Acórdão nº 300/20.3T8FLG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelCARLOS PORTELA
Data da Resolução17 de Junho de 2021
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação nº 300/20.3T8FLG.P1 Tribunal recorrido: Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este Juízo Local Cível de Felgueiras Relator: Carlos Portela Adjuntos: António Paulo Vasconcelos Filipe Caroço Acordam na 3ª Secção do Tribunal da Relação do Porto I.Relatório: B…, devidamente identificada nos autos, veio instaurar a presente acção declarativa com processo comum contra o Condomínio …, representado pelo seu administrador, C…, Ld.ª, ambos também devidamente identificados nos autos, onde conclui pedindo que pela procedência da acção seja declarada nula a deliberação da assembleia de condóminos datada de 20.01.2020 que impôs à autora a obrigação de retirar os dispositivos de recolha de toldes e pagamento dos custos de realização da assembleia e em substituição que se considere que, face à votação dos condóminos a autora está autorizada a manter os dispositivos de recolha de toldes e, subsidiariamente que seja julgada ineficaz a deliberação da assembleia de condóminos datada de 20.01.2020, por consistir um abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium.

Para tanto e em síntese alegou o seguinte: É dona da fracção designada pela letra M correspondente ao rés-do-chão do prédio sito na …, freguesia …, concelho de Felgueiras.

A ré é administradora do Condomínio do referido prédio.

Na sequência de convocatória entretanto formalizada, no dia 10.01.2020 realizou-se uma assembleia extraordinária de condóminos, na qual e por maioria dos condóminos presentes, representantes de 19,75% do total da permilagem do prédio, foi aprovado que a autora deveria proceder à retirada dos dispositivos de recolha de toldes e proceder à reposição da estrutura original do espaço utilizado, suportando todos os encargos inerentes.

Admite que na altura em que procedeu à instalação dos dispositivos agora mandados retirar não tinha a necessária autorização dos restantes condóminos.

Defende que no entanto estes vieram a ratificar a colocação dos mesmos na assembleia de 20.01.2020.

Afirma que no caso foi feita uma errada interpretação da lei e dos Estatutos do Condomínio ao exigir a unanimidade dos votos para a remoção dos dispositivos instalados pela autora na parte comum do prédio.

E isto porque a obra realizada é uma inovação e não uma ocupação da parte comum do prédio.

Daí que sejam nulas as deliberações da Assembleia de Condóminos antes identificadas.

Defende ainda que caso assim se não entenda, a mesma deliberação deve ser anulada por constituir abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium.

Tudo porque no mesmo prédio são vários os condóminos que colocaram nas partes comuns do prédio aparelhos de ar condicionado, antenas parabólicas e estendais, sem que para o efeito tenham solicitado a prévia autorização do condomínio.

Devidamente citado para o efeito veio contestar o réu Condomínio, defendendo-se por excepção invocando a prescrição do direito de accionar por parte da autora por ter já decorrido o prazo de 60 dias para interpor a acção.

Alegou ainda que não tem interesse directo em contradizer, por tal interesse residir nos condóminos ….

Mais defendeu que carece de personalidade judiciária e de legitimidade processual.

Defende não existir qualquer deliberação a impugnar, referindo que a única deliberação tomada na assembleia de 20.01.2020, foi favorável à autora, tudo porque não existiu qualquer deliberação unânime da assembleia de condóminos, para que fossem retirados os dispositivos de recolha dos toldes, mas sim, uma informação e injunção de que deveria retirá-los pelo facto de os mesmos representarem uma ocupação de uma parte comum.

Afastou a ideia de que se trata de uma inovação, assumindo o entendimento de que se trata de uma ocupação de uma parte comum que impede o seu uso pelos demais condóminos.

Afasta a tese do abuso de direito pelo facto das antenas, estendais e aparelhos de ar condicionado não consubstanciarem uma ocupação de umam parte comum.

Formula um pedido reconvencional segundo o qual pede que a autora/reconvinda seja condenada a: 1º) Retirar os dispositivos de recolha de toldes afixados nas partes comuns do réu/reconvinte; 2º) Repor as partes comuns no estado anterior à colocação abusiva dos dispositivos de recolha de toldes; 3º) Abster-se de colocar, afixar ou ocupar qualquer parte comum, sem a devida autorização; 4º) Proceder ao pagamento ao réu da quantia de € 139,25 de despesas com a convocação da assembleia extraordinária de 20.01.2020.

Conclui a sua contestação pedindo que a autora/reconvinda seja condenada no pagamento de uma quantia diária não inferior a € 50,00 por cada dia decorrido desde o trânsito em julgado da sentença, a título de sanção pecuniária compulsória, em caso de incumprimento da decisão.

Os autos prosseguiram os seus termos, dispensando-se a realização de audiência prévia e proferindo-se o seguinte despacho cujo conteúdo aqui se reproduz integralmente: “DESPACHO SANEADOR I – Do pedido Reconvencional Na contestação por si deduzida, o Réu pede, a título reconvencional, que o Tribunal condene a Autora a: “a) retirar os dispositivos de recolha de toldes afixados nas partes comuns do Reconvinte; b) repor as partes comuns no estado anterior à colocação abusiva dos dispositivos de recolha de toldes c) abster-se de colocar, afixar ou ocupar qualquer parte comum, sem a devida autorização.

  1. proceder ao pagamento ao Reconvinte da quantia de € 139,25”, bem como no pagamento de sanção pecuniária compulsória.

    Alega, para o efeito e em síntese, que a Autora colocou toldos e ocupou espaço que se caracteriza por ser parte comum do condomínio sem que, para o efeito, tenha obtido a necessária autorização prévia, o que causou os danos melhor descritos nos autos.

    Quanto a tal pedido nada disse a Autora.

    A reconvenção, tal como nos refere Abrantes Geraldes, “constitui um instrumento jurídico que reflecte, além do mais, a consagração do princípio da economia processual, permitindo que, mediante determinado circunstancialismo, possam reunir-se num mesmo processo pretensões materiais contrapostas. Constitui, no dizer de Alberto dos Reis, uma acção cruzada, aproveitando o réu a iniciativa do autor para, na contestação, deduzir contra ele uma pretensão de efeitos contrários ou com objecto diferenciado.” (in “Temas da Reforma do Processo Civil, II volume, 3.audiência preliminar, saneamento e condensação, 4. registo da prova e decisão da matéria de facto”, Almedina, 4ª edição revista e actualizada, Março 2004, pág.125).

    Trata-se, assim, de uma verdadeira “contra-acção”, de um pedido autónomo, em que o Réu, aproveitando a acção intentada pelo Autor, deduz um pedido material e processualmente conexionado com o pedido deduzido pelo Autor, criando neste último a necessidade/possibilidade de defesa.

    Preceitua-se, assim, no n.º 2 do artigo 266º, do Código de Processo Civil, que o réu pode, em reconvenção, deduzir pedidos contra o autor quando o pedido emerge do facto jurídico que serve de fundamento à acção ou à defesa, quando se propõe obter a compensação ou tornar efectivo o direito a benfeitorias ou despesas relativas à coisa cuja entrega lhe é pedida ou quando o pedido tende a conseguir, em seu benefício, o mesmo efeito jurídico que o autor se propõe obter.

    Ora, atendendo a que o pedido formulado nos presentes autos se prende com a anulação de deliberações de assembleia de condomínio, não vislumbra como possa o pedido reconvencional ser reconduzido a qualquer das alíneas do n.º2 do artigo 266 do Código de Processo Civil.

    Assim, a causa de pedir do pedido reconvencional funda-se no alegado incumprimento do previsto nos estatutos do Condomínio e alegados danos que a Autora terá causado ao mesmo com a sua conduta.

    Não há “contra-acção”, mas acções paralelas, que se aproximam quanto à materialidade, mas de onde não se verifica a conexão necessária para que a reconvenção pudesse ser admitida, designadamente, se o pedido reconvencional emergisse do facto jurídico que serve de fundamento à acção ou à defesa.

    Desta feita, atenta a falta de pressupostos legais, não deverá a reconvenção deduzida ser admitida, o que infra se determinará.

    Em face do exposto, não admito a Reconvenção deduzida.

    * II - Do Valor da causa Nos termos do artigo 306º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil compete ao juiz fixar o valor da causa, sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes, sendo que, nos processos em que não haja lugar a despacho saneador, tal valor deve ser fixado na sentença.

    Estabelece, por sua vez, o artigo 303º, n.º1 Código de Processo Civil que, as acções sobre o estado das pessoas ou sobre interesses imateriais consideram-se sempre de valor equivalente à alçada da Relação e mais (euro) 0,01.

    Assim sendo, nos termos dos supra aludidos artigos, fixo o valor da acção em €30.000,01.

    Assim sendo, nos termos dos supra aludidos artigos e atenta a causa de pedir e pedidos deduzidos em sede de petição inicial, fixo o valor da acção em €30.000,01.

    * III – Saneamento O Tribunal é o competente em razão de nacionalidade, matéria e hierarquia.

    O processo mostra-se isento de nulidades que o invalidem de todo.

    * Da...

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