Acórdão nº 577/20.4JALRA-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Julho de 2021

Magistrado ResponsávelJORGE JACOB
Data da Resolução07 de Julho de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Coimbra: I – RELATÓRIO: Nos autos supra referenciados, que correm termos pelo Juízo de Instrução Criminal de Leiria – Juiz 1 (inquérito remetido ao TIC para actos de natureza jurisdicional) foi proferido despacho com o seguinte teor: (...) Analisados os presentes autos verifica-se que o único suspeito identificado nos mesmos se trata do cidadão I., residente na (…), Lote (…), n.º (…), (…)..

Não obstante se referir no relatório de fls. 61 a 63, 64 e 65 que poderá residir na morada do suspeito I. um individuo que eventualmente terá colaborado com ele, concretamente nos factos referentes ao pagamento do abastecimento de combustíveis com recurso a nota falsa, não existe nos autos qualquer outra referência que permite identificar tal indivíduo, tanto mais que é igualmente referido que o I. se faz acompanhar por diferentes indivíduos, os quais não estão identificados nos autos.

Relativamente ao único suspeito conhecido nos autos o Ministério Público promoveu a fls.66 a realização de busca domiciliária, à residência de I., incluindo dependências usadas por outros cidadãos ali residentes, anexos, logradouro, garagens e arrecadações.

No despacho proferido pelo Mm.º Juiz de Instrução Criminal, o qual autorizou a realização da busca, constante de fls. 71, foi determinado que face à prova até ao momento produzida existiam indícios que I. realizará crime de passagem de moeda falsa e tráfico de estupefacientes e que o mesmo se faz acompanhar por gente conhecida profissionalmente ligada ao tráfico de estupefacientes e que pelo exposto e em conformidade com os artigos 174º e 177º n.º 1 do Código de Processo Penal se autorizava a realização de busca domiciliaria à casa de I. sita na Rua (…), Lote (…), n.º (…) , (…), (…)..

Consta dos autos a fls. 72 o mandado de busca e apreensão, sendo indicado no mesmo como local de diligência a residência do I. e constando desse auto que a busca deverá incidir sobre a totalidade do imóvel, mesmo na parte ocupada por pessoas diferente do aqui suspeito (residência, garagens, sótão e anexos).

Do auto de busca e apreensão realizado no dia 25/02/2021, pelas 10:30h, consta como local alvo de busca a residência do I., e que a busca teve início pelas 10:30 à moradia, composta pela habitação principal, onde reside o I. e os seus pais, e um anexo, com dois pisos, sem ligação interior, sendo que na parte inferior reside L..

Nesse auto consta que a habitação principal é composta por uma cozinha, uma sala, uma casa de banho, dois quartos, um pátio exterior comum com um anexo, composto por telheiro e grelhador.

O piso superior do anexo é acedido por uma escada exterior, que dá acesso a um terraço, sendo composto por dois quartos e uma casa de banho, sendo que actualmente ninguém reside na mesma.

O piso inferior é ocupado por L. e é composto por uma sala, uma cozinha, um quarto e uma casa de banho.

Consta do referido auto que percorridas todas as divisões da residência principal e piso superior na companhia do suspeito I., nada de relevante foi encontrado.

Do referido auto consta que passadas duas horas, ou seja, pelas 12:30h, deram início à busca ao piso inferior do anexo, na companhia da pessoa ali residente L., cujo acesso foi franqueado com a sua chave, o qual prontamente informou que ali guardava estupefaciente.

Ora, o arguido foi ouvido no dia de hoje, estando as suas declarações gravadas, declarações que não suscitam ao Tribunal qualquer dúvida, uma vez que com a mesma frontalidade e espontaneidade este arguido descreveu ao Tribunal as circunstâncias em que foi realizada a busca à sua residência, bem como explicou os motivos pelos quais tinha no interior do seu quarto e dentro da sua mochila o produto estupefaciente apreendido.

O arguido declarou que quando se encontrava no seu local de trabalho foi abordado por agentes da Polícia Judiciária, tendo-lhe sido solicitado que os acompanhasse à sua residência. O arguido já nesse local facultou o acesso à sua residência, tendo-lhe sido exibidos uns papéis nos quais não constava o seu nome e sem que lhe tivesse sido expressamente perguntado se autorizava a realização da busca.

A descrição feita no auto de busca, relativamente ao local onde a mesma ocorreu, não suscita ao tribunal qualquer dúvida que estão em causa duas residências autónomas e devidamente individualizadas, sem qualquer ligação interior.

A residência do suspeito I. descrita por referência às respectivas dependências, anexos e terraço e a residência do L., também descrita por referencia às suas dependências e que asseguram uma total autonomia.

O arguido L. esclareceu ainda o tribunal que paga de renda e por ocupação de tal residência o valor mensal de cerca de €350,00.

Nesse pressuposto quando nos mandados de busca, os quais não reflectem integralmente o despacho proferido pelo Juiz de Instrução Criminal, se faz menção que a busca deve incidir sobre a “totalidade do imóvel”, mesmo na parte ocupada por pessoas diferentes do suspeito, isso indica expressamente que a busca incide sobre a residência de I., podendo abranger todas as dependências desta residência, mesma ocupadas por pessoas diferentes do suspeito.

Não se poderá considerar que apesar das duas residências constituírem os dois pisos de uma mesma moradia, que isso signifique que a autorização da busca se refere a ambas as residências, as quais e como já se disse são totalmente independentes.

Assim não se poderá considerar que se concedeu autorização para a realização de busca domiciliária a outra residência autónoma e independente da residência de I., embora ambas situadas no mesmo prédio/moradia/imóvel.

A circunstância de ter sido necessário ir buscar o arguido L. ao seu local de trabalho e de ter sido este a franquear a chave para facilitar o acesso ao interior da sua residência é revelador de que os agentes se deparam com duas residências distintas.

Perante essa circunstância impunha-se aos agentes a realização da busca com recurso a autorização concedida pelo arguido L., consignada em auto, ou pela obtenção de um mandado que autorizasse a realização da busca.

Não se pode esquecer que está em causa um direito inviolável, com garantia e protecção constitucional, e que perante a situação em apreço o OPC competente pela investigação tinha ao seu alcance meios que lhe permitiam, em tempo útil, solucionar a questão, com o cumprimento...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT