Acórdão nº 65/18.9T8EPS.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Julho de 2021

Magistrado ResponsávelFERNANDO BAPTISTA
Data da Resolução14 de Julho de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, Segunda Secção Cível I – RELATÓRIO PERMUTARSORTE INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS, LDA, instaurou acção de processo comum contra AA e mulher BB.

Pede que se julgue resolvido o contrato-promessa de compra e venda em causa nos autos por incumprimento definitivo dos réus e se condenem estes a pagar-lhe uma indemnização no montante de 20.000,00€ correspondente ao dobro do sinal prestado.

Os Réus contestaram e deduziram reconvenção, a qual concluem pedindo que: a acção seja julgada não provada e improcedente; a reconvenção seja julgada provada e procedente e por consequência que o tribunal, nos temos do disposto no artigo 830º, nº 1, do código civil se substitua à declaração negocial da autora, transmitindo a favor da autora, o prédio identificado na cláusula primeira do contrato promessa de compra e venda celebrado em 02-09-2017, (documento junto aos autos com a petição inicial sob o nº 2) que consta de prédio rústico, sito no ....., da freguesia........, do concelho....., composto de terreno e mato, inscrito na matriz sob o artigo ….47 da união de freguesias .......... e ……, descrito na conservatória do registo predial de ...... com o nº ….18, pelo preço de 45.000,00 € (quarenta e cinco mil euros), condenando a autora a pagar-lhes, a quantia de 35.000,00 € correspondente ao remanescente do preço.

A Autora respondeu pedindo a improcedência da reconvenção.

Em sede de audiência prévia foi admitido o pedido reconvencional e fixado o seguinte objecto do litígio[1].

Após realizou-se a audiência de discussão e julgamento, tendo sido proferida sentença que julgou a acção com o seguinte dispositivo: “Por tudo o exposto, o Tribunal julga a presente acção totalmente procedente, por provada e, em consequência:

  1. Julga resolvido o contrato promessa de compra e venda em causa nos autos por incumprimento definitivo dos réus; b) Condena os réus a pagar à autora uma indemnização no montante de 20.000,00 € (vinte mil euros), correspondente ao dobro do sinal prestado.

    Mais julga improcedente a reconvenção, absolvendo a autora dos pedidos nela formulados.

    Custas pelos réus.” Inconformados com essa decisão, os Réus apresentaram recurso de apelação, pugnando pela alteração da decisão de facto e modificação da decisão de mérito em conformidade, tendo a Relação …, em acórdão, decidido julgar improcedente a apelação.

    De novo inconformados, vêm os Réus AA e mulher BB interpor recurso de revista, apresentando alegações que rematam com as seguintes CONCLUSÕES 1ª O Acórdão recorrido violou o disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 202º da Constituição da República Portuguesa, pois não apreciou as questões suscitadas pelos recorrentes fundamentando-se em proposições formais menores não estruturantes das obrigações legais de recurso para reapreciar a decisão da matéria de facto e depois por se demitir da função de julgar.

    1. Os recorrentes no recurso de apelação cumpriram os ónus necessários à impugnação da decisão da primeira instância relativa à matéria de facto, designadamente, a obrigação prevista na alínea b), do nº 1, do artigo 640º do CPC, como se pode verificar das conclusões, transcritas na fundamentação do presente recurso.

    2. No tocante à obrigação prevista na alínea a), do nº 2, do artigo 640º do CPC – “indicar com exatidão as passagens da gravação…”, conclui-se o seguinte: a) - Os Recorrentes no recurso de apelação colocaram em crise a credibilidade que o tribunal da primeira instância atribuiu às declarações de parte, de CC, e aos depoimentos das testemunhas, DD, EE e FF - conclusões 8ª, 9ª, 10ª, 11ª, 12ª, 13ª do recurso de apelação.

      b) - Para julgar da credibilidade, não é suficiente para o Tribunal da Relação a audição parcial nem a transcrição parcial dos depoimentos, tornando-se necessário ouvir todo o depoimento da parte e todo o depoimento de cada uma das testemunhas, pelo que a transcrição na totalidade e a sua junção só pretende facilitar a apreciação do tribunal superior.

      c) - Quando se quer demonstrar a inexistência de uma realidade esta só pode ser comprovada ou com meios de prova da realidade oposta ou com a com a menção da inexistência de depoimentos testemunhais que a comprovem.

      d) - Estando em causa comprovar factos negativos ou a inexistência do comprovado é necessário fazer a menção aos depoimentos totais das testemunhas (conclusão 46º do recurso de apelação).

      e) - A obrigação de indicar com exatidão as passagens da gravação, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevante, referida no artigo 640º do CPC, tem gerado polémica, tendo o Supremo Tribunal de Justiça vindo a distinguir, quanto aos ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa á matéria de facto, entre ónus primário ou fundamental, que se reportam ao mérito da pretensão e ónus secundários, que respeitam a requisitos formais.

      f) - A falta de indicação das concretas passagens dos respetivos depoimentos é um ónus secundário, que terá como consequência ouvir todo o depoimento das testemunhas, e cuja transcrição total consta dos autos.

    3. Os recorrentes, em sede de apelação cumpriram no essencial, com os comandos legais insertos no artigo 640º do Código de Processo Civil, pelo que o tribunal recorrido deveria ter procedido à reapreciação da decisão de facto, não só por referência aos elementos documentais insertos no processo, mas também com referência à prova testemunhal indicada na apelação.

    4. No recurso de apelação os recorrentes impugnaram a matéria de facto constante do item i) dos factos não provados da decisão da primeira instância que consta do seguinte: “Aquando da celebração do contrato promessa referido em 2, o prédio dele objecto era composto de pinhal e mato”, era e é entendimento dos recorrentes que tal facto devia ter sido dado como provado atento os documentos autênticos constantes dos autos, incluindo a confissão judicial do represente legal da recorrida.

    5. Porém o acórdão recorrido decidiu não conhecer, de tal questão, cita-se (página 24 do acórdão): …, ao abrigo do disposto nos arts.

      2º, nº 1, 6º e 130º, do Código de Processo Civil, decide-se não conhecer desta particular impugnação, com prejuízo para o conhecimento de todos os argumentos a ela subjacentes (cf.

      Art.

      608º, nº 2 do Código de Processo Civil).” 7ª A obrigação do Tribunal da Relação …… era de conhecer de todos os fundamentos do recurso, tendo feito uma errada interpretação e aplicação dos artigos 2º, nº 1, , 130º e 608º, nº 2 do Código de Processo Civil.

    6. Ao não apreciar todas as questões suscitadas pelos recorrentes nas suas conclusões, designadamente as questões que recorrentes alegaram, designadamente o constante das conclusões 24º, 25º, 26º, 27º, 28º 29º, 30º, 31º, 32º, 33º, 34º, 35º, 36º, 37º, 38º, 39º, 40º 41º, 42º, 43º, 44º, 45º, 46º, o acórdão recorrido é nulo nos termos do disposto no artigo 615º, nº 1, alínea d), e artigo 666º, nº 1, do Código de Processo Civil.

      PEDIDO Termos em que, deve ser concedida revista, e, em consequência, ser anulada a decisão recorrida que deverá ser substituída por outra que reaprecie a decisão de facto, tal como pretendido pelos recorrentes.

      * Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

      ** II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Considerando que o objecto do recurso (o “thema decidendum”) é estabelecido pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, atento o estatuído nas disposições conjugadas dos artigos 663º nº 2, 608º nº 2, 635º nº 4 e 639º nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil (CPC), as questões a decidir são: 1. Se o acórdão recorrido não apreciou as questões suscitadas pelos recorrentes e se, por isso, incorreu em nulidade por omissão de pronúncia (artigo 615º, nº 1, alínea d) ex vi do artigo 666º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil) e violou o disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 202º da Constituição da República Portuguesa).

      1. Se os recorrentes cumpriram os ónus impostos pelo artigo 640º do CPC e se, como tal, não deveria o recurso ter sido rejeitado, com foi.

        III – FUNDAMENTAÇÃO III. 1.

        FACTOS PROVADOS a) É a seguinte a matéria de facto provada: 1. A autora, “PERMUTARSORTE INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS, LDA.”, pessoa coletiva com o NIPC 513 … 895, com sede na Rua …, n.º …, loja …, entrada 1, …, tem por objecto a construção civil, investimentos imobiliários, compra e venda de imóveis, revenda, loteamento e urbanização de terrenos, remodelação e restauro de edifícios.

      2. No exercício do seu escopo profissional, entre a autora e os réus, em ........., no dia 02 de Setembro de 2017, foi celebrado contrato promessa de compra e venda com o seguinte teor: “CONTRATO PROMESSA DE COMPRA E VENDA Entre: Primeiros outorgantes: AA, N.I.F. ....., casado no regime da comunhão de adquiridos com BB, N.I.F. ........., residentes na ………….., ………, como Promitentes-vendedores; Segundo outorgante: PERMUTARSORTE INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS, LDA., com sede na Rua …, loja …, …, …, concelho de …, contribuinte n.º 513 … 895, com um capital social de 5,000.00 Euros, neste acto representada pelo sócio-gerente CC, contribuinte n.º ....., residente na ......, ….-… ……., concelho........., designado por Promitente-comprador; É celebrado e reciprocamente acordado, nesta data, o presente contrato-promessa de compra e venda, nos termos das cláusulas seguintes: PRIMEIRA Os primeiros outorgantes são os actuais e únicos donos e legítimos proprietários e possuidores de um terreno de pinhal e mato, inscrito na matriz sob o artigo ….47 da União de Freguesias ......., e descrito na Conservatória do Registo Predial ........ com o número ..18 SEGUNDA Pelo presente contrato, os primeiros outorgantes prometem vender ao segundo outorgante, ou a pessoa, individual ou colectiva, por ele indicada, que por sua vez, promete comprar, livre de quaisquer ónus ou encargos, o imóvel identificado na cláusula primeira do presente contrato. Os primeiros outorgantes comprometem-se a fechar, antes da escritura pública de compra e venda, o...

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