Acórdão nº 293/19.0T9PMS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelISABEL VALONGO
Data da Resolução13 de Outubro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, os Juízes na 5.ª Secção - Criminal - do Tribunal da Relação de Coimbra I - Relatório 1 - No Processo Comum Singular n.° 293/19.0T9PMS do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria - Juízo Local Criminal de Porto de Mós, foram os arguidos L., S.A., EM LIQUIDAÇÃO, pessoa coletiva n.º (…), registada na Conservatória do Registo Comercial da (…), com o mesmo número, com sede social em Casal da (…), (…), e C., (…), submetidos a julgamento, pela prática, na forma consumada e continuada, em um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, previsto e punido pelos artigos 6º, 7º, nº 1 e 3 e 107º, do Regime Geral das Infrações Tributárias (Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho), com referência ao artigo 105º, nº 1, deste último diploma, bem como pelo artigo 30º, do Código Penal.

  1. Realizado o julgamento, por sentença 15 de Dezembro de 2020, foi decidido (transcrição do dispositivo): “a) responsabilizar a arguida L., S.A., EM LIQUIDAÇÃO pela prática, na forma consumada e continuada, de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, previsto e punido pelos artigos 6º, 7º, nº1 e 3 e 107º, do Regime Geral das Infracções Tributárias (Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho), com referência ao artigo 105º, nº 1, deste último diploma, bem como pelo artigo 30º, do Código Penal, na pena de trezentos dias de multa à taxa diária de cinco euros, o que perfaz a multa global de dois mil e quinhentos euros; b) condenar o arguido C., pela prática, na forma consumada e continuada, de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, previsto e punido pelos artigos 6º, 7º, nº1 e 3 e 107º, do Regime Geral das Infrações Tributárias (Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho), com referência ao artigo 105º, nº 1, deste último diploma, bem como pelo artigo 30º, do Código Penal, na pena de cento e oitenta dias à razão diária de seis euros, perfazendo a multa global de mil e oitenta euros; e c) (…).

    * 2 - Da referida sentença foi interposto recurso pelo arguido C., formulando as seguintes conclusões: “(….).

    * 3 - RECURSOS INTERCALARES - o recorrente cumpriu o estatuído no art. 412º, nº 5 do CPP.

    3.1 - Foi ainda interposto recurso dos DESPACHOS PROFERIDOS pela juiz titular do processo a 5-11-2020 - CFR FLS 354 e 355 - formulando as seguintes conclusões: “1. 1. Após o trânsito em julgado de uma decisão judicial que declarou extinto o procedimento criminal contra os arguidos e que ordenou o arquivamento do processo, não se afigura que o M.P. possa depois, abrir um novo processo de inquérito, contra as mesmas pessoas e pelos mesmos factos materiais de que naquele outro processo vinham acusada.

  2. Permitir isso, seria permitir “ressuscitar” uma acusação e conferir uma prerrogativa ao M. P. que não tem paralelo quanto aos demais sujeitos processuais, seria a absoluta subversão do sistema processual penal.

  3. Assim, é inaceitável que tendo a decisão que declarou extinto o procedimento criminal e que ordenou o arquivamento, transitado em julgado, possa depois, como se nada tivesse ocorrido e, neste caso, até com a aquiescência da M.mª juíza “a quo”, que aliás, até é a mesma que decidiu pela extinção do procedimento criminal naquele outro processo e ordenou o seu arquivamento, dizíamos, que se possa agora, permita-se-nos a expressão “ressuscitar o morto”.

  4. Neste enquadramento, afigura-se, inclusivamente, que a M.mª Juiz “a quo” ao deferir o requerido pelo M.P. violou os princípios da isenção, objectividade e imparcialidade.

  5. No caso concreto, a possibilidade de após dedução de uma acusação pública, na qual não consta a condição objectiva de punibilidade, se poder reformular essa peça processual, corrigi-la ou construir uma outra, seria sempre manifestamente violador do princípio do acusatório e das mais elementares garantias da defesa, sendo que, nem tal possibilidade de modo algum se harmonizaria com o espírito do sistema processual penal, assente nalguma forma de proteção das expectativas do arguido em face de uma acusação determinada e não sujeita a correções ou reformulações, neste caso, dando lugar à instauração de um novo processo crime em que os factos materiais, os arguidos e a responsabilidade criminal que lhes é imputada, são precisamente os mesmos.

  6. Neste contexto, deve ser revogado o despacho que faz fls, e, consequentemente, perante a verificada extinção do procedimento criminal e arquivamento do processo, transitados em julgado, não pode o arguido ser de novo acusado pelo mesmo crime, pelos mesmos factos materiais, por via de um novo processo que propositadamente é aberto para “ressuscitar” aquele outro processo “morto”.

  7. Neste sentido, num caso como o dos autos, afigura-se, como pugnamos, vedado deduzir nova acusação, aliás, neste caso, saída de num novo processo que foi “propositadamente construído”, para o efeito, pelo que, deve determinar-se, aliás, como foi requerido e aqui se renova, o arquivamento dos autos.

    (…).

    Nestes termos e nos demais de direito que V. Exªs doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso, com todas as consequências legais daí decorrentes.

    Assim, fazendo, farão v. Exªs, justiça.” 3.2 - Foi também interposto recurso pelo arguido dos despachos proferidos pela juiz titular do processo a 19-11-2020, a fls. 363 e a fls 366 - formulando as seguintes conclusões: (…).

    4 - Respostas aos recursos interpostos.

    4.1 O Ministério Público respondeu aos recursos do arguido, concluindo: 4.1.1 - Resposta ao 1º recurso interlocutório “1 - Recorre o Arguido invocando, em suma: I. Da inadmissibilidade da sujeição do arguido julgamento após rejeição de acusação pública e II. (…).

    *** Respondendo às questões suscitadas, diremos: I. No que respeita à inadmissibilidade da sujeição do arguido julgamento após rejeição de acusação pública defende o arguido a impossibilidade de, após a dedução de uma acusação pública, na qual não consta a condição objectiva de punibilidade e que foi rejeitada por esse motivo, reformular essa peça processual, no qual aos arguidos é imputada responsabilidade criminal, pelos mesmos factos materiais, por tal constituir uma violação do princípio do acusatório e das demais garantias de defesa do arguido. Sobre esta questão diremos, a acusação que o Ministério Público primeiramente deduziu nos autos com o n.º 212/18.0T9PMS, não continha o elemento referente à condição objectiva de punibilidade do crime de abuso de confiança à segurança social, em concreto o contido no artigo 105.º n.º 4, al. b) do R.G.I.T., razão pela qual o Tribunal determinou a sua rejeição, por ser manifestamente infundada, nos termos do artigo 311.º, n.º 2, alínea a), e 3, alínea b), Código de Processo Penal. Em face do exposto o Ministério Público requereu a extracção de certidão integral dos autos e deduziu nova acusação, incluindo a narração dos factos que estavam em falta no primeiro despacho acusatório, passando a descrever a matéria que integra a condição objectiva de punibilidade do imputado crime de abuso de confiança à segurança social, vindo assim suprir o vício de insuficiência, que serviu de fundamento ao despacho de rejeição referido. Em sede de saneamento dos presentes autos a M.ma Juiz do Tribunal a quo, conheceu da acusação do presente processo e não lhe encontrou qualquer vício e, por isso a recebeu, designando data para audiência de discussão e julgamento. Em nenhum momento o arguido se insurgiu quanto à tramitação dos autos que, pelo menos, desde a acusação no presente processo conhecia. Só em sede de audiência de discussão e julgamento se insurgiu que manteve até à data. No que a esta parte diz respeito, entendemos que o recurso é extemporâneo, pois, o despacho que recebeu a acusação data de 15-07-2020, tendo o arguido siso notificado por carta de 16-07-2020, tal como o Ilustre Mandatário. A prova de depósito do arguido data de 21-07-2020, pelo que os 30 dias para recorrer do despacho de recebimento da acusação terminariam em 30-09-2020, a que acresceriam 3 dias úteis durante os quais poderia praticar o acto pagando a respectiva multa processual. Assim entendemos porque tal despacho não é irrecorrível nos termos do artigo 311.º ou 400.º do Código de Processo Penal, nem consta no rol de nulidades insanáveis, contidas no artigo 119.º do mesmo diploma legal, nem há cominação especial com esta invalidade em qualquer preceito legal. Todavia o arguido só suscitou a questão em 05-11-2020 por requerimento e agora em sede de recurso, pelo que, a decisão se consolidou não o admitindo. Pelo que, não deverá ser conhecido nesta parte. Ainda que assim não se entenda sempre diremos que sobre tal requerimento se pronunciou a M.ma Juiz, não partilhando a sua posição recorreu o arguido C., sobescrita pela arguida sociedade. Ressalvando sempre o respeito devido pela opinião diversa, é nosso entendimento que, em casos como o dos presentes...

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