Acórdão nº 187/04.3BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 16 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelVITAL LOPES
Data da Resolução16 de Setembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I. RELATÓRIO O Exmo. Representante da Fazenda Pública recorre da sentença do Tribunal tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial apresentada por M..., S.A., contra a liquidação adicional de IRC do exercício de 1997 e o despacho de indeferimento da reclamação graciosa dela deduzida, e anulou aquela liquidação e juros compensatórios na parte assente em correcções de custos contabilizados a título de “despesas com deslocações e estadas” e “despesas de publicidade e propaganda” e sujeição destas últimas a tributação autónoma.

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes e doutas conclusões: « «Imagem no original» ».

A Recorrida apresentou contra-alegações, que culmina com as seguintes e doutas conclusões: « i. Inconformada com a decisão do Tribunal a quo, a Fazenda Pública veio interpor recurso contra a Sentença proferida, em 6 junho de 2016, no âmbito do processo de impugnação judicial que correu termos no Tribunal Tributário de Lisboa, sob o número de processo 187/04.3BELSB, a qual julgou totalmente procedente a Impugnação Judicial apresentada pela ora Recorrida contra o ato de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas e de juros compensatórios por referência ao exercício de 1997, na importância parcial de Eur. 45.028,84 (quarenta e cinco mil, vinte e oito euros e oitenta e quatro cêntimos).  ii. Para o efeito, em especial no que respeita a despesas atinentes a «deslocações e estadas», questiona genericamente a Fazenda Pública a prova produzida em sede de inquirição de testemunhas, alegando que a mesma não permitiu confirmar a veracidade dos valores inscritos nos documentos internos que serviram de base ao registo contabilístico das pretensas despesas, porquanto apenas confirmaram a existência de tais documentos internos.

iii. Tendo a prova testemunhal produzida nos presentes autos como principal intuito esclarecer os procedimentos adotados e não provar os valores inscritos, verifica-se que, em momento, algum esteve em causa a veracidade dos valores inscritos nos documentos internos - aliás não foi esse o fundamento das correções promovidas em sede de inspeção tributária -, mas apenas o procedimento adotado pela Recorrida.

iv. Pelo que, para além da evidente essencialidade dos custos em causa incorridos com deslocações e estadas dos respetivos trabalhadores, ficou também demonstrado que os documentos internos existentes contêm todos os elementos necessários que justificam os custos registados, sendo que a forma como os mesmos são processados permite não apenas apurar a sua causa, natureza e montante de modo a permitir a sua arrumação contabilística, bem como a permitir o apuramento do lucro, nos termos do artigo 23.° do Código do IRC, devendo em consequência, ser anulada a correção efetuada à matéria coletável com estes fundamentos; v. De facto, não é concebível que a frota automóvel da Recorrida seja utilizada sem que existam custos com combustível, nem que os delegados da Recorrida se desloquem nos automóveis propriedade daquela sem que sejam incorridos custos com combustível, que, como é óbvio, não podem ser suportados pelos próprios funcionários; vi. Acresce que, atenta a actividade particular desenvolvida pela Recorrida, as deslocações dos delegados de venda são essenciais para a concretização do seu objeto social, pelo que também o são os custos com o combustível incorridos com essas deslocações; vii. Por outro lado, face ao número de veículos que constituem a frota automóvel da Recorrida afeta às deslocações dos seus delegados, é perfeitamente razoável o montante constante a título de despesas com combustíveis; viii. Nessa medida, e face à jurisprudência superior invocada na decisão recorrida, em especial, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 24 de abril de 2006 (Processo n.° 01194705), para efeitos de IRC a fatura não é a única forma de documentar e provar os custos incorridos, não existindo qualquer norma no Código do IRC e, muito menos nas normas contabilísticas, que exija a necessidade de fatura para documentar um custo.

ix. Ficou igualmente demonstrado que as despesas apresentadas pela Recorrida, no exercício de 1998, com reuniões, seminários nacionais e internacionais, objeto das correções levadas a cabo no ponto 1.4 das Conclusões do Relatório Final de Inspeção, foram incorridas com o escopo de publicitar os produtos comercializados pela Recorrida, e, consequentemente, incrementar as respetivas vendas e aumentar os lucros, razão pela qual que as despesas em causa devem ser consideradas despesas com publicidade, integralmente aceites, nos termos do artigo 23,°doCIRC, x. A Recorrida louva-se, assim, na sentença recorrida, a qual julgou bem a causa, sub judice, devendo ser mantida na íntegra, com as legais consequências.

Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, sempre com o douto suprimento de V. Exas., deverá ser julgado improcedente o recurso apresentado pela Fazenda Pública, e assim, confirmada a douta Sentença recorrida, nos seus exatos termos.».

A Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso, mantendo-se o julgado.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

  1. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

    Assim, analisadas as conclusões das alegações do recurso, a questão que importa apreciar reconduz-se a indagar se a sentença incorreu em erro de julgamento ao concluir pela ilegalidade das correcções dos custos contabilizados pela impugnante com “deslocações estadas” e com “publicidade e propaganda” e da sujeição destas últimas a tributação autónoma.

    *** III. FUNDAMENTAÇÃO A) OS FACTOS Na sentença recorrida deixou-se factualmente consignado: « Compulsados os autos e analisada a prova documental e testemunhal apresentada, encontram-se assentes, por provados, os seguintes factos com interesse para a decisão: 1.

    A impugnante, tem como atividade principal o comércio por grosso de produtos farmacêuticos, com CAE 51460; 2.

    Com base nas Ordens de Serviço nº 73122 e 73123 de 02/04/2003, foi efectuado procedimento inspectivo de âmbito parcial à sociedade M..., SA. aos exercícios de 1997 e 1998; 3.

    A AT defende que a proposta de abertura de ordem de serviço externa teve origem na análise efectuada à declaração Modelo 22 relativa aos exercícios de 1997 e 1998 em que se detectou a existência de rubricas com valores elevados nos fornecimentos e serviços externos (deslocações e estadas, publicidade, ofertas) que neste sector de actividade, é comum registarem custos não aceites fiscalmente; 4.

    A empresa fabrica alguns produtos que comercializa embora não tenha linha de produção própria, antes tem um contrato de fabricação com laboratórios (S...) dos quais recebe o produto acabado; 5.

    A contabilidade está organizada de forma a permitir o cálculo dos impostos IVA e IRC e o seu controlo contendo todos os elementos legais previstos à data da produção dos factos; 6.

    As correcções, ora contestadas, obtiveram a seguinte fundamentação: (…)2.1.1.2.- Conta 62227 - Deslocações e Estadas: Registaram na conta Deslocações e Estadas o pagamento de quilómetros efectuados a funcionários da empresa pela utilização de viaturas da empresa, no valor de € 307 052,72, no exercício de 1997 dos quais se expurgou o pagamento de km a funcionários da empresa pela utilização de viaturas próprias e o valor das portagens no montante de € 73.328,52 em 1997. Questionada a sociedade sobre tal procedimento fomos informados que os km pagos a funcionários da empresa pela utilização de viaturas da empresa dizem respeito ao pagamento de combustível utilizado nas mesmas. No entanto não existe legislação que permita o pagamento de quilómetros por utilização de viatura da empresa pelo que o mapa de Km apesar de registar o nº de Km percorridos pelas viaturas que pertencem ao seu activo ou por ele utilizadas em regime de locação, o nome dos funcionários que as utilizam e a matrícula das mesmas, não é suficiente para documentar a despesa, uma vez que a acompanhar este registo a empresa deveria ter documentos de suporte, tais como...

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