Acórdão nº 0124/17.5BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelPAULO ANTUNES
Data da Resolução12 de Maio de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I. Relatório I.1.

A…………..., S.A.

, melhor sinalizada nos autos, vem interpor recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 27/10/2020, que julgou improcedente a impugnação que intentara contra as liquidações de Imposto Especial sobre o Jogo (IEJ) dos meses de setembro, outubro e novembro de 2016, nos montantes de € 1.111.925,73, € 1.148.909,33 e € 989.440,30, respetivamente, referentes à concessão da zona de jogo da Póvoa de Varzim.

I.2.

Aduziu alegações que rematou com o seguinte quadro conclusivo: “1ª) A presente impugnação tem por objecto liquidações do Imposto de Jogo; 2ª) A circunstância de a actividade de jogo exercida pela ora recorrente ser feita ao abrigo de um contrato de concessão celebrado com o Estado, não retira a natureza de imposto ao... Imposto de Jogo; 3ª) O imposto de jogo não possui base contratual – como assinala a doutrina, o regime tributário da actividade do jogo é um regime exclusivamente legal; 4ª) Aliás, a recorrente, na petição inicial da impugnação, não contesta a validade do contrato de concessão, nem a validade de qualquer cláusula de tal contrato; 5ª) A recorrente contesta a legalidade de liquidações do imposto de jogo por este, tal como definido e estruturado no Decreto-Lei nº 422/89, de 2/12 (Lei do Jogo), violar os princípios constitucionais da legalidade, capacidade contributiva, da tributação pelo rendimento real e da igualdade; 6ª) A recorrente contesta, também, a legalidade de liquidações do Imposto de Jogo por não estarem devidamente fundamentadas e por violarem o disposto na Lei do Jogo; 7ª) Tendo em conta a clássica definição de tributo –“prestação patrimonial estabelecida por lei a favor de uma entidade que tem a seu cargo o exercício de funções públicas, com o fim imediato de obter meios destinados ao seu financiamento”, é indiscutível que o imposto de jogo, cujas liquidações se impugnaram, é um tributo e, além disso, dentro da classificação dos tributos, é um imposto; 8ª) A existência de um contrato de concessão não altera a natureza do tributo em questão, não havendo aqui, como assinalada na doutrina, qualquer “lei contrato”, ou qualquer “tributo contratual”; 9ª) As liquidações de Imposto de Jogo aqui impugnadas, são ilegais por terem como fundamento legal o Decreto-Lei nº 422/89, de 2/12, sendo que tal diploma, na parte fiscal, é organicamente inconstitucional por dizer respeito a matéria da competência da Assembleia da República e a lei de autorização legislativa não indicar os critérios mínimos orientadores da autorização; 10ª) As liquidações impugnadas são, também, ilegais, porque o referido Decreto-Lei nº 422/89, é inconstitucional quanto a uma outra vertente do princípio da legalidade; 11ª) Na verdade, o referido diploma atribuiu à autoridade administrativa a competência para fixar, para a tributação sobre as máquinas de jogo, um capital em giro, que constitui a incidência real do imposto; 12ª) Ora, o princípio da legalidade, na sua vertente de reserva de lei, é violado através dessa deslegalização, ao atribuir-se à autoridade administrativa a competência para fixar um elemento essencial do imposto; 13ª) As impugnadas liquidações são, também ilegais, por violação dos princípios constitucionais da capacidade contributiva e do rendimento real; 14ª) É que o imposto do jogo incide sobre o chamado “capital em giro” dos jogos, sem qualquer relação, nem com a receita bruta obtida pela recorrente nem, muito menos, com o lucro; 15ª) O imposto de jogo incide sobre verdadeiras e autênticas presunções inilidíveis de matéria colectável, violando o artº 104º, nº 2 da Constituição; 16ª) As características próprias do Imposto de Jogo, não permite afastar a sua sujeição aos princípios constitucionais da capacidade contributiva e do rendimento real; 17ª) A circunstância de o Imposto de Jogo incidir sobre o “capital em giro”, não justifica que a fixação dessa matéria tributável seja feita com ignorância ou desprezo total por um mínimo de correspondência com a capacidade contributiva e o rendimento real da recorrente; 18ª) A Lei do Jogo é, também, inconstitucional, por violação do princípio constitucional da igualdade, ao fixar taxas de imposto diferentes para as diversas concessões da actividade de jogo e, portanto, para os diversos contribuintes que se dedicam a essa actividade, sendo certo que, essa diferenciação entre os diversos contribuintes não resulta dos contratos de concessão, mas sim da Lei do Jogo; 19ª) As liquidações impugnadas são ilegais por insuficiente fundamentação quanto à fixação, pelo Turismo de Portugal, do “capital em giro inicial”, já que as deliberações das Comissões de Jogos não indicam os concretos critérios que estiveram na base da concreta fixação, para cada concreta máquina, do capital em giro inicial; 20ª) As liquidações impugnadas são também ilegais por esse capital em giro inicial ter sido fixado mensalmente, quando a Lei do Jogo estabelece uma fixação anual; 21ª) As liquidações impugnadas são, ainda, ilegais, porque o Turismo de Portugal, em violação frontal da subalínea b) da alínea c) do artº 87º da Lei do Jogo, ter fixado o “capital em giro inicial” sem tomar em consideração as características das diversas máquinas de jogo e das circunstâncias concretas verificadas na sua utilização; 22ª) Assim, a douta sentença recorrida fez, salvo o devido respeito, uma errada interpretação das normas e princípios aplicáveis.

Termos em que o presente recurso deve ser julgado procedente, revogando-se a sentença recorrida e anulando-se as liquidações impugnadas, como é de Justiça.

Mais requer, por estarem presentes os requisitos contidos no artº 6º, nº 7, do Regulamento das Custas Processuais, a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça que venha a ser considerada devida.” I.3.

O recorrido Instituto do Turismo de Portugal, I.P.

formulou contra-alegações que concluiu nos termos que se seguem: 1. O imposto especial de jogo não é um imposto geral sobre o rendimento, é um imposto especial com características de extrafiscalidade, que tem uma história, que só pode ser verdadeiramente compreendido quando analisado de forma integral e sistematicamente, continuando a ser válidas as razões que estiveram na sua criação e que é aplicável a um leque restrito de contribuintes, 7 concessionárias de zonas de jogo.

  1. O contrato de concessão em causa nestes autos foi celebrado em 29 de dezembro de 1988, quando estava em vigor o Decreto-Lei n.º 48 912, de 18 de março de 1969, que continha o regime legal de exploração de jogos de fortuna ou azar, incluindo o regime tributário que enformava o contrato. O Governo em 1989, ao aprovar o novo regime que disciplina a exploração de jogos de fortuna ou azar em casinos (Decreto-Lei 422/89) fê-lo acautelando a defesa dos direitos constituídos e das legítimas expetativas das atuais concessionárias da exploração de jogos de fortuna ou azar. Por esta razão a recorrente e demais concessionárias não se opuseram ao referido diploma nem o contestaram e inclusivamente declararam 11 anos mais tarde, em 2001, aquando da revisão dos contratos, aceitar expressamente todas as obrigações que do mesmo constam.

  2. A recorrente ignora as especificidades na regulação pelo Estado da exploração dos jogos de fortuna ou azar, que estão bem patentes na legislação que trouxe esses jogos para o campo da legalidade e, em especial, no regime fiscal introduzido e que se mantém fiel à sua estrutura desde o primeiro momento (1927) em que o Estado decidiu regular uma atividade contra a qual nada podiam já as disposições repressivas.

  3. A especialidade do imposto e as suas características de extrafiscalidade, implicam uma cautela por parte do...

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