Acórdão nº 1259/09.3BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 09 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelCRISTINA FLORA
Data da Resolução09 de Junho de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 2.ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO A Impugnante Sociedade “S... – S..., sgps, Sa., e o Representante da fazenda pública vêm recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou parcialmente procedente a impugnação apresentada por S... – S..., sgps, Sa, da liquidação de IRC respeitante ao exercício de 2005, notificada com a demonstração de liquidação nº 2009000021..., de valor de 6.683.746,42€.

A Fazenda Pública apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões: “CONCLUSÕES I) Não obstante no artigo 63º n.º 1 do CPPT, na redação anterior à dada pela Lei n.º 64-B/2011 de 30 de dezembro, se referir: “A liquidação dos tributos com base em quaisquer disposições antiabuso nos termos dos códigos e outras leis tributárias depende da abertura para o efeito de procedimento próprio.”, sempre haverá que se ter em linha de conta a redação do n.º 2 deste artigo 63º do CPPT.

II) De facto, no n.º 2 do artigo 63º do CPPT, encontram-se estabelecidas as condições que se deverão verificar para que uma determinada norma seja considerada norma antiabuso para efeitos deste artigo 63º.

III) Diz-nos o n.º 2 do art. 63º do CPPT: “Consideram-se disposições antiabuso, para os efeitos do presente Código, quaisquer normas legais que consagre a ineficácia perante a administração tributária de negócios ou actos jurídicos celebrados ou praticados com manifesto abuso das formas jurídicas de que resulte a eliminação ou redução dos tributos que de outro modo seriam devidos.” IV) O mesmo é dizer que, ainda que a doutrina ou a jurisprudência (e mesmo a própria Lei) qualifiquem determinadas normas como normas antiabuso, não será por essa razão, sem mais, que a essas normas será aplicável o procedimento previsto no artigo 63º do CPPT, quando não correspondam aos requisitos estabelecidos neste n.º 2 do art. 63º para a sua aplicabilidade.

  1. Isto mesmo é evidenciado por Jorge Lopes de Sousa (no seu Código de Procedimento e Processo Tributário anotado e comentado, Vol. I, 2011, pág. 584) ao referir: “Disposições especiais usualmente qualificadas como normas antiabuso encontram-se nos arts. 59.º (pagamentos a entidades não residentes sujeitas a um regime fiscal privilegiado), 60.º (imputação de lucros de sociedades não residentes sujeitas a um regime fiscal privilegiado), e 67.º (subcapitalização), do CIRC. No entanto, tratam-se de normas que não se enquadram na hipótese deste art. 63.º do CPPT, em face da definição dada no seu n.º 2.” VI) A situação dos presentes autos, como na situação a que se reporta o Acórdão do TCAS de 4-11- 2003, processo n.º 7464/02, não se enquadra na norma do art.° 63.° do CPPT, directamente, nem por remissão da do art.° 38.° n.°2 da LGT, e: “não está em causa pela recorrente, do uso de qualquer negócio jurídico (mais vantajoso em termos de tributação) do que um outro (menos vantajoso, que seria o correspondente à substância do negócio), e que ela tenha utilizado, precisamente, para obter essa menor ou nula tributação, caso em que esta se devia fazer pela forma jurídica correspondente à substância do negócio, ou seja por este segundo negócio.” VII) E, no caso dos presentes autos, verifica-se que nos termos do art. 23º n.º 7 do CIRC (na redação em vigor no exercício em causa nos autos) não são aceites “como custos ou perdas do exercício os suportados com a transmissão onerosa de parte de capital a entidades com as quais existam relações especiais, nos termos do n.º 4 do artigo 58.º, ou a entidades com domicílio em país, território ou região com regime de tributação claramente mais favorável, constante de lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças, ou entidades residentes em território português sujeitas a um regime especial de tributação.” VIII) Isto é, verificadas estas condições nunca será aceite como custo para efeitos fiscais o custo ou perda suportado com a transmissão onerosa de parte de capital.

    IX) E certamente que não se justifica a abertura de um procedimento especial, com o grau de protecção dos direitos dos contribuintes previsto no art. 63º do CPPT para confirmar a verificação daquelas condições.

  2. Nem se compreenderiam a exigências de fundamentação contidas no artigo 63º n.º 9 do CPPT.

    XI) No caso da norma do art. 23º n.º 7 do CIRC, na redação em vigor no exercício em causa nos autos, afasta-se a consideração como custo de uma determinada despesa, e isso é feito, independentemente de qualquer consideração relativa à licitude ou ilicitude do negócio.

    XII) Nem está em causa um qualquer poder especial da Administração Tributária, para desconsiderar um determinado negócio jurídico. Verificadas aquelas condições, sendo sindicável, nomeadamente de forma contenciosa, essa verificação, aqueles custos não são aceites.

    XIII) Da mesma forma não são normas antiabuso, nos termos definidos no art. 63º n.º 2 do CPPT, o n.º 2 do art. 23º do CIRC onde se refere “No caso das rendas de locação financeira, não é aceite como custo ou perda do locatário a parte da renda destinada a amortização financeira.” ou a norma prevista no art. 33º n.º 1 alínea e) do CIRC onde se prevê que não são aceites como custo “As reintegrações das viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, na parte correspondente ao valor de aquisição ou reavaliação excedente a 6 000 000 $00” (…) ou outras normas em que se determina a não aceitação fiscal da dedutibilidade de determinados custos, quando não estejamos perante a verificação das condições previstas no n.º 2 do art. 63º do CPPT, mesmo que essa não dedução tenha subjacente razões de moralização e neutralidade em sede de alargamento da base tributável do IRC.

    XIV) Não estamos, também, no caso dos autos para a desconsideração do custo perante a exigência de que tenham sido utilizados “meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas”, nem se exige para a desconsideração daquele custo que “tenha havido um comportamento abusivo do contribuinte.”, pois, seja o comportamento abusivo ou não, verificadas as condições que a lei prevê, não são aceites aqueles custos.

    XV) Não há assim, no caso dos autos, pela não aplicação do procedimento previsto no artigo 63º do CPPT, qualquer desigualdade no tratamento do impugnante.

    XVI) Pelo contrário, verificar-se-ia essa desigualdade no tratamento, caso, para desconsideração daquele custo (cuja previsão e condições de que depende se encontram explícitas na lei), fosse necessária a aplicação de um procedimento especial das cláusulas antiabuso.

    XVII) A sentença recorrida, ao assim não entender, apresenta-se ilegal por desconformidade com os preceitos acima assinalados, não merecendo por isso ser confirmada.

    Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser considerado procedente o recurso e revogada a douta sentença recorrida, como é de Direito e Justiça.

    Requerendo-se, ainda, em face do elevado valor da causa, que conduziria a um pagamento de taxa de justiça, a nosso ver, demasiado desproporcionado atendendo à especificidade da situação, designadamente à complexidade (ainda que a mesma exista) dos autos, a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça prevista no art. 6º n.º 7 do Regulamento das Custas Processuais.” A Recorrente S... – S..., sgps, Sa., apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões: “IV. DAS CONCLUSÕES 1. Nos presentes autos, discute-se a legalidade da liquidação adicional de IRC do exercício de 2005, na qual foram efectuadas, pela Administração fiscal, diversas correcções à matéria colectável à impugnante.

    1. À questão jurídica a solucionar - a análise da legalidade do acto de liquidação de imposto apurado à recorrente e as correcções efectuadas à matéria colectável - o Tribunal a quo respondeu, na parte sobre que versa o presente recurso (consubstanciada, conforme se refere no requerimento de interposição, na parte que negou provimento à impugnação judicial deduzida, a única que aqui releva), nos seguintes termos: (i) quanto à questão da desconsideração dos custos incorridos com deslocações e estadas, o Tribunal a quo considerou que, que "aqui apenas logrou a impugnante demostrar a justificação genérica das despesas relativas a aeronaves e a sua conexão com as opções do grupo quanto à sua expansão empresarial, mas não foram concretizados os factos atinentes às despesas incorridas, que permitissem apreciar a indispensabilidade à luz do citado preceito legal", prosseguindo ainda que "tendo a administração tributária questionado a relevância fiscal daquelas despesas, cabia ao impugnante fazer a demonstração da existência do sobredito nexo de ligação com a prossecução da actividade, o que não fez. Temos então que, ao contrário do que propugna a impugnante, cabia-lhe efectivamente o ónus da prova da indispensabilidade dos custos, o que não fez” (ii) quanto a correcção relativa ao benefício fiscal respeitante à criação de emprego para jovens, entendeu o tribunal a quo que "o benefício fiscal atribuído aos empregadores corresponde no máximo a 14 vezes o salário mínimo nacional, acrescido de 50% desse valor, isto é, acima desses valores já não haverá tal beneficio e abaixo deles, haverá uma majoração de 50%, pelo que interpretação propugnada pela impugnante só tem fundamento com a nova redacção em vigor a partir da LOE para 2003", donde, conclui, ''é de manter a correcção, nos termos propugnados pela administração tributária, após a revogação parcial do acto” (iii) no que toca aos encargos indevidamente documentados, entendeu o tribunal a quo que os documentos apresentados pela ora recorrente "são insuficientes para lograr a prova que se pretendia, posto que, suscitada a dúvida por banda da administração tributária, impunha-se que a impugnante juntasse documentos que contivessem os elementos necessários para determinar a própria causa destas despesas, afim de aferir a sua relevância fiscal", concluindo então que "serão de...

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