Acórdão nº 1144/17.5PBSTB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 21 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelMOREIRA DAS NEVES
Data da Resolução21 de Setembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório

  1. No 1.º Juízo (1) Central Criminal de Setúbal, do Tribunal Judicial da comarca de Setúbal, procedeu-se a julgamento em processo comum e competência do tribunal coletivo de OSML, nascido a …, solteiro, …, com o 12.º ano de escolaridade, residente na Rua …, em …, a quem foi imputada a prática, como autor, dos seguintes ilícitos penais: - 44 crimes de abuso sexual de crianças, previstos no artigo 171.º, § 1.º e 2.º do Código Penal (CP); - 1 crime de pornografia de menores perpetrado sobre a menor Sara Sebastião, previsto no artigo 176.º, § 1.º, al. b) e agravado nos termos do artigo 177.º, § 6.º CP, e; - 2 crimes de pornografia de menores (partilha por duas vezes, a duas pessoas distintas, das fotografias enviadas pela menor), previstos no artigo 176.º, § 1.º, al. d) e 177.º, § 6.ºCP

    O arguido não apresentou contestação

    A final o tribunal proferiu acórdão, no qual, requalificando juridicamente os factos, condenou o arguido pela prática, como autor, em concurso real, de: - 2 crimes de abuso sexual de crianças, previstos no artigo 171.º, § 1.º e 2.º CP, na pena de 4 anos de prisão por cada um dos ilícitos; - 4 crimes de atos sexuais com adolescentes, previstos no artigo 173.º, § 1.º e 2.º CP, na pena de 1 ano de prisão por cada um dos ilícitos; - e pela prática de 1 crime de pornografia de menores, previsto no artigo 176.º, § 1.º, al. b) CP, agravado nos termos do artigo 177.º, § 6.º CP, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão

    Fixando-se a pena única do concurso de crimes em 7 anos e 6 meses de prisão

    Absolvendo o arguido do demais de que vinha acusado (nomeadamente da prática de 44 crimes de abuso sexual de crianças; e 2 crimes de pornografia de menores agravado)

  2. Inconformado com a decisão o arguido recorreu, finalizando a sua motivação com as seguintes (e desnecessariamente extensas (2) ) conclusões (transcrição): «1) Após produção de prova em Audiência de Julgamento, entendeu o Tribunal «a quo» que «apurados os factos que se circunscrevem, não na matriz do crime de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo art. 171º, nºs 1 e 2, ambos do Código Penal, por cuja prática (44 crimes), o arguido vinha acusado, mas à luz do preceituado pelo art. 173º, nº1 e 2, do mesmo compendio normativo, ou seja, pela prática de crime de abuso sexual com adolescente.» 2) Decorre do artigo 178º, nº3, que o procedimento criminal pelo crime previsto no artigo 173º depende de queixa

    3) Compulsados os autos, constata-se que 19/09/2017, a mãe da menor apresentou denúncia, designadamente por «ter acedido à página do Facebook da sua filha S e ter constatado que que um individuo de nome SL efetuou diversas conversas e enviou imagens de teor sexual para a sua filha, e o mesmo convenceu a sua filha a enviar-lhe fotografias e vídeos da própria em trajes menores e nua»

    4) Do auto de denúncia não se retira que a denunciante manifeste o desejo de procedimento criminal

    5) Tratando-se de crime semipúblico, é condição do procedimento criminal a tempestiva manifestação de vontade de instauração do procedimento criminal, por parte do ofendido, definindo-se este como o titular dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação - art.º 113.º, n.º 1, do CP

    6) A atividade desenvolvida pelo Ministério Público quando não dispõe de legitimidade para o exercício da ação penal, nos termos do artigo 48.º do Código Penal, equivale à falta de promoção do processo quando lhe assiste a legitimidade, à face do mesmo preceito legal

    7) No caso presente, carecendo o Ministério Público de legitimidade para perseguir criminalmente o arguido quanto aos factos que consubstanciam a prática do crime previsto e punido pelo art. 173º do CP, forçoso é concluir que foi cometida uma nulidade insanável, que pode ser invocada, o que aqui se faz, e conhecida oficiosamente a todo o tempo até ao trânsito em julgado da decisão final

    8) As provas valoradas em audiência de julgamento e constantes da gravação nele realizada, impunham ao Tribunal «a quo» decisão diversa no que concerne à matéria de facto dada como provada

    9) O arguido considera que foram julgados de forma incorreta, os seguintes pontos da Matéria de Facto provada: (4.) Com vista a aproximar-se da menor SS, o arguido pediu à mãe desta para que a deixasse ir para sua casa aos fins de semana para tomar conta das suas filhas menores de idade, justificando tal pedido com a “necessidade de ajuda” em tal desiderato, e com o “mau momento financeiro” que atravessava

    (7). De seguida, no sofá, o arguido e SS despiram-se

    (8). Após o arguido deitou-se sobre a SS, introduziu o seu pénis erecto na vagina desta e, fazendo vários movimentos para cima e para baixo, ejaculou

    (9). Previamente à relação sexual, SS informou o arguido que era virgem, nunca tendo qualquer contacto sexual com outra pessoa

    (16). O arguido sabia perfeitamente que, a 5 de setembro de 2016, altura em que iniciou as relações sexuais com SS, esta tinha apenas 13 anos de idade

    (17). O arguido agiu de forma deliberada, livre e consciente, com o propósito concretizado, sendo maior de idade, praticar actos sexuais de relevo, nomeadamente de cópula, com SS, à data com 13 anos de idade, satisfazendo, dessa forma, os seus desejos libidinosos

    (18). O arguido de forma livre, deliberada e consciente o propósito alcançado de aliciar a menor SS a tirar fotos pornográficas, como efetivamente ocorreu, bem sabendo se tratava de uma menor de 14, ou 15 anos (g)) Sabia o arguido que quando praticou os factos referidos na alínea b) a SS tinha 13 anos de idade

    (h)) Sabia ainda o arguido, aquando da prática dos actos referidos nas alienas c), d) e), que a SS tinha 14, ou 15 anos de idade. (i)) O arguido agiu de forma deliberada, livre e consciente, com o propósito concretizado, sendo maior de idade, praticar actos sexuais de relevo, nomeadamente cópula, coito anal e coito oral, com SS, quando esta tinha 14, ou 15 anos de idade, satisfazendo, dessa forma, os seus desejos libidinosos

    10) Os meios de provas que impunham decisão diversa são as declarações de SCFS, prestadas em audiência de julgamento de 12-01-2021, cujo depoimento foi gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 10 horas e 29 minutos e o seu termo pelas 11 horas e 47 minutos e da testemunha APMFS, depoimento prestado em audiência de julgamento de 12-01-2021, e gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 16 horas e 04 minutos e o seu termo pelas 16 horas e 42 minutos

    11) Se atendermos as declarações da testemunha SS e AP, teremos que concluir forçosamente que o arguido desconhecia a idade da menor

    12) Não ficou provado que o arguido utilizou o argumento da necessidade de ajuda com as filhas, para ardilosamente, se aproximar da S. 13) Deveria o Tribunal «a quo» dar como não provados da decisão sobre a matéria de facto, o seguinte: Facto (4.) Com vista a aproximar-se da menor SS, o arguido pediu à mãe desta para que a deixasse ir para sua casa aos fins de semana para tomar conta das suas filhas menores de idade, justificando tal pedido com a “necessidade de ajuda” em tal desiderato, e com o “mau momento financeiro” que atravessava

    Facto (7). De seguida, no sofá, o arguido e SS despiram-se

    Facto (8). Após o arguido deitou-se sobre a SS, introduziu o seu pénis erecto na vagina desta e, fazendo vários movimentos para cima e para baixo, ejaculou

    Facto (9). Previamente à relação sexual, SS informou o arguido que era virgem, nunca tendo qualquer contacto sexual com outra pessoa

    Facto (16). O arguido sabia perfeitamente que, a 5 de setembro de 2016, altura em que iniciou as relações sexuais com SS, esta tinha apenas 13 anos de idade

    Facto (17). O arguido agiu de forma deliberada, livre e consciente, com o propósito concretizado, sendo maior de idade, praticar actos sexuais de relevo, nomeadamente de cópula, com SS, à data com 13 anos de idade, satisfazendo, dessa forma, os seus desejos libidinosos

    Facto (18). O arguido de forma livre, deliberada e consciente o propósito alcançado de aliciar a menor SS a tirar fotos pornográficas, como efetivamente ocorreu, bem sabendo se tratava de uma menor de 14, ou 15 anos Facto (g)) Sabia o arguido que quando praticou os factos referidos na alínea b) a SS tinha 13 anos de idade

    Facto (h)) Sabia ainda o arguido, aquando da prática dos actos referidos nas alienas c), d) e), que a SS tinha 14, ou 15 anos de idade

    Facto (i)) O arguido agiu de forma deliberada, livre e consciente, com o propósito concretizado, sendo maior de idade, praticar actos sexuais de relevo, nomeadamente cópula, coito anal e coito oral, com SS, quando esta tinha 14, ou 15 anos de idade, satisfazendo, dessa forma, os seus desejos libidinosos

    14) O Tribunal «a quo» deveria dar como provado que: A) o arguido desconhecia a idade da menor; B) que arguido e SS tiveram relações sexuais, por decisão conjunta, na sequência de um relacionamento amoroso que iniciaram por estarem apaixonados um pelo outro, o que ainda hoje se mantém e pensam em casar-se quando SS perfazer os 18 anos de idade; C) SS teve a iniciativa e consentiu em todos os atos de cariz sexual; 15) O Tribunal «a quo» valorou erroneamente a prova produzida incorreu em erro notório na valoração da prova

    16) O erro sobre a valoração da prova é patente e notório e não se pode confundir com o princípio da livre apreciação da prova

    17) A livre apreciação da prova não se confunde de modo algum com apreciação arbitrária da prova, nem com a mera impressão gerada no espírito do julgador

    18) O douto acórdão recorrido violou manifestamente o vertido no art. 127º C.P.P., bem como o princípio constitucional “In dubio pro reo”

    19) As relações sentimentais, afetivas, íntimas e tendencialmente estáveis ou duradouras, que...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT