Acórdão nº 24272/17.2T8LSB-F.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Outubro de 2021
Magistrado Responsável | FÁTIMA REIS SILVA |
Data da Resolução | 12 de Outubro de 2021 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam as Juízas da 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Lisboa 1. Relatório ML foi declarado insolvente por sentença de 21/11/2017, transitada em julgado.
Por requerimento de 12/05/2020, o Sr. Administrador da Insolvência informou ter recebido uma proposta de aquisição do imóvel compreendido na massa insolvente sito na Ericeira, por € 300.000,00, que teve concordância do credor hipotecário, e ter o proponente depositado 20% do valor da proposta, estando a escritura marcada para o dia 18/06/2020.
O insolvente pediu, em 20/05/2020, “ao abrigo do disposto no nº. 5 do artigo 161º do CIRE, se digne mandar sobrestar na alienação que o Senhor Administrador de Insolvência se propõe fazer e, bem assim, convocar a assembleia de credores para prestar o seu consentimento à venda do imóvel ao interessado que apresentou a proposta anexa, que é mais vantajosa para a massa insolvente, alegando, em síntese, ter sido notificado da intenção de alienação em 15/05/2020, sendo que a venda do imóvel, por ser o único apreendido se reveste de especial relevo pelo que depende de consentimento da assembleia de credores. Informa ter sido contactado por um vizinho que se declarou interessado na aquisição por € 330.000,00 o que demostra que a alienação a outro interessado é mais vantajosa para a massa insolvente.
Foi ocorrendo processado relativo a questão de se o imóvel em casa constituiria a habitação do insolvente e, este, por requerimento de 16/06/2020, requereu que o tribunal conhecesse do primeiro requerimento que havia efetuado em 20/05/2020, no sentido de convocação de uma assembleia de credores.
O tribunal, por despacho de 18/06/2020, entendeu nada haver a decidir.
Por requerimento de 29/06/2020, o Administrador da Insolvência informou não ter realizado a escritura marcada para 18/06/20, por entender ser necessária uma pronúncia do tribunal sobre se o imóvel da Ericeira é ou não a casa de morada de família do insolvente, o que requereu.
Em 22/10/2020 o insolvente apresentou nos autos principais requerimento referindo e reiterando o já requerido em 20/05/2020 (no apenso de liquidação) e pedindo ao tribunal que, “ao abrigo do disposto no nº. 5 do artigo 161º do CIRE, ordenar a convocação da assembleia de credores para prestar o seu consentimento à venda do imóvel ao interessado que apresentou a proposta anexa (compra por €350.000,00), que é mais vantajosa para a massa insolvente.” Em 10/11/2020, o insolvente apresentou nos autos principais requerimento reiterando o requerido em 22/10/2020.
Em 09/12/2020, um terceiro identificado informou os autos, no apenso de liquidação, ter apresentado uma proposta de aquisição do imóvel junto do insolvente, reforçar a mesma para € 350.000,00, requerendo sejam dadas instruções ao Administrador da Insolvência para realização da escritura nos termos propostos.
Por requerimento apresentado nos autos principais em 22/12/2020, o credor hipotecário referindo ter tomado conhecimento da existência de outra proposta, requereu: “Pelo supra exposto requer-se a V. Exa que: a) Seja o Sr. Administrador de Insolvência notificado para se pronunciar num prazo de 10 dias acerca da proposta enviada aos autos no dia 09/12/2020 pelo Sr. AC e do presente requerimento da credora hipotecária; b) Caso o Sr. Administrador de Insolvência nada responda, concorda-se com a posição do insolvente e desde já se requer que seja convocada uma assembleia de credores ao abrigo 161.º n.º 5 do CIRE para análise e aceitação da proposta de terceiro no montante de 350.000,00 € por ser de valor substancialmente superior e sobretudo porque o proponente não estabelece como condição para realização da escritura o imóvel encontrar-se livre de pessoas e bens.” O Administrador da Insolvência veio pronunciar-se, referindo ter a proposta formulada, de € 300.000,00 sido aceite pelo credor hipotecário, pelo que o proponente depositou 20%, tendo-lhe sido emitida declaração relativa ao cumprimento de obrigações fiscais, apenas ainda não tendo sido possível realizar a escritura, já novamente designada para o dia 28 de janeiro de 2021. A adjudicação está efetuada, correndo a massa insolvente o risco de ter que proceder à devolução do sinal em dobro.
Em 06/01/2021, o tribunal proferiu, nos autos principais, o seguinte despacho: “Ref.: 37087035, de 10.11.2020 Nos termos do artigo 164.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas cabe ao administrador da insolvência escolher a modalidade da alienação dos bens, podendo optar por qualquer das que são admitidas em processo executivo ou por alguma outra que tenha por mais conveniente, decisão que lhe é cometida em exclusivo, segundo o seu prudente critério e tendo em conta o que seja mais conveniente para os interesses dos credores.
Na liquidação o Administrador da Insolvência escolhe a modalidade da venda, podendo escolher a que considere mais conveniente, devendo fixar o valor base da venda – artigo 164.º, n.º 1, do CIRE.
Termos em que se indefere ao requerido.
Notifique.” Inconformado apelou o insolvente, pedindo que, sendo a apelação julgada integralmente procedente e revogado o despacho recorrido seja o mesmo substituído por outro que: a) Mande sobrestar na alienação do imóvel apreendido para a massa insolvente (nº xx da Rua …, Ericeira); b) convoque a assembleia de credores para prestar o seu consentimento à operação de alienação do dito imóvel, formulando as seguintes conclusões: “1. Vem o presente recurso interposto do douto despacho de 06.01.2021, na parte em que o mesmo apreciou e indeferiu o requerimento do Insolvente, ora Apelante, de 10.11.2020, com a Refª 37087035.
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O referido douto despacho limitou-se a discorrer sobre a competência exclusiva do Senhor Administrador de Insolvência para escolher a modalidade da alienação dos bens e o respectivo valor base.
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No referido requerimento, o Insolvente, ora Apelante, formulou o pedido de sustação da venda e convocatória da assembleia de credores para prestar o seu consentimento à venda do imóvel ao interessado que apresentou melhor proposta, ao abrigo do disposto no nº. 5 do art. 161º do CIRE.
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Logo, não estão em causa as questões sobre as quais se pronunciou o douto despacho recorrido, concretamente, não está em causa a modalidade da venda por negociação particular ou o valor base dessa venda, mas sim o facto de, tendo sido essa a escolha do Senhor Administrador de Insolvência, haver que atender ao disposto no artigo 161º do CIRE.
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Ao indeferir as requeridas sustação da venda e convocação da assembleia de credores, apesar de se verificarem todos pressupostos previstos na lei, designadamente aqueles de que trata o n.º 5 do artigo 161º do CIRE, o Tribunal a quo incorreu em erro na determinação da norma aplicável.
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A aplicação do disposto no artigo 161º, nº 5 do CIRE imporia, necessariamente, o deferimento do requerimento do Insolvente de 06.01.2021 (Refª 401764551).
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Fundamento específico da recorribilidade: decisão recorrível, cuja impugnação só com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil.” Não foram apresentadas contra-alegações.
Na mesma data em que foi proferido o despacho recorrido (de 06/01/2021), o insolvente apresentou nos autos principais requerimento de resposta à pronúncia apresentada pelo Sr. Administrador da Insolvência, subscrevendo o requerido pelo credor hipotecário, pedindo seja sobrestada a venda e alegando que o proponente com o qual se encontra agendada a escritura é administrador de uma empresa com sede na mesma morada do escritório do Sr. Administrador da Insolvência.
O Administrador da Insolvência respondeu em 07/01/2021, pedindo autorização para prosseguir com as diligências de venda e celebração da escritura no dia 28 de janeiro de 2021, conforme já agendado.
Em 26/01/2021 foi proferido, nos autos principais, o seguinte despacho: “Termos em que se indefere ao pedido de realização de uma assembleia para obstar à realização da compra e venda do imóvel sito na Rua …, n.º xx, na Ericeira.
Notifique.
Custas pelo devedor, fixando-se a taxa de justiça do incidente em 2 UC.” Inconformado apelou o insolvente, pedindo que, sendo a apelação julgada integralmente procedente e revogado o despacho recorrido seja o mesmo substituído por outro que: a) anule a venda do imóvel apreendido para a massa insolvente (nº xx da Rua …, Ericeira), levada a cabo pelo Sr. Administrador da Insolvência, por ter sido realizada na sequência de acto nulo por omissão e, como tal, anulável (art. 195º nº2 do CPC); ou, subsidiariamente; b) anule a venda do referido imóvel apreendido, por ter sido realizada com violação do disposto no artigo 161º, 5 do CIRE; e, em qualquer caso, c) ordene a convocação da assembleia de credores para se pronunciar sobre a eficácia da alienação do referido imóvel, levada a cabo pelo Sr. Administrador da Insolvência, com violação do disposto no artigo 161º, 5 do CIRE, formulando as seguintes conclusões: “1. Vem o presente recurso do douto despacho de 26.01.2021, que indeferiu o requerimento do Insolvente, ora Apelante, de 06.01.2021 porque “o devedor tomou conhecimento da venda e de todas as suas condições … incluindo a realização da escritura há largos meses e o prazo de arguição de qualquer nulidade secundária… há muito se esgotou.” 2. Mas, o devedor suscitou TEMPESTIVAMENTE a questão que o douto despacho recorrido classifica como arguição de nulidade.
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Na verdade, o Insolvente foi notificado pelo Sr. Administrador da Insolvência, do projecto de venda do imóvel, em 15.05.2020 e, em 20.05.2020, requereu a sustação da projectada venda e a convocação da assembleia de credores para apreciação de uma proposta mais vantajosa para a massa insolvente.
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Os requerimentos do Insolvente de 22.10.2020 e de 06.01.2021 não foram mais do que renovações insistentes do pedido que fizera no seu requerimento de 20.05.2020.
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Assim, o Insolvente arguiu tempestivamente a alegada nulidade, mas o Tribunal não a apreciou em tempo útil, o que, constitui irregularidade por omissão...
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