Acórdão nº 01655/18.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução08 de Outubro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:*I Relatório D.

, no âmbito da Ação Administrativa intentada contra a Comissão para o Acompanhamento dos Auxiliares da Justiça, tendente, em síntese, a impugnar a decisão por esta proferida a 27/03/2018, que lhe aplicou a sanção disciplinar de interdição definitiva do exercício da atividade profissional de agente de execução, inconformado com a Sentença proferida em 30 de março de 2021, através do qual a ação foi julgada “totalmente improcedente”, veio interpor recurso jurisdicional da referida Sentença proferida em primeira instância no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto.

Formula o aqui Recorrente/D.

nas suas alegações de recurso, apresentadas em 17 de maio de 2021, as seguintes conclusões: “1. A decisão recorrida enferma de um desvio processual suscetível de gerar ou influir no exame e na decisão da causa, designadamente por violação do princípio do contraditório decorrente do n.º 3, do art.º 3.º, do CPC, o que conduz à nulidade da decisão recorrida.

  1. O Recorrente só com a notificação da sentença proferida teve conhecimento da dispensa da audiência prévia a que alude o art.º 87.º B, do CPTA, pelo que o presente recurso jurisdicional interposto dessa sentença é o meio adequado para reagir contra essa nulidade.

  2. Aliás, o despacho a dispensar a realização da audiência prévia, proferido no próprio relatório da sentença, é contrário ao despacho anteriormente proferido, de 18.03.2019, proferido 2 anos antes, no qual se defere a realização da audiência prévia, tendo em conta a oposição manifestada pelo Requerente à sua dispensa, por entender ser necessária e imprescindível à boa decisão da causa.

  3. O Tribunal não só omitiu a prolação do despacho de dispensa da audiência prévia no tempo devido, como privou as partes de se pronunciarem e de requererem a realização da audiência prévia potestativa, prevista no art.º 87.º - B, n.º 3, do CPTA.

  4. Pelo que, estamos perante uma nulidade processual, por estar coberta por decisão judicial, traduzida na omissão de um ato processual devido (omissão do despacho de dispensa da realização da audiência prévia), em tempo processualmente útil e adequado, que assegure o contraditório às partes sobre a diferente tramitação da causa e o uso de poderem requerer a realização da audiência prévia, nos termos do artigo 87.º-B, n.º 3 do CPTA.

  5. Pelo exposto, a decisão final de mérito em saneador-sentença, com dispensa de audiência prévia, constitui nulidade, impugnável por meio de recurso, implicando a revogação da decisão que dispensou a convocação da audiência prévia e, consequentemente, a nulidade dos atos praticados subsequentemente a tal decisão e que da mesma dependam em absoluto, ou seja, in casu a sentença (saneador/sentença). Sem prescindir, e por mero dever de patrocínio, caso assim não se entendesse; 7. A decisão recorrida enferma de erro de julgamento, em matéria de direito, fazendo uma errada aplicação da lei e orientação jurisprudências.

  6. O entendimento do Tribunal a quo plasmado na decisão recorrida que entendeu que ainda não havido findado o prazo de prescrição do procedimento disciplinar previsto nos artigos 135.º, n.º 2, do ECS e do artigo 184.º do EOSAE, sem atender à Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP), esvazia por completo o preceituado no art.º 178.º da LGTFP.

  7. De acordo com os artigos 181.º e seguintes do Estatuto da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução (EOSAE), o procedimento disciplinar não se cinge à enunciação dos princípios orientadores do poder disciplinar.

  8. É contrária à lei, a interpretação dos artsº 135.º ECS e art.º 184.º EOSAE isoladamente sem a aplicação do art.º 178.º da LGTFP, por remissão do art.º 189.º do EOSAE, no sentido de que considerar que o prazo de prescrição do processo disciplinar de 10 anos, sem se atender ao prazo máximo de 18 meses para a conclusão do procedimento disciplinar, estipulado no art.º 178.º, n.º 5, do LGTFP.

  9. No presente caso, o prazo de 18 meses foi largamente ultrapassado, dado que o acórdão referente ao Processo n.º 15847/09.4TDPRT, transitou em julgado em 18/03/2016 e, apenas e só, em 27/02/2018, a Recorrida, notifica o Recorrente, da decisão final do procedimento disciplinar.

  10. Pelo exposto, o procedimento disciplinar nº 59/2012 mostra-se assim prescrito nos termos dos artsº 135.º ECS e art.º 184.º EOSAE, conjugado com o artigo 178º, n.ºs 5 e 6, da LTFP, e extinta a responsabilidade disciplinar do arguido, no que concerne à sua conduta no âmbito do processo judicial em referência. Sem prescindir, 13. É igualmente inequívoco que a decisão do Tribunal a quo enferma em erro de julgamento, fazendo uma errada aplicação da lei e orientações jurisprudenciais, quando na sentença recorrida concluiu que a Recorrida não violou os direitos de defesa do Autor ao não proceder à inquirição das testemunhas arroladas pelo arguido, aqui Recorrente, no processo disciplinar que lhe foi instaurado, fazendo uma errada interpretação dos arts.º 168.º do ECS e 204.º EOSAE.

  11. No caso concreto, ao ser omitida a inquirição das testemunhas arroladas pelo Recorrente, arguido no processo disciplinar, foi violada uma das fases obrigatórias e essenciais do processo disciplinar, estipulado pelos normativos supra descritos, a fase de defesa do arguido.

  12. Pelo que a Recorrida violou gravemente o princípio do dever legal de defesa dos direitos do Autor, bem como o princípio da igualdade e proporcionalidade que encontram acolhimento no art.º 268.º, n.º 3, da CRP.

  13. A omissão da inquirição de testemunhas requerida pelo Recorrente, arguido no processo disciplinar n.º 59/2012, deve ser apreciada, em conjugação com os arts. 168.º do ECS e posterior art.º 204.º do EOSAE, à luz da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP), aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20.06, nomeadamente no seu art. 218.º, no qual estatui que o instrutor pode recusar diligências de prova requeridas pelo arguido, porém, para indeferir o requerimento de prova apresentado pelo arguido, teria de proferir despacho fundamentado, com enunciação das razões pelas quais as diligências de prova requeridas sejam reputadas de impertinentes e desnecessárias, o que não aconteceu no presente caso.

  14. O instrutor, in casu, aceitou a inquirição das testemunhas, notificando a mandatária do arguido para indicar os factos pelos quais as testemunhas deviam ser inquiridas, considerando, desta forma, que a diligência instrutória de produção da prova testemunhal se revelava pertinente e necessária para a boa decisão e apreciação do processo.

  15. Apenas no relatório final do procedimento disciplinar, a Recorrida, para corrigir um alegado “lapso” ao referir que o arguido não indicou os factos pelos quais as testemunhas deviam ser inquiridas, quando o mesmo não correspondia à verdade dos factos, alega, pela primeira vez, que a audição das testemunhas se mostra desnecessária atenta a factualidade em discussão e os elementos de prova carregados para os autos de procedimento disciplinar.

  16. A não inquirição da prova testemunhal arrolada pelo Recorrente, sem apontar qualquer fundamento, equivale à falta de demonstração da materialidade fática que o Recorrente propunha em sua defesa, incorrendo, desta forma, a entidade, aqui Recorrida, em vício de violação de lei como omissão de diligência legalmente devida.

  17. Pelo supra exposto, estamos perante uma nulidade do procedimento disciplinar, por ofensa ao conteúdo de um direito fundamental de defesa, o que traduz na nulidade insuprível, conducente à anulação do ato que puniu o Recorrente com a pena de Interdição definitiva do exercício da atividade profissional.

  18. A decisão recorrida traduz-se numa interpretação abusiva e que vai contra os elementares princípios de direito sancionatório, como seja, mormente, o princípio do contraditório.

  19. A decisão recorrida ao considerar que não existe qualquer nulidade, enferma em evidente erro jurídico, ao conceber o direito disciplinar como um mero "processo de partes", pondo de lado o princípio da legalidade e bem assim a necessidade de melhor apurar as circunstâncias que determinaram a prática desses factos, as quais se revelam de especial importância, mormente para a correta escolha e determinação do tipo e medida da pena a aplicar.

  20. A decisão recorrida enferma numa errada aplicação das orientações jurisprudenciais, uma vez que, a temática da necessária pronúncia do instrutor sobre o pedido de realização das diligências de prova requeridas pelo arguido, em sede disciplinar, tem assumido, coerente e uniforme Doutrina e igual Jurisprudência dos Tribunais Superiores, defendendo que o instrutor só pode recusar a inquirição das testemunhas de defesa arroladas pelo arguido na resposta à acusação, se considerar os respetivos depoimentos patentemente dilatórios (cf. desnecessários) ou impertinentes, o que deve fundamentar por escrito, não preenchendo esse requisito a mera afirmação de que a matéria da acusação está suficientemente provada.

  21. In casu, o Recorrente (arguido no processo disciplinar em causa) pretendia, através da inquirição das testemunhas que arrolou e cuja inquirição a Requerida omitiu, demonstrar factos que até então não tinham sido levados em conta, permitindo, dessa forma, a alteração da decisão que viesse a ser tomada, fosse ao nível da natureza da sanção ou do menor grau de intensidade da atuação que lhe foi imputado.

  22. A concretização do direito de defesa do arguido, aqui Recorrente, e a necessidade de descoberta da verdade dos factos, impunha que aquela diligência instrutória de inquirição das testemunhas arroladas pelo Recorrente tivesse tido lugar.

  23. Pelo que, se poderá conclui, que foi indevidamente recusada por parte da Recorrida, a produção de prova testemunhal apresentada pelo Recorrente, redundando essa omissão em nulidade do processo disciplinar e da decisão de aplicação de sanção.

  24. Pelo supra exposto, deve ser declarada a nulidade do processo disciplinar...

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