Acórdão nº 249/19.2PAOLH-C.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 11 de Maio de 2021
Magistrado Responsável | JO |
Data da Resolução | 11 de Maio de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam os Juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - RELATÓRIO Nos autos de instrução nº 249/19.2PAOLH, que correm termos no Juízo de Instrução Criminal de Faro (Juiz 1), e mediante despacho judicial, foi rejeitado o requerimento para abertura da instrução apresentado pelo arguido EJAG, com fundamento na sua inadmissibilidade legal
Inconformado com essa decisão, recorreu o arguido, terminando a motivação do recurso com as seguintes (transcritas) conclusões: “1. Por despacho datado de 03-11-2020 o Ministério Público arquivou a denúncia apresentada pelo ora Recorrente por violência doméstica e proferiu despacho de acusação pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, alíneas b) e c), n.º 1, alínea a) e n.º 4 e 5 do Código Penal
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Não se conformando nem com o despacho de arquivamento nem com o despacho de acusação o ora Recorrente requereu a abertura de instrução, quer na qualidade de Assistente, quer na qualidade de arguido
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O tribunal “a quo” não apreciou o RAI relativamente ao despacho de arquivamento e rejeitou o RAI apresentado pelo arguido, por o mesmo ser legalmente inadmissível ao abrigo do disposto nos artigos 286.º, n.º 1 e 287.º, n.º 2 e 3, do Código de Processo Penal
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O ora Recorrente não se conforma com o despacho recorrido, em primeiro lugar porquanto estamos perante uma omissão de pronúncia
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O ora Recorrente reúne, desde o momento em que apresentou a participação que deu origem aos presentes autos, os pressupostos legais para ser admitido a intervir nos autos como assistente, mas certamente por manifesto lapso nunca o requereu
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Quando o ora recorrente requereu a abertura de instrução estava convencido de que havia requerido a sua intervenção nos presentes autos na qualidade de assistente, motivo pelo qual não foi requerida simultaneamente a sua constituição como assistente, pressuposto legal da abertura da fase de instrução
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Ao que acresce que, verificado que o ora Recorrente se intitula de Assistente, mas não tinha nem requereu a constituição de assistente, podia/deveria o tribunal “a quo” formular o convite ao ora Recorrente a requerer formal e expressamente a sua constituição como assistente, dado resultar demonstrado nos autos que o requerente reúne os requisitos legais de que dependia a sua admissão nessa qualidade
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O despacho recorrido viola assim o disposto no artigo 68.º, n.º 3, do Código de processo Penal, porquanto o tribunal “a quo”, ao invés de se obviar de apreciar o requerimento de abertura de instrução, deveria ter formulado o convite ao ora Recorrente para requerer a sua constituição de Assistente
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Termos em que deverá o despacho recorrido ser declarado nulo por omissão de pronúncia e por violação do disposto no artigo 68.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, e do princípio de acesso ao direito, consagrado no art.º 20 da CRP, e, consequentemente, deverá ser proferido outra que conceda a oportunidade processual ao ora Recorrente de requerer a sua constituição de Assistente
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Sem prescindir, andou mal o tribunal “a quo” ao rejeitar o requerimento de abertura de instrução, tendo violado a finalidade e o âmbito da instrução, previsto no artigo 286.º do CPP, pois o aqui recorrente cumpriu o disposto nos artigos 286.º e 287.º, n.ºs 1 e 2, ambos do CPP
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Senão vejamos, o requerimento de abertura de instrução foi junto aos autos no prazo estabelecido no nº. 1 do artigo 287° do CPP - 20 dias
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O requerimento de abertura de instrução foi apresentado por quem tem legitimidade
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Nesse requerimento foram expostas as razões de facto e de direito que motivam a discordância relativamente ao arquivamento, e, bem assim, à acusação
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Logo, não poderá a abertura de instrução ser rejeitada por inadmissibilidade legal, pois o requerimento de abertura de instrução apresentado é legalmente admissível
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Tendo sido apresentado em súmula as razões de facto pelas quais discorda do despacho de arquivamento e bem assim do despacho de acusação, conforme dispõe o artigo 287.º, n.º 2, do CPP, apresentando também a sua versão dos factos e peticionando a sua não pronúncia
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Termos em que deverá ser revogado o despacho objeto do presente recurso, substituindo-o por outro que receba o requerimento e declare aberta a fase de instrução, em cumprimento do disposto nos artigos 286.º e 287.º do Código Processo Penal e da nossa Constituição
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O Tribunal “a quo”, ao rejeitar liminarmente o Requerimento apresentado pelo ora Recorrente para abertura da Instrução com fundamento em inadmissibilidade legal, violou o disposto no artigo 287.º, n.º 3, do CPP
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Tal despacho é uma evidente expressão de discricionariedade e uma evidente prevalência da forma em detrimento da verdade material, pela qual o Processo Penal, para não dizer toda a Justiça, sempre deverá ser norteado
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O despacho de que ora se recorre viola o disposto no artigo 287.º, n.º 3, do CPP, bem como todos os direitos constitucionais e garantias do processo criminal previstos na nossa Constituição, uma vez que in casu não estamos perante nenhuma situação que configure uma situação de inadmissibilidade legal da instrução
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Termos em que deverá ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogado o despacho ora recorrido, por violação do disposto nos artigos 286.º, n.º 1, e 287.º, n.º 1, al. b), e n.º 3, do CPP, e proferido outro que admita o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo ora Recorrente
Nestes termos e nos melhores de direito, deverá V. Exa. dar provimento ao presente recurso e revogar o douto despacho recorrido, por violação dos artigos 286.º e 287.º do Código de Processo Penal e bem assim do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa, proferindo outro que admita o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo ora recorrente, assim se fazendo justiça”
* O Exmº Magistrado do Ministério Público junto da primeira instância respondeu ao recurso, defendendo a improcedência total do mesmo
O Exmº Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal da Relação de Évora emitiu douto parecer, pronunciando-se no sentido da improcedência do recurso
Foi dado cumprimento ao disposto no artigo 417º, nº 2, do C. P. Penal, não tendo sido apresentada qualquer resposta
Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido à conferência
II - FUNDAMENTAÇÃO 1 - Delimitação do objeto do recurso
No caso destes autos, e vistas as conclusões extraídas pelo recorrente da motivação do recurso, as quais delimitam o objeto do recurso e definem os poderes cognitivos deste tribunal ad quem, nos termos do disposto no artigo 412º, nº 1, do C. P. Penal, a questão a apreciar prende-se com a aferição da existência de motivo legal de rejeição da instrução, face ao requerimento para abertura de instrução apresentado pelo arguido, isto é, saber se o despacho recorrido deve ser revogado e substituído por outro que admita o requerimento a pedir a abertura de instrução em causa
2 - A decisão recorrida
O despacho revidendo é do seguinte teor: “Tendo o arguido constituído mandatária a Drª …, subscritora do RAI, tendo em momento anterior constituído mandatária a Drª … (procuração a fls. 136 dos autos principais e fls. 113 do apenso A), notifique o mesmo para, no prazo de 10 dias, informar se pretende manter ambas as mandatárias ou se pretende revogar o mandato conferido a esta última mandatária
Requerimento de abertura de instrução do arguido EJAG – fls. 243 a 249 e 263 a 270 (pese embora se denomine de arguido/assistente, o mesmo não reveste esta última qualidade nos autos, pois nunca requereu a sua intervenção nos autos nessa qualidade e os termos do RAI apenas respeitam ao despacho de acusação do Mº Pº e não ao despacho de arquivamento): O requerimento é tempestivo, o Tribunal é competente e o requerente tem legitimidade
Vejamos, porém, se o mesmo é admissível
Nos presentes autos, findo o inquérito o Mº Pº deduziu acusação contra o arguido EG, imputando ao mesmo a prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152º, nº 1, als. b) e c) e nº 2, al. a) e nºs 4 e 5 do Código Penal
O arguido não se conformou com a acusação, tendo vindo requerer a abertura de instrução, pugnando pela sua não pronúncia
Sucede que, não obstante conclua pedindo a sua não pronúncia, compulsado o RAI, verifica-se que no âmbito do mesmo o arguido, embora tecendo considerações sobre aspetos vários, desde o sistema de justiça, o amor que teve pela denunciante, a sua beleza, em contraponto da dele arguido, aquela ter imputado ao arguido a...
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