Acórdão nº 694/11.1BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 13 de Maio de 2021
Magistrado Responsável | SUSANA BARRETO |
Data da Resolução | 13 de Maio de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I - Relatório A Fazenda Pública não se conformando com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a oposição deduzida por A...
, revertido no âmbito processo de execução fiscal n.º 334420100...
e apensos, originalmente instaurado contra a sociedade G... - Cofragens Lda., para cobrança coerciva de dívidas de IRC, IVA, e coima fiscal, no montante global de € 92.208,40, dela veio interpor o presente recurso.
Nas alegações de recurso apresentadas, a Recorrente formula as seguintes conclusões: I. Pelo elenco de fundamentos acima descritos, infere-se que a douta sentença, ora recorrida, julgou procedente a oposição à margem referenciada com as consequências aí sufragadas, por ter considerado que o oponente não praticou actos de gerência, sendo parte ilegítima.
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Neste âmbito, o thema decidendum, assenta em determinar se o oponente havia ou não exercido a gerência de facto da sociedade devedora originária e se foi por sua culpa que o património da sociedade se delapidou.
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O oponente foi gerente da sociedade uma vez que a mesma se obrigava com a assinatura de qualquer dos gerentes nomeados, sendo um deles, o ora oponente, não tendo logrado provar que nunca exerceu a gerência até porque assinou contratos, sendo que o seu nome, enquanto gerente, vinculava a sociedade devedora originária perante terceiros, descontando como membro do órgão estatutário, isto é, como gerente pois só sendo gerente é que poderia efetuar os descontos para a Segurança Social naquela modalidade, pelo que a AT provou que o oponente era gerente desde 07/08/2001.
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No decurso dos presentes autos e através da prova testemunhal, foi também possível verificar que o Oponente, era trabalhador da sociedade, e nas obras/empreitadas das cofragens, fazia o seu trabalho sem qualquer orientação do Sr. G..., dando ordens aos trabalhadores contratados pela empresa, neste sentido parece-nos também ter ficado devidamente demonstrado, que não era um simples trabalhador, visto que orientava as obras e os trabalhos juntamente com o Sr. J..., conforme a testemunha deixou bem explicito nas suas declarações.
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Nomeadamente ao tempo da gravação 11:31, o Sr. P..., quando questionado sobre o facto de quem eram as pessoas que orientavam os trabalhos na obra (excluindo o Sr. G...), portanto se seria o Oponente ou o Sr.
J... que dirigiam a obra, o mesmo declarou “Em principio eram os dois que orientavam a obra”, no tempo 11:59, referiu “O Senhor A... também estava à frente da obra”.
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Pelo que se entende que o Oponente dirigia o trabalho em obra no exercício da sua função de gerente.
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Mas, para além do oponente, eram gerentes o seu sogro e o seu cunhado, sendo que o seu sogro faleceu em 13/05/2008, tendo tomado os destinos da devedora originária desde essa data, no intuito de cumprir os contratos realizados pelo seu sogro.
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Ora, neste circunspecto, o oponente é também herdeiro de G..., indiretamente do seu sogro, sendo que a herança, em 1.ª linha e nos termos do art.º 2068.º do CC, responsabiliza pelas dividas.
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Na verdade, tal como foi referido a sociedade não tinha bens e a insuficiência do património da sociedade reflectiu-se na esfera da devedora originária e, consequentemente, na dos herdeiros, podendo estes serem revertidos.
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Contudo, o oponente foi revertido por ter sido gerente e no período da sua gerência ter sido posto a pagamento a dívida exequenda, nos termos do art.º 24.º, n.º 1, al. b) da LGT, isto é, em 2010, pelo que é parte legítima.
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Por outro lado, também, não conseguiu provar que a insuficiência do património não foi por culpa sua, uma vez que a sua actuação não foi diligente, tendo desprotegido os credores.
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Mas, ainda que se admitisse que o oponente, actuou esporadicamente na sua condição de gerente, tal não seria suficiente para a eximir da responsabilidade porque “a jurisprudência tem vindo também a entender que a lei não exige, para a responsabilização dos gerentes pelas dívidas fiscais das sociedades, que estes exerçam uma administração continuada, nem em todas as áreas por que se desenvolve a actividade da sociedade, bastando que pratiquem actos exteriorizadores da vontade e que vinculem a sociedade”. – vide Ac. do TCAN, de 06/07/2006, proferido no proc. n.º 00129/98 XIII. Em sede de oposição, é ao responsável subsidiário que incumbe o ónus da prova de que não exerceu a administração de facto.
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Por outro lado, o oponente não provou a inexistência da prática de atos de gerência tais como as fichas bancárias em que se ateste a impossibilidade do oponente ter acesso a dados de contas bancárias e legitimidade na sua movimentação, nem outros quaisquer documentos que comprovassem que não exerceu a gerência bem pelo contrário, pois ao assinar cheques significa que tem acesso às contas bancárias e, ao emiti-los vinculou a sociedade a sociedade, com a sua assinatura, perante terceiros.
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A atuação do oponente como gerente da sociedade, fez, assim, crer a terceiros que era responsável pelas obrigações que advinham em resultado do exercício da atividade da sociedade.
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“Quanto à responsabilidade dos oponentes, não podendo esquecer que o regime é o do art.º 24.º da LGT, para ilidir a culpa o oponente teria que fazer uma prova positiva de que não existiu qualquer relação causal entre a sua actuação e a insuficiência patrimonial da empresa que geriu. E tal só será alcançado se o oponente alegar factos, por exemplo, respeitantes à situação financeira económica da empresa, à sua actuação concreta para alcançar os objectivos para que a sociedade se constituiu. Quais sejam esses factos em concreto, apenas cada gerente o poderá saber pois dependem das particularidades de cada sociedade, da actividade que desenvolvida, da conjuntura em que laboraram. Certo é que nada valem para aquele efeito as afirmações de foi um gerente rigoroso ou sóbrio, ou criterioso, ou diligente ou cumpridor”.
– vide Ac. do TCAN de 07/12/2005, rec. 0086/01 XVII. Ora, o oponente não logrou fazer esta prova, não se podendo concluir que não tenha agido com culpa quanto ao facto de o património social se ter revelado inexistente quando a dívida exequenda foi instaurada.
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Na verdade, não pode a Fazenda corroborar com a posição assumida pelo Tribunal a quo quando considera que o oponente é parte ilegítima.
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Neste desiderato, não pode ser considerado o oponente como parte ilegítima da execução fiscal, pelo que a douta sentença deverá ser substituída por uma outra que considera o oponente como parte legítima da execução fiscal.
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Assim, a responsabilidade do oponente, nos termos da al. b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT, “nada tem que ver com o facto constitutivo da obrigação tributária não cumprida, mas com deveres funcionais de administração, mais concretamente, pela inobservância culposa das disposições legais destinadas à protecção do credor tributário e que foi a causa da insuficiência do património social para a satisfação daquele crédito” – vide PAULO MARQUES, Responsabilidade tributária dos gestores e dos técnicos oficiais de contas, 2011, Coimbra Editora, pág. 176 XXI. “A culpa afere-se em abstracto, pela diligência de um administrador ou gerente pressuposto medianamente diligente e respeitador das boas práticas comerciais (bonus pater familiae, na tradição jurídica), operando com a teoria da causalidade, seguindo um processo lógico de prognose póstuma, por forma a averiguar se a actuação daquele enquanto representante da sociedade originária devedora, concretizada quer em actos positivos quer em omissões, foi adequada à insuficiência do património societário para a satisfação dos créditos fiscais” - vide Ac. do TCAS de 06/10/2009, proferido no proc. n.º 03267/09).
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Nos termos do n.º 1 do art.º 64.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC), os gerentes ou administradores da sociedade devem observar: “a) Deveres de cuidado, revelando a disponibilidade, a competência técnica e o conhecimento da actividade da sociedade adequados às suas funções e empregando nesse âmbito a diligência de um gestor criterioso e ordenado; E b) Deveres de lealdade, no interesse da sociedade, atendendo aos interesses de longo prazo dos sócios e ponderando os interesses dos outros sujeitos relevantes para a sustentabilidade da sociedade, tais como os seus trabalhadores, clientes e credores.” XXIII. O oponente, ao alegar que não teve intervenção nos destinos da sociedade, como era seu dever tendo legitimidade para tal, apenas indica que norteou a sua atuação, enquanto administrador da devedora originária, por condutas omissivas, ou seja, que se demitiu dos seus deveres, nomeadamente de vigilância.
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O ora oponente, na sua atuação enquanto administrador da sociedade violou o dever diligência, tal como vimos a aludir, pelo que é parte legítima na presente oposição.
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Pelo facto de não ter provado de que não era gerente de facto ou por quem era exercido esse cargo, através de ata e, por se ter afirmado e provado que o oponente era gerente à data da constituição da dívida exequenda, foi por sua culpa que a sociedade devedora originária não cumpriu com as suas obrigações.
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Ou seja, a culpa “…traduz-se sempre num juízo de censura em relação à actuação do agente: o lesante, pela sua capacidade, e em face das circunstâncias concretas da situação, podia e devia ter agido de outro modo”. - vide Ac. TCAS de 23/06/2009, proferido no Proc. n.º 02890/09 XXVII. Face ao exposto, demonstra-se a culpa do oponente, nomeadamente por omissão de deveres legais que lhe estavam cometidos por força da sua qualidade de gerente na devedora originária.
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Efetivamente, é à gerência (enquanto órgão cujas funções são definidas por lei que força criá-lo para permitir à sociedade atuar no comércio jurídico) que incumbe (pode e deve) praticar todos os actos necessários para o cumprimento dos deveres impostos por lei à sociedade e os necessários ou convenientes para...
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