Acórdão nº 00453/13.7BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Julho de 2021

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução02 de Julho de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte: I. RELATÓRIO 1.1.

A.

e mulher, M.

, instauraram a presente ação administrativa comum contra o MUNICÍPIO (...), pedindo a condenação deste a pagar-lhes a quantia de € 242.156,87, sendo € 154.343,51 relativa à condenação dos Autores no âmbito do processo nº 2960/09.7TBVIS, acrescida de juros de mora vencidos até à data de instauração da presente ação, no montante de € 24.813,36, e a quantia de € 63.000,00, a título de lucros cessantes.

Para tanto alegam, em síntese, serem proprietários da fração “A”, sita no prédio constituído em regime de propriedade horizontal, à Tapada ou Quinta do (...), na Rua (...), com a licença de utilização aprovada para comércio, emitida em 27/10/98 pelo Réu; Em 01 de junho de 2008, os Autores deram essa fração de arrendamento à I., Lda., a fim de nela ser instalada uma clínica médica, estando então, Autores e arrendatária, convictos de que o alvará de utilização para comércio era apto à instalação da referida clínica médica naquele; Acontece que alguns dos condóminos começaram a opor-se à instalação dessa clínica, o que levou os Autores e a arrendatária a indagarem junto do Réu se a instalação da clínica médica estava ou não compreendido na licença de utilização por esta emitida para a dita fração; Nessa sequência, os serviços do Réu informaram que para a instalação na referida fração da clínica era necessário obter autorização dos condóminos, com vista à alteração do fim da fração em causa, que se cingia ao “comércio”, enquanto que a atividade que nela se pretendia exercer era a “prestação de serviços”; Perante essa informação, os Autores tentaram obter o consentimento dos restantes condóminos para a instalação da clínica médica na fração, mas não o conseguiram, facto que comunicaram à arrendatária em setembro de 2008, a qual, por sua vez, resolveu o contrato de arrendamento celebrado com fundamento em não poder dar ao locado o destino previsto no contrato de arrendamento, e acionou judicialmente os mesmos, os quais, por decisão judicial, transitada em julgado, foram condenados a pagar-lhe a quantia de 154.343,51 euros, acrescida de juros de mora desde 02/10/2009; Acontece que no âmbito dessa ação, instaurada pela arrendatária contra os aqui Autores, foi o próprio Réu que informou o tribunal dessa ação que para a instalação da clínica médica na dita fração não era necessário alterar a finalidade desta, em virtude do alvará de que a mesma era beneficiária para o comércio permitir o exercício de exploração de clínica médica TAC/RX; Os Autores confiaram na informação dada pelo Réu, que sempre lhes comunicou a necessidade da alteração do fim da fração e a necessidade de obterem o acordo dos condóminos como facto indiscutível, derivado de uma imposição legal, a fim de ser viável a instalação naquela da referida clínica médica, e agiram sempre em conformidade com essa informação; Acontece que essa imposição legal não existe e estavam reunidas ab initio todas as condições legais para funcionamento na clínica médica na dita fração, mesmo com a valência de imagiologia; Por via das referidas exigências ilegais do Réu, este tornou-se responsável pelos prejuízos sofridos pelos Autores, seja os decorrentes do contrato de arrendamento celebrado entre estes e a I. ter sido declarado nulo e de, por via disso, terem sido condenados a pagar a essa sociedade a quantia de 154.343,51 euros, acrescida de juros de mora desde 02/10/2009, por decisão transitada em julgado, como pelos danos emergentes que sofreram ao verem-se privados da renda que a fração lhes proporcionaria caso o contrato de arrendamento celebrado com a I. se mantivesse em vigor.

1.2. Citado, o Réu contestou defendendo-se por exceção e por impugnação.

Invocou a exceção da ineptidão da petição inicial, por falta de alegação de causa de pedir em que alicerçam o respetivo pedido, sustentando que os Autores não invocam factos suficientes para integrar os pressupostos da ilicitude e da culpa integrativos da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos que pretendem exercer contra aquele.

Impugnou parte da facticidade alegada pelos Autores, alegando não estarem preenchidos os pressupostos legais da ilicitude, da culpa e do nexo de causalidade entre a suposta errónea informação camarária e o facto do contrato de arrendamento celebrado pelos Autores com a I., Lda. não ter sido cumprido, de que depende o direito indemnizatório a que os Autores se arrogam titulares.

Conclui pedindo que por via das pretensas exceções que deduz seja absolvida da instância e que, em todo o caso, se absolva o mesmo do pedido.

Juntou o processo administrativo, que se encontra apenso a fls. 161/162.

1.3. Por despacho de fls. 167, solicitou-se ao Tribunal Judicial de Viseu o envio, a título devolutivo, do processo 2960/09.7TBVIS, o que foi satisfeito, encontrando-se esse processo apenso aos presentes autos a fls. 172/173.

1.4. Realizou-se audiência prévia em que se proferiu despacho saneador no qual se julgou improcedente a exceção dilatória da ineptidão da petição inicial invocada pelo Réu, fixou-se o valor da presente causa em 242.156,87 €, o objeto do litígio e os temas da prova, que não foram objeto de reclamação, e conheceu-se dos requerimentos de prova apresentados pelas partes.

1.5. Realizada, a audiência final, proferiu-se sentença julgando a presente ação procedente e condenando o Réu a pagar aos Autores o crédito indemnizatório que deduzem, a liquidar em incidente de liquidação, constando essa sentença da seguinte parte dispositiva: “Nos termos e pelos fundamentos expostos e de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da Constituição da República Portuguesa, julgo a presente ação procedente e, em consequência, condeno o Demandado a pagar aos Autores os danos sofridos em montante cujo apuramento se relega para incidente de liquidação de sentença.

Condeno em custas o Demandado (cfr. artigo 527º, nºs 1 e 2 do CPC)”.

1.6. Inconformado, com o assim decidido, o Réu interpôs o presente recurso de apelação, em que formula as seguintes conclusões: I- Entende o Recorrente que a decisão prolatada pela Digníssimo Tribunal a quo não teve em consideração a prova produzida em audiência de julgamento, pois que existe uma flagrante desconformidade entre os elementos probatórios disponíveis nos autos e a decisão do Tribunal recorrido sobre a matéria de facto, daí que esta seja merecedora de um juízo de censura no que respeita aos pontos M), Q), W) e Y), do nosso ponto de vista, e com todo o respeito por opinião contrária, incorretamente julgados.

II- Na alínea M) deve ser acrescentado o segmento “em datas não apuradas”, de molde a que esta alínea passe a conhecer a seguinte redação: “Os Autores, em datas não apuradas, apesar de várias tentativas junto de alguns condóminos, não conseguiram obter o consentimento destes, pelo que comunicaram tal facto à arrendatária em setembro de 2008”.

III- A relevância daquele segmento resulta de não ter sido provada qualquer diligência seja dos Autores/recorridos, seja da própria arrendatária, posterior à notificação que lhes é feita pelo ora Recorrente em 2 de setembro de 2008, limitando-se os Autores/recorridos a, concomitantemente, ainda nesse mês, comunicar à arrendatária tal facto.

IV- Dos autos resulta provada uma única tentativa de obter dos condóminos autorização para a instalação da clínica no arrendado, ocorrida na reunião de condomínio de 13 de julho de 2018 – logo, em data anterior àquela notificação do recorrente -, onde os condóminos manifestaram a sua repulsa pelo facto de estarem a ser executadas obras que causaram danos no prédio e nas próprias frações; V- Aquela alteração ao teor da alínea M) impõe-se face ao teor da ata da Assembleia de Condóminos dada como provada em G) dos factos provados, cuja reunião é anterior à do próprio pedido de licenciamento das obras, conjugadamente com o facto provado K) e com o depoimento das testemunhas P. e A. reproduzido no corpo destas alegações.

VI- Não ficou provado que, depois desta data, 31 de julho de 2008, e muito menos depois de 2 de setembro de 2008, data em que a informação n.º 342/2008 foi notificada à arrendatária, tenha sido realizada outra reunião de condóminos ou com condóminos, onde essa questão tenha sido suscitada; VII- A razão de discordância da Recorrente relativamente ao facto provado Q) radica na conclusão de que a arrendatária decidiu resolver o contrato de arrendamento por não poder dar à fração o destino estabelecido no mesmo, o que não encontra arrimo na prova produzida.

VIII- Jamais a recorrente comunicou que não autorizava o exercício daquela atividade, nem existe prova de qualquer impossibilidade de a arrendatária dar à fração o destino previsto no contrato de arrendamento.

IX- Resulta sim dos autos que o arrendatário, no seguimento de notificação que lhe é feita pelo Recorrente no sentido de apresentar vários elementos, entre as quais a autorização dos condóminos, optou por não dar sequência ao pedido, não dizendo mais fosse o que fosse, nem apresentando sequer parte dos elementos solicitados, assim desistindo, tacitamente, do pedido de licenciamento.

X- Nesta conformidade, entendemos que, face à prova produzida e à ausência dela no que toca à motivação subjacente à resolução, esta deve ser expurgada do acervo de factos provados, passando a alínea Q) a conhecer a seguinte redação: “Q) A arrendatária decidiu resolver o contrato de arrendamento em data posterior à receção da comunicação referida em M), tendo acionado judicialmente os Autores, mediante a instauração do processo que foi distribuído ao 4º Juízo do Tribunal Judicial de Viseu, sob o nº 2960/09.7TBVIS, no qual era Autora a empresa I. e Réus os Autores na presente ação”.

XI- Pela mesma ordem de razões, deve a conclusão referida em Y) conhecer diferente redação, pois a não entrega dos elementos solicitados pelo Recorrente à arrendatária decorre da...

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