Acórdão nº 055/21.4BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelANÍBAL FERRAZ
Data da Resolução22 de Setembro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa; # I.

A…………, S.A., …, ao abrigo do disposto nos artigos (arts.) 25.º n.ºs 2 a 4 e 26.º do Decreto-Lei (DL.) n.º 10/2011 de 20 de janeiro, que estabeleceu o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAMT) e 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), interpôs, para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, recurso, destinado a uniformização de jurisprudência, da decisão (colegial) proferida, em 18 de fevereiro de 2021, no âmbito do pedido de pronúncia arbitral, formulado no processo nº 429/2020-T, do Centro de Arbitragem Administrativa (caad), a qual, na primeira linha, julgou improcedente o pedido arbitral e manteve, “na ordem jurídica, o acto de liquidação de IRC impugnado, bem como, o despacho de indeferimento do pedido de revisão oficiosa contra ele deduzido”.

Aponta-lhe contradição/oposição com o decidido na, também, decisão arbitral (colegial), datada de 27 de novembro de 2020, emitida no processo nº 729/2019-T, do caad.

* Por despacho do relator, foi a recorrente (rte) notificada para, além do mais, se pronunciar sobre a circunstância de a decisão arbitral fundamento não haver, ainda, transitado em julgado.

* Na sequência da aludida notificação, a rte expôs e requereu: « (…).

  1. DA FALTA DE TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO ARBITRAL FUNDAMENTO15.ºConforme acima referido, nos termos da notificação efetuada, o STA informa que a decisão arbitral fundamento adotada pela Recorrente no âmbito do Recurso interposto encontra-se, ainda, presentemente, pendente de recurso para uniformização de jurisprudência, neste Supremo Tribunal, pelo que não transitou em julgado.

16.ºRecorde-se que em causa está o acórdão proferido pelo Tribunal Arbitral no âmbito do processo n.º 729/2019-T, de 27 de novembro de 2020, que a Recorrente utilizou como decisão arbitral fundamento no âmbito do Recurso, ao abrigo do disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 25.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (“RJAT”), em conjugação com o regime previsto no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (“CPTA”), por se encontrar em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com a decisão arbitral proferida no âmbito do processo n.º 429/2020-T, de 18 de fevereiro de 2021, que julgou improcedente o pedido de pronúncia arbitral formulado pela ora Recorrente.

17.ºDe salientar que a questão fundamental de direito em referência é a dos efeitos da revogação do regime previsto no n.º 2 do artigo 32.º do Estatuto dos Benefício Fiscais (“EBF”) na dedutibilidade fiscal, em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”), no período de tributação de 2014, dos encargos financeiros suportados por Sociedades Gestoras de Participações Sociais (“SGPS”) com a aquisição de partes de capital (cuja transmissão onerosa não foi realizada até ao momento da revogação do regime fiscal aplicável às SGPS) no âmbito e durante a vigência desse regime – um tema de manifesta relevância jurídica e tributária, que tem sido alvo de discussão e apreciação no âmbito de vários pedidos de pronúncia arbitral interpostos no Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”), dos quais, ao longo dos últimos anos, resultaram decisões diversas, verificando-se posições diametralmente opostas por parte dos tribunais arbitrais, com graves consequências para os contribuintes afetados, como foi o caso, relativamente à decisão arbitral recorrida quando comparada com a decisão arbitral fundamento escolhida pela Recorrente, cfr. melhor exposto e demonstrado no âmbito do Recurso apresentado.

18.ºOra, a este respeito, começa a Recorrente por reconhecer que, de acordo com a jurisprudência recorrente do STA, é entendimento uniformizado deste Supremo Tribunal que “(…) o recurso - este ou qualquer outro destinado a prevenir ou solucionar conflitos de jurisprudência – não pode ser admitido (ou, tendo-o sido indevidamente, deve ser julgado findo) se o acórdão invocado como fundamento não transitou, também ele, em julgado, pois que tal seria contrário à razão de ser de tais recursos. É que não pode pretender-se uniformizar jurisprudência tendo como parâmetro uma decisão ainda não definitiva e que pode nunca vir a sê-lo.

”, cfr. entendimento já acolhido no acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA de 3 de julho de 2013, no recurso nº 01136/12, também interposto ao abrigo do artigo 25.º do RJAT.

19.ºIsto é, é entendimento do STA que é pressuposto formal essencial do recurso previsto no artigo 25.º do RJAT, tal como acontece com o recurso para fixação de jurisprudência, o trânsito em julgado do acórdão fundamento, o que, nos termos do artigo 628.º do CPC, se verifica logo que a decisão não seja suscetível de recurso ordinário ou de reclamação.

20.ºEste entendimento de que o trânsito em julgado da decisão fundamento constitui um pressuposto substantivo de que depende o conhecimento do mérito da pretensão deduzida decorre do previsto nos termos do n.º 2 do artigo 688.º do CPC, que o STA considera aplicável ao caso em apreço, por força do disposto no n.º 3 do artigo 140.º do CPTA, que determina que “Os recursos das decisões proferidas pelos tribunais administrativos regem-se pelo disposto na lei processual civil, salvo o disposto no presente título”.

21.ºNote-se que, segundo o n.º 2 do artigo 688.º do CPC, que dispõe sobre o fundamento do recurso de uniformização de jurisprudência no processo civil, “Como fundamento do recurso só pode invocar-se acórdão anterior com trânsito em julgado, presumindo-se o trânsito.

” (…).

22.ºNo caso em apreço, a Recorrente não juntou, aquando da interposição deste recurso, a 3 de maio de 2021, prova do trânsito em julgado do acórdão fundamento, e, notificada para o fazer, juntou certidão, emitida pelo CAAD a 25 de maio de 2021, onde se certifica que o acórdão foi alvo de interposição de recurso para o STA, a que foi atribuído o número de processo 11/21.2BALSB,23.ºTendo, por força da notificação a que ora responde, ficado a conhecer que o referido processo 11/21.2BALSB terá sido interposto, também ele, no âmbito de recurso para uniformização de jurisprudência, ao abrigo do disposto no artigo 25.º do RJAT.

24.ºFoi, portanto, neste momento, já após a interposição do Recurso, que a Recorrente ficou a conhecer que a decisão arbitral fundamento, presentemente, ainda não transitou em julgado.

25.ºA este respeito, note-se que, não só os regimes previstos nos termos do artigo 25.º do RJAT e do artigo 152.º do CPTA não preveem expressamente o requisito de que a decisão fundamento tenha transitado em julgado à data da apresentação do recurso para uniformização de jurisprudência, como, conforme acima exposto, o próprio n.º 2 do artigo 688.º do CPC prevê a presunção de trânsito em julgado do acórdão fundamento, procedimento adotado pela Recorrente no âmbito da apresentação do Recurso em apreço.

26.ºAdicionalmente, a decisão proferida no âmbito do acórdão do processo n.º 729/2019-T, utilizado como decisão fundamento do Recurso, data de 27 de novembro de 2020, pelo que, em condições normais, atendendo aos termos e prazos legais aplicáveis, afigura-se perfeitamente plausível e justificável a presunção assumida pela Recorrente de que, a 3 de maio de 2021, data da interposição do Recurso, a decisão já teria transitado em julgado.

27.ºAté porque, à data da referida decisão, havia já um vasto histórico de vários anos de decisões arbitrais diametralmente opostas sobre a mesma questão de direito, não tendo a Recorrente informação de que a Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”) tivesse interposto recurso para uniformização de jurisprudência sobre qualquer desses acórdãos.

28.ºA título de exemplo, atente-se às decisões arbitrais emitidas no âmbito dos processos 285/2017-T e 645/2017-T, referidas na própria decisão arbitral recorrida, bem como as decisões emitidas nos processos 35/2019-T, 144/2019-T, 14/2020-T e, em particular, à decisão arbitral emitida no âmbito do processo 342/2018-T, de 9 de abril de 2019, substancialmente idêntica à decisão fundamento escolhida pela Recorrente no âmbito do Recurso apresentado (conforme adiante melhor se expõe) e sobre a qual a AT, podendo, não interpôs recurso para uniformização de jurisprudência.

29.ºAo mesmo tempo, sendo a decisão favorável ao contribuinte, não seria expectável que fosse esta parte a impugnar a decisão ou interpor recurso para uniformização de jurisprudência.

30.ºAdemais, a decisão proferida no âmbito do acórdão do processo n.º 729/2019-T estava já, à data da apresentação do Recurso, disponível para consulta no website do CAAD, sem qualquer menção que pudesse indiciar o não trânsito em julgado do acórdão (o que, tanto quanto foi possível apurar, se mantém até ao presente dia).

31.ºE note-se que não será de desconsiderar que foi bem aplicada a presunção do trânsito em julgado expressamente prevista nos termos do n.º 2 do artigo 688.º do CPC, sob pena de esvaziar de sentido e efeito prático aquela que foi uma pretensão expressa do legislador, o que, manifestamente, não seria admissível.

  1. A este respeito, atente-se ao próprio entendimento esgrimido pelo STA no recente acórdão referente ao processo n.º 01658/13.6BESNT-A, de 27 de maio de 2021, onde reconhece que a presunção do trânsito em julgado do acórdão fundamento é pressuposto de admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência: “2.1. Da verificação dos pressupostos do artigo 152.º do CPTA (admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência) 2.1.1. Os recursos para uniformização de jurisprudência destinam-se a obter uma «orientação jurisprudencial», sendo para o efeito necessário que estejam verificados os seguintes pressupostos [artigo 152.º, n.º 1, n.º 2, e n.º 3, do CPTA]:

  1. Existência de decisões contraditórias entre acórdãos do STA, ou deste e do TCA, ou entre acórdãos do TCA; b) Que a contraditoriedade decisória se verifique sobre a «mesma questão» fundamental de...

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