Acórdão nº 3553/20.3T8CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Junho de 2021
Magistrado Responsável | V |
Data da Resolução | 01 de Junho de 2021 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório A...
, com os sinais dos autos, intentou procedimento cautelar especificado de suspensão de deliberações sociais contra “B...
” ([1]), também com os sinais dos autos, pedindo a suspensão da deliberação, tomada em assembleia geral extraordinária e datada de 05/09/2020, que determinou a exclusão do Requerente e a perda da qualidade de associado da Requerida, dispensando-se tal Requerente do ónus da propositura da ação principal.
Alegou, para tanto, em resumo ([2]): - sendo o Requerente associado da Requerida, a deliberação de exclusão daquele, tomada em assembleia geral extraordinária de 05/09/2020, mostra-se totalmente infundada (baseia-se em alegações falsas, deturpadas e abusivas), sendo ilegal, injustificada, abusiva e violadora das mais elementares regras da boa-fé e dos bons costumes; - se o Requerente for expulso de associado, por exprimir os seus pontos de vista, o seu direito à liberdade de expressão continuará a ser-lhe denegado enquanto não obtiver sentença que reconheça a ilegitimidade da sua expulsão; - permanecendo excluído de associado, não poderá pronunciar-se sobre a vida, as opções e as deliberações de uma associação a que tem uma forte ligação, que serviu diligentemente durante mais de quinze anos e com cujo futuro se preocupa; - para além de perder o direito a obter toda e qualquer informação respeitante a esta associação.
A Requerida apresentou oposição, deduzindo a exceção de ilegitimidade processual do Requerente e pugnando pela improcedência da providência requerida.
Realizada a audiência com produção das provas, foi julgada improcedente aquela exceção de ilegitimidade e proferida decisão de não decretação do procedimento cautelar, por não verificação do pressuposto legal traduzido no dano apreciável para o Requerente, indeferindo-se, outrossim, a peticionada inversão do contencioso.
Desta decisão veio o Requerente interpor o presente recurso, apresentando alegação e as seguintes Conclusões: ...
A Requerida contra-alegou, concluindo que o «recurso deve julgar-se improcedente, por infundado, mantendo-se a Sentença recorrida».
Este recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito suspensivo, tendo neste Tribunal ad quem sido mantido o regime e o efeito fixados.
Nada obstando, na legal tramitação, ao conhecimento do mérito de tal recurso, cumpre apreciar e decidir ([3]).
II – Âmbito recursivo Perante o teor das conclusões formuladas pela parte recorrente – as quais definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso ([4]), nos termos do disposto nos art.ºs 608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil em vigor (doravante NCPCiv.), o aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26-06 –, o thema decidendum consiste em saber se resulta preenchido todo o requisitório de procedência do pedido cautelar suspensivo, importando apurar, neste âmbito, face aos específicos contornos do caso, o pressuposto do “dano apreciável”.
III – Fundamentação
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Matéria de facto Na 1.ª instância foi considerada – sem controvérsia – a seguinte factualidade como indiciariamente provada: ...
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O Direito Do invocado “dano apreciável” 1. - Dispõe o art.º 380.º, n.º 1, do NCPCiv. que “se alguma associação ou sociedade, seja qual for a sua espécie, tomar deliberações contrárias à lei, aos estatutos ou ao contrato, qualquer sócio pode requerer, no prazo de 10 dias, que a execução dessas deliberações seja suspensa, justificando a qualidade de sócio e mostrando que essa execução pode causar dano apreciável” (destaque aditado).
Assim sendo, o procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais, como procedimento nominado que é, assenta na verificação cumulativa dos seguintes requisitos:
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Que o requerente tenha a qualidade de sócio da associação ou da sociedade que tomou deliberação; b) Que tal deliberação seja contrária à lei, aos estatutos ou ao contrato/pacto social; c) Que a execução dessa deliberação possa causar dano apreciável.
Vem sendo entendido por setor significativo da jurisprudência que o primeiro requisito aludido constitui pressuposto de legitimidade ativa e os dois restantes são constitutivos da causa de pedir, esclarecendo-se que a «… qualidade de sócio e a ilegalidade da deliberação bastam-se com um mero juízo de verosimilhança, mas, quanto ao “dano apreciável”, exige-se, pelo menos, uma probabilidade muito forte da sua verificação. (…) A exigência legal de demonstração de que a execução da providência pode causar “dano apreciável” reclama a alegação de factos concretos que permitam aferir da existência dos prejuízos e da correspondente gravidade (…). O “dano apreciável” não é toda ou qualquer possibilidade de prejuízo que a deliberação ou a execução em si mesmas comportam, mas sim a possibilidade de prejuízos imputáveis à demora da acção de anulação, pois a providência cautelar visa prevenir o “periculum in mora”, ou seja, acautelar a utilidade prática da sentença de anulação da deliberação social contra o risco da duração do respectivo processo» ([5]).
Pretende-se, por isso, evitar o denominado periculum in mora – o prejuízo apreciável/significativo causado pela demora inevitável da ação principal, o processo de anulação dessas deliberações a intentar pelo sócio requerente, com vista à declaração da sua invalidade –, de molde a que a sentença favorável que venha a ser proferida assuma o seu efeito útil.
Assim, nesta perspetiva, “dano apreciável não é toda ou qualquer possibilidade de prejuízo que a deliberação ou a execução em si mesmas comportam, mas sim a possibilidade de prejuízos imputáveis à demora da acção de anulação, pois que não faria sentido que o legislador desse relevo, para efeitos da concessão da providência cautelar, à eventualidade de danos diferentes dos originados pelo retardamento da sentença a proferir naquela acção” ([6]).
Nesta senda, depois de se concluir, na decisão recorrida, que “a deliberação de exclusão do requerente tomada em Assembleia Geral Extraordinária de 5 de Setembro de 2020 é contrária à lei e aos Estatutos da A... uma vez que os comportamentos imputados ao requerente não são susceptíveis de violar qualquer norma estatutária da A...”, expendeu-se assim (quanto ao “dano apreciável”): «(…)...
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