Acórdão nº 1488/18.9T9FAR-O.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Maio de 2021
Magistrado Responsável | FILOMENA SOARES |
Data da Resolução | 25 de Maio de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Criminal (1ª Subsecção) do Tribunal da Relação de Évora: I [i] No âmbito do processo comum, com intervenção do Tribunal Colectivo, nº 1488/18.9 T9FAR, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo Central Criminal de Portimão, Juiz 1, por acórdão proferido em 06.10.2020, ainda não transitado em julgado, foi decidido: “(…) julgamos a acusação parcialmente procedente, por provada e, em consequência: a) Absolvemos o arguido AS/C da pratica de um crime de violação de medida de interdição, previsto e punido pelo artigo 187º, n.º1, da lei n.º 23/2007, de 4 de julho b) Absolvemos o arguido MD da pratica de um crime de trafico de estupefacientes de menor gravidade p. e p. no artigo 21.º, n.º 1 e 25º, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência às tabelas I-A anexas àquele diploma; c) Absolvemos os arguidos JCRV, ARV, AFCSG e FBRS da qualificativa operada pelo disposto no artigo 24º, alínea j) do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro d) Condenamos o arguido JCRV como co-autor material e na forma consumada pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão; e) Condenamos o arguido ARV como co-autor material e na forma consumada pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão; f) Condenamos o arguido AS, como autor material e na forma consumada pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 7 (sete) anos
g) Condenamos o arguido AMP, como autor material e na forma consumada pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. no artigo 21.º, n.º 1 e 25º, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão suspensa na sua execução por igual período de tempo; h) Condenamos o arguido AFSCG, como co-autor material e na forma consumada na prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão; i) Condenamos o arguido FBRS, como co-autor material e na forma consumada na prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão j) Mais condenamos os arguidos na taxa de justiça de 6 (seis) U.C. e, nas demais custas do processo, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário; k) Declaramos perdidos a favor do Estado, o estupefaciente, acessórios, os telemóveis, as quantias monetárias e os veículos automóveis apreendidos e determinamos a destruição do estupefaciente, que se dê o legal destino ao dinheiro e a entrega ao MºPº dos restantes objectos (para que promova o destino a dar-lhes); Mantem-se as medidas de coacção aplicadas, ou seja, l) Aos arguidos JCV, ARV e AS/C, a medida de coacção de prisão preventiva; m) Extraia certidão das declarações do arguido AS/C em primeiro interrogatório, em audiência de discussão e julgamento e bem assim do auto de busca à residência do arguido e dos documentos entregues pelo arguido nos autos (recibos da sua atividade económica) e remeta aos M.P. para os fins tidos por convenientes, nomeadamente para aferir da verdadeira identidade do arguido
(…)”
[ii] Inconformado com a declaração de perdimento a favor do Estado de que foi objecto (entre outros) o veículo automóvel …, de matrícula …, o “Banco …” veio recorrer dessa decisão, extraindo da respectiva motivação de recurso as seguintes conclusões: “A. No Acórdão proferido de aqui se recorre não se encontra provado que o Arguido AS/C tenha adquirido a viatura de marca …, modelo …, de matrícula … com recurso a dinheiro proveniente dos crimes pelos quais vai condenado, B. tal como não resulta provado que o veículo melhor identificado supra foi utlizado na prática daqueles crimes, C. motivo pelo qual não deverá ser o mesmo declarado perdido a favor do Estado por não se encontrarem reunidos os pressupostos dos artigos 35.º e 36.º do DL n.º 15/93, de 22 de Janeiro e conforme também se retira do Acórdão do Tribunal da Relação de Évora (4)«Assim, o decretamento da perda pressupõe, designadamente, a demonstração/comprovação de que as armas apreendidas no processo foram utilizadas ou destinavam-se a ser utilizadas na prática do crime, conclusão a retirar dos factos provados da sentença.» D. No entanto, é decidido no Acórdão recorrido que aquele veículo automóvel seja declarado perdido a favor do Estado, E. Aquando da apreensão da viatura, já se encontrava inscrita a cláusula de reserva de propriedade a favor do aqui Recorrente quanto ao sobredito veículo
F. No entanto, nunca o Recorrente foi notificado para se pronunciar sobre a apreensão da referida viatura, o que constitui uma nulidade relativa do inquérito nos termos do artigo 120.º, número 2, alínea d) do CPP, a qual desde já se alega
G. Conforme refere o Acórdão do Tribunal Constitucional (5) «Julgar que a falta de audição do interessado, no inquérito, de pessoa não arguida no processo contra quem é requerida a apreensão de bens com vista à sua perda a favor do Estado, suposta a não inviabilidade da sua notificação para o respetivo ato, constitui a nulidade relativa prevista no artigo 120.º, n.º 2, alínea d), do CPP e declarar, em consequência, a nulidade do despacho que decretou a apreensão dos imóveis supra identificados com o consequente levantamento da apreensão.» H. Não tendo o Recorrente sido notificado, esta nulidade não se encontra sanada, devendo a mesma ser declarada no que respeita à apreensão da viatura melhor identificada supra e devendo a apreensão ser declarada inválida nos termos do disposto no artigo 122.º do CPP e assim a viatura entregue ao aqui Recorrente
I. O Recorrente é um Banco cujo objeto social se traduz no exercício da atividade bancária, incluindo todas as operações acessórias, conexas ou similares compatíveis com essa atividade e permitidas por lei, conforme se pode constatar da certidão permanente disponível em https://eportugal.gov.pt/empresas/Services/Online/Pedidos.aspx?service=CCP , utilizando o código de acesso à certidão permanente …
J. No âmbito do exercício da sua atividade, o Recorrente encetou uma parceria comercial com a sociedade RE, U LDA., Pessoa Coletiva n.º …, com sede na Avenida …, nº. …, …
K. Dedicando-se a RE, U LDA. à comercialização de viaturas novas e usadas, e no âmbito da sobredita parceria, a mesma disponibiliza aos seus clientes os produtos financeiros do Recorrente, destinados à concessão de crédito para a aquisição de veículos por aquela comercializados
L. Em meados do mês de Fevereiro de 2019, em data que não pode precisar, foi o Recorrente contactado pela RE, U LDA., porquanto um seu cliente havia demonstrado interesse em adquirir um veículo automóvel, através de crédito a conceder pelo Recorrente
M. O referido cliente era AC, Arguido nos presentes autos
N. A RE, U LDA. informou o Recorrente que o senhor AC pretendia adquirir o veículo automóvel da marca …, modelo …, com a matrícula …, de Dezembro de 2010, pelo preço de 35.000,00 € (trinta e cinco mil Euros), solicitando ao Recorrente um crédito no valor de 22.000,00 € (vinte e dois mil Euros)
O. Por forma a poder avaliar da viabilidade da concessão do crédito que lhe foi solicitado, e como é procedimento habitual, a RE, U LDA. recolheu do seu cliente, e remeteu ao Recorrente, os dados e documentos necessários para análise
P. Assim, o Recorrente concedeu ao aqui Arguido um crédito no valor de 23.183,53 € (vinte e três mil cento e oitenta e três euros e cinquenta e três cêntimos), através da celebração com este, em 11 de Fevereiro de 2019, do contrato de mútuo (ou de crédito, como está epigrafado) ao qual foi atribuído o número …, conforme se junta como Doc. 1 que se considera integralmente reproduzido para os efeitos tidos por convenientes
Q. O ora Recorrente procedeu ao financiamento solicitado pelo Arguido AC, nas condições acordadas e levadas às “Condições Particulares” do contrato de doc. 1
R. Como garantias do pontual cumprimento do contrato identificado, foram acordadas, além da subscrição de uma livrança por parte do mesmo, a inscrição, em nome do ora Recorrente, do direito de reserva de propriedade sobre o veículo automóvel objeto de apreensão nos presentes autos
S. Ora, nos casos em que o comprador do veículo recorre ao crédito, o procedimento registral passa por ser a Instituição Bancária mutuante a fazer o registo da propriedade em seu nome, na qualidade de comprador, fazendo-se, ato contínuo, o registo da propriedade no nome da pessoa que adquiriu o veículo, mutuário perante aquela
T. Nesse mesmo ato e no mesmo formulário, procede-se ao registo da reserva de propriedade em nome da Instituição mutuante
U. Este tem sido, aliás, o entendimento pacífico na doutrina e jurisprudência, pois, existindo conexão entre a compra e venda de um veículo automóvel e o contrato de mútuo a prestações, a reserva de propriedade pode ser convencionada a favor do mutuante
V. Sobre a reserva de propriedade, diz-nos o artigo 409.º do Código Civil o seguinte: «1. Nos contratos de alienação é lícito ao alienante reservar para si a propriedade da coisa até ao cumprimento total ou parcial das obrigações da outra parte ou até à verificação de qualquer outro evento
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Tratando-se de coisa imóvel, ou de coisa móvel sujeita a registo, só a cláusula constante do registo é oponível a terceiros.» W. Sendo certo que, a cláusula de reserva de propriedade é entendida e utilizada como, conforme refere o Código Civil, um meio de acautelar e proteger aquele que coloca o bem à disposição de outrem, mediante a contrapartida da entrega do preço
X. Assim é referido...
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