Acórdão nº 106431/19.9YIPRT-A.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelORLANDO NASCIMENTO
Data da Resolução27 de Maio de 2021
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes que constituem o Tribunal da Relação de Lisboa.

  1. –RELATÓRIO: … Portugal, Lda, requereu procedimento de injunção contra … Level, Lda, para lhe ser paga a quantia de € 13.730,62, sendo € 13.237,66 de capital relativo a incumprimento de um contrato de empreitada que alega, € 390,96 a título de juros e € 102,00 de taxa de justiça.

    Citada, a R apresentou oposição, nela arguindo a exceção do uso indevido do procedimento injuntivo, defendendo-se por impugnação e pedindo a condenação da requerente no pagamento de indemnização no valor de € 20.074,70 correspondente a trabalhos não executados.

    O tribunal a quo julgou improcedente a exceção, indeferiu por inadmissibilidade legal o pedido de condenação formulado pela R e designou data para a realização da audiência.

    Inconformada com essa decisão a R dela interpôs recurso, recebido como apelação, com subida imediata e em separado, pedindo a sua revogação e substituição por decisão que julgue procedente a exceção deduzida ou, se assim se não entender, que determine a alteração da forma de processo para processo comum, admitindo-se o pedido reconvencional deduzido e se assim se não entender que os autos prossigam a forma especial de processo e seja admitido o pedido reconvencional deduzido pela apelante, formulando para o efeito as seguintes conclusões: 1–A Apelante foi citada para deduzir oposição ao requerimento injuntivo através de carta registada recebida em 25/11/2019.

    2–A Apelante deduziu a sua Contestação de forma articulada, excecionando a inadmissibilidade legal do procedimento de injunção, o incumprimento do contrato de empreitada e impugnando os factos alegados.

    3–A Apelante também deduziu reconvenção, peticionando o pagamento da quantia de € 20.074,70, referente a trabalhos não concluídos pela Apelada no âmbito do contrato de empreitada celebrado entre ambas.

    4–A injunção consiste em providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1º do diploma preambular ao DL n.º 269/98, de 1 de Setembro ou das obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo DL n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro, artigo 7º do respetivo diploma anexo.

    5–O limite consagrado no artigo 1º do DL 269/98, de 1 de Setembro, refere-se às obrigações pecuniárias de per si; não se refere ao contrato de que emergem as obrigações pecuniárias.

    6–Os artigos 8º e ss, mormente o artigo 10º do DL n.º 269/98, de 1 de Setembro estabelecem o especifico regime aplicável a esta especial forma processual, iniciada por requerimento de injunção segundo modelo aprovado nos termos em que constam do diploma.

    7–Conforme refere o Acórdão do TRL de 24/04/2019, “para a pertinente determinação da forma de processo a aplicar, não basta olhar e ponderar, apenas, se estamos ou não perante o cumprimento de uma obrigação pecuniária emergente de contrato de valor não superior a € 15.000,00, antes urgindo, igualmente, para além da verificação e preenchimento de tais pressupostos, indagar se o pedido formulado está em consonância com o fim para o qual foi estabelecida ou criada a forma processual a que o autor recorreu, bem como ter em atenção e ponderação se o litígio subjacente e natureza do contrato/relação obrigacional em causa implica o conhecimento de questões complexas e carecidas de um desenvolvimento e trato mais exigente, de forma a acautelar os direitos das partes em litígio”.

    8–Acrescenta ainda que, “Pelo que, apesar do concreto preenchimento dos pressupostos objetivos exigidos para a utilização do procedimento de injunção – cumprimento de obrigação pecuniária emergente de contrato, concretamente contrato de empreitada/gestão de obra; obrigação pecuniária de valor inferior a € 15.000,00 …. -, a complexidade das questões apreciandas podem ilegitimar o uso, por parte do Requerente, do procedimento de injunção”. 9– É admissível utilizar o procedimento de injunção em duas situações: quando esteja em causa um requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a € 15.000,00 e quando estejam em causa obrigações emergentes de transações comerciais.

    10–O recurso ao procedimento de injunção só se pode ocorrer quando se verifiquem na íntegra os pressupostos da sua admissibilidade pois, existem várias diferenças incontornáveis entre o requerimento injuntivo e a ação de processo comum, tais como, a forma articulada da P.I., o prazo de Contestação, a constituição de mandatário, etc.

    11–O requerimento de injunção com a linearidade prevista no artigo 10º do DL n.º 269/98, de 1 de Setembro, e uma notificação para pagar ou deduzir oposição em 15 dias, e com o conteúdo descrito no artigo 13º do mesmo diploma, só são compagináveis quando os pressupostos que presidiram à criação deste expediente célere e simples de cobrança de dívidas se verifiquem efetivamente.

    12–Caso contrário, estava encontrado o meio para, com pensado propósito de, ilegitimamente, se tentar obter título executivo, se defraudar as exigências prescritas nas disposições legais que disciplinam o procedimento de injunção, conforme decidiu o Acórdão do TRC de 20/05/2014.

    13–In casu, se é certo que as partes são empresas comerciais, não cremos que a quantia cujo pagamento a Apelada reclama da Apelante consubstancie obrigação emergente de transação comercial que dê origem ao fornecimento de mercadorias ou à prestação de serviços contra uma remuneração.

    14–No presente caso, está em causa um negócio jurídico global de € 39.084,71 que tomou a designação de empreitada, para remodelação de um prédio em Lisboa, discutindo-se na presente ação a falta de pagamento da quantia de € 13.730,62, bem como a existência de defeitos e a não conclusão de trabalhos, o que não se reconduz a uma mera falta de pagamento da última tranche do contrato.

    15–Efetivamente, tal como resulta da pretensão apresentada, está em equação o alegado incumprimento de um contrato de empreitada, celebrado entre Apelante e Apelada.

    16–O processo simplificado que o legislador teve em vista com a criação do regime especial da injunção, com vista facultar ao credor de forma célere a obtenção de um título executivo, em ações que normalmente se revestem de grande simplicidade, não é adequado a decidir litígios decorrentes de contratos que revestem alguma complexidade, como é o caso.

    17–Há que analisar e avaliar o clausulado complexo; há que analisar e avaliar o incumprimento do contrato; há que analisar e ponderar as consequências do incumprimento; há que conceder à Apelante a possibilidade de deduzir pedido de reconhecimento de um crédito, por via da reconvenção (artigo 266º n.º 2 alínea c) do CPC).

    18–Face ao exposto, considerando a evolução jurisprudencial acima expendida, não estão reunidos os pressupostos legalmente exigidos para a utilização do procedimento de injunção, o que se alega.

    19–Quando tal não se entenda, deverá ser admitido o pedido reconvencional, dado que o valor constante do mesmo e o do requerimento injuntivo é superior a metade do valor da alçada da Relação, Acórdãos do TRP de 04/06/2019, processo n.º 58534/18.0YIPRT e do TRG de 31/10/2019, processo n.º 129733/18.7YIPRT-A.G1.

    20–O valor da reconvenção, deve ser atendido, segundo as regras processuais civis, para o cálculo do valor da ação, influenciando ou determinando s forma de processo a observar. Isto é, ao valor do pedido inicial haveria que somar o valor do pedido reconvencional, o que implicaria a aplicação da forma do processo comum, com a consequente admissão do pedido reconvencional.

    21–A admissibilidade da reconvenção na ação especial terá sempre de passar pelo crivo da observância dos princípios enformadores do processo civil, como a garantia do processo equitativo, e o facto de a ela se recorrer...

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