Acórdão nº 78/21.3BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 27 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelMÁRIO REBELO
Data da Resolução27 de Maio de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: RECORRENTE: MUNICÍPIO DE CASCAIS RECORRIDO: AUTORIDADE TRIBUTÁRIA.

OBJECTO DO RECURSO: Sentença proferida pelo MMº juiz do TAF de Sintra que julgou improcedente a INTIMAÇÃO PARA A PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES, requerida pelo MUNICÍPIO DE CASCAIS contra o MINISTÉRIO DAS FINANÇAS, invocando ter apresentado vinte pedidos de informação, dirigidos ao Exmo. Senhor Diretor de Serviços de Registo dos Contribuintes, no sentido de lhe ser facultada informação constante da base de dados da AT, relativa ao domicilio fiscal de diversos contribuintes, invocando ter instaurado contra aqueles os processos de execução fiscal ......, ......, ......, ......, ......, ......, ......, ......, ......, ......, ......, ......, ......, ......, ......, ......, ...... e .......

CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES: A sentença recorrida deve ser revogada e substituída por outra que dê provimento à ação e intime o Ministério das Finanças a prestar as informações requeridas, no prazo máximo de dez dias, como de seguida se conclui, em síntese. Vejamos: 1. Os factos que se deram como provados no ponto «III. 1 - Fundamentação de facto» da sentença recorrida não são, de todo em todo, os que resultam dos documentos juntos aos Autos ou da alegação do Recorrente, plasmada na p.i. da intimação apresentada e não contraditada pela Fazenda Pública na sua contestação.

  1. O que resulta daqueles documentos e alegações é que o Recorrente apresentou não um, mas vinte pedidos de informação relativa ao domicílio fiscal de vinte pessoas singulares executadas no âmbito de vinte processos de execução fiscal diferentes por si instaurados e aos quais a AT respondeu com quatro decisões de indeferimento, todas juntas pelo Recorrente em anexo à p.i., relativamente às quais foi apresentado o recurso hierárquico.

  2. O ora Recorrente impugna, assim, a totalidade da matéria de facto dada como provada, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 662.°, n.° 1, do CPC e cumprindo-se o ónus do artigo 640.° do CPC, aplicáveis ex vi da alínea e) do artigo 2.° do CPPT, devendo ser dados como provados, em substituição dos constantes das alíneas a) a d) do ponto «III. 1 - Fundamentação de facto» da sentença recorrida, os Factos elencados pelo Recorrente nas alíneas A) a I) do capítulo II. das presentes alegações, para as quais se remete e cujo conteúdo se considera reproduzido para efeitos das presentes conclusões.

  3. O ora Recorrente considera ainda que, além dos Factos cuja alteração se solicita, existem outros Factos que, vertendo dos documentos juntos aos Autos, bem como da alegação das partes e relevando para a decisão sub judice, devem igualmente ser incluídos na factualidade provada, pelo que também por este motivo se impugna, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 662.°, n.° 1, do CPC e cumprindo-se o ónus do artigo 640.° do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 1.° do CPTA, a decisão do Tribunal a quo de não os incluir no ponto «III. 1) - Fundamentação de facto».

  4. Especificamente, os documentos juntos aos Autos evidenciam que desde a data em que foi alterado o artigo 7.° do Decreto-Lei n.° 433/99 de 26 de outubro, a AT respondeu positivamente a todos os pedidos de informação que precederam o identificado na alínea A) dos Factos que o Recorrente pretende ver dados como provados, fornecendo-lhe a informação relativa ao domicílio fiscal dos executados, mediante identificação dos mesmos e do processo de execução fiscal em causa.

  5. Concretizando, resultaram ainda provados pelos documentos juntos aos Autos os Factos elencados pelo Recorrente sob os números 1) a 5), no capítulo II. das presentes alegações, para as quais remete e cujo conteúdo se considera reproduzido para efeitos das presentes conclusões, os quais deverão ser aditados à matéria provada.

    Avancemos com o Direito.

  6. O Tribunal a quo decidiu erroneamente pela improcedência do pedido de intimação apresentado pelo Recorrente para obtenção de informações relativas ao domicílio fiscal de vinte contribuintes executados no âmbito dos correspondentes processos de execução fiscal por si instaurados, argumentando não estarem verificados os pressupostos da derrogação do sigilo fiscal ao abrigo do dever de cooperação legal da AT com outras entidades públicas, previsto no artigo 64.°, n.° 2, alínea b) da LGT.

  7. Para tanto, argumentou, em suma, que i) o Recorrente não enquadrou os pedidos de informação formulados no âmbito dos poderes tributários de que dispõe, fazendo um pedido genérico onde não demonstra a necessidade de recorrer aos dados solicitados; e que, ii) como decorre do Acórdão do TCAS, de 30 de setembro de 2020, proferido no processo n.° 108/20.6BEFUN «a cessação do sigilo fiscal depende da existência de uma norma que atribua ao requerente o acesso à informação protegida ou a possibilidade de determinar a quebra do dever de sigilo e a prestação dessa informação, para efeitos da alínea b), do n.°2, do artigo 64.°da LGT».

  8. Quanto ao primeiro ponto, encontra-se demonstrado que o Recorrente peticionou apenas o acesso a uma informação específica - o domicílio fiscal - tendo identificado claramente o executado, pela indicação do seu nome e NIF e, bem assim, o número do processo de execução fiscal no âmbito do qual a informação solicitada será utilizada - como bem resulta da leitura conjugada do modelo de ofício utilizado nos vinte pedidos de informação apresentados e dos indeferimentos emitidos pela AT (juntos à p.i. como docs. n.° 1 a n.° 5) -, pelo que não existe qualquer margem para dúvida quanto ao fim visado com a obtenção da informação: ter como contactar os executados para efeitos da citação e subsequentes notificações a efetuar no âmbito das execuções fiscais instauradas.

  9. Sendo evidente a necessidade dos órgãos de execução fiscal estarem na posse do domicílio fiscal do executado, não se alcança de que outra forma poderia o Recorrente invocar e demonstrar a necessidade da obtenção da sobredita informação «em ato inserido nos PEFs e em cada PEF em concreto», como refere a sentença recorrida, que não a adotada: identificando com precisão os processos de execução fiscal instaurados e os respetivos executados a contactar por meio dos dados facultados, tal como decidiu o TAF de Sintra, em 15 e 17 de março de 2021, respetivamente, no âmbito das intimações tramitadas sob os números 955/20.9BESNT e 130/21.5BESNT, em que o Recorrente também foi parte e nos quais se discutiu a mesma questão sob análise nos presentes Autos.

  10. Quanto ao segundo ponto, o Recorrente demonstrou à exaustão, no âmbito da presente ação que existe, sim, «norma que atribua ao requerente o acesso à informação protegida ou a possibilidade de determinar a quebra do dever de sigilo e a prestação dessa informação, para efeitos da alínea b), do n.° 2, do artigo 64.° da LGT» — cfr. Acórdão do TCA Sul, de 30 de setembro de 2020, proferido no processo n.° 108/20.6BEFUN - tal como concluiu igualmente o TAF de Sintra nas já citadas intimações n.°s 955/20.9BESNT e 130/21.5BESNT.

  11. A Lei n.° 114/2017, de 29 de dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2018, procedeu à alteração do artigo 7.° do Decreto-Lei n.° 433/99, de 26 de outubro, passando a facultar expressamente às autarquias locais o acesso à informação indispensável à realização de diligências de citação, notificação e execução no âmbito dos processos de execução fiscal por si instaurados, prevendo, no seu n.° 6, o direito de consulta nas bases de dados da administração tributária, de informação sobre o domicílio fiscal e a identificação e a localização dos bens do executado.

  12. As alterações a que o artigo 7.° do Decreto-Lei n.° 433/99, de 26 de outubro foi sujeito, visaram esclarecer os contornos do dever de confidencialidade, imposto pelo artigo 64.°, n.° 1 da LGT à administração tributária face às autarquias locais, tornando, simultaneamente, efetivos e praticáveis os poderes tributários relativamente aos impostos e outros tributos a cuja receita estas tenham direito, nos termos do disposto no artigo 15.° do RFALEI, os quais compreendem, nomeadamente, a possibilidade de cobrança coerciva desses mesmos impostos e tributos, como determina a alínea c) do mesmo normativo, através do processo de execução fiscal previsto e regulado no CPPT, tal como postula o artigo 12.°, n.° 2 do RGTAL e como passou igualmente a prever, de forma mais genérica, o próprio artigo 7.°, n.° 1 do Decreto-Lei n.° 433/99, de 26 de outubro, na sua redação inicial.

  13. Com efeito, de pouco serviria a atribuição de uma competência específica no âmbito da execução coerciva dos tributos a cuja receita os municípios têm direito, se depois se vissem estes impedidos de levar a cabo as diligências necessárias, por falta de informação fidedigna relativamente ao domicílio fiscal dos executados e, bem assim, aos bens suscetíveis de penhora.

  14. Acresce que não é diferente, no que respeita ao seu peso jurídico, o interesse da AT em conhecer o domicílio fiscal dos contribuintes no âmbito de uma execução fiscal, do interesse das autarquias locais em obter essa mesma informação para esse mesmo efeito, no domínio dos tributos por si administrados e/ou aproveitados, não fazendo qualquer sentido conferir tratamento díspar à AT e às autarquias locais, permitindo à primeira o conhecimento do domicílio fiscal dos devedores e vedando essa mesma informação às segundas, tal como decidiu o TAF de Sintra, no âmbito da intimação n.° 130/21.5BESNT (p. 25 da sentença, já junta como doc. n.° 1 em anexo).

  15. Neste contexto, irreleva a necessidade de regulamentação, via Portaria ainda não aprovada, dos termos em que poderá decorrer a consulta informática direta àquelas bases de dados, como dispõe o n.° 8, do artigo 7.° do Decreto-Lei n.° 433/99, de 26 de outubro, pois que, o facto de a consulta informática direta às bases de dados se encontrar carecida de maiores desenvolvimentos legislativos, em nada belisca a legitimidade dos municípios no que...

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