Acórdão nº 01704/16.1BEBRG 0663/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 06 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução06 de Outubro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACÓRDÃO 1. RELATÓRIO 1.1.

A Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante Recorrente), inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga - que julgou procedente a Impugnação Judicial deduzida por A………… e mulher B…………, contra a liquidação de Imposto de Selo, no valor de € 9.420,00, que incidiu sobre a aquisição, por usucapião, operada por escritura de justificação outorgada em 01.04.2015, relativa ao artigo matricial urbano nº ……….., da matriz da freguesia de Vilar da Veiga, concelho de Terras de Bouro – interpôs para este Supremo Tribunal Administrativo o presente recurso jurisdicional.

1.2. Admitido o recurso, veio a Recorrente apresentar a sua motivação, que conclui nos seguintes termos: «1.ª) – A Fazenda Pública alega que a jurisprudência recente do STA veiculada, v.g., pelos Acórdãos de 29/03/2017 e de 12/10/2016, respetivamente, nos Processos n.ºs 01372/16 e 0718/15, inverteu sentido jurisprudencial anterior, fixando-se, atualmente, a doutrina seguinte: ficcionando o legislador a usucapião como transmissão gratuita de bens imóveis para efeitos de incidência de IS, a escritura de Justificação Notarial de aquisição por usucapião é que constitui o facto tributário na medida em que a obrigação do pagamento do IS neste caso se constitui na data da sua celebração (alínea r), art. 5.º do CIS); 2.ª) – Entende a Fazenda Pública que a usucapião é um modo de aquisição originária do direito de propriedade sujeito a IS e que a obrigação tributária deste imposto se constitui na data em que for celebrada a escritura de Justificação Notarial, nos termos do art. 5.º, alínea r) do CIS, atento o facto de terem sido os Impugnantes quem invocaram tal título e o participaram ao serviço de finanças competente; 3.ª) – Nos termos do art. 1.º do CIS, o imposto incide sobre todos os atos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos ou situações jurídicas previstos na Tabela Geral, incluindo as transmissões gratuitas de bens; 4.ª) – A alínea a) do n.º 3 do art. 1.º do CIS considera que, para efeitos da verba 1.2 da Tabela Geral, a aquisição do direito de propriedade por usucapião é considerada transmissão gratuita sujeita à taxa de 10% sobre o valor do bem adquirido; 5.ª) – A usucapião, como decorre do disposto no art. 1316.º do CC, é um dos modos de aquisição do direito de propriedade e, nos termos do art. 1317.º do CC, o momento de aquisição do direito de propriedade é, nos casos de usucapião, o do início da posse; 6.ª) – A usucapião, nos termos do disposto no art. 1287.º do CC, é a aquisição do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo que deriva da posse desses direitos por certo lapso de tempo; 7.ª) – No caso dos autos, a escritura de Justificação Notarial constitui o título que confere a titularidade do imóvel aos Recorridos, sendo tal facto que releva para efeitos da incidência do IS; 8.ª) – Decorre dos factos provados, especialmente do facto provado 5-, que são os próprios Recorridos que invocam, em nome próprio, uma posse que conduziu à aquisição por usucapião do direito de propriedade de um prédio urbano composto de casa de rés-do-chão e primeiro andar e logradouro; 9.ª) – Para efeitos de incidência do IS não releva a data do início da posse que originou a usucapião, mas a data da outorga da escritura de Justificação Notarial, sendo este o facto tributário que determina o nascimento da obrigação tributária; 10.ª) – Embora a usucapião constitua uma forma de aquisição originária do direito de propriedade e os seus efeitos como se deixou anteriormente dito retroajam à data do início da posse, para efeitos de incidência do IS a lei ficciona tal facto como transmissão gratuita e a data da celebração da escritura como o momento do nascimento da obrigação tributária; 11.ª) – No caso dos autos, como ficou provado, não tendo a Justificação Notarial tido como escopo o reatamento do trato sucessivo ou o estabelecimento de novo trato sucessivo com vista a suprir a falta de título, já que os Impugnantes na escritura de Justificação Notarial invocam uma posse própria e a usucapião como causa de aquisição por si do direito de propriedade, a escritura de Justificação Notarial releva como facto tributário autónomo pelo que a liquidação do IS correspondente não enferma de qualquer ilegalidade; 12.ª) – No sentido do que temos vindo a concluir, vide a recente jurisprudência do STA, que inverteu sentido anterior, especialmente os Acórdãos do STA de 29/03/2017, proferido no Processo n.º 01372/16, e o de 12/10/2016, proferido no Processo n.º 0718/15; 13.ª) – E, ainda, os seguintes Acórdãos do STA: de 14/07/2010, proferido no Processo n.º 01073/09; de 02/05/2012, proferido no Processo n.º 0746/11; de 13/10/2010, proferido no Processo n.º 0431/10; 14.ª) – Da jurisprudência enumerada resulta, em síntese, que a usucapião, que constitui uma forma de aquisição originária (cfr. artigos 1287.º e ss. do CC), é, para efeitos fiscais, considerada como uma transmissão gratuita de bens imóveis, que ocorre no momento do trânsito em julgado da ação de justificação judicial ou em que é celebrada a escritura de justificação notarial [cfr. a citada alínea r) do art. 5.º do CIS]; 15.ª) – Assim, para efeitos do nascimento da obrigação tributária, não releva o momento da aquisição do direito de propriedade, pois que a obrigação tributária se constitui com a escritura de Justificação Notarial, incidindo o IS sobre o ato de aquisição por usucapião; 16.ª) – A usucapião constitui uma forma de aquisição originária do direito correspondente à posse exercida – e não uma forma de transmissão –, uma forma de aquisição de direitos que se funda na posse, quando esta reveste certas caraterísticas e desde que se mostrem verificados alguns requisitos, relativos, nomeadamente, ao seu tempo de duração (cfr. art. 1287.º do CC), sendo certo que a usucapião tem sempre na sua base uma situação possessória e essa posse pode ter sido constituída ex novo pelo sujeito a quem a usucapião aproveita ou pode derivar da transmissão, a favor desse sujeito, de posse anterior; 17.ª) – A invocação desta posse apta à usucapião, tanto pode ser feita judicial como extrajudicialmente (como no presente caso aconteceu) e, uma vez invocada, a usucapião atua retroativamente, tendo-se a aquisição como operada desde o início da posse (artigos 1288.º e 1317.º, alínea c), do CC); 18.ª) – Tratando-se de Justificação, só no caso de ser invocada a usucapião como causa de alguma das aquisições é que pode haver lugar ao pagamento de IS; tal não acontecerá, por exemplo, no caso do processo de justificação se destinar ao reatamento do trato sucessivo tendo em vista suprir a...

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