Acórdão nº 19673/20.1T8LSB.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelLUÍS FILIPE SOUSA
Data da Resolução08 de Junho de 2021
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO Em 25.9.2020, BB intentou ação de divórcio sem consentimento contra CC.

Apensos a estes autos encontram-se o Apenso A- Inibição e Limitação ao Exercício das Responsabilidades Parentais em que é Requerente: CC e Requerido: BB e o Apenso B - Regulação das Responsabilidades Parentais em que é Requerente: CC e Requerido: BB.

Em 9.12.2020, realizou-se tentativa de conciliação com início pelas 11.50 horas, constante da ata o seguinte: «De seguida, pela Ilustre Mandatária da ré foi solicitada a palavra, a qual no seu uso disse ter na sua posse os acordos relativamente à utilização da casa de morada de família e da relação de bens, acordos esses que, depois de apresentados à Ilustre Mandatária do autor, pela mesma foi dito que o seu cliente concorda com o seu teor, pelo que autor e ré requerem a convolação do presente divórcio em divórcio por mútuo consentimento, para o que formulam os seguintes:--‑ ---ACORDOS--‑ A) Na impossibilidade de as partes chegarem a um acordo quanto a questão das responsabilidades parentais, as partes requerem que o mesmo seja decidido conforme as consequências do artigo 1778-A do código civil;--‑ B) Prescindem mutuamente da pensão de alimentos, por dela não carecerem;--‑ C) Não existem animais de estimação a dar destino.--‑ d) Os bens comuns mostram-se relacionados conforme o acordo junto aos autos na presente data, cujo teor reproduzem.--‑ e) A casa de morada de família será atribuída ao cônjuge marido conforme acordo junto aos autos na presente data, cujo teor reproduzem.--‑ ---Após, pela Mma. Juiz foi proferido o seguinte:--‑ =DESPACHO= ---Em face do adiantado da hora, da diligência ainda a ter lugar no apenso B) e a necessidade de melhor ponderar a aplicação do regime ora solicitado pelas partes, determina-se que se concluam os autos logo que oportuno.--‑» No apenso B, de Regulação das Responsabilidades Parentais, decorreu Conferência de Pais, também no dia 9 de dezembro de 2020, com início pelas 12.05 horas, tendo os progenitores (ora apelante e apelado) acordado na fixação de um regime provisório, o qual foi homologado por despacho, ordenando-se o prosseguimento dos autos (fls. 45-47).

Em 23 de fevereiro de 2021, foi proferido o seguinte despacho: «A Lei 61/2008 de 31/10, que alterou o regime jurídico do divórcio, consagrou, a par do divórcio por mútuo consentimento, uma nova modalidade de divórcio, o “divórcio sem consentimento de um dos cônjuges” – cfr. artigo 1773º, nº 1, do Código Civil.

O divórcio sem consentimento de um dos cônjuges é requerido no tribunal por um dos cônjuges contra o outro, tendo como causa de pedir um dos fundamentos previstos no artigo 1781º do Código Civil.

Porém, também pode ser objeto de convolação/conversão em divórcio por mútuo consentimento. Por isso se dispõe no artigo 1779º, nº 2, do Código Civil, que: “Se a tentativa de conciliação não resultar, o juiz procurará obter o acordo dos cônjuges para o divórcio por mútuo consentimento; obtido o acordo, ou tendo os cônjuges, em qualquer altura do processo, optado por essa modalidade de divórcio, seguir-se-ão os termos do processo de divórcio por mútuo consentimento, com as necessárias adaptações”.

1 Permitiu-se, destarte, a possibilidade de os cônjuges acordarem apenas quanto ao divórcio, não quanto às consequências do divórcio, caso em que conforme decorre do disposto no artigo 1778ºA do Código Civil: “2- Recebido o requerimento, o juiz aprecia os acordos que os cônjuges tiverem apresentado, convidando-os a alterá-los se esses acordos não acautelarem os interesses de algum deles ou dos filhos.

3- O juiz fixa as consequências do divórcio nas questões referidas no n.º 1 do artigo 1775.º sobre que os cônjuges não tenham apresentado acordo, como se se tratasse de um divórcio sem consentimento de um dos cônjuges.

4- Tanto para a apreciação referida no n.º 2 como para fixar as consequências do divórcio, o juiz pode determinar a prática de actos e a produção da prova eventualmente necessária.

5- O divórcio é decretado em seguida, procedendo-se ao correspondente registo.

Na determinação das consequências do divórcio, o juiz deve sempre não só promover mas também tomar em conta o acordo dos cônjuges.”.

2 Por conseguinte, sempre que os cônjuges acordem quanto ao divórcio, a declaração de vontade de ambos permitirá a convolação do divórcio sem consentimento de um dos cônjuges em divórcio por mútuo consentimento.

Todavia, faltando os acordos ou algum dos acordos pressuposto do divórcio por mútuo consentimento – alimentos, destino sobre os animais de companhia, destino sobre a casa de morada de família, exercício de responsabilidades parentais e relação de bens comuns – o processo prosseguirá sem o acordo dos cônjuges relativamente às matérias não acordadas e o divórcio, ainda que convolado/convertido, só pode ser decretado depois de proferida decisão transitada em julgado na matéria não acordada – cfr. artigos 1775º e 1778ºA, ns.º 3 e 5, do Código Civil.

Com efeito, havendo acordo dos cônjuges quanto à dissolução do casamento, o divórcio converte-se em mútuo consentimento. Porém, só pode ser decretado e dissolvido o vínculo quando fixadas todas as consequências do divórcio, ou seja, quando decididas, por decisão transitada em julgado, todas as matérias não acordadas entre os cônjuges, rectius, a necessidade de alimentos, o destino da casa de morada de família, o destino dos animais de companhia, relacionados os bens comuns, regulado o exercício das responsabilidades parentais.

Como doutamente se decidiu, entre outros, no acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Guimarães no processo n.º 4508/17.0T8BRG.G1, a 03-05-2018: “(...) II. Numa acção de divórcio que tiver resultado da conversão por acordo do divórcio sem o consentimento de um dos cônjuges em mútuo consentimento, o Juiz só poderá proferir a sentença que decrete o divórcio, depois de terem sido por si decididas as questões sobre as quais os cônjuges não alcançaram acordo (art. 1775º, 1778º-A, nº 4, 5 e 6 do CC).

III- Para este efeito, a solução que parece mais conforme com as intenções da Lei e o princípio da adequação formal (art. 547.º CPC) é a de o Tribunal fixar os regimes necessários relativos às aludidas questões, sobre as quais não existe ainda consenso entre os cônjuges, como uma questão incidental, através da forma da jurisdição voluntária, devendo tal procedimento iniciar-se com uma notificação às partes para que as mesmas aleguem o que tiverem por conveniente (e apresentem os respectivos meios de prova), seguida de debate a realizar a final”.

3 Criou assim o legislador, por esta via, uma figura híbrida, que tem vindo a ser denominada, na doutrina e na jurisprudência, como divórcio por mútuo consentimento judicial, que segue, nas matérias não acordadas, o regime do divórcio sem consentimento do outro cônjuge porquanto impõe decisão judicial, com o que se gera, na verdade, acrescidas dificuldades e complexidades na gestão e tramitação processual, retardando-se a dissolução de um vínculo já destruído e indesejado.

Ora, no caso em apreço, os cônjuges mantêm o propósito de ser divorciar e alcançaram acordo sobre 4 (quatro) das matérias consequência do divórcio: relacionaram bens comuns, prescindiram de alimentos, destinaram a casa de morada de família ao cônjuge marido e declararam não ser donos de animais de companhia para dar destino.

Contudo, não alcançaram acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais, pelo que só depois de proferida decisão transitada em julgado na ação de regulação de responsabilidades parentais já em curso poderá ser proferida decisão nestes autos, circunstância que obriga à suspensão da instância dada a existência de causa prejudicial.

Pelo exposto, e ao abrigo dos artigos 269º, n.º 1, alínea c), e 272º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 549º, n.º 1, do mesmo diploma, declara-se suspensa a instância até que seja proferida sentença transitada em julgado no âmbito da ação de regulação das responsabilidades parentais apensa aos presentes autos.

DN.» * Não se conformando com a decisão, dela apelou a requerente, formulando, no final das suas alegações, as seguintes CONCLUSÕES: «1. A presente ação divórcio sem consentimento do outro cônjuge deu entrada em tribunal e foi distribuída em 25/09/2020.

2. Nessa data, corriam já termos os autos de Inibição e Limitação ao Exercício das Responsabilidades Parentais e os de Regulação das Responsabilidades Parentais que foram depois autuados por apenso à ação de divórcio em 21/10/2020, respetivamente, como Proc. N.º 19673/20.1T8LSB-A e Proc. N.º 19673/20.1T8LSB-B (cf. Termo de Apensação, a fls ...).

3. Em 9/12/2020 foi realizada a tentativa de conciliação prevista no n° 1 do art. 931° do Cód. Proc. Civil e nela A. e R. manifestaram o seu propósito de se divorciarem, confirmaram os acordos então apresentados e requereram a convolação do divórcio sem consentimento do outro cônjuge em divórcio por mútuo consentimento.

4. Tal como ficou consignado na Ata da referida tentativa de conciliação, ambos os cônjuges manifestaram o propósito de se divorciarem, ambos requereram a convolação do presente divórcio em divórcio por mútuo consentimento e declararam ainda que (…) 5. Foi então determinado na referida tentativa de conciliação que os autos fossem conclusos para prolação de decisão que veio a ser proferida por despacho de 23/02/2021 com a Ref.a 402693863 e que constitui o objeto do presente recurso, decisão esta que se tem por intrinsecamente complementada pelo que ficou declarado e estipulado naquela referida diligência de 09/12/2020.

6. Nesta decisão, determinou-se conforme se transcreve: "Contudo, não alcançaram acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais, pelo que só depois de proferida decisão transitada em julgado na...

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