Acórdão nº 19922/19.9T8PRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelLEONOR CRUZ RODRIGUES
Data da Resolução15 de Setembro de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc.º nº 19922/19.9T8PRT.P1.S1 4ª Secção LCR/JG/CM Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1 - Relatório 1.

No Juízo do Trabalho do ... do Tribunal Judicial da Comarca ….... AA propôs contra “BANCO BPI, S.A.” acção declarativa de condenação emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma comum, pedindo a condenação do Réu: a) a reconhecer à autora o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzida do valor correspondente à percentagem de 23,809%, correspondente a 5 anos e 9 meses de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhadora bancária; b) a pagar à A. o valor de € 583,42, acrescido de juros de mora vincendos até à data do trânsito em julgado da presente lide, a liquidar em execução de sentença; c) a pagar à A. as diferenças mensais que o Banco venha a reter e que excedam a percentagem de 23,809% da pensão atribuída pelo CNP, acrescido dos juros de mora vincendos, desde a data da propositura da acção até ao trânsito em julgado, a calcular em sede de execução de sentença; d) a aplicar uma regra pro-rata temporis ou regra de três simples pura no apuramento da parte da pensão do CNP a entregar ao Banco, respeitante aos descontos efectuados pela autora para a Segurança Social enquanto trabalhadora bancária e d) a suportar as custas processuais.

Para tanto invocou a., em síntese: - Foi admitida ao serviço do Réu em 26.6.1980 e por carta de 3.8.2016 foi informada da sua passagem à situação de reforma; - A. passou então à situação de reforma no Banco integrada no nível 10 do ACT para o Sector Bancário, passando a auferir uma pensão de reforma, à altura, pagável 14 vezes por ano, com a mensalidade base de €1.172,02 e diuturnidades no valor de €285,60, actualmente no valor de €1 198,59 e diuturnidades no valor de €292,11; - Posteriormente, na sequência do ofício do R. de 8.3.2019, referindo que, por completar a 66 anos e 5 meses de idade em 19/06/2019, deveria requerer a pensão de reforma por velhice junto do CNP, pediu a pensão de reforma por velhice ao Centro Nacional de Pensões; - Por carta do Centro Nacional de Pensões datada de 26.7.2019 foi informada de que o requerimento de pensão oportunamente apresentado foi deferido, sendo-lhe atribuída a pensão por velhice de € 551,59, acrescida de retroactivos, no montante total global de €1.875,41, com início em 2019-06-19, pagável a partir de 8.9.2019; - Por carta datada de 5.9.2019 o Réu comunicou-lhe que, nos termos da cláusula 94ª do ACT do sector bancário, passaria descontar na pensão de reforma o valor mensal de €291,77; - Esse valor corresponde a 52,885% do valor da pensão paga pelo Centro Nacional de Pensões à A., quando na realidade o Réu só tem direito a 23,809% da pensão que lhe foi atribuída pelo CNP, porquanto esta corresponde a 21 anos de descontos para a Segurança Social (01 1966 a 05/1980 fora do sector bancário, e 01/2011 a 01/10/2016, após a extinção da CAFEB, enquanto trabalhadora bancária), tendo o Réu apenas direito a fazer seu o valor resultante da percentagem correspondente a esse período de 5 anos e 9 meses de descontos após a integração da CAFEB no ISS,IP, ou seja, 23,809%.

  1. Realizada a audiência de partes e frustrada a conciliação o Réu apresentou contestação, pugnando pela improcedência da acção, alegando, em síntese, que, contrariamente ao pretendido pela Autora, a redação da cláusula 136.ª do ACT do sector bancário não autoriza a leitura de que o benefício a descontar pelo Banco seja apurado na base de um critério de proporcionalidade em “regra de três simples pura”. Pelo contrário, entende que tal “pensão de abate” é o benefício do CNP pelo tempo de carreira ao serviço do Banco (pensão teórica) que resulta das contribuições feitas no período em apreço, apurado segundo as regras do regime geral da segurança social, que são as regras aplicáveis ao cálculo do benefício a pagar pelo CNP.

  2. Por sentença de 22.1.2021, foi a acção julgada improcedente procedente e o Réu absolvido dos pedidos.

  3. Inconformada com a sentença dela apelou a Autora 5.

    Conhecendo do recurso, o Tribunal da Relação da Relação, por acórdão de 22 de Fevereiro de 2021, julgou-o procedente, revogando a sentença recorrida e substituindo-as pelo acórdão que condena o Réu a: - aplicar a regra pro-rata temporis ou regra de três simples pura no apuramento da parte da pensão paga à autora pelo Centro Nacional de Pensões que pode deduzir, respeitante aos descontos efectuados pela autora para a Segurança Social, enquanto trabalhadora bancária; - reconhecer à autora o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzida do valor correspondente à percentagem de 23,809%, correspondente aos 5 anos e 9 meses de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhadora bancária; - pagar à autora o valor de €583,42, acrescido de juros de mora vincendos até à data do trânsito em julgado do presente acórdão, a liquidar.

    - A pagar à autora as diferenças mensais que a ré venha a reter e que excedam a percentagem de 23,809% da pensão atribuída pelo CNP, acrescidas dos respectivos juros de mora, a liquidar.

  4. Irresignado com esta decisão dela interpõe o Réu recurso de revista, tendo formulado as seguintes conclusões: “1. A interpretação das cláusulas regulativas de convenção coletiva de trabalho deve fazer-se de acordo com as regras de interpretação da lei, em particular de acordo com o disposto no artigo 9.º do Código Civil, como vem sendo entendimento da Jurisprudência, como recentemente foi defendido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 1/2019, publicado no Diário da República, 1.ª série, n.º 55, de 19 de Março de 2019.

  5. Na interpretação da cláusula 136.ª do ACT do sector bancário, deve atender-se aos seus elementos literal, sistemático, histórico e teleológico.

  6. No que respeita ao elemento literal, a redação da cláusula 136.ª do ACT do sector bancário (cláusula que veio a ser substituída pela cláusula 94.ª do ACT do setor bancário) é clara nos dois aspetos que aqui relevam.

  7. Primeiro, que nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por Instituições ou Serviços de Segurança Social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas Instituições ou seus familiares - como sucede com a Recorrida, a partir de 1.1.2011, dada a sua integração no regime geral de segurança social por imposição do Decreto-Lei n.º 1-A/2011, de 3 de Janeiro -, apenas será garantida, pelas Instituições de Crédito, a diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos no ACT – cfr. 2.ª parte do n.º 1 da cláusula 136.ª.

  8. Segundo, que o benefício a “abater” é o que decorre de contribuições feitas no período de serviço contado pelo Banco para o cálculo da pensão a pagar por este, pois, como se refere no n.º 2 daquela cláusula estão em causa os benefícios decorrentes de contribuições.

  9. A “pensão de abate” é, assim, o benefício do CNP pelo tempo de carreira ao serviço do banco (pensão teórica) que resulta das contribuições feitas no período em apreço, apurado segundo as regras do regime geral da segurança social, que são as regras aplicáveis ao cálculo do benefício a pagar pelo CNP.

  10. A cláusula 136.ª alude, literalmente, ao benefício decorrente das contribuições com fundamento na prestação de serviço que seja contado na antiguidade do trabalhador.

  11. Acresce ainda que, quando no Acordo Coletivo se pretendeu exprimir o critério pro rata temporis tal foi feito de modo particularmente claro e direto (n.º 3 da cláusula 98.ª) sem qualquer semelhança com a redação da analisada cláusula 94.ª.

  12. O elemento sistemático é também conducente ao mesmo resultado interpretativo.

  13. A norma em causa insere-se no sistema de previdência e, no caso concreto, na conjugação de dois regimes de previdência: o regime de segurança social do sector bancário e o regime geral de segurança social.

  14. A cláusula reenvia para as regras de cálculo do regime geral da segurança social a fim de as utilizar e não de aproveitar os seus resultados.

  15. A inserção sistemática da cláusula 136.ª do ACT do sector bancário impõe a sua interpretação no sentido da aplicação das mesmas regras que servem para o cálculo da pensão do CNP.

  16. Ao invés, não há qualquer elemento do sistema que aponte para a interpretação que defende a Recorrida, ou seja, não há qualquer norma no sistema em que se insere a cláusula 136.ª do ACT do sector bancário e a cláusula 94.ª que lhe sucedeu, que contenha norma para o cálculo de benefícios de pensão em razão de qualquer critério de pro rata temporis.

  17. O montante da pensão do CNP é igual ao produto da remuneração de referência pela taxa global de formação da pensão e pelo fator de sustentabilidade., como resulta do disposto no artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de Maio.

  18. E a remuneração de referência é definida no artigo 28.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio, pela fórmula TR/(nx14), em que TR representa o total das remunerações anuais revalorizadas de toda a carreira contributiva e n o número de anos civis com registo de remunerações, até ao limite de 40.

  19. São estas as regras do sistema a que apela a cláusula 136.ª do ACT do sector bancário e que, com recurso ao elemento sistemático, devem aplicar-se no apuramento da parte da pensão a pagar pelo CNP que há-de ser entregue pela Recorrida ao Recorrente.

  20. E são essas as regras aplicadas pelo Recorrente, para apuramento da “pensão de abate”.

  21. Por fim, o elemento teleológico é particularmente relevante na tarefa interpretativa, pois a norma da cláusula 136.ª do ACT do sector bancário tem por fim coordenar o percebimento de benefícios por trabalhadores submetidos a ambos os regimes de forma a impedir que, por força do mesmo período contributivo, o trabalhador possa ver-lhe atribuídos benefícios cumulados.

  22. É uma expressão do princípio da não acumulação de prestações plasmado no artigo 67.º, n.º 1 da Lei de Bases da Segurança Social (Lei n.º 4/2007, de 16 de Janeiro).

  23. A não acumulação de prestações não pode alcançar-se com recurso...

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