Acórdão nº 314/21 de Tribunal Constitucional (Port, 13 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Lino Rodrigues Ribeiro
Data da Resolução13 de Maio de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 314/2021

Processo n.º 1073/19

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra, em que é recorrente o Ministério Público e são recorridos A., B., C., Lda., D. e E., Lda., o primeiro veio interpor recurso de constitucionalidade ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), da decisão proferida por aquele tribunal que recusou a aplicação, com fundamento em inconstitucionalidade, da norma incriminatória relativa ao crime de lenocínio – i.e., o n.º 1 do artigo 169.º do Código Penal – e, consequentemente, absolveu os arguidos.

2. O Ministério Público alegou no sentido da não inconstitucionalidade, concluindo:

«1. A norma do artigo 169.º, n.º 1, do Código Penal, na redação da Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro, na qual se prevê e pune o crime de lenocínio, não viola o artigo 18.º, n.º 2, da Constituição, não sendo, por isso, inconstitucional.

2. Termos em que deve ser negado provimento ao recurso.»

3. Os recorridos D. e E., Lda., contra-alegaram, concluindo:

«1ª – O artº169º-1 do CP é uma norma inconstitucional por violar o tecido do preceituado normativo nos artºs 18º-2 e 17º da CRP;

2ª – Deverá ser declara a inconstitucionalidade do crime de lenocínio simples incutido naquele inciso legal.»

4. As recorridas A. e B. também contra-alegaram, concluindo:

«1ª

O objeto do recurso (obrigatório) apresentado pelo Ministério Público circunscreve-se à questão da conformidade ou inconformidade constitucional, da norma do nº 1 do artº 169º do Código Penal.

A alteração ao Código Penal levada a cabo pela Lei nº 65/98, de 2/09, tornou evidente, sem qualquer margem para dúvidas, que a incriminação do comportamento subjacente ao lenocínio, p.p. então no nº 1 do art. 170º, prendia-se (e ainda se prende) com razões de ordem moral.

Ao eliminar o requisito “explorando situações de abandono ou de necessidade económica”, o legislador destapou o “fraco véu” que ainda permitia considerar estar aqui em causa o bem jurídico “liberdade sexual”, verificando-se objetivamente que uma tal incriminação em nada contende ou abarca a defesa da liberdade sexual.

Com a tipificação do lenocínio na sua versão atual (herdeira da alteração da Lei nº 65/98), não temos quaisquer dúvidas que a norma do nº 1 do art. 169º do CP padece do vício de inconstitucionalidade.

Temos por unanimemente aceite que no nosso ordenamento jurídico, o Direito Penal tem como função a tutela subsidiária de bens juridicamente reconhecidos como valiosos, tendo como referente a “consciência jurídica geral” – a tutela penal só deve intervir quando haja lesões a bens jurídicos dignos de tutela e, havendo, quando tais lesões não possam ser contrariadas por meios não criminais de política social.

A intervenção do direito penal implica graves restrições em matéria de direitos e liberdades fundamentais, pelo que a tutela penal só se justifica quando for o único modo de política social para a preservação das condições indispensáveis da mais livre realização possível da personalidade de cada homem na comunidade.

Aliada a esta abordagem da necessidade da tutela penal e da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT