Acórdão nº 00929/06.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelRos
Data da Resolução23 de Junho de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:* 1. RELATÓRIO 1.1. A Fazenda Pública vem recorrer da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 24.10.2012, pela qual foi julgada procedente a impugnação judicial deduzida por C., S.A.

, contra a decisão de indeferimento tácito da reclamação graciosa que visou os atos de liquidação adicional de juros compensatórios relativos aos períodos de 0109, 0110, 0112, 0201, 0306, 0208,0210, 0211, 0301, 0302, 0303, 0304, 0305, 0306, 0307, 0308, 0309, 0310, 0401 e 0402, no valor global de € 22.018,26.

1.2. A Recorrente Fazenda Pública terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: «A. O presente recurso vem interposto da douta Sentença que julgou procedente a impugnação deduzida na sequência do indeferimento tácito da Reclamação Graciosa n.º 1805-05/4000126.5, contra os actos de liquidações de juros compensatórios, que se mostravam devidos pelo atraso nas liquidação de IVA no montante global de 22.018,26 euros, relativamente a períodos de imposto dos exercícios de 2001 a 2004, melhor identificados no Ponto N) da factualidade dada como provada.

B. Para tanto, o Tribunal a quo sustentou, no essencial, a fundamentação da decisão recorrida na argumentação plasmada no acórdão do venerando Supremo Tribunal Administrativo de 16.12.2010, no processo n.º 0587/10.

C. Para a final julgar pela verificação do alegado vício da violação da lei, determinando a anulação das liquidações de juros compensatórios.

D. Com a ressalva do sempre devido respeito, que é muito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim doutamente decidido, porquanto considera existir erro de julgamento – de facto e de direito, atendendo às razões que se passam a expender.

E. O thema decidendum reside em saber se vinga o entendimento segundo o qual, não são devidos juros compensatórios pela Impugnante, porque não se verificam os pressupostos constantes dos artigos 89º do CIVA e 35º da LGT, e nessa conformidade, não lhe é imputável a culpa pelo retardamento da liquidação do imposto.

F. A fundamentação da douta Sentença recorrida assenta, em síntese, no entendimento segundo o qual o erro em que incorreu a Impugnante advém da circunstância da alteração estatutária do dono da obra, de Serviços Municipalizados de Gaia para A. – Empresa Municipal, só veio a ficar definida com a orientação administrativa sancionada por despacho do SEAF, de 07.08.2002, no sentido de ser de aplicar a taxa normal de imposto às referidas operações e não a taxa reduzida de 5%.

G. Sendo, ao que se percebe o enquadramento do dono da obra na verba 2.17, da Lista I anexa ao CIVA, actual verba 2.19, erro desculpável e causa de exclusão de culpabilidade que afasta a imputabilidade decorrente do retardamento das liquidações que aqui se litigam.

H. Ora, se se atentar a que a apreciação e determinação da culpa depende do comportamento da Impugnante, temos por pertinente referir que esta não demonstrou ter efectuado diligências para em tempo oportuno obter esclarecimentos junto da Administração Tributária e Aduaneira (doravante, AT) sobre qual a taxa de IVA a aplicar ás operações em causa.

I. Na verdade, desde 2000, que a DGCl/Direcção de Serviços do Imposto sobre o Valor Acrescentado, se veio a pronunciar sobre matéria em tudo semelhante à que subjaz à dos presentes autos v. g. as Informações n.º 2185, de 02.12.2000 e n.º 1643 de 22.06.2001; J. não se percebendo ao contrario do sentenciado que a Impugnante tivesse actuado no cumprimento dos deveres gerais de diligência atribuídos a um bonus pater familias, à semelhança de outros parceiros económicos que procuraram obter esclarecimentos junto da AT, e em tempo recolhendo a informação sobre qual a taxa de IVA a aplicar à situação em apreço.

K. Também a Informação n.º 80 do Gabinete do Director Geral, prestada em 07.08.2002, é esclarecedora da taxa de IVA a aplicar a situações tributárias como a sub judicie, permitindo assim um cumprimento atempado por parte da Impugnante e destarte evitando mo legal consubstanciado na liquidação dos juros compensatórios.

L. Em suma, a impugnante praticou operações tributáveis, aplicando a taxa de IVA reduzida, num lapso de tempo que decorreu desde o ano 2001 ao ano de 2004; a liquidação dos juros compensatórios foi efectuada nos termos dos artigos 89.º do CIVA e 35.º da LGT, por ter sido retardada a liquidação do imposto por facto imputável ao sujeito passivo do imposto.

M. A douta Sentença recorrida considera verificada uma causa de exclusão de culpabilidade, qualificando como desculpável o erro no incorrecto enquadramento das operações pelo facto de só em 2004 ter sido pela AT proferida orientação administrativa no sentido de ser de aplicar a taxa normal de imposto às referidas operações e não a taxa reduzida, considerando mesmo que, “esta não estava ciente da necessidade de, no caso de empreitadas com empresas municipais, ser aplicável IVA à taxa normal”.

N. A culpa consiste na omissão reprovável de um dever de diligência que se afere em abstracto, segundo o critério do bom pai de família; O. A culpa traduz-se na omissão da diligência exigível no caso concreto, sendo que ao julgador cabe aferir se a conduta do agente foi a que seria esperar segundo as regras de experiência, ou se, pelo contrário devia e podia ter agido de outro modo.

P. In casu, em face das circunstâncias concretas, não se pode afirmar que a Impugnante tenha agido de forma diligente, pois não demonstra diligência de um bom pai de família desconhecer a situação jurídica da contraparte num contrato que foi executado durante vários anos – de 2001 a 2004.

Q. A que acresce o facto de, ter a recorrente sido notificado pela AT pela primeira vez em 04.11.2004, para proceder à regularização do IVA em todas as facturas emitidas nas mesmas condições e, substituir as declarações periódicas de IVA, em resultado da análise de um pedido de reembolso por parte da AGEM, na qual foi detectado a incorrecta aplicação da verba 2.17 da Lista I, nas empreitadas efectuadas pela Impugnante – cf. facto I). do Probatório.

R. E, só ulteriormente, quando instada pela segunda vez veio a Impugnante a entregar as referidas declarações de substituição de IVA em 17.04.2005, ou seja ao fim de cerca de cinco meses, atraso que só pode ser imputado à Impugnante – cf. facto J). do Probatório.

S. Não obstante a douta Sentença, determina a anulação de todas as liquidações de juros compensatórios, referentes aos vários períodos, mas quanto a nós erradamente, pois, que não existe fundamento para afastar a imputabilidade do retardamento da liquidação à Impugnante, antes deviam ter sido considerados como verificados os pressupostos de aplicação de juros compensatórios consagrados no artigo 35º da LGT.

T. Se por mera hipótese se julgasse noutro sentido, ainda assim sempre seriam devidos os juros compensatórios desde 04.11.2004 até que a 17.04.2005, ante o exposto nos itens Q. e R. destas conclusões.

U. O Tribunal a quo decidiu com violação das disposições legais supra citadas.

Termos em que, e nos melhores de direito aplicáveis, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta Sentença recorrida, com o que se fará inteira JUSTIÇA.

».

* 1.3. A Recorrida C., S.A.

apresentou contra-alegações, que concluiu nos seguintes termos: «

  1. O recurso interposto visa reagir contra a douta sentença que julgou procedente a impugnação judicial da decisão de indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada pela ora recorrida e, consequentemente, dos actos tributários de liquidação adicional de juros compensatórios.

  2. Não pode a recorrida conceder com o entendimento perfilhado pelo recorrente que, contrariamente ao entendimento seguido pela sentença recorrida, considera que não existe fundamento para afastar a imputabilidade do retardamento da liquidação à impugnante, devendo “ter sido considerados como verificados os pressupostos de aplicação de juros compensatórios consagrados no artigo 35.º da LGT”.

  3. Em processos judiciais em tudo semelhantes ao presente, nos quais se discutem as mesmas questões de facto e de direito, os tribunais superiores (STA, TCA Norte e Sul) têm proferido diversas decisões judiciais no sentido da ilegalidade dos actos de liquidação dos juros compensatórios.

  4. A ilegalidade dos referidos actos tem sido judicialmente decretada com fundamento na não verificação dos pressupostos de aplicação dos juros compensatórios – cfr. Acórdão do STA, de 11.03.2009, proferido no processo n.º 961/08; Acórdãos do TCA Norte de 02.02.2012, proferido no processo n.º 233/06.6BEPNF, de 29.02.2012, proferido no processo n.º 1012/06.6BEVIS, de 16.04.2009, proferido no processo 280/06.8BEPNF, de 23.04.2009, proferido no processo n.º 285/06.9BEPNF, de 30.04.2009, proferido no processo n.º 511/06.4BEBRG, de 30.04.2009, proferido no processo n.º 230/06.1BEPNF, de 14.05.2009, proferido no processo n.º 276/06.0BEPNF, de 4.06.2009, proferido no processo n.º 231/06.0BEPNF; de 14.05.2009, proferido no processo n.º 277/06.8BEPNF; Acórdão do TCA Sul, de 3.06.2009, proferido no processo n.º 02963/09.

  5. A recorrida reitera a sua concordância com a decisão judicial recorrida bem como com a recente jurisprudência que, relativamente a situações semelhantes à presente, se tem sedimentado.

  6. O retardamento da liquidação não pode ser imputável ao sujeito passivo.

Termos em que, E, nos melhores do direito, se requer que seja negado provimento ao recurso, desta forma, se fazendo inteira justiça.» 1.5. Os autos foram com vista ao Ministério Público junto deste Tribunal.

Dispensados os vistos legais, nos termos do artigo 657.º, n.º 4, do CPC, cumpre apreciar e decidir, pois que a tanto nada obsta.

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