Acórdão nº 10192/15.9T8STB.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelVIEIRA E CUNHA
Data da Resolução08 de Setembro de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça* As Partes, o Pedido e o Objecto do Processo Sereia da Praia, Ldª, intentou a presente acção, com processo de declaração e forma comum, contra Ocidental - Companhia Portuguesa de Seguros, S.A., e Companhia de Seguros Allianz Portugal, S.A.

Peticionou a condenação da 1ª Ré a pagar-lhe: a) € 89.217,67 pela perda total do veículo NL; b) € 60.180,00, a título de indemnização por privação do uso de veículo, desde a data do sinistro até à presente data; c) Indemnização pela privação do uso do veículo a ser contabilizada desde a presente data até ao efetivo e integral pagamento das quantias que se reclamam a título de perda total do veículo, no valor diário de € 60,00.

A título subsidiário, caso se apure que a culpa pertence ao condutor do veículo da A. ou não sendo possível determinar qual dos veículos foi o culpado pela ocorrência do acidente, a condenação da 2ª Ré a pagar-lhe: a) € 70.708,00 pela perda total do veículo NL; b) € 60.180,00, a título de indemnização por privação do uso de veículo, desde a data do sinistro até à presente data; c) Indemnização pela privação do uso do veículo a ser contabilizada desde a presente data até ao efetivo e integral pagamento das quantias que se reclamam a título de perda total do veículo, no valor diário de €60,00.

Ou caso se venha a apurar que ambos os condutores contribuíram com culpa para a produção do sinistro deverão as Rés serem condenadas na respectiva proporção.

Mais peticionou que se condenem as Rés no pagamento de juros moratórios, contados à taxa legal em vigor, desde da data de citação até efectivo e integral pagamento.

Alegou ser proprietária de um veículo da marca …, modelo … …., com matricula ....-NL-..., que foi interveniente em acidente de viação, em que interveio igualmente o veículo ligeiro de passageiros …, modelo …, com matricula ...-...-VF, segurado pela 1ª R., tendo sido este último a dar causa ao sinistro, posto que invadiu a hemifaixa de rodagem por onde circulava o veículo Audi, cujos danos próprios decorrentes da respectiva circulação foram segurados pela 2ª Ré.

A R. Ocidental Companhia Portuguesa de Seguros SA. alegou, em virtude de averiguações efectuadas, ter concluído que os danos apresentados pelas viaturas não eram compatíveis com a dinâmica do acidente apresentada pelos condutores. Após peritagem dos serviços da Ré, o veículo foi considerado em perda total, posto que o valor previsto para a reparação era superior ao valor de mercado do veículo, já incluindo os extras que possuía. Perante uma situação de perda total não é devida reparação indemnizatória pela privação do uso.

A Ré Allianz igualmente alegou ter declinado qualquer responsabilidade pelos danos reclamados pela Autora, sua segurada, porquanto concluiu, após verificação e análise dos danos e das circunstâncias participadas do acidente, que esses referidos danos não eram compatíveis com as circunstâncias alegadas.

Atendendo ao valor de mercado do veículo e ao o valor estimado para a reparação, não era economicamente viável essa reparação, sucedendo no entanto que o valor do capital subscrito em 08.02.2013, de € 71.308,00, se mostra desadequado porque superior ao valor de mercado do NL à data do acidente, sendo que a obrigação de indemnizar, a existir, está limitada ao valor real do objecto seguro ao qual se deduz o valor do salvado e da franquia contratual. No que tange à indemnização pela privação de uso a existir reduz-se a mesma aos termos acordados no âmbito do contrato de seguro.

As Decisões Judiciais Em 1ª instância, a acção foi julgada parcialmente procedente e a Ré Ocidental Companhia de Seguros, S.A., condenada a pagar à A. Sereia da Praia, Ldª, a quantia de € 67.139,00, acrescida de juros calculados à taxa legal de 4%, desde a citação até integral pagamento.

A quantia total referida proveio das seguintes parcelas - € 47 789,00, valor da perda total do veículo; € 19 350,00 – indemnização pela privação do uso.

Recorreram de apelação a Ré Ocidental (recurso independente) e a Autora (recurso subordinado).

Defendeu a Ré Ocidental que, desconhecendo-se até quando a Autora manteve a posse do veículo, se tinha imposto a condenação da Apelante numa indemnização pela privação do uso a apurar em sede de liquidação de sentença.

A Autora defendeu que o período temporal a fixar para efeitos de indemnização pela privação de uso não deveria ter como limite a data da venda do salvado, mas sim a data do pagamento efectivo da indemnização devida pela perda total do veículo NL.

O acórdão recorrido sustentou: “A ré Ocidental está obrigada a proceder à reparação integral dos danos sofridos pela autora, o que passa pela reparação da privação do uso do veículo desde a data do acidente até ao momento em que o pagamento da indemnização pela perda total do veículo deveria ter sido satisfeito, como forma de se alcançar ou de se aproximar da reconstituição natural da situação que existiria se acaso não tivesse ocorrido o acidente, nos termos do art.º 562º do C. Civil (Ac. do STJ, de 13-07-2017, proc. 188/14.3T8PBL.C1.S1, relatora Maria da Graça Trigo, www.dgsi.pt, e Ac. do TRE, de 5-11-2020, proc. 795/18.5T8TNV.E1, relator Tomé Ramião, www.dgsi.pt).” “A autora peticionou a quantia de € 60.180,00, a título de indemnização por privação do uso de veículo, desde a data do sinistro até à presente data; bem como a partir desta data até ao efetivo e integral pagamento das quantias que reclama a título de perda total do veículo, no valor diário de €60,00.” “Como foi decidido no citado Acórdão do STJ, de 13-07-2017 “Compreendendo-se o período de privação do uso de veículo entre 4-01-2013 e a data da entrega efetiva da indemnização pela perda total do veículo (que se desconhece se já ocorreu), uma vez que o valor acumulado da indemnização pela privação de uso ascenderá presentemente a um nível extremamente elevado e desproporcionado, tanto em relação ao valor devido pela perda total do veículo sinistrado, como em relação ao preço de um veículo novo nos últimos anos em que o mesmo foi produzido, deve o valor da indemnização a atribuir ter como limite máximo este último valor”.

“No caso concreto, até à presente data, a recorrente Ocidental não colocou à disposição da autora o pagamento da indemnização correspondente ao valor de perda total do veículo.” “Consequentemente, e na ausência de outros elementos de facto, não alegados, fazendo uso do princípio da equidade e de justiça, ínsito no art.º 566º/3 do C. Civil, e tendo em conta todas as circunstâncias do caso concreto, considera-se adequada uma indemnização que não deve ultrapassar o montante da indemnização atribuída pela perda total do veículo, ou seja, o valor de €47.789,00.” No dispositivo, foi julgado improcedente o recurso principal da recorrente Ocidental-Companhia Portuguesa de Seguros, S.A., e parcialmente procedente o recurso subordinado da Sereia da Praia, Ld.ª, e, em consequência, revogou-se parcialmente a sentença recorrida, substituindo-a por outra que condenasse a ré Ocidental-Companhia Portuguesa de Seguros, S.A. a pagar ao autor a quantia de € 95.578,00, mantendo-se o decidido quanto aos juros.

Inconformada ainda, recorre de revista a Ré Ocidental: I. Vem o presente recurso interposto do Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora que revogou parcialmente a Sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal Judicial da Comarca ...., substituindo-a por outra onde condenou a ora Recorrente numa indemnização pela privação de uso de veículo, no montante de € 47.789,00 (quarenta e sete mil setecentos e oitenta e nove euros), acrescida dos respectivos juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a citação até integral pagamento.

  1. Ao contrário do Tribunal em 1.ª instância, entendeu o Tribunal «a quo» que o período a considerar para a determinação da indemnização respeitante à privação de uso de veículo não é a da venda do salvado, mas a do pagamento efectivo da indemnização devida pela perda total do veículo, o que não se pode aceitar.

  2. Com efeito, a aqui Recorrida, peticionou uma indemnização pela privação do uso do veículo a ser calculada num valor diário de € 60,00 (sessenta euros) desde a data do sinistro até integral pagamento, a apurar em sede de Incidente de Liquidação de Sentença, cfr. artigos 30.º e 31.º da Petição Inicial.

  3. Acontece que, após ter sido notificada para vir aos Autos informar se o veículo tinha, entretanto, sido reparado e onde se encontrava, a ora Recorrida comunicou que o veículo em questão tinha sido vendido como salvado, cfr. Requerimento com a Referência n.º ...158.

  4. Bem como comunicou posteriormente que não tinha ficado com qualquer documento comprovativo da venda, cfr. Requerimento com a Referência n.º ...759.

  5. Não obstante, através da informação da base de dados do Registo Automóvel, foi possível apurar que o registo seguinte, com data de apresentação em 26.03.2014, indicava como proprietário AA.

  6. Pelo que, o Douto Tribunal Judicial da Comarca .... deu como provado que: «Do registo automóvel consta o registo do veículo ....-NL-... indicando como proprietário, Sereia da Praia Lda., com data de apresentação a registo de 13.03.2013; seguida da indicação como proprietário AA, com data de apresentação a registo de 26.03.2014; de seguida como proprietária figurando BB com apresentação a registo de 14.05.2014 e por último indicação como proprietário CC e como data de registo 06-04-2015.» (FACTO PROVADO em 35). Ora, VIII. A jurisprudência maioritária seguida pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal em 1.ª instância «(…) reconhece o direito à indemnização pela privação de uso de veículo com fundamento na simples privação do uso normal do bem. A afirmação desta tese assenta, por isso, na constatação naturalística de que a privação do uso de uma coisa inibe o proprietário de sobre ela exercer os inerentes poderes de gozo, maxime, de uso e fruição, razão porque constitui por si só uma perda autónoma avaliável em dinheiro e, por conseguinte, susceptível de ser considerada. (…)»...

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