Acórdão nº 23/16.8BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelSUSANA BARRETO
Data da Resolução14 de Outubro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I - Relatório J...

veio apresentar recurso da sentença proferida a 14.10.2020, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada parcialmente procedente a impugnação por si apresentada, que teve por objeto o indeferimento da reclamação graciosa que versou sobre a liquidação de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS), relativa ao ano de 2013.

Nas alegações de recurso apresentadas, o Recorrente formula as seguintes conclusões: a) O deferimento da reclamação graciosa apresentada pelo Recorrente investiu este num direito, ou, dito de outro modo, tal deferimento representou um acto constitutivo de direitos na esfera do Recorrente, direito esse ao reembolso do imposto pago em excesso, tudo isto por força do artigo 30°, n° 1, alínea c) da LGT.

b) Direito esse que, precisamente, se consumou/materializou com o reembolso ao Recorrente e a anulação administrativa, por se estar perante um acto constitutivo de direitos, obedecia a prazos para o efeito.

c) A LGT prevê, efectivamente, a possibilidade legal de revogação de actos administrativos em matéria tributária no seu art. 79° fazendo, também a distinção daquela em relação à possibilidade legal de revisão dos actos tributários consagrada no art. 78° do mesmo diploma, revisão que se reporta a actos de liquidação ou a actos de fixação da matéria colectável, e que, sendo da iniciativa da Administração Tributária por erro imputável aos serviços, pode ter lugar no prazo de 4 anos após a liquidação se o tributo tiver sido pago ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago.

d) Sucede que nem a LGT nem o CPPT contém qualquer norma sobre o prazo para a aludida revogação o que apenas permite a conclusão de que tal prazo só pode ser o constante das regras do CPA, e que, precisamente por força de tal, devem ser aplicadas no direito tributário de acordo com a natureza do caso omisso, concretamente as regras que directamente regulam a revogação e anulações dos actos administrativos.

e) Assim, o prazo para a revogação de tal acto administrativo de deferimento da reclamação graciosa só pode ser o constante nas normas do CPA e não o relativo ao prazo previsto para a revisão do acto de liquidação do imposto.

f) A Douta Sentença, e de modo a procurar justificar a aplicação do artigo 78° da LGT, lavra num outro equívoco pois o que o que foi alvo de anulação administrativa não foi qualquer acto de liquidação mas sim a decisão de anterior reclamação graciosa.

g) É que aqui há que fazer a distinção entre o acto tributário stricto sensu (o acto de liquidação) e os actos administrativos em matéria tributária ou actos administrativos relativos a questões tributárias e só em relação ao acto de liquidação é que seria passível de aplicação o artigo 78° da LGT, já não o sendo em relação a uma decisão da reclamação graciosa que se integra na categoria de acto administrativo em matéria tributária ou relativo a questão tributária.

h) Pelo que ao assim não ter entendido errou grosseiramente a Douta Sentença e violou o aludido artigo 78° da LGT.

i) O instituto do aproveitamento do acto não é nem jamais pode ser algo que sirva para desculpabilizar os vícios da AT nos procedimentos administrativos sendo notório, e isso resulta provado, que o Recorrente exerceu tempestivamente o seu direito de audição, assim como também é notório, e isso só não vê quem não quer, que a AT o desconsiderou porque tinha plena consciência que se aproximava o prazo que dispunha para consumar a anulação administrativa.

j) Como resulta sobejamente documentalmente provado nos autos não só os tribunais como a própria AT já haviam decidido em sentido favorável à pretensão do Recorrente, e decisões essas que haviam formado casos resolvidos administrativos.

k) Perante isto não se afigura intelectualmente honesto sustentar-se que a decisão da AT não podia ser outra pois que os autos demonstram que tal afirmação é falsa e se destrói a si própria.

l) Como é generalizadamente entendido o instituto do aproveitamento do acto apenas logra aplicação nas situações em que com toda a segurança a decisão administrativa não poderia ser outra que não aquela que veio a ser tomada e que juridicamente o único caminho passível de ser seguida seria aquela que a decisão trilhou.

m) Ora tal não é manifestamente o caso dos presentes autos como a prova documental nos mesmos incorporada o demonstra.

n) É por tudo isto que o instituto do aproveitamento do acto deve apresentar uma feição de excepcionalidade na sua aplicação e nunca pode ser uma regra que se aplica de forma quase que acrítica e a roçar a irracionalidade.

o) A questão substantiva não é assim tão linear e simplista como abordado no libelo decisório e não podendo a doutrina que emana do Douto Aresto do Supremo Tribunal Administrativo ser transposta de forma acrítica para os presentes autos.

p) É que cumpre compaginar o Douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, em que a Douta Sentença se alcandora, com o contrato que a Douta Sentença interpretou de forma incorrecta.

q) Do aludido contrato retira-se que o Recorrente poderia efectuar o resgate ao perfazer 60 anos de idade, ou 65 anos conforme opção tomada, e foi isso, e em tal momento temporal, que aquele o fez; r) E que a entrega dos valores ao Recorrente tem por fundamento a perda de licença de voo após perfazer 60 anos de idade.

s) Não consta, e bem pois o Recorrente a elas não aderiu, do probatório fixado a adesão do Recorrente às condições particulares do contrato que estabeleciam a data do vencimento como sendo aos 65 anos (apenas se refere no ponto 3 dos factos dados como provados a adesão do Recorrente ao contrato, a menção da existência das referidas condições particulares mas não resulta provado que o Recorrente aceitou estas últimas) e só se tal se tivesse dado como provado é que se poderia considerar aplicável a doutrina que emana do Douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo.

t) Pelo que, e bem ao contrário do decidido, a correcta leitura do Douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, quando no mesmo se faz alusão às condições particulares e aos 65 anos como sendo a data do vencimento, só faria sentido se do probatório fixado constasse tal facto mas não só não consta como o que consta do texto do contrato diverso, é o de que o resgate podia ser feito quando o Recorrente atingisse os 60 anos de idade.

u) Ora se o podia fazer nessa idade e não constando do probatório fixado a adesão, por parte dos Recorrente, a quaisquer condições particulares, então o Douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo lido a contrario leva à conclusão que o Recorrente defende, ou seja, só se estivesse provada uma antecipação no recebimento em relação à data prevista, que não está, é que o raciocínio da Douta Sentença seria passível de sustentação, pois que de outro modo não a é.

v) Como numa situação exactamente igual à presente neste aspecto já o decidiu Tribunal Superior em Douto Aresto citado no corpo alegatório w) Violou a Douta Sentença os artigos 60° e 78° da LGT, 163°, n° 5 do CPA e 2°, n° 3, b) 3) do CIRS, bem como fez uma errada interpretação do teor do contrato de seguro subjacente aos presentes autos, o que deve levar à sua revogação e substituindo-se a mesma por uma decisão que dê provimento à pretensão do Recorrente.

Nestes termos e nos melhores de Direito deverá o presente recurso merecer provimento e, em consequência, ser revogada a Douta Sentença e substituída a mesma por uma decisão que dê provimento à pretensão do Recorrente no sentido de ser ordenada a anulação do acto de liquidação aqui questionado, em concreto no segmento atinente às retenções na fonte efectuadas ao Impugnante, bem como revogada a decisão de anulação da anterior decisão da reclamação graciosa que assim não entendeu, com o reembolso de tais valores, tudo o mais com as consequências legais.

A Recorrida, devidamente notificada para o efeito, não apresentou contra-alegações.

O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II – Fundamentação Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, que fixam o objeto do recurso, sendo as de saber: se incorre em erro de julgamento na apreciação dos factos e na aplicação do direito a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou...

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