Acórdão nº 2360/15.0BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 16 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelISABEL FERNANDES
Data da Resolução16 de Setembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que compõem a 1ª Sub-Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul I – RELATÓRIO M...

deduziu oposição, na sequência da reversão efetuada no âmbito do processo de execução fiscal com o n° 3107200801..., em que é devedora originária a sociedade "F..., Lda.", com vista à cobrança coerciva do valor de € 33.608,85.

O Tribunal Tributário de Lisboa, por decisão de 14 de Junho de 2018, julgou procedente a oposição.

Não concordando com a sentença, a FAZENDA PÚBLICA veio interpor recurso da mesma, tendo nas suas alegações formulado as seguintes conclusões: «A) Visa o presente recurso reagir contra a douta Sentença proferida em primeira instância, porquanto a mesma julgou totalmente procedente a oposição à execução, e, em consequência, determinou a extinção do processo de execução n.° 3107200801... e apensos, por considerar que a Oponente é parte ilegítima no mesmo, atento o disposto no art. 204.°, n.° 1, alínea b) do CPPT.

B) O douto Tribunal “a quo” entende que, e passando-se a transcrever parte da fundamentação de direito da douta sentença proferida, que “a gerência de direito faz presumir a gerência de facto, mas porque se trata de mera presunção judicial, admite-se que seja ilidida por qualquer meio de prova, bastando para o efeito a contraprova, não sendo exigível a prova do contrário (cfr. arts. 350.° e 351.° do Código Civil)”.

C) Ora, com o devido respeito e salvo melhor opinião, a douta sentença carece, nesta matéria, de rigor jurídico, sendo que o raciocínio formulado e supra transcrito conduziu a que fosse, a nosso ver, incorrectamente, valorada a prova feita pela Representação da Fazenda Pública e considerada provada, para efeitos da decisão jurídica alcançada.

D) Em matéria probatória, em regra, é a quem invoca um direito que cabe provar os factos seus constitutivos do mesmo (vide art. 341.° e 342.° do Código Civil).

E) Por outro lado, ao abrigo do disposto no artigo 346° do Código Civil, «à prova que for produzida pela parte sobre quem recai o ónus probatório pode a parte contrária opor contraprova a respeito dos mesmos factos, destinada a torná-los duvidosos», sendo então «a questão decidida contra a parte onerada com a prova».

F) Não obstante, as presunções influenciam este regime geral do ónus probatório.

G) De acordo com o artigo 349° do Código Civil, «presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido».

H) Há, pois, presunções legais - ilações que a lei tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido - e presunções judiciais - ilações que o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido.

I) O artigo 350° n°1 do mesmo diploma diz-nos que «quem tem a seu favor a presunção legal escusa de provar o facto a que ela conduz». (vide artigos 342° n.°1, 344.°, n.° 1 e 350.°, todos do Código Civil).

J) Ao contrário da presunção legal, que está plasmada na lei, a presunção judicial não tem existência prévia, é um juízo casuístico que o julgador retira da prova produzida num concreto processo quando a aprecia e valora.

K) Por isso, se faz sentido o regime contido no artigo 350° n° 2 do Código Civil, quando estabelece as condições em que podem ser ilididas as presunções legais, o mesmo regime nenhum sentido faria se aplicado às presunções judiciais.

L) Quanto a estas, quem está onerado com a obrigação de fazer a prova fica desonerado se o facto se provar mediante presunção judicial; mas sem que caiba falar, aqui, de inversão do ónus.

M) Não se trata, portanto, de ilidir as presunções judiciais, produzindo contraprova ou prova em contrário, porque não há nenhum facto que, estando, em princípio, provado por força da lei, possa deixar de se dar por provado por obra dessa prova em contrário ou contraprova.

N) Com efeito, em matéria do ónus probatório, das duas uma: ou se segue o regime geral, previsto no art. 342.° do Código Civil, que se inverte no caso de pré existir uma presunção legalmente estabelecida; ou se aceita que, no caso concreto, o julgador, usando as regras da experiência, fazendo juízos de probabilidade, possa retirar ilações de um facto conhecido de forma a firmar um facto desconhecido.

O) Destarte, e quanto à prova do exercício da gerência de facto da sociedade executada originária pela ora recorrida, admitindo-se a inexistência de presunção legal que permita extrair esse facto a partir da nomeação da mesma como gerente: - ou se considera que a Representação da Fazenda Pública, a quem incumbe o ónus da prova, não logrou provar o exercício da gerência de facto, o que conduz à inevitável procedência da Oposição Judicial por falta de legitimidade da Oponente para os autos executivos; - ou se considera que, não obstante os meios de prova juntos pela Representação da Fazenda Pública, a Oponente fez contraprova a respeito dos mesmos factos, de forma a torná-los duvidosos, o que também conduz à inevitável procedência da Oposição Judicial por falta de legitimidade da Oponente para os autos executivos; - ou se considera que a Representação da Fazenda Pública, a quem incumbe o ónus da prova, logrou provar o exercício da gerência de facto, o que conduz à inevitável improcedência da Oposição Judicial por falta de legitimidade da Oponente para os autos executivos; - ou se considera, como o faz o douto Tribunal “a quo”, provado o exercício da gerência de facto da sociedade pela Oponente (o que apenas poderia fazer se a Representação da Fazenda Pública não lograsse provar esse facto desconhecido por qualquer meio probatório, o que não acontece no caso concreto) a partir da nomeação de direito da mesma para o cargo de gerente, caso em que o pressuposto da responsabilidade subsidiária se considera provado por presunção judicial, ficando a Representação da Fazenda Pública desonerada de o provar, o que conduz à inevitável improcedência da Oposição Judicial por falta de legitimidade da Oponente para os autos executivos.

P) Com a devida vénia, o que não poderá acontecer, no nosso entender, é que o juiz considere provado um determinado facto desconhecido com fase numa presunção judicial, e depois admita que tal facto possa ser ilidido por contraprova da parte contrária, como se estivéssemos perante o regime probatório regra, conforme entende o douto Tribunal “a quo".

Q) Assim, no nosso entendimento, da afirmação que o douto Tribunal “a quo" profere na fundamentação de direito da douta sentença: “a gerência de direito faz presumir a gerência de facto", deveria ter sido obtida, necessariamente, a decisão de mérito no sentido da improcedência da Oposição Judicial com base na legitimidade da Oponente nos autos de execução fiscal, nos termos do disposto na alínea b) do n.° 1 do art. 204.° do CPPT, a contrario, R) pois que, conforme consta dos factos provados da douta sentença (pontos 2 e 6 dos mesmos), a Oponente foi nomeada gerente de direito da sociedade devedora originária em 29/04/2002, tendo renunciado ao cargo em 15/03/2009, renúncia que é registada em 16/09/2009.

S) Sem prescindir, ainda que assim não se entenda, o que apenas por mera hipótese académica se...

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