Acórdão nº 358/21 de Tribunal Constitucional (Port, 27 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Lino Rodrigues Ribeiro
Data da Resolução27 de Maio de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 358/2021

Processo n.º 978/20

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa, em que é recorrente A. e recorrida B., o primeiro veio interpor recurso de constitucionalidade ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), do acórdão proferido por aquele Tribunal no dia 13 de outubro de 2020, no âmbito de ação declarativa de condenação em que contra o réu, aqui recorrente, foi requerida a resolução de contrato de arrendamento verbal celebrado com a autora em fevereiro de 1978.

2. O recurso de constitucionalidade apresenta o seguinte teor:

«A., réu e recorrido no processo à margem identificado em que é autora e recorrente B., notificado do acórdão proferido por este Venerando Tribunal em 14.07.2020 (Ref.a 15871403) − fruto de reclamação para a Conferência que apresentou em 10.06.2020 (Ref.as 35753890/486569) da decisão singular proferida ao abrigo do disposto no art. 656.° do Código de Processo Civil (CPC), em 20.03.2020 (Ref.a 15601355) −, bem como do acórdão proferido em 13.10.2020 (Ref.a 16104401) − que desatendeu a reclamação que sobre aquele deduziu em 10.09.2020 (Ref.as 36434316/495015) −, decisões com as quais não se conforma, vem requerer a V. Exa. se digne admitir interposição de recurso para o Venerando Tribunal Constitucional, que leva a efeito por meio do presente requerimento no qual dará cumprimento ao disposto no artigo 75.°-A da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional (LTC), aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, nos seguintes termos:

1− O presente recurso − dos identificados acórdãos do Tribunal Relação de Lisboa proferidos em 14.07.2020 e 13.10.2020 é interposto ao abrigo do disposto no 70.°, n.º 1, al. b), da LTC, visando a apreciação da inconstitucionalidade do art. 1048.°, n.º 2, do Código Civil (CC), norma aplicada na primeira das referidas decisões, constituindo a ratio decidendi da mesma na interpretação abaixo indicada, e sobre a qual se debruçou a segunda daquelas decisões que manteve a primeira pronunciando-se pela respetiva constitucionalidade.

2 Nos termos do disposto no n.º 2 do art. 1048.° do CC (norma visada pelo presente recurso e que foi introduzida pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, tendo a sua redação atual resultado da Lei 31/2012, de 14 de agosto): O locatário só pode fazer uso da faculdade referida no número anterior uma única vez, com referência a cada contrato, {bold nosso)

Determina o n.° 1 do art. 1048.° do CC que: O direito à resolução do contrato por falta de pagamento da renda ou aluguer, quando for exercido judicialmente, caduca logo que o locatário, até ao termo do prazo para a contestação da ação declarativa, pague, deposite ou consigne em depósito as somas devidas e a indemnização referida no n.º 1 do artigo 1041.°.

Nos autos à margem identificados resultou provado, nomeadamente, o seguinte:

4 o Correu termos no extinto 3º Juízo Cível de Cascais a ação de despejo n.º 6/96, instaurada pelo marido da autora contra o aqui réu, no âmbito da qual aquele peticionou a "resolução do contrato de arrendamento" e que o aqui réu fosse "condenado a despejar imediatamente a moradia e a garagem em questão", com fundamento na falta de pagamento da quantia referida em 3 º desde setembro de 1992 até dezembro de 1995, quantia essa que, por força da sua atualização, era então de 4.000S00.

Na ação 6/96, o aqui réu reconheceu a falta de pagamento das rendas e procedeu ao seu depósito, acrescido de indemnização.

16° A presente ação foi proposta em 02/02/2018.

17º O réu foi citado no dia 17/03/2018.

18º No dia 27/04/2018, na C., Balcão da …., em Lisboa, o réu procedeu ao depósito a favor da autora, da quantia de € 450,00, a título definitivo de 15 rendas vencidas entre 01/02/2017 e 01/04/2018.

O Tribunal da Relação de Lisboa entendeu que já tendo o ora recorrente usado, na ação 6/96, de faculdade (a prevista no n.º 1 do art. 1048.° do CC) que, face à lei vigente a partir de 27.06.2006 (n.º 2 do art. 1048.° do CC), só pode ser usada uma vez com referência a cada contrato, esgotou a possibilidade de a voltar a usar com os mesmos efeitos, decidindo pela procedência do pedido de resolução do contrato contra aquele formulado.

O ora recorrente considera esta solução normativa, a ser admitida, de atribuição de eficácia preclusiva a ato praticado em momento anterior ao da entrada em vigor da lei que lhe consagra tal efeito, constitucionalmente inadmissível, por se entender que a mesma consubstancia uma restrição retroativa de um direito em termos não permitidos, nomeadamente, pelo art. 12.° do CC e, mormente, pelo disposto no art. 18.°, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa (CRP), implicando igualmente a violação dos princípio da confiança e segurança jurídicas, que radicam no princípio do Estado de Direito Democrático consagrado no art. 2.° da CRP, bem como os direitos protegidos pelos artigos 65.°, n.ºs 1 e 3 e 72.°, n.º, 1, também da Lei Fundamental.

Na aplicação do regime do art. 1048.°, n.º 2, do CC não pode levar-se em consideração os atos - que constituem, nos termos do disposto no n.º 1 do mesmo artigo, causa da caducidade do direito à resolução do contrato - ocorridos em momento anterior ao da respetiva entrada em vigor. Uma interpretação e aplicação diferente da acabada de referir [do disposto no art. 1048.°, n.º 2, do CC] e que impeça os arrendatários de obstar, a partir da entrada em vigor da Lei 6/2006, de 27 de fevereiro, à resolução do contrato de arrendamento por falta de pagamento da renda, quando for exercida judicialmente, por meio do pagamento, depósito ou consignação em depósito das somas devidas e a indemnização referida no n.º 1 do art. 1041.° do CC, até ao termo do prazo para a contestação da ação declarativa, por já terem usado de tal faculdade em momento anterior ao da entrada em vigor daquela disposição, implica a atribuição de efeito retroativo à Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, no que concerne à referida norma, ferindo-a de inconstitucionalidade por violação dos supra indicados preceitos e princípios constitucionais.

Por força dos referidos preceitos e princípios constitucionais e do disposto no art. 12.° do CC, o n.º 2 do art. 1048.° do CC introduzido pela Lei n.° 6/2006, de 27 de fevereiro, na redação que lhe foi dada pela Lei n.° 31/2012, de 14 de agosto aplica-se aos contratos de arrendamento celebrados em momento anterior ao da entrada em vigor daquela Lei n.º 6/2006, mas não nos termos em que o foi pelo Tribunal da Relação de Lisboa dos referidos arestos. Ou seja, se num desses contratos, a partir de 27.06.2006 (data da entrada em vigor daquela norma), o arrendatário faltar ao pagamento da renda e vir contra si instaurada ação declarativa para resolução...

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