Acórdão nº 783/21 de Tribunal Constitucional (Port, 04 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Maria José Rangel de Mesquita
Data da Resolução04 de Outubro de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 783/2021

Processo n.º 985/2021

Plenário

Relator: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita

Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional

I - Relatório

1. Nos presentes autos de recurso de contencioso eleitoral, Fernando Tavares Pereira, na qualidade de primeiro candidato da lista apresentada pela coligação «CORAGEM PARA MUDAR», integrada pelo Partido Social Democrata (PPD/PSD) e pelo CDS-Partido Popular (CDS-PP), às eleições para a Câmara Municipal de Tábua, vem interpor recurso para o Tribunal Constitucional da deliberação da Assembleia de Apuramento Geral do Município de Tábua, reunida no dia 28 de setembro de 2021, em requerimento com o seguinte teor (cf. fls. 2 a 10 com verso):

«Venerandos Conselheiros do Tribunal Constitucional,

Fernando Tavares Pereira, (…), primeiro candidato da lista da coligação PPD/PSD-CDS/PP às eleições para a Câmara Municipal de Tábua, vem, nos termos do art. 156.º e ss. da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto (doravante “LEOAL”), interpor

RECURSO CONTENCIOSO ELEITORAL

do ato de indeferimento da reclamação apresentada pelo mandatário da referida coligação à “Assembleia de Apuramento Geral do Conselho de Tábua”, conforme o que consta da Ata da reunião de 28 de setembro de 2021 da referida Assembleia (cfr. o Anexo 1 ao presente requerimento), o que faz nos seguintes termos:

A. Do prazo do presente recurso contencioso:

1. Começa o Recorrente por lamentar que a afixação do Edital contendo os resultados do apuramento das votações tenha sido efetuado às 20 horas do dia 28 de setembro de 2021.

2. Não é seguramente este comportamento fugidio e a desoras da noite que a lei permite qualificar como proclamação dos resultados eleitorais (cfr., v. g. o art. 150.º da LEOAL).

3. Principalmente quando não podia ser ignorado que tal insólita proclamação noturna, através de um edital porventura só legível com lanternas, não publicita coisa nenhuma.

4. Se a publicitação é feita por edital, o edital tem de ser acessível e legível por todos.

5. Ora, só na manhã seguinte, do dia 29 de setembro de 2021, é que o edital pôde desempenhar a sua função publicitadora.

6. Só então pôde ser conhecido publicamente o seu conteúdo e produzidos, consequentemente, os efeitos associados a esse conhecimento público.

7. Entre esses efeitos consta o início do prazo de interposição do recurso contencioso eleitoral a que se refere o art. 158.º da LEOAL.

8. Logo, o prazo de interposição do presente recurso termina no dia 30 de setembro.

9. Daí que só por mera cautela o Recorrente apresente hoje o correspondente requerimento.

10. Não prescindindo do direito de apresentar mais tarde os elementos de prova e demais documentação que acompanha o presente requerimento de recurso.

B. Dos fundamentos do recurso:

11. Como consta da reclamação indeferida pela Assembleia de Apuramento Geral, houve utilização na mesa n.º 2 da secção de voto de Tábua de cadernos de recenseamento que se veio a descobrir, posteriormente ao termo da votação, estarem incompletos, por desaparecimento de páginas

12. E terem sido “completados” a posteriori, por via do agrafamento de novas páginas.

13. Sem que se saiba porque estavam incompletos e em que medida.

14. E sem que se saiba como foram “reconstituídos”.

15. E sem que se saiba onde foram obtidas as folhas em falta…

16. E quem as forneceu!

17. Tal facto, gravíssimo, compromete a lisura e fidedignidade do processo eleitoral.

18. Acresce que, tal como relatado na reclamação, houve utilização de transportes particulares por parte de elementos ligados às candidaturas ou aos próprios serviços camarários para deslocação de eleitores.

19. Houve conversas entre candidatos e eleitores que aguardavam a sua vez para votar.

20. Houve colocação nas urnas de votos não pelo eleitor, mas por um membro da mesa, sem legitimidade para o efeito.

21. Todos estes fatos foram conhecidos a posteriori, após o encerramento das urnas, e serão provados com os elementos que o Recorrente protesta juntar.

Nestes termos, deverá ser dado provimento ao presente recurso e declarada a nulidade dos atos eleitorais relativos à eleição da Assembleia Municipal e da Câmara Municipal de Tábua

Os Advogados».

2. Notificados os recorridos quanto ao presente recurso, apenas foi apresentada resposta por Ricardo Manuel Oliveira da Silva Cruz, na qualidade de primeiro candidato pelo Partido Socialista às eleições para a Câmara Municipal de Tábua, com as seguintes conclusões:

«CONCLUSÕES:

I. Não pode ser conhecido o presente recurso, porquanto do mesmo, e da acta geral de apuramento, resulta não se encontrar verificado o pressuposto exigido pelo n° 1, do art. 156° da LEOAL, para a sua apreciação, que obriga a tal recurso, estejam subjacentes protestos escritos, apresentados aquando do acto, em que verificaram as alegadas irregularidades - durante a votação, neste caso.

II. Igualmente não o Recurso não cumpre os requisitos essenciais do n° 1, do art. 159°, que exige que do articulado do mesmo, façam parte integrante todos os factos e provas, que fundam a pretensão, o que não sucede no caso vertente, porquanto a junção de testemunhas e demais documentação, foi apresentada em momento ulterior, por via de requerimento autónomo, sendo que excluindo a Acta da Assembleia Geral de Apuramento, todos estavam, ou eram necessariamente conhecidos pelo Recorrente, em momento anterior, até pelas datas apostas em tais documentos, pelo que devem os mesmo expurgados dos autos, por extemporaneidade e rejeitado o Recurso, por ineptidão do mesmo.

III. Não obstante o que vai concluído, sempre se dirá que carecem de fundamento as alegações do Recorrente, atinentes á eventual ocorrência de irregularidades, porquanto como melhor resulta da Acta Geral de Apuramento, aquando da ocorrência dos factos, uma parte substancial dos mesmos foi presenciada pelo mandatário da candidatura encabeçada pelo Recorrente, sem que ele, ou qualquer delegado hajam lavrado os protestos respectivos. Pelo que não resultam de conhecimento à posteriori (vide pag. 12 a 14 do citada Ata de Apuramento Geral).

IV. No tocante aos restantes factos alegados, constituem, os mesmos, meras generalidades, não consubstanciadas ou concretizadas, relativas a alegadas conversas e telefonemas, feitos por pessoas ligadas a candidaturas, sem apontar uma irregularidade que não sejam sob a forma de hipotéticas e putativas atitudes, que pretendem constituir irregularidades

V. Excepção feita à questão, em concreto, da fol. 55 de um dos cadernos eleitorais, que na mesa de apuramento 2, em Tábua, estava em falta, mas que rapidamente foi junta, -facto presenciado sem protesto, pelo Mandatário do Recorrente - após verificação por parte dos restantes elementos da mesa, sem que os mesmos vissem qualquer necessidade de lavrar protesto, antes a havendo rubricado, em conjunto o que, ainda que constituísse uma nulidade, apenas feriria o resultado da mesma em causa, e não da totalidade do processo eleitoral.

VI. Termos em que deve o presente recurso ser havido como totalmente improcedente, confirmando-se o resultado conforme consagrado na Ata de Apuramento Geral, e a regularidade do acto eleitoral do concelho de Tábua.»

Cumpre apreciar e decidir.

II – Fundamentação

3. O presente recurso vem interposto da deliberação da Assembleia de Apuramento Geral do Município de Tábua, reunida no dia 28 de setembro de 2021, que indeferiu por extemporaneidade a reclamação apresentada pelo mandatário da coligação «CORAGEM PARA MUDAR» composta pelo PPD/PSD.CDS-PP.

Pretende o ora recorrente contestar esta decisão, com base nos seguintes factos (v. supra o requerimento em I, 1):

i) a utilização de cadernos eleitorais que se encontravam incompletos, e aos quais foram acrescentadas páginas, na mesa n.º 2 da secção de voto de Tábua (cf. os pontos B, 11 a 17 do requerimento transcrito supra em I, 1);

ii) a utilização de veículos pertencentes aos serviços camarários ou a elementos ligados às candidaturas para transportar eleitores para os locais de voto (cf. o ponto B, 18 do requerimento transcrito supra em I, 1);

iii) a presença de candidatos nas imediações das assembleias de voto em contacto com os eleitores que aguardavam a sua vez para votar (cf. o ponto B, 19 do requerimento transcrito supra em I, 1);

iv) colocação dos votos de um eleitor na urna por um membro da mesa que não detinha legitimidade para o fazer (cf. o ponto B, 20 do requerimento transcrito supra em I, 1).

4. Da documentação junta aos autos extrai-se, no que aos presentes autos interessa, o seguinte:

a) A Assembleia de Apuramento Geral (AAG) dos resultados das eleições para os órgãos das autarquias locais do Município de Tábua reuniu no dia 28 de setembro de 2021 (cf. fls. 22v-49);

b) Da ata da referida assembleia, e no que se refere ao objeto do presente recurso, consta o seguinte (cf. fls. 27-31):

«2. CÂMARA MUNICIPAL

Foram analisados os votos nulos. Constatou-se que não existe qualquer voto sobre o qual tenha recaído reclamação ou protesto.

Relativamente a um voto nulo para a Câmara Municipal foi apresentado à Assembleia de Apuramento Geral protesto pelo mandatário da lista “CORAGEM PARA MUDAR” PPD/PSD.CDS-PP, Vítor Hugo Rodrigues de Melo por considerar que o voto apresenta características diferentes em cada um dos quadrados assinalados (foram assinalados os três quadrados), com utilização diversa de caneta.

Mais apresentou protesto à referida Assembleia, a mandatária da lista do Partido Socialista, Sandra Filipa de Sousa Guiomar Ribeiro Mêna que defendeu a nulidade do voto, já que o eleitor...

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