Acórdão nº 0793/11.0BELLE de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelJOAQUIM CONDESSO
Data da Resolução20 de Outubro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACÓRDÃO X RELATÓRIO XA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, deduziu recurso para uniformização de jurisprudência, ao abrigo do artº.284, do C.P.P.T., dirigido ao Pleno da Secção de Contencioso Tributário do S.T.A., visando o acórdão proferido pelo T.C.A. Sul, no pretérito dia 8/10/2020 (cfr.fls.173 a 207 do processo físico), o qual negou provimento à apelação deduzida pela Fazenda Pública e manteve a sentença recorrida, oriunda do T.A.F. de Loulé, que julgou procedente a impugnação intentada pelo ora recorrido, mais tendo anulado o acto tributário objecto do processo, uma liquidação de I.R.S., relativa ao ano de 2009 e no valor de € 51.392,70.

A recorrente invoca oposição entre o acórdão recorrido, proferido pelo T.C.A. Sul, e o aresto da Secção de Contencioso Tributário, igualmente do T.C.A. Sul, exarado no processo 6726/13, datado de 12/06/2014 e já transitado em julgado (cfr.cópia junta a fls.267 a 271-verso do processo físico).

XFoi exarado despacho pelo Exº. Desembargador relator a admitir o recurso e a ordenar a subida do processo a este Tribunal (cfr.despacho exarado a fls.248 do processo físico).

XPara sustentar a oposição entre o acórdão recorrido e o aresto fundamento, a entidade recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.227 a 244 do processo físico), formulando as seguintes Conclusões: A-Tendo o acórdão recorrido e o acórdão fundamento, já identificados, decidido em sentido oposto a mesma questão fundamental de direito, verificando-se o estar em causa situações fácticas idênticas, vem, a Fazenda Pública (FP) pedir a uniformização da jurisprudência e pugnar pela aplicação, in casu, da solução jurídica adotada no acórdão fundamento; B-A questão jurídica a esclarecer é a de estabelecer se as mais-valias resultantes da alienação de um prédio rústico, obtido por sucessão hereditária numa parte, cujos óbitos ocorreram antes de 1989, e, numa outra parte, adquirido em partilha da mesma sucessão celebrada em 2009, mas mediante o pagamento de tornas a outro herdeiro estará ou não, nesta segunda parte, sujeita a tributação pela aplicação do artigo 9.º, n.º 1 e 10.º do CIRS ou beneficiará da aplicação do regime transitório previsto no artigo 5.º, n.º 1, do DL 442-A/88 de 30/11, que exclui esse tipo de ganhos da tributação se já se encontrarem na titularidade dos alienantes anteriormente à entrada em vigor do CIRS em 01.01.1989; C-Na presente decisão, partiu-se da premissa de que a lei estabelece que os efeitos da partilha retroagem à data da abertura da sucessão, ou seja, independentemente da correspondência entre a quota ideal da herança de cada um dos sucessores e os valores efectivamente adjudicados e as tornas pagas, a aquisição dos bens é considerada para os efeitos legais, incluindo os fiscais, como tendo tido lugar totalmente na data da abertura da sucessão; D-No acórdão fundamento, pelo contrário, entendeu-se que a parte que exceder a quota ideal da herança pertencente ao herdeiro não é adquirida por efeito da sucessão, mas através de uma aquisição onerosa, efectuada na partilha, que até implica o pagamento de tornas, ou seja, trata-se de uma autêntica compra e venda, embora ocorrida entre sujeitos com relações muito específicas num momento particular, mas, mesmo assim, sujeita a imposto; E-Assim sendo, verifica-se que no acórdão recorrido foi perfilhado entendimento contrário ao preconizado no acórdão fundamento, ou seja, em ambos os arestos foi decidida a mesma questão fundamental de direito, embora de forma diferente e até contraditória, servindo o presente recurso para esclarecer definitivamente a questão; F-Ou seja, apesar das situações fácticas serem idênticas e de estar em causa a mesma questão fundamental de direito, a solução encontrada nas decisões já identificadas foi diametralmente oposta, como se demonstrou, pelo que se impõe uma uniformização da jurisprudência, o que se vem pedir no presente recurso; G-Pelo que nos parecem reunidos requisitos previstos no artigo 284.º do CPPT para que o presente recurso de uniformização de jurisprudência seja admitido; H-Relativamente ao mérito, na nossa opinião, o entendimento agora adoptado não só contradiz jurisprudência anterior como interpreta incorrectamente o regime jurídico vigente e deve ser corrigido conforme adiante se desenvolve; I-No presente acórdão, para o que aqui nos traz, ficaram estabelecidos os seguintes factos: a) Ambos os progenitores do Impugnante faleceram antes de 1989 (1971 e 1983); b) Do acervo hereditário faz parte o prédio rústico, inscrito na matriz sob o artigo ………, secção AC, freguesia de Santa Bárbara de Nexe, concelho de Faro; c) Em 29/01/2009, foi celebrada “escritura de partilha” onde consta que o Impugnante e a sua irmã declaram que foi feita partilha dos bens tendo o prédio rústico em causa ficado na titularidade do Impugnante, onde pagou, a título de tornas a sua irmã, relativamente ao prédio rústico em causa o montante de € 460,45; d) Em 14/04/2009, o Impugnante celebrou “contrato de compra e venda” com I... – Investimentos Imobiliários, S.A.” onde declarou que “(…) pelo preço de € 475.000 (…) vende à segunda outorgante, livre de ónus ou encargos, o prédio rústico sito em ………………., freguesia de Santa Bárbara de Nexe, concelho de Faro, omisso na competente conservatória, composto por terra de cultura com árvores (…), inscrito na respectiva matriz sob o artigo …………. …, secção AC; J-Perante esta factualidade, decidiu-se no presente aresto, com a seguinte fundamentação: Das normas aplicáveis e da interpretação que delas faz a doutrina, resulta manifesta a natureza declarativa da partilha, não configurando a mesma um modo autónomo de aquisição e retroagindo os seus efeitos à data da abertura da sucessão.

(….) No caso concreto, considerando que a sucessão se abriu em 1971 e em 1983, que o CIRS entrou em vigor em 01/01/89, nos termos do disposto no artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30/11, haverá que ter em conta o disposto no artigo 5º de tal diploma, por estarmos perante uma operação que não era tributada em sede de imposto de mais-valias.

A sentença recorrida que assim entendeu, considerando que os efeitos da partilha retroagem à data da abertura da sucessão, não enferma do vício de violação de lei que lhe vinha apontado.

K-Esta decisão não foi unânime, mereceu voto de vencido, com base no acórdão fundamento lá citado com a seguinte justificação: Considero que do ponto de vista do direito tributário a partilha dos bens da herança foi, desde há muito, encarada sob duas perspetivas distintas: uma declarativa, onde se enquadram os bens que cabem no quinhão hereditário – quota ideal - esta considerada uma transmissão gratuita, já o bem já que os bens transmitidos já entraram na esfera jurídica do herdeiro à data da abertura da herança (do óbito), sendo a partilha o ato que formaliza a titularidade desses mesmos bens; outra uma perspetiva constitutiva que abarca a transmissão dos bens que extravasam a quota ideal e pelos quais são devidas tornas. Aqui o herdeiro adquire bens de valor superior ao seu quinhão hereditário e por esse acréscimo paga um preço, por conseguinte trata-se de uma transmissão onerosa, fiscalmente tratada como tal (artigo 2.º n.º 5 alínea c) e 12.º n.º 4 regra 11.ª ambos do CIMT).

(…)”.

Neste sentido considero que a mais-valia decorrente da alienação de metade do prédio rústico adquirido, pelo Recorrido, para além da sua quota ideal na herança, está sujeita a IRS, nos termos do disposto no art. 10º n.º 1 a) do CIRS”.

L-O acórdão fundamento (TCA Sul, proferido em 12/06/2014 no processo n.º 06726/13) pronunciou-se da seguinte forma: Releve-se que as normas de incidência dos tributos bem como as que concedem isenções ou exclusões de tributação, devem ser interpretadas nos seus exactos termos, sem o recurso à analogia, tornando prevalente a certeza e a segurança na sua aplicação.

O artº.10, nº.1, al. a), do C.I.R.S., sistematicamente inserido na categoria de incrementos patrimoniais (normas de incidência real), apresenta-se como uma norma de delimitação da incidência. O preceito consagra um facto gerador de imposto (norma de incidência tributária) relativo às mais-valias realizadas com a alienação onerosa de bens imóveis que tenham sido originadas fora dos quadros de uma actividade económica deliberada, visto que só então o respectivo ganho não será considerado um rendimento profissional ou empresarial, portanto, um rendimento inserido na categoria B (cfr.artº.3, do C.I.R.S.). O normativo em exame tem, portanto, subjacente a ideia de que o proveito a considerar mais-valia será um ganho inesperado ou imprevisto. Por outro lado, quanto ao momento em que o imposto é fiscal, rege o artº.10...

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