Acórdão nº 1791/15.0BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 27 de Maio de 2021
Magistrado Responsável | VITAL LOPES |
Data da Resolução | 27 de Maio de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL 1 – RELATÓRIO O N........, SA., recorre da sentença do TT de Lisboa que julgou improcedente a impugnação da liquidação relativa ao indeferimento do pedido de revisão oficiosa que versou sobre a autoliquidação de IVA relativa a 2009, mantendo os actos impugnados.
O Recorrente juntou alegações, que termina com as seguintes conclusões: «1.ª O presente recurso vem deduzido contra a sentença que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o despacho de indeferimento proferido pelo Subdiretor Geral da Direção de Serviços do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), datado de 26.03.2015, no âmbito do pedido de revisão oficiosa n.º ……….. (RO………..) relativo ao ato de autoliquidação de IVA do ano de 2009; 2 .ª O Tribunal considerou que, à luz do conteúdo do acórdão do STA proferido no âmbito do processo n.º 01075/13, datado de 29.10.2014 e do acórdão do TJUE proferido no âmbito do processo C-183/13, em 10.07.2014, não assiste razão ao Recorrente no que diz respeito à inclusão do montante do capital das rendas faturadas no âmbito dos contratos de leasing e ALD no valor das operações para efeitos de cálculo do pro rata de dedução em sede de IVA; 3.ª Adicionalmente, para o Tribunal recorrido não ocorreu qualquer violação do artigo 23.º, n.º 3, do Código do IVA; 4.ª Sendo estes os fundamentos em que se estribou a sentença recorrida para julgar a impugnação judicial improcedente, não pode o Recorrente deixar de discordar da mesma; 5.ª Primeiramente, no passado dia 06.04.2107 o Recorrente interpôs o presente recurso dirigido à Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, ao invés de à Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo; 6.ª Atendendo ao objeto do recurso, este não encerra qualquer discordância relativamente à matéria de facto, apenas se mantendo em discussão o direito, sendo competente o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 280.º do CPPT; 7.ª Requer-se que seja reconhecido o lapso na indicação da instância de recurso e remetido o recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, com as demais consequências legais; 8.ª Embora, à luz dos princípios basilares da ordem jurídica europeia da interpretação conforme e da uniformidade de aplicação, em consagração do princípio da efetividade, os tribunais nacionais devam obediência às decisões do TJUE, o que resulta dos acórdãos do TJUE são orientações interpretativas sobre uma determinada norma, cabendo ao juiz nacional a aplicação da norma comunitária ao caso concreto; 9 .ª No caso sub judice, o Tribunal a quo considerou que é legalmente inadmissível a inclusão do montante do capital das rendas faturadas no âmbito dos contratos de leasing e ALD no valor das operações para efeitos de cálculo do pro rata de dedução em sede de IVA, embora não seja possível extrair esta conclusão do aludido acórdão; 10 .ª Com efeito, há que ter presente que do acórdão do TJUE – e, por conseguinte, do mencionado acórdão do STA proferido no âmbito do processo n.º 01075/13, datado de 29.10.2014 –, não é possível extrair a conclusão de que o artigo 23.º do Código do IVA e a correspondente norma da Diretiva do IVA (antigo artigo 17.º, n.º 5, da Sexta Diretiva do IVA e atual artigo 174.º da Diretiva 2006/112/CE) devem ser interpretados no sentido de se encontrar excluída do cálculo do pro rata de dedução a componente de capital das rendas faturadas no âmbito dos contratos de leasing e ALD; 11.ª A questão sobre a qual aqueles acórdãos se debruçam – bem diferente - trata de saber se o artigo 17.º, n.º 5, da Sexta Diretiva do IVA se opõe a que a administração tributária obrigue um determinado sujeito passivo a excluir essa componente do cálculo do pro rata de dedução, o que não é a mesma coisa que afirmar que uma determinada norma obriga à exclusão de um determinado componente; 12.ª Assim, dúvidas não restam de que o alcance da decisão do TJUE – e, por conseguinte, do acórdão do STA – se circunscreve à aferição da possibilidade de, à luz do artigo 17.º, n.º 5, terceiro parágrafo, alínea c), da Sexta Diretiva, a administração tributária poder obrigar um sujeito passivo à exclusão da componente de capital das rendas faturadas no âmbito dos contratos de leasing e ALD para efeitos de cálculo do pro rata de dedução; 13 .ª No que concerne à questão de saber se os Estados-Membros podem excluir do cálculo do pro rata de dedução a componente de capital das rendas pagas no âmbito dos contratos de locação financeira, é entendimento do TJUE que os Estados-Membros poderão afastar o método do pro rata geral de dedução e determinar a aplicação da afetação real dos bens e serviços a montante às operações a jusante, prevista no aludido artigo 17.º, n.º 5, terceiro parágrafo, alínea c), da Sexta Diretiva do IVA, com recurso a critérios objetivos com vista a determinar o grau de utilização dos inputs; 14 .ª Acrescenta, no entanto, o Tribunal que “(…) há que observar que, embora a realização, por um banco, de operações de locação financeira para o setor automóvel, como as que estão em causa no processo principal, possa implicar a utilização de certos bens ou serviços de utilização mista, como edifícios, consumo de eletricidade ou certos serviços transversais, na maioria dos casos esta utilização é sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão dos contratos de locação financeira celebrados com os seus clientes, e não pela disponibilização dos veículos.
Incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se é efetivamente esse o caso no processo principal (cf. considerandos 33 e 34, sublinhado nosso); 15.ª Em face do conteúdo do acórdão do TJUE, facilmente se constata que a situação subjacente ao caso sub judice é bem diferente e, por conseguinte, crê-se evidenciado o erro de julgamento em matéria de facto e em matéria de direito em que incorreu a sentença recorrida; 16.ª Com efeito, sendo certo que o TJUE julgou admissível a exclusão da componente de capital das rendas dos contratos de locação financeira do pro rata de dedução, não é menos certo que fez depender essa exclusão da ligação dos bens e serviços de utilização mista ao financiamento e à gestão dos contratos de locação financeira, e não à atividade de disponibilização dos veículos, o que caberia ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, recaindo essa obrigação sobre qualquer órgão jurisdicional que pretenda aplicar o entendimento daquele acórdão do TJUE; 17.ª Efetivamente, ao longo do acórdão do TJUE, são várias as referências nesse sentido (cf. considerandos 33 e 34); 18.ª Assim, e em face de todo o exposto, resulta evidente que sobre o Tribunal recaía a obrigação de pronúncia sobre a verificação da ligação dos bens e serviços de utilização mista ao financiamento e à gestão dos contratos de locação financeira, como, aliás, parece de resto ter entendido o STA no processo n.º 1075/13, em que decidiu baixar os autos ao tribunal de 1.ª instância para a pronúncia sobre as questões que ficaram prejudicadas pela decisão; 19.ª No caso sub judice, a verificação da ligação dos bens e serviços de utilização mista ao financiamento ou à gestão dos contratos de locação financeira não é concretamente aferida pelo Tribunal recorrido; 20.ª Com efeito, e tanto quanto o Recorrente consegue depreender, o Tribunal partiu do pressuposto de que, atento o facto de estarem em causa contratos de natureza primacialmente financeira, deve ter-se por imediatamente evidenciada a ligação dos bens e serviços de utilização mista ao financiamento ou gestão dos contratos; 21.ª Um entendimento de tal ordem não pode proceder, porque a natureza primacialmente financeira dos contratos de locação financeira não é suficiente para concluir por aquela ligação; 22.ª Com efeito, se o TJUE julgou por necessária aquela verificação, é porque a mesma não decorre da natureza dos contratos, mas das circunstâncias concretas de cada caso; 23.ª De facto, se não fosse necessária essa verificação em concreto, bastaria ao TJUE afirmar como princípio que a componente de capital nunca poderia estar incluída para efeitos de cálculo do pro rata de dedução, pelo que, não o tendo feito, foi porque se impunha sempre a verificação em concreto da ligação dos bens e serviços de utilização mista ao financiamento ou à gestão dos contratos de locação financeira; 24.ª Deste modo, deve concluir-se que a interpretação que o Tribunal realiza das normas nacionais e comunitárias aplicáveis neste âmbito enferma de ilegalidade; 25.ª De facto, outra interpretação que não esta incorre em inconstitucionalidade por violação dos princípios consignados na CRP, já que a interpretação do artigo 174.º, n.º 1, da Diretiva 2006/112/CE (Diretiva do IVA), no sentido de que não se impõe a verificação da ligação dos bens e serviços de utilização mista ao financiamento e à gestão dos contratos de locação financeira atenta a natureza primacialmente financeira dos contratos, viola quer o princípio da tutela jurisdicional efetiva plasmado no artigo 20.º, n.º 5, da CRP, quer os princípios e normas conformadores da construção comunitária constitucionalmente aceites por força do artigo 7.º, n.º 6, da CRP, designadamente os princípios da atribuição, da subsidiariedade e da proporcionalidade e da cooperação leal entre a União Europeia e os Estados; 26.ª Em face do exposto, e atenta a errónea interpretação da sentença recorrida, deve determinar-se de imediato a sua anulação, por manifesto erro de julgamento; 27.ª Sendo anulada a sentença recorrida, como espera o Impugnante, ora Recorrente, deve julgar-se procedente a impugnação judicial e determinar-se a anulação do ato tributário impugnado; 28.ª Com efeito, inexistem quaisquer elementos nos autos que permitam ao Tribunal a conclusão de que essa ligação existe, pelo que, estando em causa um contencioso de mera anulação, tal só pode conduzir, no caso sub judice e à luz dos elementos de...
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