Acórdão nº 405/07.6GBAND-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelJORGE LANGWEG
Data da Resolução08 de Setembro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 405/07.6GBAND-A.P1 Data do acórdão: 8 de Setembro de 2021 Relator: Jorge M. Langweg Adjunta: Maria Dolores da Silva e Sousa Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro | Juízo de Competência Genérica de Anadia Sumário: ....................................

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Acordam os juízes acima identificados do Tribunal da Relação do Porto Nos presentes autos acima identificados, em que figura como recorrente o requerente B….

I - RELATÓRIO1. Em 8 de Fevereiro de 2021 foi proferida nos presentes autos a decisão que decidiu não reconhecer a idoneidade do requerente B… para ser detentor de arma de fogo da categoria C, devendo este aguardar o decurso do prazo de cancelamento definitivo do registo criminal.

2. Inconformado com a decisão, o requerente interpôs recurso da decisão, terminando a motivação de recurso com a formulação das conclusões seguidamente reproduzidas: "1 O recorrente não se conforma com a decisão do Tribunal A QUO ao considerar que ele não tem idoneidade para renovar a licença de uso e pote de arma de caça, da classe C; 2- A matéria de facto dada como provada pelo Tribunal A QUO, nos factos 1.ª a 32.º da matéria provada, que aqui se dá por reproduzida, por razões de economia processual, está em oposição com a subsunção jurídica feita pelo Tribunal A Quo; 3- O Tribunal A QUO ao concluir, como concluiu, na parte dispositiva da sentença- sic- " Pelo exposto, decide-se não reconhecer a idoneidade do requerente B… para ser detentor de arama de fogo da categoria C, devendo este aguardar o decurso do prazo de cancelamento definitivo do registo criminal"- demonstra inequivocamente que o único fundamento em que se fundamentou a sentença foi no averbado constante do registo criminal do recorrente, condenação do recorrente no processo n.º 407/07.6GBAND, respeitante a factos ocorridos no ano de 2007 e não em qualquer outro facto ou fundamento; 4 - Se tivesse tido em consideração a globalidade dos factos dados como provados, tinha de concluir, necessariamente, que o recorrente é pessoa idónea para renovar a licença de uso e porte de arma de caça, classe C, nos termos dos artºs 14, n.º 2 e 3 e 15.º, n.º 1 al. c) e 2, da Lei 5/2006; 5- O ter sido aplicado ao recorrente uma pena de prisão superior a 1 ano, suspensa na sua execução, sem qualquer injunção, é, nos termos da lei, apenas uma susceptibilidade de indiciar falta de idoneidade para o efeito e não uma consequência necessária; 6- Se o espírito do legislador fosse no sentido de considerar que uma condenação em pena de prisão superior a 1 ano, por crime doloso, violento, tinha como consequência a ineidoneidade de quem fosse punido nesses termos, tinha-o dito de forma clara e expressa na lei, o que não aconteceu 7- Ao estipular no art.º 14, n.º 3, do citado diploma que o recorrente no decurso anterior à verificação do cancelamento da inscrição no registo criminal das decisões em que o requerente foi condenado, pode este requerer que lhe seja reconhecida a idoneidade para os fins pretendidos, afastou de forma clara que a condenação em pena de prisão superior a 1 ano, por crime doloso, violento, seja condição, só por si, de ineidoneidade do recorrente.

8- Para o Tribunal A QUO decidir, como decidiu, tinham de existir outros factos que levassem à conclusão que o requerente não tinha idoneidade para ser titular da licença de uso e porte de arma de caça, classe C, o que não acontece no caso do recorrente, todos os outros factos para além do primeiro, dados como provados, são demonstrativos da idoneidade do recorrente.

9- Por outro lado, os factos por que o recorrente foi condenado no processo n.º 405/07.6GDAND e cuja condenação se encontra averbada no seu registo criminal, não foram praticados com uso de arma de fogo, muito menos com caçadeira; 10- O pedido formulado ao tribunal pelo requerente foi o de saber se ele tinha condições, qualidades, aptidões e competências para o desempenho da actividade lúdica que o uso de tal arma pressupõe, e não o perigo de poder cometer um crime com a arma ou fazer um novo julgamento pelos quais já foi condenado anteriormente, já cumpriu, como fez o Tribunal A QUO ao decidir como decidiu.

11- Da matéria de facto considerada provada pelo Tribunal A QUO (facto 2 a 32) resulta à saciedade que o requerente é idóneo para renovar a licença de uso e porte de arma de caça, classe C, sendo o único facto desabonatório, o facto provado sob o n.º 1, mas insuficiente para o considerar ineidónio, como aconteceu; 12- A matéria de facto dada como provada sob o n.º 1, respeita a factos ocorridos no ano 2007 (há cerca de 14 anos), não havendo qualquer registo de outro ilícito antes ou depois desses factos, por o requerente não ter cometido.

13- Na condenação que sofreu por violência doméstica, foi-lhe aplicada uma pena de prisão de 2 anos e 6 meses, suspensa a execução pelo mesmo período, sem ser imposto ao recorrente qualquer dever ou regras de conduta, nomeadamente proibição de obter licença de uso e porte de arma de fogo, nos termos dos art.ºs 51 e 52 CP.

14- Já, na altura, o Tribunal que apreciou os factos fez uma prognose favorável da personalidade do ora recorrente, que levou à suspensão da execução da pena, sem qualquer dever ou regra de conduta; 15- Não podia, nem devia, o Tribunal A QUO fundamentar, como fundamentou, a sua decisão única e simplesmente na gravidade do crime de maus tratos e o alarme social que tais crimes causam na sociedade e o risco que representa a atribuição da idoneidade do recorrente; 16- O recorrente pediu ao Tribunal para apreciar se ele era uma pessoa capaz de usar de forma avisada, prudente e de acordo com a lei, a arma no exercício venatório e não a reapreciação dos factos que deram origem ao processo n.º 405/07.6GBAND e pelos quais foi condenado e já cumpriu, 17- O Tribunal A QUO, na nossa modesta opinião, preocupou-se em reapreciar os factos ocorridos em 2007 e o impacto social do crime de violência doméstica, olvidando o pedido do recorrente.

18- O Tribunal A QUO centrou o seu foco de decisão na reapreciação dos factos ocorridos em 2007, que deram origem ao processo n.º 405/07.6GBAND, o alarme social que provocam, bem como o perigo que representava permitir que o recorrente renovasse a licença de uso e porte de arma, classe C, e esqueceu o verdadeiro pedido formulado pelo requerente, como já foi sabiamente decidido em processo semelhante por este Venerando Tribunal da Relação, por acórdão de 29/04/2015, relatado pelo Venerando Desembargador Dr. Ernesto Nascimento, disponível em www.dgsi.pt, onde foi decidido caso semelhante e demonstra o erro cometido pelo tribunal A QUO.

9- Decidiu incorretamente o Tribunal a QUO, ao considerar que o recorrente não tinha idoneidade para renovar a licença de uso e porte de arma, da classe C, para poder exercer a actividade lúdica de caçar, em manifesta oposição à matéria de facto dada como provada.

20- A interpretação feita pelo tribunal A QUO da al. c), do art.º 14, da Lei 5/2006, viola frontalmente os princípios constitucionais ínsitos no art.º 30 CRP., devendo ser declarada inconstitucional.

21- A douta decisão recorrida violou, entre outros, o disposto nos art.ºs 14 e 15 da Lei 5/2006 e 30ª da CRP.

Nestes termos e nos doutamente forem supridos por V. Exas deve dar-se provimento ao recurso, revogando-se a decisão do Tribunal A QUO e ser substituída por outra, que considere que o recorrente é pessoa idónea para renovar a licença de uso e porte de arma de caça, classe C, para exercer a actividade lúdica de caça, Como é legal e justo." 3. O Ministério Público respondeu ao recurso, pugnando pela sua improcedência, apresentando as seguintes conclusões: "1. Face ao regime jurídico em vigor, uma condenação em pena de prisão superior a um ano, pela prática de crime doloso, com uso de violência é suscetível de, por si só, indiciar falta de idoneidade para a concessão ou renovação da licença de uso e porte de arma de caça.

2. A condenação do recorrente pela prática de um crime de maus tratos, que se consubstanciou, para além do mais, no facto deste ameaçar de morte uma outra pessoa e de a ter tentado molestar corporalmente com uma catana, evidencia falta de idoneidade para obtenção de licença de uso e porte de arma de caça, que justifica o indeferimento do pedido.

Nestes termos, não deve o recurso interposto (…) merecer provimento, mantendo-se integralmente a sentença recorrida, assim se fazendo justiça. ." 4. Nesta instância, o Ministério Público[1] emitiu parecer em sentido divergente, pugnando pela procedência do recurso nos seguintes termos: "(…) Salvo melhor opinião, estamos crentes que lhe deve ser concedida a idoneidade recusada pela 1.ª instância, além do mais que consta da decisão de facto, porquanto: o recorrente completará, no próximo mês de Setembro, 48 anos de idade; a única condenação data de há 7 anos atrás por crimes cometidos há cerca de 13 anos; está divorciado da ex-mulher (vitima do crime de maus tratos) e dela separado há cerca de 13 anos, tendo constituído uma nova relação há cerca de 12 anos que se mantém estável [cfr. relatório social e decisão de facto]; As penas a que foi condenado encontram-se extintas pelo cumprimento, a última desde finais de 2016; a possibilidade do cancelamento da condenação encontra-se, atualmente, à distância de 6 meses; mas mais relevante, no sentido de influenciar a decisão de recurso, é que o recorrente, apesar da condenação transitada em Junho de 2016, manteve a licença a que agora pretende aceder durante 5 anos, em pleno período da suspensão da pena a que foi condenado e para além dele (entre 19.11.2014 e 18.11.2019), podendo caçar e usar armas de caça, armas que possui e a que tem acesso.

Ou seja, o recorrente tem um longo período de uso de armas de caça (desde 2008) em atividades lúdicas venatórias sem registo de que delas tenha feito mau uso.

Durante cerca de 11 anos, manteve a licença a que pretende aceder, tendo o procedimento para sua...

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