Acórdão nº 16/16.5T9BNV.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 12 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelGOMES DE SOUSA
Data da Resolução12 de Outubro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal da Relação de Évora: A - Relatório No Tribunal Judicial da Comarca de Santarém – Juízo Local Criminal de Benavente - Juiz 1 - correu termos o processo comum singular supra numerado no qual são arguidos: "(...), UNIPESSOAL, LDA.", titular do NIPC (…), com sede na (…); e (...), ; imputando ao arguido (...), como autor material, a prática de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, na forma continuada, p. e p. pelos arts. 6., n. 1, 7., n. 3, e 107., ns. 1 e 2, todos do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), com referência ao art. 105., ns. 1 e 4, ais. a) e b), do mesmo diploma legal, e art. 30. n. 2, do C. Penal, aplicável ex vi art. 3., al. a), do RGIT.

E imputando à sociedade arguida "(...) - Unipessoal, Lda." a responsabilidade por tais ilícitos, atento o disposto nos arts. 7., n. 1, 12., n. 2 e 107., ns. 1 e 2, todos do RGIT, com referência ao art. 105., ns. 1 e 4, als. a) e b), do mesmo diploma legal, e 30., n. 2, do C. Penal, aplicável ex vi art. 3., al. a) do RGIT.

O Centro Distrital de Santarém do Instituto de Solidariedade e Segurança Social deduziu pedido de indemnização civil.

Os arguidos apresentaram contestação, negando a prática dos factos, alegando que à data do despacho de acusação apenas era devido à Segurança Social o montante de 6.545,48 €, pelo que não se mostra preenchido o ilícito criminal. Quanto ao pedido de indemnização civil, invocam a caducidade do direito da Segurança Social liquidar os tributos de 2008 a 2011, bem como a prescrição do crédito da Segurança Social.

* Por sentença de 13-10-2020 foi decidido julgar procedente por provada a acusação deduzida pelo Ministério Público e, em consequência, decidiu o tribunal recorrido:

  1. CONDENAR a sociedade arguida "(...), UNIPESSOAL, LDA." pela prática de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, na forma continuada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 107º. e 105º., n.s 1 e 2, e 7., n. 1 do RGIT e 30º. e 79º., n. 1 do CP, na pena de 200 dias de multa, à taxa diária de €10,00, o que perfaz o montante global de € 2.000,00.

    b) CONDENAR o arguido (...), pela prática, de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, na forma continuada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 107. e 105., n.s 1 e 2, do RGIT e 30. e 79., n. 1 do CP, na pena de 110 dias de multa, à taxa diária de € 6,00, o que perfaz o montante de € 660,00.

    c) CONDENAR os arguidos, solidariamente, no pagamento à demandante civil do montante relativo a quotizações em dívida de € 6.071,85, acrescido dos juros de mora vencidos e vincendos sobre aquela capital, desde a partir do 15. dia do mês seguinte àquele a que as referidas contribuições dizem respeito, até efetivo e integral pagamento, todos calculados de acordo com as disposições especiais por dívidas à Segurança Social; d) CONDENAR os arguidos no pagamento das custas do processo penal, fixando-se a taxa de justiça devida em 3 UC, reduzida a metade atenta a confissão, nos termos do disposto nos artigos 344º., n. 2 e 513° do Código de Processo Penal, e artigo 8°, n 9 e Tabela III do Regulamento das Custas Processuais; e) CONDENAR os demandados/arguidos a pagar as custas cíveis do processo - cfr. artigo 527º. do Novo Código de Processo Civil.

    * Inconformados, interpuseram recurso os arguidos com as seguintes conclusões:

    a) Segundo o disposto no artigo 32.º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa, é dever do Mmo. Juiz pronunciar-se sobre todos os factos, quer os constantes da acusação, quer os narrados em sede na contestação, bem como ainda os resultantes da discussão da causa.

    b) Do disposto na alínea d), do nº 1 do artigo 374º do CPP, bem como do nº 2 do mesmo preceito, a sentença tem de conter, ainda que sumariamente, as conclusões contidas na contestação, c) A sentença proferida pelo Tribunal A Quo, é omissa quanto aos factos alegados pelos arguidos em sede de contestação à acusação pública, bem como da contestação ao pedido de indemnização civil.

    d) Face ao vertido no artigo 368.º, n.º 2 do CPP, é inequívoco que o Tribunal A Quo deveria ter-se pronunciado sobre os factos alegados na contestação com interesse para a decisão, e) Ao não dar como provados ou não provados, os factos invocados na contestação e perante a omissão de qualquer análise critica sobre a matéria de facto alegada em tal articulado, o Tribunal A Quo não deu cumprimento ao vertido no artigo374°, n. 2, do CPP, f) Omissão que constitui uma violação do disposto no artigo 379º, nº 1, als. a) e c) do CPP, g) Dos pontos 12 e 13 dos Factos Provados, constantes da Fundamentação de Facto da Sentença Recorrida é feita alusão aos pressupostos que determinam o preenchimento dos elementos subjectivos do crime apenas no que concerne a um dos arguidos, h) Da sentença recorrida não fora dado como provado que o arguido (...) agiu em nome próprio ou só em nome e representação da arguida sociedade, i) Ou que tenha praticado os factos dados como provados, no seu próprio interesse, j) Ou mesmo que tenha atuado no interesse da sociedade, k) O que constitui uma evidente nulidade da sentença recorrida, por omissão da descrição dos elementos subjectivos do crime.

    I) Resulta ainda da sentença recorrida, no ponto 3.2 (Escolha e medida da Pena), especificamente na alínea B) (Da Medida Concreta da Pena), que "( ... ) tendo presente que a sociedade arguida tem uma condenação anterior pela prática de crime da mesma natureza, sendo que parte dos factos em causa nestes autos foram praticados em data anterior a essa condenação, afigura-se adequada a aplicação de uma pensa de multa de 200 dias", vide penúltimo parágrafo da página 23 da sentença recorrida.

    m) Acontece que ambos os arguidos são primários.

    n) Aquando da fixação da medida da pena aplicada à sociedade arguida, o Tribunal A Quo não ponderou que a mesma era primária.

    o) A sentença recorrida não concretiza a exacta situação financeira da sociedade arguida para justificar a fixação do quantitativo diário, p) O Tribunal A Quo não atendeu ao facto de já se encontrar liquidada a parcela de valor de contribuições correspondentes aos trabalhadores, q) Sendo tal facto omisso da sentença recorrida, o que determinará a nulidade da mesma, conforme resulta do disposto nas já citadas alíneas a) e c), do nº 1 do artigo 379º do CPP.

    r) No Pedido de Indemnização Civil deduzido pelo ISS, são reclamados valores "relativos ao não pagamento das quotizações deduzidas das remunerações pagas aos trabalhadores nos meses de Janeiro de 2009 a Março de 2014", s) Para o Tribunal A Quo, o que está em causa, é "a obrigação de indemnizar pelos danos causados pela prática de facto ilícito e culposo, pelo que esta indemnização não é afectada pelo facto de existir, ou não, execução tributária para liquidação de contribuição, nem por já ter sido ou não pago o tributo, sendo que da condenação no pedido cível não resultará nunca, uma sobreposição ou duplicação de pagamento de uma mesma quantia que seja devida".

    t) Não resulta da sentença sub judice qualquer fundamento de Facto e de Direito justificativo do apuramento do quantum indemnizatório com base em alegada responsabilidade civil extracontratual. ..

    u) Face ao acima exposto, a Sentença Recorrida deverá ser declarada nula, com todas as consequências daí resultantes.

    Nestes termos e com o mui douto suprimento de v. exas., é nosso humilde entendimento que o presente recurso deve ser julgado procedente, por provado, para tanto, devem ser reconhecidas e declaradas as invocadas nulidades e consequentemente, ser ordenada a substituição da sentença recorrida.

    * A Digna magistrada do Ministério Público apresentou resposta defendendo a manutenção do decidido.

    A Exmª. Procuradora-geral Adjunta neste Tribunal da Relação emitiu douto parecer defendendo a manutenção do decidido.

    Foi cumprido o disposto no artigo 417º n.º 2 do Código de Processo Penal.

    *** B - Fundamentação: B.1.1 - O Tribunal recorrido deu como provados os seguintes factos: Da acusação pública 1. A arguida, constituída no dia 07.06.2006, tinha como objeto social, durante o período em referência em 6. as atividades de restauração e snack-bar.

    1. Também nesse período, o arguido exerceu, em exclusivo, as funções de gerente da arguida e, pelo exercício de tal atividade, foi remunerado, na qualidade de membro de órgão estatutário.

    2. No exercício das funções de gerência, competia ao arguido a prática de todos os atos de direção e gestão da arguida, designadamente, as obrigações de entregar, atempadamente, à Segurança Social, as declarações de remunerações dos seus trabalhadores e membros de órgãos estatutários, bem como os valores das contribuições e cotizações deduzidas nas referidas remunerações.

    3. O arguido sabia que, até 31.12.2010, a entrega do valor das contribuições e cotizações deduzido nas remunerações indicadas em 3., devia ser efetuada até ao dia 15 do mês seguinte àquele a que respeitava.

    4. Sabia ainda que, a partir de 01.01.2011, a entrega do valor das contribuições e cotizações deduzido nas remunerações...

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