Acórdão nº 076/20.4BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Setembro de 2021
Magistrado Responsável | JOSÉ GOMES CORREIA |
Data da Resolução | 22 de Setembro de 2021 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1. – Relatório A. Z………….., Lda., melhor sinalizada nos autos, vem, nos termos do n.º 1 do artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (“CPTA”), aplicável ex vi n.º 2 do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Tributaria — “RJAT”), com a alteração introduzida pela Lei n.º 119/2019, de 18 de Setembro, interpor recurso de oposição de decisões para o Pleno do Contencioso Tributário do STA, da decisão arbitral proferida no processo n.º 333/2019–T do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), indicando como decisão fundamento a que foi proferida no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, no âmbito do processo n.º 01456/06, de 06/02/2007, no segmento que diz respeito aos impostos do ano de 2015 e das sequentes liquidações adicionais de IVA e IRC, promovidas pela Autoridade Tributária.
Inconformada, formulou a recorrente A. Z…………., Lda.
, as seguintes conclusões: 1) Entre as decisões em causa, a fundamento e a recorrida, decisão prolatada pelo tribunal arbitral no âmbito do processo n.º 333/2019-T do CAAD, existe oposição susceptível de servir de fundamento ao presente recurso, atento o disposto no artigo 36.º, n.º 1 do RCPITA, foi decidida diferentemente na decisão recorrida e na decisão fundamento.
2) Contudo, o Acórdão fundamento e a decisão arbitral recorrida decidiram diferentemente quanto à questão de direito enunciada, 3) E que se entende que se justifica, no caso, o presente recurso para uniformização de jurisprudência, pela existência de contradição entre a decisão arbitral recorrida e a decisão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito.
4) Encontra-se, pois, preenchido o condicionalismo previsto nos arts. 25.º n.º 2 do RJAT, 152.º n.º 2 do CPTA e 27.º n.º 1 al. b) do ETAF.
5) Pois que, a ora Recorrente ao ter sido notificada do início do procedimento de inspecção a 14/06/2018, o procedimento de inspecção deveria ter sido concluído até 14/12/2018, salvo se, antes dessa referida data, a Administração Tributaria validamente a notificasse da prorrogação do prazo de conclusão da mesma, ao abrigo de qualquer uma das três circunstâncias previstas no n.° 3 do artigo 36.° do RCPIT, o que não sucedeu no caso concreto.
6) Assim, a liquidação de IRC/IVA ora sindicada padece de vício de caducidade por decurso do prazo previsto no n.° 5 do artigo 45.° da LGT, uma vez que o legislador distingue claramente a notificação do início do procedimento, a qual se efectiva mediante o envio de carta - aviso ao sujeito passivo (artigo 49.° do RCPIT), do início (propriamente dito) dos actos de inspecção, os quais se materializam com a entrega da ordem de serviço (artigo 51.° do RCPIT).
7) Para efeitos de contagem do prazo de duração do procedimento de inspecção, o artigo 36.° do RCPIT dispõe de forma absolutamente cristalina que o dies a quo e o momento da notificação do início da inspecção, e não o de início da inspecção.
8) A admitir-se a bondade da interpretação secundada pelo CAAD na sua sentença, a alteração introduzida no n.° 1 do artigo 46° da LGT não teria qualquer efeito útil (quando se eliminou a referência ao início do procedimento de inspecção como causa de suspensão do prazo de caducidade e se passou a prever a entrega da ordem de serviço); 9) De facto, «procedimento de inspecção» externa e «acção de inspecção» externa são realidades factuais e jurídicas diferentes e com conteúdos distintos, como decorre da própria lei — nos termos dos artigos 13.º, 60.º, 61.º e 62.º do RCPITA — a acção de inspecção externa, reconduzível aos actos de inspecção que são praticados em instalações ou dependências do contribuinte ou de terceiros incorpora-se num procedimento de inspecção externa, que até pode ter começado por ser um procedimento de inspecção externa, mas não o esgota, pois ele contém outras fases prévias e posteriores a prática dos actos de inspeccçã externa propriamente ditos.
10) Não obstante a afinidade que possa existir entre os conceitos de «acção de inspecção externa», «inspecção externa», «actos de inspecção» e «procedimento de inspecção», a realidade é que são conceitos de conteúdo e alcance preciso e só o recurso a «dimensão procedimental» da inspecção, de todo ausente do artigo 46.º da LGT, lhes conferiria articulação normativa.
11) Ora, como se encontra constitucionalmente vedada a interpretação extensiva de uma norma que verse sobre garantias dos contribuintes, - como e o artigo 46.º da LGT, - a interpretação que dela vem feita na pagina 42, é inadmissível.
12) A acção de inspecção externa, essa sim, foi dada por concluída com a emissão das notas de diligência ND020182125 [correspondente à OI201802748] no dia 2018/12/11.
13) Nos termos do artigo 36.º, números 2 e 3 do RCPIT, «o procedimento de inspecção é contínuo e deve ser concluído no prazo máximo de seis meses a contar da notificação do seu início» e apenas pode ser ampliado por mais dois períodos de três meses, nas circunstâncias aí taxativamente indicadas.
14) Pelo que, relativamente a ND020182125 [correspondente a OI201802748] o procedimento tributário já se encontrava ferido de caducidade, uma vez que aquele prazo e imperativo — conforme acórdão do Tribunal Constitucional, Processo n.º 196/08 e acórdão do TCAS, processo n.º 01456/06.
15) De resto, não há razão para concluir que o legislador não soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, como tem de se presumir, por força do disposto no artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil.
16) Pelo que se entende que se justifica, no caso, o presente recurso para uniformização de jurisprudência, pela existência de contradição entre a decisão arbitral recorrida e a decisão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito.
Termos em que e, com o douto suprimento de V. Exas., deve decidir-se no sentido de que existe oposição de julgados, conhecer-se do objeto do presente recurso e resolver-se o conflito de jurisprudência quanto à questão de direito enunciada, no sentido do deliberado na decisão fundamento, uma vez que a decisão arbitral recorrida fez uma incorreta apreciação e aplicação do n.° 1 do art. 36.° RCPITA quanto à caducidade do procedimento inspectivo e, bem assim, o efeito invalidante nas liquidações de IVA e IRC do ano de 2015.
Não houve contra-alegações.
Neste Supremo Tribunal Administrativo, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido do não conhecimento do recurso, no seguinte parecer: “I. Objecto do recurso.
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O presente recurso de uniformização de jurisprudência vem interposto do acórdão arbitral proferido no processo nº 333/2019-T do CAAD, ao abrigo do disposto nas disposições conjugadas dos artigos 25º, nº2 e 3 do RJAT, e do artigo 152º do CPTA, e com o fundamento de aquele acórdão se encontrar em oposição com a doutrina do acórdão da secção de Contencioso Tributário do TCA Sul de 06/02/2007, proferido no proc.
01456/06, na apreciação que foi feita da questão relativa à caducidade do procedimento inspetivo e validade das liquidações adicionais.
1.1 Como é entendimento pacífico na jurisprudência do STA, a admissibilidade dos recursos por oposição de acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos artigos 27.º, alínea b) do ETAF, 284.º do CPPT e 152.º do CPTA, depende de existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito e que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
1.2 No que ao primeiro requisito respeita, como tem sido inúmeras vezes explicitado pelo Pleno desta Secção relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da LPTA, para detectar a existência de uma contradição, quais sejam: - identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica; - que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica; - que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta; - a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta (- cfr. Jorge de Sousa e Simas Santos, Recursos Jurisdicionais em Contencioso Fiscal, p. 424, e acórdãos do Pleno da seção de contencioso tributário do STA, de 15/9/2010, recs. nºs. 344/2009 e 881/2009, e de 26 de Setembro de 2007, 14 de Julho de 2008 e de 6 de Maio de 2009, recursos números 452/07, 616/07 e 617/08, respectivamente).
1.3 Entende o Recorrente que a questão objecto de apreciação consiste em «aferir da caducidade do procedimento inspectivo e, por conseguinte, da validade das liquidações adicionais de IRC e IVA, relativamente ao ano de 2015».
1.4 Decorre do acórdão arbitral de 11 de Maio de 2020, proferido no processo nº 339/2019-T, que a situação analisada se reporta a atos de liquidação adicional relativos a IVA e IRC dos anos de 2015 e 2016, emitidos pela AT na sequência de ação inspectiva realizada em 2018, tendo o tribunal arbitral definido como uma das questões a analisar a «caducidade do procedimento inspetivo e o pretendido efeito invalidante das liquidações».
1.6 O tribunal arbitral considerou então que «os atos de inspeção terminaram antes de expirado o prazo de seis meses a contar do início do procedimento. Já a notificação do Relatório, momento a que a lei reporta a cessação do procedimento inspetivo, verificou-se além deste prazo, excedendo a sua duração máxima.
A consequência da ultrapassagem de prazo referente à notificação do Relatório de Inspeção Tributária [emitido, note-se, antes do decurso do prazo] não se afigura ser, contudo, a invalidade do(s) ato(s) de...
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