Acórdão nº 657/19.9T8CSC.L2-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 30 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelSÉRGIO ALMEIDA
Data da Resolução30 de Junho de 2021
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa I.–Relatório A AAA, nesta ação declarativa de condenação emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, demandou a R.

BBB, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 1.833,80, acrescida da que se vencer até decisão final, de juros contados à taxa legal desde a data da citação da ré e até integral pagamento.

Para tanto alegou que é trabalhadora da ré desde 16 de junho de 2016, por transferência da empresa ISS, nos termos da Cláusula 17ª do CCT outorgado entre a Associação de Empresas de Prestação de Serviços de Limpeza e Actividades Similares e o Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Profissões Similares e Actividades Diversas, com antiguidade reportada a 3 de Junho de 2008, com a categoria de trabalhadora da limpeza, com o horário de trabalho das 7H00 às 15H00 de Segunda a Quinta-feira e das 7H00 às 16H00 aos Domingos, sendo o local de trabalho o Hospital …., auferindo, em 2018, a retribuição de € 603,85, acrescida de € 84,80 a título de subsídio de Domingo e € 1,82 de subsídio de alimentação por cada dia de trabalho prestado. É associada do Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Actividades Diversas (STAD), desde 2 de Novembro de 2012 e que à relação laboral se aplica o CCT celebrado entre a Associação Portuguesa de Facility Services e o Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Profissões Similares e Actividades Diversas, que vigora com a redacção constante do BTE n.º 12, de 29 de Março de 2004. A ré não lhe paga as horas nocturnas como pagava a ISS, e também não lhe paga o trabalho prestado em dia feriado como deveria por força da Cláusula 27º do CCT referido.

*** A ré contestou, alegando que não acordou com a A. a manutenção integral das mesmas condições que esta tinha na ISS e que em Junho de 2016 o CCT do STAD já não estava em vigor, alegando que a autora não foi transferida para a ré mas sim admitida com novo contrato de trabalho, assim nada devendo a título de horas nocturnas Mais invoca a caducidade do CCT em que a autora baseia as suas pretensões nos termos e com os fundamento que identifica considerando ter o mesmo caducado em 17 de Fevereiro de 2014, concluindo que, por esse motivo, não se aplica à relação de trabalho o referido CCT do STAD. À relação aplica-se em exclusivo o Código do Trabalho, por, atenta a filiação da autora, também não ser aplicável o CCT da FETESE. Por esse motivo, improcedem as pretensões da autora baseadas na aplicação de cláusulas convencionais do CCT do STAD. Relativamente ao pedido de pagamento do trabalho em dia feriado com acréscimo remuneratório alega não ser devido por não ser trabalho suplementar.

A autora não respondeu.

*** Saneados os autos e efetuado o julgamento, o Tribunal julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré "a pagar à autora AAA a quantia a liquidar, acrescida de juros à taxa legal de 4% desde a citação e até integral pagamento, correspondente ao pagamento dos feriados trabalhados desde 15 de Junho de 2016, deduzindo os valores já pagos, e aos que vierem a ser trabalhados futuramente nos termos previstos na Cláusula 27º do CCT celebrado entre a Associação das Empresas de Prestação de Serviços de Limpeza e Actividades Similares e o STAD — Sindicato dos Trabalhadores dos Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Profissões Similares e Actividades Diversas e outros, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego nº 12, de 29 de Março de 2004 (alterações e texto consolidado), com rectificação publicada no BTE, 1ª Série, nº 32, de 29 de Agosto de 2004, absolvendo a ré do demais peticionado".

*** Inconformada, a R. recorreu, concluindo: a.-A sentença recorrida concluiu pela subsistência do CCT do STAD, publicado no BTE n.º 12, de 29.03.2004, pela aplicação da Cláusula 27 do CCT do STAD ao trabalho normal em dia feriado, e assim condenou a Ré nas diferenças a liquidar a título de trabalho normal em dia feriado.

Caducidade do CCT do STAD b.-Ora, conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, em 17.02.2014 cessou a vigência do CCT do STAD, pelo que, em face do art.º 7, n.º 1 e 5, da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, e art.º 501º, n.º 1 e 4, do CT (na redação anterior à Lei n.º 55/2014), mas sem prejuízo do seu n.º 6, a partir dessa data o CCT do STAD deixou de ser aplicável.

c.-Não é relevante a falta de publicação de aviso de caducidade, porque o art. 501º n.º 4 do CT (na redação anterior à Lei n.º 55/2014) estabelecia que a convenção coletiva caducava logo que decorridos os prazos e procedimentos indicados nessa mesma disposição legal (“após o que caduca”), sem necessidade de qualquer outra formalidade. No mesmo sentido, o art. 10º n.º 2 e 3 da Lei n.º 7/2009.

d.-Havendo duas formas possíveis de cessação da vigência de uma convenção coletiva, a revogação e a caducidade, apenas em relação à primeira estabelece em termos gerais a aplicação “(d)as regras referentes ao depósito e à publicação de convenção coletiva”, isto é, os arts. 494º, 495º e 519º, ex vi 502º n.º 2 do CT (na redação anterior à Lei n.º 55/2014).

e.-Em relação à segunda forma de cessação, a caducidade, o legislador apenas estabelece a obrigatoriedade de a DGERT proceder à publicação no BTE de aviso sobre a data da cessação da vigência de convenção coletiva – art. 502º n.º 4 do CT (na redação anterior à Lei n.º 55/2014).

f.-Em caso de caducidade o legislador apenas se afastou da regra anterior, e estabeleceu a aplicação das regras sobre depósito e publicação de convenção coletiva, em duas situações (art. 501º, n.º 8 e 9, do CT, na redação anterior à Lei n.º 55/2014): (i) acordo de prorrogação da vigência da convenção por período determinado; (ii) acordo sobre os efeitos decorrentes da convenção em caso de caducidade.

g.-Assim, ao prever a obrigatoriedade de registo e publicação apenas nessas duas situações especiais, que se afastam do «regime geral» de caducidade de uma convenção coletiva, essa é a intenção e o pretendido pelo legislador, pelo que a falta de publicação de aviso de caducidade não tem efeitos associados.

h.-Consequentemente, apenas nos casos específicos dos acordos previstos no art. 501º n.º 8 e 9 do CT (na redação anterior à Lei n.º 55/2014), e em termos gerais no caso de acordo de revogação, é condição da sua entrada em vigor a sua publicação no BTE, à semelhança do que sucede em caso de novo instrumento ou alterações ao mesmo (art.º 519, n.º 1, do CT).

i.-Em face do exposto, a falta de publicação do aviso, até por depender de uma autoridade administrativa, não afeta de todo a cessação da convenção coletiva por caducidade, pelo que o CCT do STAD caducou em 17.02.2014.

j.-Nesta medida, a administração laboral não deveria ter de analisar a legalidade da caducidade da convenção coletiva - como não tem nos casos de depósito de convenção coletiva (art. 494, n.º 4, do CT) -, mas simplesmente publicar um aviso, a pedido de qualquer interessado (atualmente, art.º 502, n.º 8, do CT).

k.-Não há qualquer razão de ordem lógica ou jurídica que imponha um entendimento diferente, notando-se que foram já algumas as alterações legislativas nesta matéria, e essas alterações até reforçam o entendimento que se vem defendendo.

l.- Invocar razões de certeza e segurança jurídicas para entender que a publicação do aviso da caducidade é constitutiva, não pode ser argumento, pois tal entendimento não tem suporte no texto legal, nem numa interpretação histórica, sistemática, lógica ou teleológica da lei, salientando-se ainda que o intérprete deve presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (art.º 9 do C. Civil).

m.-Também não há lacuna, pois conforme o exposto há claramente vontade de o legislador de não associar ao aviso de caducidade de convenção coletiva quaisquer efeitos (art. 10, n.º 3, do C. Civil), e só por si as razões de certeza e segurança jurídicas não são suficientes para se oporem a essa vontade do legislador.

n.-Aliás, não seriam no caso aplicáveis razões de certeza e segurança jurídica para entender de forma diferente, considerando os vários acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça sobre o assunto, o primeiro de 13.10.2016, e todos no mesmo sentido, e ainda o facto de a Ré ser filiada na APFS e a Autora no STAD.

o.-Por último, com o devido respeito, uma interpretação que considerasse que a eficácia da caducidade do IRCT estaria dependente da publicação do aviso de caducidade teria de ser considerada manifestamente inconstitucional, por não corresponder ao pensamento legislativo, e não ter qualquer correspondência na letra da lei; poderá mesmo considerar-se essa interpretação como uma interferência na função legislativa, dado que está a corrigir e/ou a criar normas que não existem, sobre os efeitos da falta de publicação do aviso de caducidade, o que é proibido pela nossa Constituição (artigo 110 a 112, 161, 164, 165, 198 e 202).

p.-Assim, à data da sua admissão ao serviço da Ré, o CCT do STAD já não estava em vigor, pelo que a sentença recorrida, ao decidir como decidiu, violou nomeadamente o disposto nos arts. 501, n.º 4, e 502, n.º 1, al. b), e n.º 4, do CT, na redação anterior à Lei n.º 55/2014.

Admissão da Autora ao serviço da Ré: novo contrato de trabalho q.-Como já não estava em vigor o CCT do STAD quando a Autora foi admitida na Ré, também não se aplica o disposto no n.º 6 do art.º 501 do CT (na redação anterior à Lei n.º 55/2014), ou n.º 8 na atual redação, dado que esta cláusula só mantém (alguns) efeitos já produzidos pela convenção nos contratos de trabalho.

r.-Tal regime apenas se poderia aplicar a relação de trabalho já existente à data da cessação da vigência desse instrumento, a que fosse aplicável o CCT do STAD. Assim, quanto a relações laborais posteriores à caducidade do CCT do STAD, esse regime não se...

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