Acórdão nº 25713/19.0T8LSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 17 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelPEDRO MARTINS
Data da Resolução17 de Junho de 2021
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo identificados: GR-SA, instaurou a presente acção comum contra A-Lda, pedindo a condenação desta no pagamento de indemnização/cláusula penal (de 5279,73€ (IVA incluído) ou de 4292,46€ (sem IVA, caso o tribunal entenda que o mesmo não é devido), devida pelo incumprimento contratual pela ré/locatária, vencida com a resolução do contrato, julgada válida em processo judicial autónomo, transitado em julgado, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento, melhor especificando no seu petitório os diversos montantes reclamados.

Alegou, para tanto, e em síntese, que alugou à ré um equipamento impressora multifunções, por esta escolhido e, com vista a tal fim, adquirido pela autora a fornecedor entidade terceira. Tendo tal bem sido entregue à ré, a 25/02/2013, a ré não pagou os alugueres de Abril a Setembro de 2017, os custos de aviso e os juros de mora. Face a tal, comunicou à ré a resolução do contrato, tendo reclamado todos os valores em dívida. Por tal, e tendo havido um processo judicial anterior [uma injunção em que, por decisão judicial, se considerou que a cláusula penal não podia ser exigida na injunção], vem no presente processo peticionar o montante devido a título de cláusula penal, de 5279,73€, que equivale aos alugueres de 01/10/2017 a 31/03/2018, vencidos antecipadamente com a resolução do contrato pelo incumprimento da locatária, ora ré, acrescido dos respectivos juros de mora, liquidados à taxa de 15% convencionada no contrato de locação. Invoca 14 acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, proferidos entre Out/2011 e Jan/2013.

A ré contestou, excepcionando a nulidade da cláusula penal por abusiva (art. 19/-c do RJCCG).

A autora respondeu à excepção, pugnando pela validade de tal cláusula, reiterando ter a ré vinculado validamente à mesma aquando da celebração do contrato, mais se tendo verificado a cessação antecipada do mesmo em virtude de incumprimento desta.

A acção foi decidida no saneador, que a julgou improcedente e absolveu a ré do pedido, declarando nula a cláusula penal estabelecida na cláusula 16.º, n.º 1, das condições gerais do contrato de locação celebrado nos presentes autos entre as partes.

A GR recorre deste saneador sentença, para que seja revogado e substituído por outro que condene a ré.

A ré contra-alegou defendendo a improcedência do recurso, no essencial pelas razões que constam do saneador sentença.

* Questões a decidir: se a ré devia ter sido condenada a pagar à autora a cláusula penal.

* Para a decisão desta questão importam os seguintes factos dados como provados: 1. A autora é uma sociedade comercial que tem por objecto, designadamente, a actividade comercial de aluguer de equipamentos informáticos.

  1. A ré é uma sociedade comercial que tem por objecto o diagnóstico médico por imagem.

  2. Do documento intitulado factura n.º FT 2013/1, de 26/02/2013, com data de vencimento no mesmo dia, emitido pela fornecedora M-Lda, em nome da autora, consta a descrição do seguinte produto: uma “solução print xerov v_t 550 com finalizador pro”, pelo valor de 44.218,50 €.

  3. Por documento intitulado Locação Clássica – Contrato de Locação para Clientes Empresariais – Corporate Clients, n.º 000-010898, autora e ré acordaram o “aluguer” do produto referido supra, acordando o pagamento de 60 prestações mensais, no valor de 879,95€ cada (com o valor do IVA incluído, à taxa legar em vigor).

  4. Do documento intitulado de “contrato” em cima referido, fazem parte integrante as Condições Gerais de Locação e os Termos e Condições Gerais Relativas ao Seguro de Propriedade da GR, mais se prevendo nesse documento a identificação da fornecedora do equipamento como sendo a M-Lda.

  5. A modalidade de pagamento acordada entre as partes foi o pagamento trimestral, por débito directo.

  6. A ré assinou o documento em causa, tendo conhecimento do seu teor.

  7. Do documento referenciado, constam, entre outras a cláusula 14, que prevê, sob a epígrafe “Consequências de atrasos, cessação sem aviso prévio”: 1. Caso o Locatário esteja em mora com o pagamento de quaisquer montantes devidos de acordo com o contrato, serão devidos juros à taxa legal para operações comerciais acrescidos de 8% pelos alugueres em divida e juros à taxa legal para operações comerciais acrescidos de 5% por quaisquer outros montantes em divida (taxa de serviço, prémio de seguros, despesas administrativas).

  8. No caso de cessação pelo Locador, a Secção 16 será aplicável. O Locador terá o direito de fazer cessar o contrato de locação sem aviso prévio caso o Locatário esteja em mora com o pagamento dos alugueres.

  9. O Locatário poderá evitar a cessação do contrato através do pagamento dos alugueres em mora acrescidos de uma penalização de 50% do valor dos alugueres em mora.

  10. O Locador poderá avisar o Locatário da falta de pagamento das facturas, implicando os avisos custos que serão imputados ao Locatário. Os custos de aviso e gestão de cobrança poderão variar entre os EUR 10 e EUR 120 (acrescidos de IVA), consoante sejam efectuados pelo Locador ou também por terceiras entidades”.

  11. E a cláusula 16, que prevê, sob a epígrafe “Consequências de cessação prematura extraordinária”: 1. Tendo em consideração que o Locador adquiriu o bem locado para benefício do Locatário e tendo em conta a necessidade de compensar os danos emergentes, nomeadamente, com o investimento patrimonial perdido pelo Locador como resultado da perda de valor do equipamento, custos financeiros com o investimento em equipamento novo objecto da locação e custos administrativos com a celebração e manutenção deste contrato, entre outros, caso o Locador exerça o seu direito de cessação sem aviso prévio ou caso o Locatário cesse o contrato de acordo com a secção 12, o Locador poderá exigir a título de cláusula penal um montante equivalente a todos os alugueres que fossem devidos até ao termo do contrato. A compensação com a poupança de custos ou a obtenção de benefícios relacionados com a cessação antecipada – incluindo indemnizações pagas pelo seguro e outras indemnizações, se existirem (confrontar secção 11 nºs 2 e a secção 13 números 7 e 8) recebidas pelo Locatário estarão sujeitas às disposições legais. Os direitos do Locador tornam-se exigíveis com a recepção da notificação de cessação. O Locatário deverá ser considerado em incumprimento caso não realize o pagamento devido nos 30 dias subsequentes à recepção da notificação da cessação e dos danos enumerados.

    […] 9-A\ E a cláusula [ou secção] 18: Fim do contrato, cessação, renovação, devolução do bem locado, inexistência de direito de aquisição do Locatário: 1. Ambas as partes podem impedir a renovação do contrato e fazê-lo cessar por denúncia, na data do respectivo termo, se comunicarem por escrito e com um aviso prévio de 3 meses, antes do fim do termo inicial base, a sua decisão de não renovação do contrato.

  12. No caso de o direito de cessação não ser exercido, o contrato será renovado por sucessivos períodos de 6 meses, até ser denunciado por escrito por uma das partes, com um período de aviso prévio de 3 meses relativamente ao termo de cada renovação.

    Esta cláusula foi invocada pela autora na PI (artigos 24, 36 e 78) e constando do contrato, não impugnado pela ré, é agora acrescentada por este TRL, ao abrigo dos arts. 663/2 e 607/4 do CPC, tendo em conta o que é alegado pela autora nas alegações de recurso.

  13. A ré procedeu ao pagamento dos alugueres até 31/03/2017, não tendo pago os correspondentes do mês de abril a setembro de 2017.

  14. A empresa L-SA, e a autora, comunicaram à ré, quanto ao “contrato” supra mencionado, encontrarem-se montantes em dívida à autora, por missivas datadas de 20/04/2017, 10/05/2017, 20/06/2017, e 10/07/2017.

  15. Por missiva de 10/08/2017, a autora comunicou à ré a “resolução do contrato por falta de pagamento de alugueres – incumprimento definitivo do contrato de locação”.

    * A fundamentação da sentença foi a seguinte, em síntese: Por força do art. 1022 do CC, que trata do contrato de locação, que foi o contrato celebrado entre as partes, há um nexo sinalagmático entre o pagamento das específicas prestações acordadas e a obrigação de proporcionar o gozo de uma coisa.

    As partes podem, no âmbito da liberdade contratual (artigo 405 do Código Civil), fixar livremente o conteúdo dos contratos, estabelecendo, nomeadamente, uma cláusula penal. Segundo o artigo 810/1 isso significa que podem fixar por acordo o montante da indemnização exigível, em caso de incumprimento.

    O contrato de locação em apreciação enquadra-se nos designados contratos de adesão por conter cláusulas elaboradas sem prévia negociação individual, destinadas a uma pluralidade indeterminada de contraentes, artigo 1 do DL 446/85, de 25/10 (LCCG - na sua versão actualizada).

    Nos termos do artigo 19/-c da LCCG, são relativamente proibidas, consoante o quadro negocial padronizado, as cláusulas penais desproporcionadas aos danos a ressarcir, o que é, além do mais, de conhecimento oficioso.

    A pretensão da autora de ser indemnizada pelo valor correspondente às rendas que se venceriam até ao final do contrato só poderia ter acolhimento no caso de a mesma, ante o incumprimento contratual, tivesse optado pela subsistência e integral realização do contrato em causa, o que pressuporia o cumprimento da sinalagmática obrigação contratual sobre si impendente e consubstanciada na cedência ao locatário do gozo e fruição do veículo locado, pelo período de duração do contrato, que não sucedeu visto que a autora optou pela resolução do contrato.

    Caso contrário, a autora ficaria na situação privilegiada de obter os benefícios decorrentes do cumprimento do contrato pelo locatário, sem que da sua parte tivesse a correspondente obrigação de facultar ao locatário o gozo e fruição dos bens locados, o que se traduziria num injustificado desequilíbrio da estrutura das obrigações sinalagmáticas de cada um dos sujeitos contratuais.

    E, se é certo que a cláusula 16...

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