Acórdão nº 514/20.6T8VNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelALEXANDRA PELAYO
Data da Resolução27 de Abril de 2021
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. n.º 514/20.6T8VNG.P1 Tribunal de origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto-Juízo Central Cível de Vila Nova de Gaia - Juiz 3 SUMÁRIO: ……………………………… ……………………………… ……………………………… Acordam, os Juízes que compõem este Tribunal da Relação do Porto: I-RELATÓRIO: BANCO B…, S.A., que incorporou o BANCO C…, S.A interpôs a presente PROVIDÊNCIA CAUTELAR DE ENTREGA DO BEM LOCADO nos termos do artigo 21º do Decreto-Lei nº 149/95 de 24 de Junho, contra D…, LDA., com sede em VILA NOVA DE GAIA, pedindo a imediata entrega à requerente do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, sob o n.º 2526, freguesia …, concelho de Vila Nova de Gaia, inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo 3536, devoluto de pessoas, animais e bens, pedindo ainda a requerente a dispensa do ónus de propositura da ação principal, nos termos do disposto no art.º 369.º, n.º 1, do Cód. Processo Civil.

Citada, a Requerida não deduziu oposição.

Veio a ser decretada a medida cautelar requerida, por decisão de 24-07-2020, com o seguinte teor: “Pelo exposto, defere-se a presente providência cautelar e, consequentemente, determina-se a imediata entrega à requerente do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, sob o n.º 2526, freguesia …, concelho de Vila Nova de Gaia, inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo 3536, devoluto de pessoas, animais e bens.

Considerando que a matéria adquirida no procedimento permitir formar convicção segura acerca da existência do direito acautelado e a natureza da providência decretada se mostra adequada a realizar a composição definitiva do litígio, dispensa-se a Requerente do ónus de propositura da ação principal, nos termos do disposto no art.º 369.º, n.º 1, do Cód. Processo Civil.

Custas a cargo da Requerente - cfr. art.º 539.º, n.º 1 do Cód. Processo Civil”.

Na sequência da declaração de insolvência da requerida D…, LDA., foi em 10.2.2020 foi proferido o seguinte despacho: “Em conformidade com o determinado no acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido no apenso A, nos termos do art. 162º do Código das Sociedades Comerciais (aplicado analogicamente), os autos prosseguem, neste tribunal, contra os sócios da requerida – E… e F….

Notifique.” No auto de diligência para entrega que teve lugar em 11.8.2020, o senhor funcionário Judicial fez ali consignar o seguinte: “De imediato dirigi-me ao imóvel a entregar e fui recebido pela Srª F… (….), que depois de informada do objetivo da diligência, declarou que aquela é a morada e casa da família, sendo o agregado familiar composto por oito pessoas, das quais cinco são menores. A mesma disse que reside ali há cerca de nove anos sem qualquer tipo de contrato com a requerida. A Srª F… disse que é sócia da requerida e que não se encontra em condições de abandonar o imóvel, uma vez que o agregado familiar não tem, neste momento para onde ir morar”, tendo aí declarado não proceder á diligência ordenada, invocando as limitações/imposições decorrentes da Lei 16/2020 de 29.5.

O Requerente veio requerer o reagendamento da diligência de entrega.

Foi proferido despacho datado de 19.2.2021 com o seguinte teor: “Requerimento de 15/10/2020: Conforme foi constatado pelo Sr. funcionário judicial que ali se deslocou (cfr. auto de diligência de 11/8/2020), os Requeridos residem, com o seu agregado familiar, no imóvel cuja entrega foi ordenada no presente procedimento cautelar (o que, aliás, também resulta do atestado da Junta de Freguesia …, que acompanha o requerimento de 15/10/2021).

Ora, apesar de não estar demonstrada a existência de qualquer contrato de arrendamento entre Requerente e Requeridos relativo àquele imóvel (sendo que a própria Requerida, naquele auto de 11/8/2020, reconheceu, perante o sr. funcionário judicial, que ocupa o imóvel sem qualquer tipo de contrato), o certo é que a concretização da entrega do imóvel constitui um acto executivo em sede do presente procedimento cautelar.

Assim, é forçoso aplicar o disposto no art. 6º-B nº6 da L 1-A/2020 de 19-3, com a redação da L 4-B/2021 de 1-2, de acordo com o qual são suspensos todos os atos a realizar em sede de processo executivo (aqui tendo de se incluir todo o tipo de atos executivos).

Pelo exposto (e não sendo a entrega de imóvel enquadrável nas diligências previstas nos nº7 ou 10, da mesma norma, pois não está em causa qualquer dano irreparável ou de difícil reparação para a Requerente), em conformidade com aquele art. 6º-B nº6, declaro suspensa a diligência de entrega do imóvel a que alude a sentença aqui proferida.

Notifique.

Inconformado o BANCO B…, S.A., veio interpor o presente recurso de Apelação, tendo apresentado as seguintes Conclusões: “1. Vem o presente recurso interposto do despacho que declarou suspensa a diligência de entrega do imóvel ao abrigo do artigo 6.º-B, n.º 6 da lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março, na sua redação atual.

  1. A presente providência cautelar foi intentada ainda antes do contexto pandémico que estamos a viver e foi decretada em Julho de 2020, não cabendo na disposição excecional da referida norma.

  2. Não se trata de nenhuma ação executiva, nem processo de insolvência, pelo que não há norma naquela legislação excecional que possa ser aplicada a este caso.

  3. O aqui Recorrente é o legítimo proprietário do imóvel e os ocupantes nunca o foram.

  4. O processo tem origem no facto de a Requerida inicial, uma sociedade comercial que se dedicava à construção de edifícios, em tempos locatária (financeira) do imóvel em questão, ter incumprido o contrato subjacente (em Novembro de 2018), deixando de pagar as rendas devidas, o que determinou a resolução do contrato (/em Abril de 2019).

  5. O imóvel não foi entregue aquando da resolução do contrato, há muito ocorrida (muito antes do contexto pandémico) e os ocupantes continuam a ocupá-lo ilegalmente.

  6. Portanto, as circunstâncias de facto que estão na origem do presente processo e que fundamentaram a decisão nele proferida são em muito anteriores à pandemia que assolou o país e que esteve na origem na Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março.

  7. Os ocupantes do imóvel bem conheciam a sua obrigação de entrega do imóvel, sabendo perfeitamente que o deviam entregar ao Requerente em data muito anterior aos factos em que se baseou o despacho de que ora se recorre.

  8. Por outro lado, conforme decorre do leitura do auto de diligência de entrega, o imóvel está ocupado pelos ex-sócios da Requerida, seus representantes legais, e pelo seu agregado, o que fazem ilegitimamente e sem qualquer título justificativo.

  9. Portanto, não estamos perante um processo executivo ou de insolvência, ao que acresce o facto de esta ilegítima ocupação poder provocar prejuízo irreparável no direito do Requerente, conforme invocado na petição inicial da providência cautelar – os pressupostos que determinaram o decretamento da providência mantêm-se.

  10. Os Requeridos não são parte passiva de um processo de execução nem de insolvência. A sua posição é a de ocupantes ilegítimos – situação já reconhecida por sentença judicial há muito transitada em julgado.

  11. Sendo excecionais as normas que se destinam ao enquadramento e execução da prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS- CoV-2 e da doença COVID -19, as mesmas não podem interpretar-se analogicamente (art. 11.º CC).

  12. Pelo que o despacho proferido deve ser revogado e substituído por outro que ordene de imediato a realização da diligência de entrega, atenta a natureza urgente da providência cautelar e o facto de esta situação não estar contemplada nas normas excecionais e de carácter temporário que estão previstas na Lei n.º 1-A/2020.” Os Requeridos, E… E F…, sócios da empresa D…, Lda., vieram pugnar pela improcedência do recurso, juntando contra-alegações, onde concluíram que: “1 - A presente providência cautelar foi decretada em julho de 2020 e a diligência de entrega do imóvel teve lugar em 11 de agosto de 2020.

2 - A referida diligência ficou suspensa, pois, o Sr. Funcionário Judicial incumbido de a realizar, uma vez chegado ao local, constatou que no imóvel “sub judice” residem os Recorridos e os seus 6 filhos, dos quais 5 são menores.

3 - Este imóvel constitui a habitação própria e permanente deste agregado familiar, nunca tendo havido qualquer oposição do Recorrente.

4 - A efetivação da supracitada diligência colocaria os Recorridos, mas, principalmente, os filhos tão pequenos, numa situação de manifesta fragilidade, por falta de habitação, não tendo estes, à data, para onde ir.

5 - A concretização da entrega do imóvel constitui um ato executivo em sede do presente procedimento cautelar, pelo que, in casu, é forçoso aplicar o disposto no artigo 6º-B, nº6, da Lei 1-A/2020 de 19-3, com a redação da Lei 4-B/2021 de 1-2, de acordo com o qual são suspensos todos os atos a realizar em sede de processo executivo (aqui tendo de se incluir todo o tipo de atos executivos).

6 - Mesmo que assim se não entenda, deverá ser feita uma aplicação analógica do referido preceito legal, pois, crê-se que o mesmo teve o intuito de ser o mais abrangente possível, justificado pela situação transitória e excecional que vivemos.

7 – Face ao exposto, andou bem...

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