Acórdão nº 1785/12.7GBABF.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelLAURA GOULART MAUR
Data da Resolução25 de Maio de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora Relatório No Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo Local Criminal de Albufeira - Juiz1, no âmbito dos autos com o NUIPC nº 1785/12.7GBABF foi, em 11 de dezembro de 2020, proferido o seguinte despacho: “Por sentença transitada em julgado a 16.09.2016, foi a arguida (…) condenada na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de €6

Por despacho proferido de 11-12-2017 foi autorizada a substituição da pena de multa por TFC, o qual porem nunca se veio a realizar, por falta de colaboração do arguido, o qual apenas foi revogado por despacho proferido a 4.10.2018, em virtude de diversas vicissitudes, inclusive alterações da residência da arguida

A pena de multa sido convertida em 100 dias pena de prisão subsidiária por despacho proferido a 09.01.2019. Este despacho não foi notificado ao arguido, por se encontrar ausente em parte incerta

O prazo de prescrição da pena de multa é de 4 anos e começou a correr no dia em que transitou em julgado a sentença que a aplicou – artigo 122.º, nºs 1, d) e 2 do Código Penal

Aplicada uma pena de multa, compete ao condenado pagá-la no prazo de 15 dias a contar da notificação para o efeito – artigo 489º, nº 2, do CPP

Só não será assim, se entretanto o pagamento for deferido ou autorizado em prestações – nº 3, daquele preceito – ou for requerido e deferido a sua substituição, total ou parcial, por dias de trabalho – artigos 490º, do CPP e 48º, nº1, do CP

É o caso sub judice, em que o condenado, tendo requerido a substituição da pena de multa por TFC, tal foi deferido

No seguimento do requerido, foram então encetadas diligências promovidas pelo Ministério Público e deferidas pelo juiz, no sentido de o arguido prestar o respectivo trabalho, cuja fixação nunca foi possível, na sequencia de diversas vicissitudes nunca tendo o arguido iniciado a prestação do trabalho a favor da comunidade até ao momento em que o Ministério Público promove que se derrogue a substituição da pena de multa, a que se seguiu o despacho de conversão da pena de multa em prisão subsidiaria

A questão que se segue é então apurar da exacta natureza desta substituição da pena de multa aplicada por dias de trabalho a favor da comunidade na perspectiva de saber se esta substituição é fundamento de suspensão da execução daquela pena de multa, nos termos do artigo 125º, nº 1, alínea a), do Código Penal

A resposta passa necessariamente pelo tratamento jurídico que o legislador dá a esta substituição bem como ao facto de o arguido não cumprir ou prestar efectivamente os dias de trabalho resultantes daquela substituição

O que nos remete desde logo para o disposto no artigo 49º do Código Penal, segundo o qual, sempre que o condenado não cumpra a prestação dos dias de trabalho resultantes da substituição de pena de multa, deverá distinguir-se: - O incumprimento culposo do condenado, situação em que este cumprirá prisão subsidiária – nº 4, 1ª parte, daquele art. 49º

- O incumprimento não culposo do condenado ou incumprimento não imputável ao condenado, situação em que a prisão subsidiária que em princípio deveria ser cumprida, pode ser suspensa, nos termos do artigo 49º, nº3, do CP – nº 4, 2ª parte, deste mesmo preceito (art. 49º)

Deste regime resulta que a prestação deste trabalho pelo condenado, é uma das formas de cumprimento da própria pena de multa aplicada

Conclusão que tem ainda apoio no teor do nº1, do artigo 49º do CP, na medida em que equipara a prestação do trabalho ao pagamento da multa, bem como no nº1 do artigo 48º do CP, ao prever que a substituição da multa por trabalho pode ser total ou parcial. O que significa que existe igual equiparação entre o pagamento da multa em dinheiro e a prestação de trabalho, merecendo, pois, o mesmo tratamento

Podendo ainda afirmar-se que, em caso de prestação parcial do trabalho, ou seja, de apenas alguns dias, sempre deverá ser descontado à eventual prisão subsidiária a cumprir, os dias de trabalho efectivamente cumpridos – n.º 4 do artigo 59º do CP que sempre deverá ter aqui aplicação senão directamente pelo menos por analogia

Segundo o regime analisado da substituição da multa por trabalho, existe, pois, uma equiparação desta prestação de trabalho a um verdadeiro cumprimento da pena de multa, de tal modo que a prestação de trabalho corresponderá a uma forma de pagamento da multa. E que a prestação parcial do trabalho significará igualmente um pagamento parcial dessa multa

Perante esta conclusão, entendemos que tem aqui plena aplicação a jurisprudência do Acórdão nº 2 de 2012, do STJ de 8.3.2012 (AUJ), na medida em que, de acordo com os elementos do processo, não tendo havido qualquer prestação de trabalho – um dia que fosse -, não chegou a haver também qualquer pagamento ou início de pagamento/cumprimento da pena de multa, ainda que parcial

Com efeito, o AUJ do STJ de 8.3.2012, in DR 1º Série de 12 de Abril de 2012 veio dar corpo ao entendimento de que «[...] a instauração da acção de execução da pena de multa [...] não corresponde ainda à ‘execução’ da pena de multa. [...] só com o início do pagamento da pena de multa, isto é, só com o pagamento parcial da pena de multa se verifica a interrupção da prescrição da pena» - v. Paulo Pinto de Albuquerque in Comentário do Código Penal, 2.ª ed. actualizada, p. 387

Esta substituição da multa por dias de trabalho, não terá outro sentido que não seja a mera equiparação a “instauração de execução patrimonial para pagamento da multa”

Em sumula, será de concluir que o simples requerimento de deferimento da substituição do pagamento da pena de multa pela prestação de trabalho a favor da comunidade não constitui, no caso concreto, causa de suspensão do decurso do prazo de prescrição

Com pertinência para o caso, cite-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 15-01-2020, disponível in www.dgsi.pt: I – Ao lado do direito fundamental do arguido de se ver julgado em prazo razoável, existe um direito fundamental da sociedade de obter o resultado deste julgamento em prazo que não torne inócua a tutela penal dos bens jurídicos que a incriminação da conduta almeja salvaguardar. Como forma de obstar a esta última surge o instituto da prescrição penal, resultante da demora na persecução penal

II – Atenta a previsão do corpo do art.º 125.º do CP, bem como, mormente, da alínea a) do seu n.º 1, apenas a lei, que não o foro judicial, pode criar ou estabelecer outras causas de suspensão além das aí especialmente previstas

III – Por isso que, nomeadamente, o deferimento do requerimento da substituição do pagamento da pena de multa pela prestação de trabalho a favor da comunidade não constitui causa de suspensão do decurso do prazo de prescrição da pena, nos termos do citado art.º 125.º, n.º 1, alínea a)

Por conseguinte, não se verificando quaisquer causas de interrupção ou suspensão da prescrição da pena e considerando a data do trânsito em julgado da sentença, a natureza da pena e o prazo estabelecido no artigo 122.º, n.º 1 al. d) do Código Penal, é de concluir que a pena de multa aplicada à arguida (...) nos presentes autos extinguiu-se, por efeito da prescrição

Caso existam, recolha-se imediatamente os mandados de detenção

Notifique

Após trânsito, remetam-se boletins ao registo criminal

Oportunamente, arquive.” * Inconformado com a decisão, o Ministério Público interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões: 1.ª Por sentença transitada em julgado em 16 de setembro de 2016 (…) foi condenada na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de € 6,00 perfazendo o montante de € 900,00

  1. Em 3 de novembro de 2017 requereu a substituição da pena de multa pela prestação de trabalho a favor da comunidade, deferido por despacho de 11 de dezembro de 2017

  2. Por despacho de 4 de outubro de 2018 foi revogada a prestação de trabalho a favor da comunidade por não ter dado início à prestação de trabalho

  3. O requerimento a solicitar a prestação de trabalho a favor da comunidade constituiu causa de suspensão da prescrição da pena nos termos do disposto no artigo 125.º, n.º 1 alínea a) do Código Penal e o trânsito em julgado do despacho que revogou a pena de substituição faz terminar a suspensão

  4. O prazo de prescrição da pena de multa...

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