Acórdão nº 132/21.1BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 24 de Agosto de 2021

Magistrado ResponsávelANA CRISTINA CARVALHO
Data da Resolução24 de Agosto de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul I - RELATÓRIO S....., Lda., inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra que julgou improcedente reclamação por aquela deduzida contra o acto de indeferimento proferido pela Chefe do Serviço de Finanças de Sintra – 2, datado de 06 de outubro de 2020, que indeferiu o pedido de reconhecimento da prescrição no âmbito do processo de execução fiscal n.º ....., dela veio interpor o presente recurso formulando, para o efeito, as seguintes conclusões: «1.ª – A douta sentença recorrida enferma de julgamento de facto, por um deficiente juízo valorativo da dispensa de prova testemunhal ou da sua irrelevância para a decisão da causa, dado que mostrava-se indispensável para a apreciação da responsabilidade do mandatário a produção de prova através da inquirição das testemunhas arroladas pela Recorrente no requerimento de 16.03.2021, pelo que o Tribunal recorrido violou o disposto nos artigos 13.º, 113.º e 114.º do CPPT e 99.º da LGT.

  1. – A decisão recorrida integra erro de julgamento de direito porque por imperativo constitucional (princípio da legalidade e tipicidade, e reserva de lei da AR), é inaplicável, à prescrição dos créditos tributários, o regime do artigo 327.º n.º 1 do CC, segundo o qual o prazo de prescrição só se inicia quando transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo - consequência do entendimento segundo o qual a interrupção da prescrição tem um "efeito duradouro", protelando o início da prescrição para o fim do processo no qual se discute a legalidade da liquidação, como se tratasse de uma causa de suspensão da prescrição, e não de interrupção.

  2. – A sentença recorrida enferma de julgamento de direito, por errada interpretação e aplicação da lei, e por violação de lei por considerar verificada a autoridade caso julgado considerando que a divida em cobrança coerciva não se encontra prescrita, tendo violado o disposto nos artigos 8.º e 30.º da LGT, bem como dos artigos 20.º, n.º 1, 103.º, n.º 2, 266.º, n.º 2 e 268.º, n.º 4 da CRP, 4.ª – A sentença recorrida enferma de erros de julgamento, pelo que o pedido de condenação da Recorrente como litigante de má fé e consequente condenação em multa deveria ter sido julgado integralmente procedente, porquanto violou claramente e frontalmente os artigos 542.º do CPC e artigos 2º e 266º da CRP.

    NESTES TERMOS, Deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com as legais consequências.

    SÓ ASSIM SE DECIDINDO SERÁ CUMPRIDO O DIREITO E FEITA JUSTIÇA!» * A Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.

    * Foi dada vista ao Ministério Público, e neste Tribunal Central Administrativo, o Procurador–Geral Adjunto pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso, acolhendo os argumentos invocados no parecer do Ministério Público prolatado em primeira instância, entendendo que “perante a ocorrência dos factos suspensivos e interruptivos do prazo de prescrição, a dívida tributária não se encontrar prescrita.” * Com dispensa dos vistos legais, atenta a natureza urgente do processo, vem o processo submetido à conferência para apreciação e decisão.

    * II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Atento o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente no âmbito das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

    Importa assim, decidir se o tribunal a quo incorreu: i) em erro de julgamento de facto ao dispensar a prova testemunhal indicada pela recorrente e de direito por violação do disposto nos artigos 13.º, 113.º e 114.º do CPPT e 99.º da LGT; ii) em erro de julgamento de direito por ser inaplicável à prescrição dos créditos tributários o régie previsto no artigo 327.º, n.º 1 do CCivil quanto ao efeito duradouro da interrupção do prazo; iii) em erro de julgamento de direito por errada interpretação e aplicação da autoridade do caso julgado; iv) em erro de julgamento de direito quanto à condenação da recorrente como litigante de má fé.

    III - FUNDAMENTAÇÃO III – 1. De facto É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida: «

    1. Correu neste Tribunal o processo de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.º 456/17.2BESNT, instaurado pela Reclamante, “S....., Lda.”, em que foi impugnado o despacho do órgão de execução fiscal, de 08-02-2017, que não reconheceu a prescrição da dívida em cobrança no processo de execução fiscal n.º ..... - provado por consulta, na plataforma SITAF, ao processo n.º 456/17.2BESNT; B) No processo n.º 456/17.2BESNT, foi proferida sentença, no dia 31 de maio de 2017, na qual se pode ler o seguinte: «[…] III.2. DE DIREITO A questão decidenda consiste em saber se se encontra prescrita a dívida exequenda a ser exigida em sede do processo de execução fiscal n.º .....

      , instaurado para cobrança do montante correspondente à liquidação de IRC, referente ao exercício de 1998, no valor de €1.010.987,63, e acrescido.

      Cumpre decidir.

      Em causa nos presentes autos encontra-se uma dívida de IRC respeitante ao período de 1998, pelo que à data dos factos, encontrava-se em vigor o artigo 48.º da Lei Geral Tributária (LGT), sob a epígrafe “Prescrição”, com a seguinte redacção: “1 - As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu.

      2 - As causas de suspensão ou interrupção da prescrição aproveitam igualmente ao devedor principal e aos responsáveis solidários ou subsidiários.

      3 - A interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação deste, em processo de execução fiscal, for efectuada após o 5.º ano posterior ao da liquidação.” Considerando que o IRC é um imposto de obrigação periódica, o termo inicial do prazo de prescrição de 8 anos contava-se, à luz da redacção do n.º 1 do artigo 48.º da LGT, a partir do termo no ano em que se verificou o facto tributário.

      Consequentemente, o prazo de prescrição aqui em análise, relativo ao IRC de 1998, iniciou-se em 01.01.1999, pelo que o decurso do prazo de prescrição terminaria a 31.12.2006, caso não existissem causas interruptivas ou suspensivas relevantes.

      Importa assim aferir da existência de tais causas de suspensão e de interrupção, nos termos do disposto no artigo 49.º da LGT, a aplicar ao caso em apreço, sendo que a redacção à data do facto tributário em análise, dada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro era a seguinte: “1 - A reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição.

      2 - A paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que tiver decorrido após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação.

      3 - O prazo de prescrição legal suspende-se por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de pagamento ou prestação legalmente autorizada, ou de reclamação, impugnação ou recurso.” Face à redacção introduzida pela Lei n.º 100/99, de 26 de Julho, passou o n.º 1 do artigo 49.º, passou a consagrar mais um facto interruptivo: a citação.

      Assim, e olhando para os factos interruptivos, verificamos que pela Reclamante foi apresentada reclamação – em 13.02.2003, foi interposta impugnação judicial – em 10.09.2003, e ainda foi citada em sede de processo de execução fiscal – em 23.06.2003 [cf. als. C), D) e G) dos factos assentes].

      A interrupção da prescrição inutiliza todo o tempo anteriormente decorrido ao facto interruptivo (cf. o n.º 1 do artigo 326.º do Código Civil), recomeçando a contagem do prazo de prescrição de 8 anos.

      Assim temos três factos que interromperam a contagem do prazo de prescrição. Uma vez que só com a introdução da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, é que se introduziu a norma do n.º 3 que prevê que a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verifica em primeiro lugar.

      Devendo ainda ser tida em consideração a suspensão do prazo de prescrição, previsto no n.º 3 do artigo 49.º da LGT, uma vez que dos factos assentes resulta que pela Reclamante foi apresentado contencioso de legalidade da liquidação – reclamação e impugnação, o que, associado à prestação de garantia idónea, permitiu a suspensão do referido processo de execução fiscal.

      Tal como se escreveu, entre outros, nos Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 05.05.2010, em sede do processo n.º 0140/10 e de 07.12.2010, em sede do processo n.º 0490/10: “A impugnação judicial interrompe a prescrição, mas a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo, faz cessar tal efeito, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação (n.ºs 1 e 2 do artigo 49.º da LGT). Porém, se a execução se encontrar suspensa em virtude de prestação de garantia ou de penhora de bens que garantam a totalidade da dívida e do acrescido, ao abrigo do artº 169º do CPPT, a paragem do processo não releva para efeitos de prescrição, uma vez que, em face do disposto no nº 3 do artº 49º da LGT, a prescrição se suspende também com a paragem da execução”.

      Atentos os factos dados como provados, o processo de execução fiscal ficou suspenso por determinação do Chefe do Serviço de Finanças de Sintra 2, em...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT