Acórdão nº 1661/19.2T8FNC.L2-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 13 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelFRANCISCA MENDES
Data da Resolução13 de Outubro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa 1.

–Relatório 1.1.

–AAA veio instaurar a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra “BBB.” e “CCC”, peticionando: a)-Que se declare a nulidade dos sucessivos documentos denominados contratos de trabalho temporário a termo certo não renovável assinados e entregues à autora para assinatura; b)-Que se considere a existência de contrato de trabalho por tempo indeterminado entre a autora e a ré; c)-Que se considere a existência de um despedimento ilícito da autora; d)-Que se declare a ilicitude do despedimento e que, em consequência, as rés sejam condenadas a pagar à autora a retribuição de € 345,00 (trezentos e quarenta e cinco euros), acrescidos de € 5,45 (cinco euros e quarenta e cinco cêntimos) de subsídio de refeição e bem assim as retribuições subsequentes até ao trânsito em julgado da sentença.

Fundamentou a sua pretensão alegando, em síntese: - Desde 22 de Junho de 2017 trabalha ao serviço da 2.ª ré como operadora de caixa, numa loja do Funchal, cumprindo horário de trabalho, sob as ordens e instruções desta, mediante a retribuição mensal de € 345,00 (trezentos e quarenta e cinco euros), acrescida de € 5,45 (cinco euros e quarenta e cinco cêntimos); - Para o efeito, assinou com a 1.ª ré os contratos de trabalho a termo certo não renováveis que discrimina, não tendo, apenas, assinado dois contratos que lhe foram apresentados a 8 de Maio de 2018, um datado de 1 de Abril de 2018 e outro de 1 de Maio de 2018, o que motivou a cessação do contrato por parte da 1.ª ré.; - Os motivos invocados para a sua contratação como trabalhadora temporária não correspondem à verdade, sendo ainda que em nenhum dos contratos é especificamente concretizada qual a alínea do art. 140.º, n.º 2 do Código do Trabalho que enquadra a situação; - Trabalhou para a 2.ª ré desde 1 de Abril de 2018, sem contrato escrito, pelo que se considera que estava contratada sem termo; - Para além da invocada cessação do contrato no período experimental ser inócua, por este já se mostrar decorrido, a cessação do contrato pela 1.ª ré, num momento em que já trabalhava para a 2.ª ré ao abrigo de um contrato sem termo, constitui abuso de direito.

- Os contratos celebrados são nulos e a A. foi despedida de forma ilícita; - Deve a 2ª R. ser condenada a reintegrar a A..

Realizada audiência de partes, frustrou-se a conciliação entre a autora e as rés.

A ré “CCC.” apresentou contestação, impugnando a matéria de facto alegada pela autora, discriminando os motivos subjacentes a cada uma das contratações da autora e afirmando que os mesmos correspondem à realidade.

Concluiu, assim, que inexiste qualquer nulidade dos contratos celebrados, sendo lícita a contratação da autora ao abrigo de contrato de trabalho temporário a termo, pelo que a acção deverá improceder.

A ré “BBB.” apresentou igualmente contestação na qual discriminou os contratos celebrados com a autora, concluindo que a autora não desempenhou as suas funções para a 2.ª ré, de forma ininterrupta, não tendo trabalhado para nenhuma das rés no período compreendido entre 22 de Setembro de 2017 e 30 de Setembro de 2017 e entre 1 de Março de 2018 e 31 de Março de 2018.

Concluiu que os contratos celebrados respeitaram todas as exigências, requisitos e normativos legais aplicáveis, não padecendo de qualquer vício.

Para o caso de assim não se entender, considerou, por um lado, que a autora apenas poderia ser reintegrada na 1.ª ré e, por outro lado, que os efeitos da ilicitude do despedimento apenas lhe dariam o direito a auferir uma indemnização correspondente a 23 dias de retribuição, isto é, a retribuição vencida entre a data da cessação do contrato e a data do respectivo termo, no valor de € 461,53 (quatrocentos e sessenta e um euros e cinquenta e três cêntimos).

Ambas as RR. alegaram que a A. assinou os contratos de trabalho a termo certo datados de 1 de Abril de 2018 e 1 de Maio de 2018.

Foi proferido despacho saneador.

Procedeu-se a julgamento e foi elaborada sentença.

Pelo Tribunal a quo foi proferida a seguinte decisão : «Face ao exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente e, em consequência: a)- Declaro a ilicitude do despedimento da autora AAA levado a cabo pela ré BBB a 8 de Maio de 2018, referente ao contrato celebrado a 1 de Maio de 2018; b)- Condeno a ré BBB no pagamento à autora AAA, das retribuições que receberia até ao termo do contrato, 31 de Maio de 2018, tomando-se em consideração a retribuição mensal de € 345,00 (trezentos e quarenta e cinco euros), com as deduções previstas no art. 390.º, n.º 2 do Código do Trabalho, a liquidar em execução de sentença.

c)- Absolvo a ré BBB.

do demais peticionado.

d)- Absolvo a ré CCC. dos pedidos.

Custas pela autora e pela ré BBB nos termos do art. 527.º do Código de Processo Civil, na proporção de 50% para a ré e 50% para a autora.» A A., com o patrocínio do Ministério Público, recorreu e formulou as seguintes conclusões : 1.

– Deverá ser considerado não provado que: - “23- No dia 1 de abril de 2018, a 1.ª ré, na qualidade de empresa de trabalho temporário e a 2.ª ré, na qualidade de utilizador, celebraram um “contrato de trabalho temporário termo certo não renovável” … “29- No dia 1 de maio de 2018, a 1.ª ré, na qualidade de empresa de trabalho temporário e a 2.ª ré, na qualidade de utilizador, celebraram um “contrato de trabalho temporário termo certo não renovável”.

  1. –Estriba-se essa discordância, essencialmente, nas declarações da A. e no facto da alegada assinatura do contrato datado do dia 1 de maio ter tido lugar no dia 1 de maio, que é feriado, nas instalações da R.

    BBB no Funchal que estavam encerradas.

  2. – Pelo contrário, atendendo às declarações da A. e também ao facto de não ser possível a assinatura de contrato de trabalho em 1 de abril, pois a A. iniciou o seu trabalho para a R. … no dia 1 de abril sem que tivesse assinado qualquer documento pois, fê-lo para substituir outros trabalhadores iniciando o seu trabalho na loja de S. … não sendo possível a assinatura prévia de um contrato no mesmo dia.

  3. –Se a A. tivesse assinado contrato de trabalho para iniciar a respetiva prestação no dia 1 de abril teria de o ter feito previamente e não no próprio dia de início do trabalho em que estava naturalmente a trabalhar.

  4. –Pelo contrário deverá considerar-se provado que, no dia 8 de maio de 2018, nas instalações do Funchal da R.

    BBB a A. assinou dois documentos designados por “contrato de trabalho termo certo não renovável” um datado e com data de início no dia de 1 de abril de 2018 e data de termo no dia 30 de abril de 2018, e outro datado e com data de início no dia 1 de maio de 2018 e data de termo no dia 31 de maio de 2018.

  5. –Tal assenta nas declarações da A. e também num enquadramento lógico dos factos pois única data que tem o assentimento das partes – 8 de maio, em que foi entregue à R. – nas instalações da BBB a rescisão contratual (documento nº 7 junto à PI).

  6. –Aliás nenhuma testemunha das RR explicou de forma cabal como e onde eram assinados os contratos de trabalho temporário da A. de forma a negar de forma válida as suas declarações.

  7. –Atendendo ao disposto no nº 2 do art. 181º do código de trabalho, nos termos do qual “na falta de documento escrito ou em caso de omissão ou insuficiência da indicação do motivo justificativo da celebração do contrato, considera-se que o trabalho é prestado à empresa de trabalho temporário em regime do contrato de trabalho sem termo, sendo aplicável o disposto no n.º 6 do artigo 173.º”(…), trabalhou a A. através de contrato sem termo.

  8. –E, ultrapassado o período experimental, como bem julgou a MMª Juiz foi a A. despedida ilicitamente.

  9. –Destinando-se o período experimental do contrato de trabalho à apreciação pelas partes do interesse ou não na sua manutenção esse período tinha já decorrido em relação à A. que tinha iniciado funções no dia 22 de junho de 2017, se bem que com interrupções.

  10. –Assim sendo deverá a segunda R. ser condenada a reintegrar a A. nos termos do disposto na alínea b) do nº 1 do art. 389º do Código do Trabalho.

  11. –Devendo também, nos termos da alínea b) do nº 2 do art. 390º do Código do Trabalho serem as RR condenadas a pagar à A. a retribuição mensal de € 345, acrescidos de € 5,45 de subsídio de refeição e bem assim às retribuições subsequentes até ao trânsito da presente ação.

    Após as alegações a recorrente juntou documento que constitui cópia de sms.

    A Exmª Juiz a quo determinou a permanência dos autos do referido documento.

    A R. “CCC” contra-alegou e formulou as seguintes conclusões : a.-Não assiste razão à Recorrente e, por isso mesmo, deve ser mantida a sentença do Tribunal a quo, a qual não merece qualquer censura; b.-Os argumentos alegados não devem merecer acolhimento nestes autos pelo Tribunal ad quem, porquanto definem um enquadramento legal que não é o adequado para regulamentação da situação controvertida, além de que se encontram descontextualizados, sendo antes uma tentativa de encontrar um enquadramento legal que venha dar razão à pretensões da Recorrente, quando o que, de facto, se lhes aplica é claro e cristalino como, de modo correto, a sentença recorrida concluiu.

    c.-O Tribunal a quo soube desbravar, com sucesso e de forma magistral, a prova produzindo e o devido enquadramento, valorizando devidamente qual o enquadramento legal correto, assim como as consequências da sua aplicabilidade.

    d.-Verifica-se assim que a Recorrente não põe em crise, no presente recurso, a matéria dada como provada.

    e.-Inexistiu, portanto, qualquer nulidade dos contratos celebrados, sendo totalmente lícita a contratação da A. ao abrigo de contrato de trabalho temporário a termo, pelo que o recurso deverá improceder.

    f.-Acresce que, como cabalmente ficou provado, a Autora, ora Recorrente, não desempenhou as suas funções para a 2.ª Ré, ora Apelante, de forma ininterrupta, desde 22 de Junho de 2017, g.-Não tendo trabalhado para nenhuma das Rés no período...

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