Acórdão nº 1528/07.7BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 13 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução13 de Maio de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I-RELATÓRIO C....., SA (doravante Recorrente), com os demais sinais nos autos, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o ato de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC), referente ao exercício de 2002, e respetivos juros compensatórios, no valor global de €73.719,75.

*** A Recorrente veio apresentar as suas alegações, formulando as conclusões que infra se reproduzem: “1. A Recorrente contabilizou em 2002 facturas de 2001, que foram recebidas após o fecho de contas em 15 de Janeiro de 2001, o que tem sucedido desde a transformação em sociedade anónima, criando uma compensação entre os valores considerados como custo em anos diferentes, tendo já suportado em 2001 a diferença de imposto que pretende agora adicionar à sua matéria colectável, sucedendo o mesmo de 2002 face a 2003; 2. A correcção efectuada pela DDF enferma de violação de lei, por não se conformar com o princípio da justiça com dignidade constitucional e legal (artigo 55.º da LGT e artigo 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (“CRP”)), visto que a correcção não teve por objecto o interesse público, uma vez que o Estado não ficou prejudicado com a actuação da Recorrente, nem está em causa a obtenção de um imposto devido, apenas a Recorrente tem sido prejudicada pela não contabilização de todos os custos do respectivo exercício; 3. Aliás, não foi efectuada qualquer omissão voluntária e intencional com vista a operar a transferência de resultados entre exercícios; 4. A actuação da Recorrente tem demonstrado ser-lhe prejudicial em longo prazo, conforme se pode atestar pelo quadro, junto como doc. 4 na petição inicial de impugnação judicial, que demonstra peremptoriamente todos os custos diferidos de um exercício para outro, desde 1997 a 2006, nunca tendo o Estado sido prejudicado; 5. A Recorrente aplicou o princípio contabilístico da consistência em conjugação com o princípio da especialização dos exercícios, embora considerasse como fecho de contas a data de 15 de Janeiro do ano seguinte, para recepção e contabilização da documentação; 6. Deve ter-se em consideração, na aplicação ao caso concreto dos princípios da verdade material, igualdade tributária e capacidade contributiva, de forma a assegurar a adequada justiça fiscal, visto que nunca qualquer pagamento de IRC ficou em causa, apenas o momento do seu cálculo; 7. No mesmo sentido pode ler-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no âmbito do processo n.º 0291/08, de 25 de Julho de 2008, do qual resulta a conclusão que, no caso em apreço, afigura-se efectivamente irrelevante o ano em que o imposto é deduzido, uma vez que o impacto é sempre similar no sentido da dedução daquele custo ao imposto a ser pago (de taxa fixa no caso do IRC), ou podendo dar lugar a um acumular de prejuízos fiscais a deduzir futuramente.

  1. Aliás, conforme decorre ainda deste Acórdão do STA, as deduções em causa deverão ser aceites por não terem resultado de omissões voluntárias e intencionais, com vista a operar transferência de resultados entre exercícios, por exemplo: quando está para acabar ou, para se iniciar um período de isenção, quando há interesse em reduzir os prejuízos de determinado exercício, para retirar benefícios do seu reporte e quando se pretende reduzir o montante dos lucros tributáveis para reduzir o IRC, no caso concreto.

  2. Nunca se verifica qualquer prejuízo para a Administração Tributária, uma vez que ao deduzir um custo no ano seguinte àquele em que o deveria ter deduzido, não diminuiu o montante do imposto correspondente no ano em que tal diminuição deveria ter ocorrido, só tal correndo no ano seguinte e, paralelamente, a Administração Tributária não tem qualquer prejuízo, pois recebera no ano anterior o imposto sem que fosse tido em conta esse custo que o deveria diminuir.

  3. A manter-se a correcção considerada pelos Serviços de Inspecção Tributária, nos termos supra, isso conduz efectivamente a uma dupla tributação (em sentido não técnico), uma vez que, embora não se trate da tributação do mesmo facto tributário pelo mesmo imposto por duas vezes, tal prática conduz a que a Recorrente seja tributada em dois anos distintos em IRC sem que sejam considerados os custos apresentados, devidamente comprovados e sem correcções.

  4. A Recorrente admitiu as correcções mencionadas nas secções 7.2 a 7.6 do Relatório, excepto no que à prestação de serviços do Exmo. Sr. M..... diz respeito, os quais se encontram devidamente comprovadas pelo respectivo contrato realizado em 2002, nos termos do artigo 23.º, n.º 1, alínea d), do CIRC; 12. O entendimento da DDF do artigo 5.º número 2 alínea a) do Decreto Legislativo Regional não tem qualquer apoio na letra da lei nem tão pouco se conforma com os cânones de interpretação jurídica consagrados no artigo 9.º do Código Civil aplicáveis por remissão do artigo 11.º da LGT; 13. Este entendimento (da DDF), se porventura fosse adoptado teria a consequência de permitir que uma disposição prevista num Decreto Legislativo Regional derrogasse o disposto numa Lei da República, ao arrepio de princípios consagrados na Constituição da República Portuguesa; 14. O facto de a Recorrente ter a sua sede na Região Autónoma dos Açores é, por si só, e de acordo com o citado artigo 5.º número 2 alínea a) do Decreto Legislativo Regional, suficiente para que a redução da taxa de IRC nacional consagrada no Decreto Legislativo Regional seja aplicada, sendo essa a intenção inequívoca do legislador nacional e regional; 15. A distinção, prevista quer na Lei de Finanças das Regiões Autónomas e no Decreto Legislativo Regional”, entre “residentes” e “não residentes” corresponde ao critério da localização da sede ou direcção efectiva, que consta do Código do IRC e da Convenção Modelo; 16. O critério de localização deve assim ser aferido de acordo com a lei, considerando a sua sede ou direcção efectiva de acordo com o devidamente estatuído no seu contrato de sociedade, sendo que a sede social de uma sociedade se determina pela dos seus órgãos, sendo na Região Autónoma dos Açores que reuniam o Conselho de Administração e a Assembleia Geral da Recorrente.

  5. Não poderá assim considerar-se como outra a localização da Recorrente, considerando as regras da interpretação da lei fiscal, nos termos do artigo 11.º da LGT.

  6. Realçando ainda que a actividade da Recorrente é de venda por correio e à distância de objectos de arte e decoração estando, por consequência, ligada à realização da sua actividade por todo o território nacional.

  7. As importâncias de IRC pagas são efectivamente receita da Região Autónoma dos Açores, pelo facto de a sede social da Recorrente estar localizada em Ponta Delgada, independentemente da percentagem de lucro tributável “obtido” na Região e fora dela, e isto exclusivamente por força da aplicação do critério legal da localização da sede.

    Nestes termos e nos demais de Direito aplicáveis, que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente, e, em consequência, ser determinada a anulação do correspondente acto de liquidação e do acto de compensação, em apreço, com base na sua ilegalidade e inconstitucionalidade, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!” *** A Recorrida, devidamente notificada para o efeito, optou por não apresentar contra-alegações.

    *** O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

    *** Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

    *** II - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: Com relevância para a decisão da presente impugnação, consideram-se provados os seguintes factos: A. A Impugnante, “C....., S.A.”, é uma sociedade anónima, que tem como objeto social a comercialização de uma diversidade de coleções de objetos de arte, alguns deles manufaturados em metais preciosos, a que corresponde o CAE 52610 (cfr. fls. 64 do PAT – facto não controvertido); B. No exercício de 2002, a Impugnante tinha a sede social na Região Autónoma dos Açores, localizada em Ponta Delgada, estando enquadrada, para efeitos de IRC, no regime geral e, em sede de IVA, no regime normal com periodicidade mensal (cfr. fls. 65 do PAT – facto não controvertido); C. No exercício de 2002, a atividade da Impugnante foi desenvolvida, em cerca de 98,52%, no Continente, e em 1,48% nos Açores (cfr. fls. 77 do PAT – facto não controvertido); D. A Impugnante foi objeto de uma ação inspetiva, credenciada pela Ordem de Serviço n.º OI2006003538, de âmbito geral, com incidência no exercício de 2002 (cfr. fls. 64 do PAT); E. Em 15/12/2006, a Impugnante foi notificada do projeto de relatório de inspeção tributária elaborado na sequência da ação inspetiva mencionada na alínea D), para exercer, querendo, no prazo de 10 dias, o direito de audição prévia, nos termos dos artigos 60.º da LGT e 60.º do RCPIT (cfr. “Mandado” e “Certidão de Notificação” constantes de fls. 131 a 133 do PAT, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais); F. Em 27/12/2006, deu entrada, na Direção de Finanças de Lisboa, requerimento através do qual a impugnante exerceu o respetivo direito de audição prévia (cfr. Doc. constante de fls. 83 a 85 do PAT, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais); G. No âmbito do referido procedimento inspetivo, foi elaborado relatório final de inspeção tributária, sobre o qual recaiu Despacho de concordância da Chefe de Divisão dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa, e de cujo teor se retira o seguinte: 3- Tributação peta taxa da Região Autónoma dos Açores versus tributação pelo regime geral O sp em 2002 tinha a sede social na Região Autónoma dos Açores» em Ponta Delgada, tendo por esta razão sido tributado em...

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