Acórdão nº 2654/20.2T8VNG-F.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 23 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelTOM
Data da Resolução23 de Setembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 2654/20.2T8VNG-F.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal – Juízo de Comércio de Setúbal – J1 * Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório: “(…), SA, Sucursal em Portugal” veio intentar acção de verificação ulterior de créditos contra a Massa Insolvente de “(...) Portugal, Lda.”, a própria insolvente e demais credores. Proferida decisão final, a Autora veio interpor recurso da decisão que julgou procedente a excepção deduzida pela massa insolvente de “(…) Portugal, Lda.” relacionada com a intempestividade da acção.

* A sociedade “(…) Portugal, Lda.” foi declarada insolvente por sentença proferida nos autos principais em 24/04/2020, acto decisório que transitou em julgado em 11/05/2020.

* A Autora não constava da lista de credores junta pela devedora com o requerimento inicial.

* A lista definitiva de credores reconhecidos foi junta ao apenso de reclamação de créditos em 21/10/2020, não foi reconhecido qualquer crédito à Autora nem a mesma foi notificada nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 129.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.

* Em 08/01/2021, a recorrente instaurou, junto dos autos de insolvência, acção de verificação ulterior de créditos contra a insolvente “(…) Portugal, Lda.”, a massa insolvente de “(…) Portugal, Lda.” e os demais credores da insolvente.

* Para tanto, a Autora alegava que era detentora de um crédito sobre a insolvente no montante de € 1.395.580,11, resultante de um contrato através do qual concedeu uma linha de gestão de pagamentos a fornecedores a várias sociedades, entre elas a insolvente, as quais ascendem a € 1.345.701,29, montante ao qual acrescem juros legais no valor de € 23.878,82.

* Posteriormente, em 08/03/2021, veio a Autora informar que havia recuperado parte da dívida, que então se cifrava em € 327.189,11 (€ 301.189,11 de capital, a que acrescem € 26.000,00 de juros).

* A Massa Insolvente contestou, pugnando pela sua absolvição da instância, uma vez que a acção foi intentada depois de decorrido o prazo previsto na alínea b) do n.º 2 do artigo 146.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.

* A Autora tem a natureza jurídica de representante permanente da sociedade espanhola e o local da representação fica situado em Lisboa.

* A sentença recorrida julgou procedente a excepção deduzida pela massa insolvente de “(…) Portugal, Lda.” na sua contestação, absolvendo as Rés da instância.

* A sociedade recorrente não se conformou com a referida decisão e o articulado de recurso continha as seguintes conclusões: 1. Vem o presente recurso interposto do despacho proferido pelo Tribunal a quo, que julgou improcedente a acção de verificação ulterior de créditos proposta pela aqui recorrente, 2. com o qual, salvo devido respeito, esta não se resigna.

  1. A recorrente instaurou a presente acção em 08/01/2021, com vista ao reconhecimento o crédito do qual é credor o (…), em Espanha.

  2. Conforme clarificado na petição inicial e respectiva documentação junta, em 30/03/2017 a credora concedeu às sociedades comerciais (…) Centro de Salud Y Estetica, S.L., (…) Clinical, S.L. e (…) Italia, S.R.L., uma linha para a gestão de pagamentos a fornecedores, devendo os montantes mobilizados e respectivos juros ser reembolsados até à data de vencimento das respectivas ordens de pagamento.

  3. Em 27/11/2018 foi formalizado um aditamento ao contrato primitivo, com a inclusão, enquanto entidade financiada, da sociedade (…) Portugal, Lda., aqui insolvente.

  4. Em 25/06/2019 foi celebrado novo aditamento para fixação do limite máximo contratualizado.

  5. Face ao incumprimento do contrato em apreço, concluiu pela pendência do crédito devido pela insolvente, a ser qualificado como comum, na quantia global de € 1.395.580,11.

  6. Ulteriormente, porque foi a entidade ora credora ressarcida no âmbito do processo de insolvência, que corre termos em instância espanhola, da co-devedora (…) Centro de Salud Y Estetica, S.L., 9. pelo que o valor ora peticionado foi reduzido à importância de € 327.189,11.

  7. Por despacho do Tribunal a quo de 20/01/2021, foi a recorrente notificada para pronunciar-se quanto à tempestividade da acção, 11. sendo que, após a competente pronúncia, foi proferido despacho de citação da acção.

  8. A R. Massa Insolvente de (…) Portugal, Lda. deduziu contestação, na qual firmou, sucintamente, a intempestividade da acção por força da alínea b) do n.º 2 do artigo 146.º do C.I.R.E., assim como o desconhecimento do crédito em apreço.

  9. Fazendo face ao teor impugnado, a aqui recorrente, em exercício de contraditório, juntou aos presentes autos a missiva interpelatória para pagamento da dívida, remetida à insolvente pelo (…), em momento anterior à data declaratória da insolvência.

    Ora, 14. O Tribunal a quo decidiu pela procedência da excepção de intempestividade, e consequente decaimento da acção, 15. socorrendo-se do entendimento de que a sucursal em Portugal “tinha o dever, como representante da empresa de verificar a insolvência da devedora e reclamar os seus créditos”, não se verificando, assim, a omissão de notificação, 16. com a aplicação do prazo de 6 meses previsto no artigo 146.º do C.I.R.E., já precludido à data da propositura da acção.

    Então vejamos, 17. O negócio bancário que se encontra na base do crédito peticionado na presente acção decorre de negócio bancário outorgado em Espanha, junto do (…), S.A.

  10. A A., sucursal em Portugal, é dotada de personalidade judiciária para demandar, nos termos do n.º 2 do artigo 13.º do C.P.C..

  11. Entendimento em sentido diverso não foi suscitado pelo Tribunal a quo, e, por conseguinte, tem-se como firmada a inexistência de qualquer vício neste âmbito.

  12. Ainda que assim não fosse, tal vício sempre seria sanável, mediante aplicabilidade dos artigos 6.º, 14.º e 590.º, todos do C.P.C..

  13. Nesta senda, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 28/03/2019.

    Prosseguindo, 22. Salvo devido respeito, distintamente do entendido pelo Tribunal recorrido, a existência de sucursal do Banco credor em Portugal não acarreta a sua responsabilidade na verificação da insolvência da aqui devedora, e consequente reclamação de créditos dentro do prazo previsto para o efeito.

  14. Em virtude das imposições decorrentes do Regulamento Geral Sobre a Protecção de Dados (RGPD) da União Europeia, aplicável às sucursais, em estrito cumprimento do princípio da minimização de tratamento de dados pessoais, os dados dos clientes desta entidade bancária quanto a negócio celebrados em Espanha não são transmitidos à sucursal em Portugal.

  15. Desta feita, as entidades em Portugal que verificam e controlam a publicação de anúncios nacionais não têm acesso aos dados dos clientes de negócios celebrados em Espanha, que lhes permitam detectar as publicações com os mesmos relacionadas em Portugal.

  16. Como tal, o ónus de verificação activa não poderia impender sobre a ora credora, que está impossibilitada de usar dos elementos dos susoditos clientes.

  17. Motivo pelo qual apenas tomou conhecimento da pendência destes autos na sequência da publicação do anúncio no Boletim Oficial do Estado de Espanha, em 03/12/2020, o que conduziu à presente demanda.

  18. Sem prescindir, não deixa da A. de censurar a alegação, pela R. contestante, de total ignorância quanto à existência de uma dívida na proporção como é a que a ora recorrente peticiona, mormente nos registos de contabilidade, 28. sobretudo quando foi interpelada ao respectivo pagamento, por missiva remetida pelo (…), em 18/02/2020.

    Com efeito, 29. Ao abrigo do vertido no Regulamento (EU) 2015/848 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Maio de 2015, relativo aos processos de Insolvência – artigos 53.º, 54.º e 55.º – com transposição no n.º 4 do artigo 37.º do C.I.R.E., o (…), em Espanha, deveria ter sido citado da presente insolvência, 30. acto este que não ocorreu.

  19. Após tomada de conhecimento por via do anúncio no Boletim Oficial do Estado de Espanha, a entidade credora viu-se na contingência de avançar com a presente acção, 32. que se vislumbra como o único expediente legal existente para, nesta fase processual, alegar voluntariamente o seu crédito e ver o seu direito reconhecido.

  20. E sem prejuízo do prazo vertido no artigo 146.º do C.I.R.E., salvo devido respeito, face aos factos alegados pela recorrente, prova carreada e legislação suscitada, a douta decisão recorrida faz “tábua rasa” de todo o...

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