em julgado do referido processo principal.

Alega que é usufrutuária de um bem imóvel e é credora do 1.º requerido, seu ex-marido, a título de tornas.

O 1.º requerido transmitiu a nua propriedade do imóvel de que é usufrutuária à 2.ª requerida para impedir o pagamento do seu crédito.

Não estando pago esse crédito e tendo findado o usufruto, tem direito a reter o imóvel até que esteja decidida a ação principal que vai intentar – ação de impugnação pauliana -.

*Citados os requeridos, contestaram os requeridos opondo-se à procedência do peticionado.

*Realizada inquirição de testemunhas, foi proferido despacho a julgar totalmente improcedente o procedimento.

*Inconformada, interpôs a requerente recurso, formulando as seguintes conclusões que se eliminam em parte por serem claramente violadoras da síntese que se exige (transcrição de testemunhos): «1.ª O presente recurso tem por objecto modificar a sentença recorrida nos seguintes aspectos: Da Nulidade da Sentença por Impedimento de Patrocinio Judiciário de Mandatário.

Erro de apreciação da prova gravada quanto ao facto dado como não provado em 16.º, da Petição Inicial dos Factos não Apurados.

Erro de julgamento em matéria de Direito.

  1. Existia uma forte amizade que durou mais de 20 anos, entre a recorrente, o Mandatário E…, Mandatário do Recorrido C…, e a filha do Mandatário F… (Advogada).

  2. O Mandatário E…, e a sua filha F… (Advogada) têm ambos residência profissional na Rua …, .. – 1º. ….-… Sever do Vouga.

  3. A recorrente não é família dos referidos advogados, mas ao longo de mais de 20 anos, foi amiga íntima da família, juntamente com o seu ex. marido, o Recorrido C….

  4. O recorrido C… iniciou a sua carreira de empregado forense, com o Sr. Advogado E…, apenas saindo de tal escritório após se casar com a recorrente para trabalhar no escritório da mesma.

  5. A recorrente era solicitadora e como tal existia troca constante de serviços por mais de 20 anos, entre escritórios.

  6. Os convívios familiares, as ajudas na quinta da propriedade do Sr. Advogado E…, os constantes almoços e jantares entre as famílias, saída em conjunto para férias, ida ao casamento da advogada F…, conduziram a uma intimidade idêntica a família.

  7. Tendo sido a recorrente a madrinha e o recorrido C… o padrinho de casamento da Sr.ª Advogada F… 9.ª Tanto o Mandatário do recorrido C… como a filha do Mandatário tinham conhecimento de assuntos pessoais da recorrente, sendo ajudada por estes em quaisquer problemas que surgissem.

  8. No final do ano de 2020, a Sr.ª advogada F…, teve um encontro com a recorrente, no qual a recorrente lhe contou toda a estratégia de defesa que iria ser utilizada e quais as ações que iriam ser intentadas contra o ex. marido e a irmã deste.

  9. Foi intentada a providência cautelar contra o recorrido C…, tendo assumido a defesa deste o Sr. advogado E…, pai da advogada F….

  10. O facto de ambos os Advogados terem uma relação familiar, serem amigos de longa data da recorrida, saberem a sua estratégia de defesa e exercerem atividade profissional no mesmo escritório, criou automaticamente um impedimento emergente do art. 99.º do Estatuto da Ordem dos Advogados.

  11. A recorrente em resposta à contestação apresentada pelo Mandatário do recorrido C…, por requerimento datado de 05/05/2021, com a Ref. 11445982, escreveu o seguinte: “6 - Para além do mais, litiga de má-fé quando faz intervir como seu Mandatário alguém que privou durante longos anos com a Requerente, “assim como com o Requerido”, Mandatário este, que tem conhecimento pleno de toda a vida do ex casal.

    7 - Litiga também de má-fé, quando induz a filha do aqui Mandatário “também advogada no mesmo escritório”, a interpelar a requerente sobre estas matérias que estão em discussão, tomando conhecimento assim, de toda a versão, factos e demais matérias provatórias da Requerente.

    8 - Significando isto, conflitos de interesses, e pelos quais quer Mandatário, quer os elementos do seu escritório não podiam patrocinar…” 14.ª Por despacho de 18/05/2021 com Ref. 116244708, a Meretissima Juiz escreveu o seguinte: “Nos artigos 6.º, 7.º, 8.º e também 13.º do seu requerimento invoca factos que podem consubstanciar impedimentos de patrocínio judiciário, ao abrigo do disposto no art.º 99 do EOA e que têm relevância para os autos, na medida em que podem levar a considerar-se que estamos perante uma irregularidade do mandato. No exercício do contraditório quanto a esses conflitos, os mandatários das partes contrárias negaram a sua existência.

    Perante as alegações mencionadas, deve a requerente informar se efectuou alguma participação à Ordem dos Advogados, comprovando-o nos autos, se a resposta for afirmativa.” 15.ª Em requerimento datado de 26/05/2021 com Ref. 38988345, a recorrente veio transmitir o seguinte: “B…, Requerente, melhor identificada nos autos do processo à margem identificada, vem mediante a notificação de V./Ex.ª dizer o seguinte, A requerente participou à Ordem dos Advogados os factos de forma pormenorizada e indicando testemunhas para o efeito, do alegado nos artigos 6.º, 7.º, 8.º e 13.º do requerimento de resposta da aqui requerente, que consubstanciam de facto impedimentos de patrocínio judiciário ao abrigo do disposto no artigo 99.º do EOA. Assim, participou à Ordem dos Advogados dos Ilustres Advogados: Dr. E…; Dr.ª F…; Dr.ª G…; Assim, juntam-se documentos confirmativos de ter sido enviada a participação à Ordem dos Advogados contra os Ilustres Advogados supra identificados.” 16.ª Em requerimento datado de 28/05/2021 com Ref. 390016124, a recorrente requer aos autos o seguinte: “B…, requerente, melhor identificada nos autos do processo à margem identificada, notificada do requerimento formulado pelo requerido C…, vem dizer que ao mesmo não assiste qualquer razão, e é nosso entendimento que deve ser determinado que o mandatário do requerido seja impedido de continuar a patrocinar o mesmo, dado o conflito de interesses que é bem patente em toda a discussão desta matéria nos presentes autos.” 17.ª Por despacho ditado para a ata pela Meretissima Juiz do tribunal a quo (registo 20210531101122_4048315_2870421 do sistema de registo áudio integrado na Aplicação Informática Habilus, com início da gravação às 10:20:10): “Relativamente ao conflito de interesses: artigo 99º do Estatuto da Ordem dos Advogados que está invocada no processo: Tendo em consideração os factos alegados no processo, não dispõe este Tribunal de elementos que nos permitam, com um mínimo de certeza, considerar que os Ilustres Mandatários dos Requeridos tenham aconselhado, representado ou atuado na defesa dos interesses da Requerente e dos Requeridos em assuntos comuns e conexionados com os factos aqui em discussão.

    Não se coloca a questão prevista no número 1 do artigo 99º por não ter sido invocada, nem prevista a do número 2 do mesmo artigo. De igual forma, não foi alegado o preenchimento das circunstâncias previstas pelos nºs 4 e 5 do artigo 99º, restando-nos a circunstância prevista no número 3; e quanto a essa alega a requerente várias suspeitas, negadas pela parte contrária, sem que os elementos dos autos nos permitam concluir pelos mesmos. Por conseguinte, o assunto em discussão quanto à possível existência de um eventual conflito de interesses, deverá ser dirimido numa outra sede, nomeadamente, pela Ordem dos Advogados, constando dos autos que já foram apresentadas queixas pela requerente. Acresce que, a natureza urgente e sumária da providência cautelar, não se coaduna com a suspensão do processo até que as queixas que foram apresentadas na Ordem dos Advogados sejam decididas. Pelo exposto, consideramos que os autos não permitem decidir pela existência de uma irregularidade de mandato prevista pelo artigo 48º do C.P.C.” 18.ª Apesar de estarmos perante um processo urgente, não pode esta urgência atropelar as garantias do Direito Processual Civil.

  12. Não se pode no caso concreto observar a questão do impedimento em sentido estrito.

  13. A amizade ao longo dos anos e as informações privilegiadas que o Mandatário detinha em mãos, não poderiam ser usadas contra nenhuma das partes, pois estavam vedadas deontologicamente.

    21.º Levantada a questão da incompatibilidade do Mandatário, nada mais restava se não o afastamento do Mandatário por conflito de interesses.

    22.º Não cabia ao tribunal a quo procurar exaustivamente saber pormenores sobre os factos do impedimento, mas sim, apenas indícios suficientes que existiam factos que impediam o patrocínio do Mandatário referido.

  14. Os alegados no requerimento datado de 05/05/2021, com a Ref. 11445982, nos pontos 6, 7 e 8, eram suficientes para promover o afastamento do Mandatário.

  15. Do despacho de 18/05/2021 com Ref. 116244708, o tribunal a quo escreve que nos artigos 6.º, 7.º, 8.º e também 13.º invoca factos que podem consubstanciar impedimentos de patrocínio judiciário, ao abrigo do disposto no art.º 99 do EOA e que têm relevância para os autos, na medida em que podem levar a considerar-se que estamos perante uma irregularidade do mandato.

  16. No despacho referido, o tribunal a quo solicitou informações e comprovativos de ter sido enviada participação à Ordem dos Advogados, o que foi realizado pela recorrente.

  17. O alegado nos artigos 6.º, 7.º, 8.º datado de 05/05/2021, com a Ref. 11445982, juntamente com o comprovativo de participação à Ordem dos Advogados, eram mais do que indícios suficientes para promover o afastamento do Mandatário.

  18. Não cabia ao tribunal a quo fazer a avaliação quanto aos impedimentos, essa avaliação caberia exclusivamente à Ordem dos...

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