Acórdão nº 268/21.9T8GRD.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelHELENA MONIZ
Data da Resolução09 de Setembro de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n. º 268/21.9T8GRD.S1 Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: I Relatório 1.

No Tribunal Judicial da Comarca ……… (Juízo Central Cível e Criminal ……… — Juiz …) foi julgado, em audiência de discussão e julgamento, ao abrigo do disposto no art. 472.º, do CPP, AA e, por acórdão de 12.05.2021, foi condenado na pena única conjunta de 11 (onze) anos e 6 (seis) meses de prisão, resultante do cúmulo jurídico das penas aplicadas no âmbito dos processos NUIPC’s n.ºs 25/16…... e 16/18…….. .

  1. Inconformado, o arguido interpôs recurso do acórdão cumulatório para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo concluído a motivação nos seguintes termos[1]: «1. Conforme Jurisprudência constante e unânime, “Na formação da pena única no concurso de crimes, o Supremo Tribunal de Justiça, evidenciando preocupações de justiça relativa e de equidade, tem adoptado maioritariamente um critério segundo o qual a pena conjunta se há-de encontrar, em resultado da apreciação conjunta dos factos e da personalidade do agente, fazendo acrescer à pena mais grave o produto de uma operação que consiste em comprimir a soma das restantes penas com factores variáveis, mas que se situam, normalmente, entre um terço e um sexto (por vezes até menos, chegando a um oitavo)[2] .

  2. Importante na determinação concreta da pena conjunta será, pois, a averiguação sobre se ocorre ou não ligação ou conexão entre os factos em concurso, bem como a indagação da natureza ou tipo de relação entre os factos, sem esquecer o número, a natureza e gravidade dos crimes praticados e das penas aplicadas, tudo ponderando em conjunto com a personalidade do agente referenciada aos factos[3] , tendo em vista a obtenção de uma visão unitária do conjunto dos factos, que permita aferir se o ilícito global é ou não produto de tendência criminosa do agente, bem como fixar a medida concreta da pena dentro da moldura penal do concurso, tendo presente o efeito dissuasor e ressocializador que essa pena irá exercer sobre aquele[4].

  3. Assim, na realização do cúmulo jurídico deverá atender-se aos critérios previstos no art. 77.º do CP, designadamente as condições económicas e sociais do arguido, as condenações de que foi alvo, a sua personalidade manifestada nos factos, o grau de culpa, as necessidades de prevenção geral e especial, considerando assim a globalidade dos factos em interligação com a personalidade do agente de forma a aquilatar-se, fundamentalmente, se o conjunto dos factos traduz uma personalidade propensa ao crime, ou é antes, a expressão de uma pluriocasionalidade, que não encontra a sua razão de ser na personalidade do arguido.

  4. Assim, aos limites mínimos - as penas parcelares aplicadas mais gravosas – deverá “acrescer o produto de uma operação que consiste em comprimir a soma das restantes penas com factores variáveis, mas que se situam, normalmente, entre um terço e um sexto (por vezes até menos, chegando a um oitavo).”[5] ou mesmo menos ainda, como se justifica no caso presente)”[6].

  5. Consequentemente, acredita a ora Recorrente que, atendendo aos tipos de ilícitos praticados, aos bens jurídicos lesados e à personalidade não perigosa do mesmo, bem como às respectivas condições pessoais, demonstradas no relatório social a que se refere o acórdão de que se recorre, se justifica, atendendo às finalidades de prevenção especial e geral, não ultrapassando a medida da culpa, que pena aplicada, resultante da operação de cúmulo jurídico efectuada, se situe em 10 (dez) anos e 6 (seis) meses de prisão.

  6. Ao ter entendido de outra forma, a decisão recorrida violou o disposto nos artgs.ºs 40.º, 70.º, 71.º e 77.º do CP.

  7. Pelo que deve ser revogada nos termos reclamados e substituída por outra que aplique ao recorrente a pena referida.

    Disposições legais violadas ou incorrectamente aplicadas: • Artgs.ºs 40.º, 70.º, 71.º e 77.º do CP.» 3.

    A Magistrada do Ministério Público no Tribunal Judicial da Comarca …….. respondeu ao recurso interposto tendo concluído nos seguintes termos: «1. Nos presentes autos foi realizado o cúmulo jurídico das penas aplicadas ao arguido AA, nos processos n.ºs 25/16……… e 16/18………, tendo o Tribunal aplicado ao arguido AA a pena única de 11 (onze) anos e 6 (seis) meses de prisão.

  8. Ao contrário do que sustenta o recorrente, inexistem critérios matemáticos para a definição da pena aplicável – tão pouco a jurisprudência reflecte tal critério aritmético - impondo-se ao julgador uma ponderação mais profunda e fundamentada de todos os factores em presença, permitindo-lhe fixar a pena dentro de todo o arco da moldura concurso, de acordo com o juízo formulado a final sobre a personalidade do agente.

  9. Na determinação da medida concreta da pena única, o Tribunal atendeu aos critérios gerais da prevenção e da culpa (art. 71.º, do CP), efectuou uma ponderação conjunta dos factos e da personalidade do agente, à luz do conhecimento superveniente dos novos factos (citado art. 77.º, n.º 1, do CP) e, de forma criteriosa, adequada e suficiente, julgou aplicar ao condenado a pena única de 11 (onze) anos e 6 (seis) meses de prisão, não assistindo aqui qualquer razão ao recorrente quando pugna pela respectiva redução da pena única aplicável.

    Em suma, afigura-se-nos que o recurso do condenado não merece provimento, devendo manter-se integralmente a douta decisão recorrida.» 4.

    Uma vez subidos os autos, a Senhora Procuradora-Geral Adjunta no Supremo Tribunal de Justiça proferiu parecer considerando que o recurso deve ser julgado improcedente.

  10. O arguido foi notificado ao abrigo do art. 417.º, n.º 2, do CPP, e respondeu reafirmando, em súmula apertada, que deve ser “ver substancialmente, reduzida a pena única que lhe foi aplicada, devendo fixar-se, esta, nos 10 (dez) anos e 6 (seis) meses de prisão e não aqueloutra que, de facto, lhe foi aplicada.” 6.

    Colhidos os vistos em simultâneo, e não tendo sido requerida a audiência de discussão e julgamento, o processo foi presente à conferência para decisão.

    II Fundamentação A. Matéria de facto Na decisão recorrida, são dados como provados os seguintes factos: «O tribunal, em face das certidões das condenações proferidas nos processos que se cumulam (dando aqui por integralmente reproduzidos todos os factos que constam das diversas certidões e que determinaram a sua condenação em cada um desses processos), do CRC do arguido e do relatório social junto aos autos, com relevo para a decisão, julga provado que: 1. O arguido, por sentença proferida no dia 30/09/2020, no âmbito do (processo comum singular) NUIPC n.º 25/16…….., do Juízo Local de Competência Genérica ………., transitado em julgado no dia 30/10/2020, por factos praticados entre os dias 8 e 16/02/2016, foi condenado, como autor material de 1 crime de falsificação de documento agravado, previsto e punido pelo artigo 256º/1-a), b) e e) e 3 do Código Penal, por referência ao artigo 255º/a) (relativamente às chapas de matrícula e número do chassis), na pena de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com sujeição a regime de prova; 2. Aí se julgou provado, com relevo para a decisão e além do mais, que: 2.1. Em data não concretamente apurada, mas posterior a ade 2015, o arguido AA vendeu um veículo automóvel a BB, e recebeu como forma de pagamento do mesmo, a quantia de € 1.500 (mil e quinhentos euros) e ainda um veículo automóvel sinistrado, de marca ……., modelo ……., ….., cor ……., com a matrícula TP-….-…. propriedade do citado BB; 2.2. No dia 8 de fevereiro de 2016, o veículo automóvel, ligeiro de mercadorias, de marca …….., modelo ……, com a matrícula QM-….-…. pertença de CC foi furtado da ………, em …………; 2.3. Em data e de forma não concretamente apuradas, mas situada entre o dia 8 de fevereiro de 2016 e o dia 16 de fevereiro de 2016, o arguido entrou na posse do referido veículo automóvel, marca ………, modelo ……, ……, com a matrícula QM-….-….; 2.4. Em execução de um plano que consistia em transportar o referido veículo para a …….., através da sociedade "Transportes C……., Ld.ª", para uma vez aí, o transportar e vender a países africanos, o arguido, em data, local e de forma não apuradas, procedeu por si, ou através de outrem a seu mando, às seguintes operações, com vista a dissimular, transformando, o veículo …….., modelo …….., matrícula QM-….-….: - alterou as chapas de matrícula e assim, fez constar no lugar da matrícula QM-….-…., as chapas com a matrícula TP-….-…., que o referido veículo passou a ostentar; - na placa superior da face interior do pilar B, do lado direito, onde constam os dizeres "……… MOTOR CORPORATION JAPAN", alterou os carateres do grupo sequencial do número do chassis original …….67, através de rasura mecânica, com recurso ao polimento e rebaixamento da placa para o número ……..99; - o número original do chassis constante na longarina direita, ao nível da cava da roda da frente e anterior foi alterado para o número -LY……..99-, através do recorte de chapa, e sobreposição de uma outra chapa extraída de outro veículo da mesma marca, que foi polida de forma mecânica e soldada; 2.5. O arguido ao alterar as caraterísticas identificativas do veículo, tais como as chapas de matrícula e o número de chassis, apondo-lhe e gravando outros números que não pertenciam àquele veículo, fê-lo, sabendo que tal lhe estava legalmente vedado, e que punha, como efetivamente pôs, em causa a fé pública que tais elementos gozam perante a generalidade das pessoas e colocava em perigo, como efetivamente colocou, a segurança do tráfico comercial, pretendendo com as referidas condutas enganar terceiros e as autoridades através da circulação e exportação do veículo, em circunstâncias aparentemente legais, para assim, posteriormente, o vender a países africanos, e dessa forma, obter para si um ganho económico consubstanciado no lucro da venda do veículo alterado, só não logrando concretizar o seu intento, por razões absolutamente alheias à sua vontade; 2.6. O arguido por ele ou através de terceiro alterou as chapas de matrícula e o número de série do...

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