Acórdão nº 1545/18.1T8FIG-J.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Julho de 2021

Magistrado ResponsávelVITOR AMARAL
Data da Resolução08 de Julho de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: I – RELATÓRIO L...

, com os sinais dos autos, pai do menor D...

e da jovem R...

, veio suscitar, quanto a estes seus filhos, o incidente de incumprimento das responsabilidades parentais contra a mãe, S...

, também com os sinais dos autos, pedindo o reconhecimento da dívida alimentícia, por parte da Requerida mãe, ordenando-se o desconto da pensão de alimentos devida ao menor D... diretamente do salário daquela, com notificação à respetiva entidade patronal para o efeito.

Para tanto invocou ([1]) que: - a Requerida vem incumprindo reiteradamente o acordado quanto ao pagamento das despesas de educação e saúde dos seus filhos – que ficaram, por acordo, a residir com o pai –, também não pagando a pensão de alimentos devida ao menor D..., sendo que a filha R... somente em julho de 2020 atingiu a maioridade; - o incumprimento é deliberado, não decorrendo de qualquer dificuldade económica.

Notificada, a Requerida, impugnando o alegado pela contraparte, invocou, por sua vez, a compensação entre aos alimentos devidos ao menor D... com os devidos à jovem R..., esta, entretanto, já na maioridade e que se encontra a residir, desde julho de 2020, com a mãe, bem como entre as despesas realizadas com um e outro dos filhos ([2]).

O Requerente, pronunciando-se, veio pugnar pela improcedência da argumentação da Requerida, mormente quanto à pretendida compensação de créditos. Realizada conferência de pais e na falta de acordo entre Requerente e Requerida, prosseguiram os autos a sua tramitação, com produção de provas em audiência final, após o que foi proferida sentença – datada de 09/04/2021 –, com o seguinte dispositivo: «Atento o exposto, decide-se: - declarar verificado o incumprimento da requerida, quanto à pensão alimentícia e à comparticipação em despesas, em benefício da criança D... e da jovem R..., no valor global de €554, 81; - declarar verificado o incumprimento do requerente, quanto à pensão alimentícia e à comparticipação em despesas, em benefício da jovem R..., no valor global de €762, 75.

(…) Considerando que ambos os progenitores trabalham por conta de outrem, determina-se se notifiquem as respetivas entidades patronais para, a partir do primeiro processamento de vencimento posterior à notificação deste despacho, proceder à dedução da pensão de alimentos vincenda (€50,00 a favor da R... e €50,00 a favor do D...), acrescida de €50, 00 por conta dos alimentos vencidos (€554,81 no caso da requerida progenitora e €762,75 no caso do requerente progenitor).».

Desta sentença veio o Requerente, inconformado, interpor o presente recurso, apresentando alegação e as seguintes conclusões: ...

Em contra-alegação, o M.º P.º refere ser seu “entendimento que o recurso interposto deverá ser julgado parcialmente procedente, alterando a decisão recorrida”, para o que enfatizou não ser legalmente admissível a compensação invocada, discordar do decidido quanto a diversas despesas e ter a jovem R... completado “os seus 18 anos de idade a 30/07/2020, não tendo sido requerida/alterada/fixada pensão de alimentos a seu favor”.

A Requerida mãe, por sua vez, contra-alegando, conclui pela improcedência do recurso.

*** O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos incidentais e com efeito meramente devolutivo, tendo sido ordenada a remessa dos autos a este Tribunal ad quem, onde foi mantido o regime e efeito assim fixados.

Nada obstando, na legal tramitação, ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir.

II – ÂMBITO DO RECURSO Perante o teor das conclusões formuladas pela parte recorrente – as quais definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso ([3]), nos termos do disposto nos art.ºs 608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil em vigor (doravante, NCPCiv.), o aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26-06 –, importa saber ([4]):

  1. Se a sentença padece nulidade por omissão de pronúncia e por condenação para além do pedido (cfr. conclusões 1.ª a 4.ª do Recorrente); b) Se é admissível e deve proceder a impugnação da decisão da matéria de facto; c) Se houve erro na forma de processo, quanto a pedido de fixação de alimentos à filha maior; d) Se ocorre incumprimento do regime fixado quanto a alimentos, devendo alterar-se a decisão recorrida, para o que cabe conhecer, designadamente, quanto às despesas em discussão e, bem assim, se, relativamente à jovem R..., por ter entretanto atingido a maioridade, não são devidos alimentos.

    III – FUNDAMENTAÇÃO

    1. Nulidades da sentença 1. - Por omissão de pronúncia Sob a conclusão 1.ª do Apelante, este argui a nulidade da sentença a que alude o art.º 615.º, n.º 1, al.ª d), do NCPCiv., isto é o vício de omissão de pronúncia, com reporte à não apreciação de invocada exceção dilatória de erro na forma do processo, quanto ao pedido de fixação de pensão de alimentos à jovem R..., já maior, junto da Recorrida.

      A Requerida mãe, em contra-alegação, conclui pela inexistência de tal nulidade, esgrimindo que é certo cessar a obrigação de alimentos a favor de menor com o advento da sua maioridade, a não ser que o filho requeira a sua manutenção, o que se verificou no caso, estando demonstradas as necessidades de sustento da maior R..., que se encontra ainda a estudar.

      Resulta daquele art.º 615.º, n.º 1, al.ª d), que a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou, inversamente, conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.

      Vêm entendendo, de forma pacífica, a doutrina e a jurisprudência que somente as questões em sentido técnico, ou seja, os assuntos que integram o thema decidendum, ou que dele se afastam, constituem verdadeiras questões de que o tribunal tem o dever de conhecer para decisão da causa ou o dever de não conhecer, sob pena de incorrer na nulidade prevista nesse preceito legal.

      De acordo com Amâncio Ferreira ([5]), “trata-se de nulidade mais invocada nos tribunais, originada na confusão que se estabelece com frequência entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos no decurso da demanda”.

      E, segundo Alberto dos Reis ([6]), “são na verdade coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão”.

      Já Luís Correia de Mendonça e Henrique Antunes ([7]), por sua vez, referem que “a observação da realidade judiciária mostra que é vulgar a arguição da nulidade da decisão”, sendo que “por vezes se torna difícil distinguir o error in judicando – o erro na apreciação da matéria de facto ou na determinação e interpretação da norma jurídica aplicável – e o error in procedendo, como é aquele que está na origem da decisão”.

      Por seu turno, Antunes Varela([8]) esclarece, em termos de delimitação do conceito de nulidade da sentença, face à previsão do art.º 668.º do CPCiv., que “não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário (…) e apenas se curou das causas de nulidade da sentença, deixando de lado os casos a que a doutrina tem chamado de inexistência da sentença”.

      Na nulidade aludida está em causa o uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de se pretender conhecer de questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não se tratar de questões de que deveria conhecer-se (omissão de pronúncia). São, sempre, vícios que encerram um desvalor que excede o erro de julgamento e que, por isso, inutilizam o julgado na parte afetada.

      Como já se mencionou, para apuramento quanto ao vício de omissão (ou excesso) de pronúncia cabe perspetivar as questões em sentido técnico, só o sendo os assuntos que integram o thema decidendum, ou que dele se afastam, só esses constituindo verdadeiras questões de que o tribunal tem o dever de conhecer.

      Assim, não são, obviamente, questões para este efeito os factos (alegados ou provados), nem os argumentos apresentados pelas partes, nem as razões em que sustentam a sua pretensão ou defesa, nem as provas produzidas, nem a apreciação que delas se faça em termos de formação da convicção do Tribunal.

      Ora, dito isto, o Apelante retira – se bem se interpreta o seu acervo conclusivo/recursório – a nulidade que invoca da circunstância de a decisão recorrida não ter emitido pronúncia sobre a mencionada exceção dilatória de erro na forma do processo.

      E é certo, por documentado nos autos, que a Requerida mãe, em 08/03/2021, veio “informar que pretende que seja fixada pelo tribunal a contribuição prevista no artigo 989.º, n.º 3, do CPC, a título principal das despesas com a jovem R..., sua filha”.

      Ao que respondeu o Requerente pai, em 22/03/2021, argumentando: - terem, efetivamente, as circunstâncias sofrido alteração, determinando, porém, o n.º 1 do art.º 42.º do RGPTC “que o progenitor com quem a Jovem reside e que pretenda contribuição para as suas despesas, requeira, junto do Tribunal territorialmente competente, nova Regulação das Responsabilidades Parentais”, requerimento esse a dever “ser autuado por apenso aos autos principais, nos termos da al. b) do nº 2 do mesmo art. 42º”; - não poder, por isso, “ser discutida nestes autos a possibilidade de contribuir para as despesas da jovem R..., devendo ser proposta nova Regulação das Responsabilidades Parentais, por alteração das circunstâncias, em que tudo se irá discutir, designadamente, o regime de visitas em que o progenitor possa ver a filha, o que há largo tempo que não acontece”; - não se compadecendo a tramitação específica aplicável aos...

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