Acórdão nº 4807/19.7T8VIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelJORGE MANUEL LOUREIRO
Data da Resolução08 de Setembro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 6.ª secção social do Tribunal da Relação de Coimbra I – Relatório O autor propôs contra a ré a presente acção de condenação com a forma de processo comum e emergente de contrato de trabalho, tendo deduzido o pedido seguidamente transcrito: “Termos em que e nos melhores de direito deve a presente ação ser julgada provada e procedente e consequentemente a Ré ser condenada a: a) – Reconhecer que, pelo menos desde o mês de Janeiro do ano de 2015 o Autor auferiu o salário líquido de 2.050,00 € até ao mês de Agosto (inclusive) de 2018 e que este era a sua retribuição acordada entre as partes.

  1. – Reconhecer que desde o mês de Setembro de 2018 até à presente data e futuramente até acordo de revisão salarial ou cessação do contrato de trabalho o salário do Autor é a quantia líquida de 2.100,00 €, sendo esta a retribuição acordada entre as partes.

  2. – A entregar à Segurança Social e à Autoridade Tributária, as taxas sociais e retenções na fonte que incidiam sobre os salários ilíquidos a que correspondem os salários líquidos acordados, descontando as retenções e pagamentos já efectuados parcialmente.

  3. – Pagar ao Autor as diferenças salariais não pagas e que perfazem o montante de 2.630,85 € até ao mês de setembro de 2019 (inclusive) e as diferenças salariais após esta data, se as houver.

  4. – Custas, procuradoria e mais que for devido.

    ” Alegou, como fundamento da sua pretensão e em resumo, que foi trabalhador subordinado da ré, sendo credor da mesma pelos valores correspondentes às diferenças entre as remunerações líquidas acordadas entre ambos e aquelas que a ré lhe pagou em montantes inferiores àquelas e que melhor identifica ao longo da petição.

    Citada, a ré contestou, pugnando pela improcedência da acção.

    Sustentou, em resumo, que nunca foram acordadas as remunerações líquidas invocadas pelo autor e que, em qualquer caso, o autor incorre em abuso de direito ao reclamar as diferenças salariais líquidas a que se arroga na petição.

    O processo prosseguiu os seus regulares termos, acabando por ser proferida sentença de cujo dispositivo consta, designadamente, o seguinte: “Por tudo o exposto: I) Julga-se, improcedente a invocada exceção de abuso de direito, julgando-se a presente ação parcialmente procedente por provada e, em consequência: a. Condeno a ré B…, S.A., a reconhecer que, pelo menos, desde janeiro de 2015 e até agosto de 2018, inclusive, o autor A…, auferiu a retribuição liquida de € 2.050 (dois mil e cinquenta euros) e, a partir de setembro de 2019 e pelo menos até setembro de 2019 auferiu a quantia de € 2.100 (dois mil e cem euros), correspondente à retribuição acordada entre as partes.

  5. Condeno a ré a entregar à Segurança Social e à Autoridade Tributária as taxas socias e retenções na fonte que incidam sobre a retribuição ilíquida a que correspondem os valores líquidos aludidos em a), descontando os já pagos, tendo por base o declarado nos recibos de vencimento emitidos em nome do autor.

  6. Condeno a ré no pagamento dos diferenciais de retribuição e subsidio de férias de 2019 em falta, que totalizam o montante global de € 2.504,14 (dois mil, quinhentos e quatro euros e catorze cêntimos).

  7. Considera-se prejudicada a apreciação das retribuições devidas a partir de outubro de 2019, considerando a pendência de ação de impugnação da ilicitude do despedimento, tendo por base decisão proferida pela ré em outubro de 2019.

    II) Absolve-se a ré do demais peticionado no tocante aos diferenciais de retribuição em falta.

    Custas da ação a cargo de autor e ré na proporção do decaimento que se fixa em 5% para o autor e 95% para a ré.

    ”.

    Não se conformando com o assim decidido, apelou a ré, rematando as suas alegações com as conclusões seguidamente transcritas: (…) Contra-alegou o autor, pugnando pela improcedência da apelação.

    Nesta Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da procedência da apelação, mas apenas no tocante à questão da competência material dos tribunais do trabalho.

    Colhidos os vistos legais, importa decidir*II - Principais questões a decidir Considerando que é pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso (artigos 635º/4 e 639º/1/2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei 41/2013, de 26/6 – NCPC – aplicável “ex-vi” do art. 87º/1 do Código de Processo do Trabalho – CPT), integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir: 1ª) se os tribunais do trabalho são incompetentes em razão da matéria para conhecer do pedido do autor no sentido da condenação da ré “A entregar à Segurança Social e à Autoridade Tributária, as taxas sociais e retenções na fonte que incidiam sobre os salários ilíquidos a que correspondem os salários líquidos acordados, descontando as retenções e pagamentos já efectuados parcialmente.

    ”; 2ª) se deve conhecer-se do recurso fáctico da apelante; 3ª) se deve proceder o recurso fáctico da apelante; 4ª) se o autor não tinha direito à retribuição líquida de € 2.050 e de € 2.100 que lhe foi reconhecido na sentença recorrida, não tendo por isso direito às diferenças de retribuição e de subsídio de férias que lhe foi reconhecido com base naquelas retribuições líquidas.

    5ª) se o autor incorre em abuso de direito; 6ª) se é nula a estipulação entre o autor e a ré de que esta pagaria ao primeiro uma remuneração líquida de € 2.050 e, depois, de € 2.100, por consequência do que o autor não tem direito a quaisquer quantias para lá das que se fizeram constar dos recibos de vencimento a título de salário líquido mensalmente devido ao autor e que foram pagas, designadamente as quantias líquidas referentes às diferenças salariais líquidas reconhecidas na sentença recorrida.

    *III – Fundamentação

    1. De facto Factos provados O tribunal recorrido deu como provados os factos seguidamente transcritos: “1 – A ré B…, S.A., dedica-se à atividade de, construção civil e obras públicas, jardinagem, execução de projetos, incluindo todas as especialidades, engenharia civil e hidráulica, construção de estradas, vias férreas, aeroportos e instalações desportivas e instalações especiais; projetos de construção civil engenharia, fiscalização de obras públicas e particulares, promoção imobiliária, compra e venda de propriedades, administração e gestão de bens imóveis; gestão de estabelecimentos hoteleiros e similares. Agência de viagens e promoção turística. Fornecimento de obras públicas, compra, venda e revenda de materiais de construção. Compra e venda de produtos, utensílios, eletrodomésticos, mobiliário, equipamento e decoração em geral, englobando também hotelaria. Exploração e comercialização de águas termais e outras. Gestão de participações sociais. Administração de termas de águas sulfurosas e afins, conforme documento de fls. 30 verso a 37 dos autos e de fls. 119 a 126 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (artigo 1º da petição inicial).

    2- O autor foi admitido a prestar trabalho para a ré, anteriormente denominada “ C…, L.da”, em 01/03/1996, por convite do legal representante D…, mediante contrato sem termo (artigo 2º da petição inicial).

    3 – Com as funções de Engenheiro Civil (artigo 3º da petição inicial).

    4 – Mediante salário liquido inicial que o autor já não se recorda e que em concreto não foi possível apurar (artigo 4º da petição inicial).

    5 – Foi acordado entre autora e ré que o salário acordado e subsequentes aumentos salariais seriam sempre valores líquidos (artigo 5º da petição inicial).

    6 – Cabendo à ré pagar a retenção na fonte de IRS, bem como a taxa da Segurança Social ou quaisquer outros encargos legais (artigos 6º, 7º e 47º todos da petição inicial).

    7 – Ao serviço da ré, o autor desempenhava as funções correspondentes à sua categoria profissional, nomeadamente, consultava plataformas eletrónicas de concursos públicos e anteriormente Diário da Republica e selecionava os concursos para a Administração concorrer aos que entendia; com as indicações da administração fazia o estudo das obras escolhidas, consultava fornecedores de equipamentos e materiais e subempreiteiros preparando a proposta e documentação necessária a cada concurso; nas obras adjudicadas foi quase sempre diretor de obra da ré uma vez que era obrigatório por ser o responsável pelo alvará desta; preparava as obras indo ao local, dando instruções aos trabalhadores, acompanhava as obras durante a sua execução; pedia o fornecimento dos materiais, acompanhava reuniões com a fiscalização do dono da obra e efetuava autos de medição com subempreiteiros e com o dono da obra (artigo 8º da petição).

    8 – Funções que sempre desempenhou normal e assiduamente, trabalhando por conta, sob autoridade, direção e fiscalização da ré (artigo 9º da petição).

    9- Cumprindo o seguinte trabalho de horário de acordo com a ré: - de segunda a quinta feira das 9h às 18h, com intervalo para almoço das 12h30 às 13h30 (artigo 10º da petição e 9º da contestação).

    10 – Autor e ré acordaram que esta pagaria aquele o salário liquido, que a partir de janeiro de 2015 era no montante mensal de € 2.050 (dois mil e cinquenta euros) (artigo 11º da petição).

    11 – Salário que se manteve até ao mês de agosto de 2018 (inclusive), com algumas oscilações de valores mensais (artigo 12º da petição inicial).

    12 – A partir de setembro de 2018 começou a auferir o salário liquido de € 2.100 (dois mil e cem euros), incluindo subsidio de férias e de natal, pelo que, tal valor era pago catorze vezes por ano (artigos 13º, 14º, 15º e 48º todos da petição inicial).

    13 – Autor e ré acordaram um valor a receber pelo autor como retribuição liquida, nunca se preocupando com o valor da retribuição ilíquida (artigos 16º e 46º ambos da petição inicial).

    14 – A ré sempre fez uma imputação fictícia dessa remuneração, subdividindo em vencimento com recibo próprio, ajudas de custo com os dizeres “deslocações em viatura própria”, com recibo próprio ambos em cada mês de retribuição normalmente através de...

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