Acórdão nº 5/19.8GAABF.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 21 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelEDGAR VALENTE
Data da Resolução21 de Setembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - Relatório

No Juízo Local Criminal de Albufeira (J3) do Tribunal Judicial da Comarca de Faro corre termos o processo comum singular n.º 5/19.8GAABF contra o arguido TMPL, filho de LFEL e de INP, nascido a …, natural de …, solteiro, vendedor, residente na …, …, tendo no mesmo, após a realização da audiência de julgamento, sido proferida sentença condenatória, nos seguintes termos: “A) Condenar o arguido TMPL nas seguintes penas PARCELARES: 1. pela prática de um crime de resistência e coacção sobre funcionário, previsto e punido pelo art. 347º nº 1 do Código Penal, na pena parcelar de 2 (dois) anos e 10 (dez) meses de prisão, 2. pela prática de um crime de injúria agravada, ilícito previsto e punido pelos arts. 181º nº 1 e 184º do Código Penal, na pena parcelar de 2 (dois) meses de prisão, 3. pela prática de um crime de injúria agravada, ilícito previsto e punido pelos arts. 181º nº 1 e 184º do Código Penal, na pena parcelar de 2 (dois) meses de prisão; B) E, operando o CÚMULO JURÍDICO das supra mencionadas penas parcelares, condenar o arguido TMPL, na PENA ÚNICA de 3 (três) anos de prisão, que ficará suspensa na execução por três anos”

Inconformado, o arguido interpôs recurso de tal decisão, extraindo da motivação as seguintes conclusões (transcrição): “1. Foi o Arguido TL condenando pela prática de um crime de resistência e coacção sobre funcionário, previsto e punido pelo art. 347º nº 1 do Código Penal, na pena parcelar de 2 (dois) anos e 10 (dez) meses de prisão, pela prática de um crime de injúria agravada, ilícito previsto e punido pelos arts.181º nº 1 e 184º do Código Penal, na pena parcelar de 2 (dois) meses de prisão, pela prática de um crime de injúria agravada, ilícito previsto e punido pelos arts. 181º nº 1 e 184º do Código Penal, na pena parcelar de 2 (dois) meses de prisão; 2. E, operando o CÚMULO JURÍDICO das supra mencionadas penas parcelares, condenar o arguido TMPL, na PENA ÚNICA de 3 (três) anos de prisão, que ficará suspensa na execução por três anos; E quanto à responsabilidade CIVIL, foi condenado o demandado TL a pagar ao demandante Estado Português indemnização no valor de € 51 (cinquenta e um euros), acrescida de juros de mora vincendos contados à taxa dos juros civis de 4% ao ano

  1. O presente recurso tem como objecto a matéria de facto e a matéria direito da douta Sentença proferida nos presentes autos

  2. O douto Tribunal a quo formou a sua convicção com base no depoimento das três testemunhas, considerando que os depoimentos das mesmas foram sérios, isentos e credíveis

  3. No entanto, se por um lado tivemos o depoimento de dois militares da GNR concertado, ambos foram unanimes nas suas declarações por outro lado, tivemos uma terceira testemunha que colocou em causa o depoimento das duas anteriores e, colocou em causa o que aconteceu naquele dia

  4. Testemunha esta que teve contacto direto, presenciou todos os factos que sucederam naquele dia

  5. Ora, a testemunha TC narrou de forma isenta, clara e descreveu os factos que presenciou naquele dia, inclusivamente, elaborou um desenho que foi junto aos autos, onde desenhou e descreveu as localizações dos militares da GNR

  6. De forma clara e inequívoca, referiu que o militar CF nunca passou a passadeira e nem sequer passou a passadeira, salientando que o militar CF não esteve na frente do veículo do arguido

  7. Aliás, sem margem de dúvidas, esta testemunha referiu mais que uma vez que o militar da GNR CF não passou a passadeira, o que coloca me causa as declarações prestadas pelos militares da GNR

  8. Face a tais declarações existe serias e fundadas dúvidas, sobre o que efetivamente sucedeu, e se o militar passou ou não a passadeira? Afinal qual a sua posição? 11. TC referiu, ainda que, passavam duas ou três pessoas na passadeira e que o arguido teve o cuidado de não as atropelar, reparando que a intenção do arguido era sair daquele local, todavia nunca foi sua intenção atropelar alguém

  9. Por outro lado, esta testemunha que estava no local, presenciou todos os factos ocorridos naquele dia, e que os descreveu sem lapsos de memória e de forma convicta e credível, quando questionado a cerca do veículo conduzido pelo arguido e a cor deste, salientou que o arguido conduzia um veículo automóvel da marca … de cor preta

  10. Tais declarações são absolutamente divergentes das declarações prestadas pêlos militares da GNR, pois descreveram outro veículo automóvel e de outra cor

  11. E, visionado os vídeos de fls. 22, entende o Recorrente que dos mesmos não resulta de forma equivoca a dinâmica dos acontecimentos daquele dia, aliás sustentam ainda as dúvidas existentes acerca do que realmente sucedeu naquele dia

  12. Atenta a prova produzida em sede de Audiência e Discussão de Julgamento, entende-se, contrariamente ao Tribunal a quo, que não existe convergência das provas, pelo contrário, resultam serias dúvidas do que efectivamente sucedeu naquele dia

  13. A testemunha TC que merece toda a credibilidade colocou em causa e em dúvida toda a dinâmica do sucedido naquele dia

  14. E, havendo sérias e fundadas dúvidas é de aplicar o princípio in dúbio pro reo e acerca do princípio in dubio, escreve o Prof. Figueiredo Dias que, à luz do princípio da investigação bem se compreende, efectivamente, que todos os factos relevantes para a decisão (quer respeitem ao facto criminoso, quer à pena) que, apesar de toda a prova recolhida, não possam ser subtraídos à “dúvida razoável” do tribunal, também não possam considerar-se como provados. E se, por outro lado, aquele mesmo princípio obriga em último termo o tribunal a reunir as provas necessárias à decisão, logo se compreende que a falta delas não possa, de modo algum, desfavorecer a posição do arguido: um non liquet na questão da prova – não permitindo nunca ao juiz, como se sabe, que omita a decisão (...) – tem de ser sempre valorado a favor do arguido. É com este sentido e conteúdo que se afirma o princípio in dubio pro reo», in Direito Processual Penal, reimpressão,1984, p.213. O estado de dúvida - valorado a favor do arguido por não ter sido ilidida a presunção da sua inocência - pressupõe que, produzida a prova, o tribunal, e só o tribunal, tenha ficado na incerteza quanto à verificação ou não, de factos relevantes para a decisão

  15. Por tudo o exposto e, com todo o devido respeito que é muito, entendemos que o arguido deve ser absolvido dos crimes que lhe são imputados

  16. Todavia e, se V. Exas., assim não entenderem e com todo o devido respeito, que é muito, o arguido ora Recorrente não se pode conformar com a condenação a que foi sujeito, pois cremos que, as opções de política criminal que dão corpo o sistema sancionatório vigente passam pelo privilegiamento de sanções não privativas da liberdade

  17. Ora, o arguido é condenando por um crime de resistência e coacção sobre funcionário, previsto e punido pelo art. 347º nº 1 do Código Penal e dois crimes de injúria agravada, ilícito previsto e punido pelos arts. 181º nº 1 e 184º do Código Penal

  18. Não se poderá deixar de considerar desproporcional e desadequada a aplicação da pena de prisão, embora suspensa na sua execução, aplicada ao arguido no caso concreto, pois a mesma é demasiado penosa

  19. Atento o preceituado no artigo 71.º do Código Penal, a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção

  20. No processo de determinação da pena concreta há também que ponderar as circunstâncias apuradas no caso concreto que relevam para a culpa e para a prevenção e que funcionam, assim, como factores de medida da pena

  21. E, nessa determinação a operar dentro dos limites da moldura abstracta estabelecida para o crime praticado, o tribunal deve atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo, depuserem a favor do agente ou contra ele, nomeadamente, o grau de ilicitude do facto, o respectivo modo de execução e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente, a intensidade do dolo ou da negligência; os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram; as condições pessoais do agente e a sua situação económica, a conduta anterior e posterior ao facto, especialmente quando se destina a reparar as consequências do crime, e a falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena, tudo conforme previsto no artigo 71.º, n.º 2 do Código Penal

  22. O Tribunal a quo, relativamente ao crime de resistência e coacção sobre funcionário, sustentou que o arguido usou de violência, concretizada numa ofensa corporal contra o militar da GNR CC…derrubou o militar ao chão, assim lhe causando diversos ferimentos corporais

  23. Todavia e, com todo o devido respeito que é muito, dos autos não decorre que tais ferimentos tenham sido considerados assim tão graves

  24. Aliás e, conforme o próprio militar referiu, de facto, caiu, embateu no chão, ficando com queimadura por causa da fricção com o alcatrão, tendo ido apenas ao centro de saúde

  25. Salientou, ainda que, nem de baixa médica teve, voltando logo de seguida a exercer a sua profissão

  26. Ora, consideramos que tal comportamento do arguido, passível de censura, não configura um comportamento tão grave como o Tribunal a quo considerou

  27. E, o douto Tribunal deveria ter isso em conta para a determinação da pena a aplicar no que ao crime de resistência e coacção sobre funcionário diz respeito

  28. Considerando, então, que a medida da pena abstracta em relação a este crime se situa entre um e cinco anos, entendemos que tendo em conta todas as circunstâncias da prática do mesmo, a culpa do agente, as condições e personalidade do arguido, as exigências de prevenção, a pena a aplicar deveria ser próxima dos mínimos legais., pelo que a pena aplicada a este crime deve ser alterada, reduzindo-se a pena aplicada pelo Tribunal a quo

  29. O Tribunal a quo condenou o...

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