Acórdão nº 627/09.5BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 29 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução29 de Abril de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I-RELATÓRIO A....., SA, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, a qual julgou totalmente improcedente a impugnação judicial deduzida contra o despacho de indeferimento expresso da reclamação graciosa apresentada contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e respetivos Juros Compensatórios (JC) referente ao período de abril de 2006, no valor global de €938.112,10.

A Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem: “1. O presente recurso jurisdicional vem interposto da sentença de JJs. ..., proferida nos autos referidos em epígrafe, a qual negou provimento à impugnação judicial deduzida pela ora recorrente contra a liquidação adicional de IVA, no valor total de €917.991,73, relativa ao período de 04/2006, e, bem assim, a correspondente liquidação de juros compensatórios, no valor de € 20.120,37; 2. Em causa está o entendimento do Tribunal a quo, de que, para efeitos de dedução do IVA suportado num imóvel relativamente ao qual houve, por parte do locador, renúncia à isenção daquele tributo, não se pode reconhecer ao contrato-promessa de arrendamento celebrado entre a recorrente e a A....., Lda., os mesmos efeitos do contrato definitivo; 3. A Recorrente não se conforma com o sentido da sentença proferida pelo tribunal a quo, uma vez que há um erro de julgamento quanto à análise da matéria de facto, fazendo aquele tribunal, igualmente, uma errada interpretação do direito aplicável; 4. Ao contrário do que sustenta o Tribunal a quo, em juízo não estava a equiparação de um contrato-promessa a um contrato definitivo para efeitos do direito à dedução do IVA mas antes a correcta qualificação do contrato celebrado entre as partes como contrato definitivo de locação (e não, como foi designado, de promessa de locação), e, nessa medida, atribuir-lhe os respectivos efeitos jurídicos, mormente no que respeita à dedução do IVA; 5. Os documentos juntos não foram bem apreciados pelo tribunal a quo, o que, por si só, impõe solução diversa daquela a que se chegou: na verdade, os documentos que o tribunal a quo dá “por reproduzidos” sem mais, evidenciam, inequivocamente e sem sombra de dúvidas, a existência de um contrato de locação; 6. E, se assim o é, como é bom de ver, à aqui recorrente assistiria o direito, nos termos legais, de poder deduzir a totalidade do IVA suportado na construção do imóvel, de acordo com as disposições legais aplicáveis; 7. Na verdade, o sistema de renúncia à isenção constante dos art.os 9.° e 12.° do CIVA e, bem assim, do Decreto-Lei n.° 241/86 de 20 de Agosto basta-se, conforme se viu, com a verificação substancial daquela locação do imóvel, ou seja, que o imóvel está de facto a ser utilizado com carácter de permanência, por contrapartida de uma remuneração, por outro sujeito passivo de IVA que utiliza o imóvel numa actividade tributada, facto que determina que o IVA que incide sobre a renda é por este dedutível; 8. E foi, de facto, o que sucedeu desde Abril de 2006: a impugnante, aqui recorrente, deu o imóvel de arrendamento à A..... — sujeito passivo de IVA —, com efeitos a partir de Abril de 2006, que o utiliza — desde essa data — com carácter de permanência, e em actividades tributadas, pagando as correspectivas rendas, estipuladas contratualmente; 9. Como é bom de ver, é indisputável que o direito à dedução do IVA não pode ficar precludido com base, simplesmente, na falta de uma licença de utilização — sendo esta um elemento dirigido ou instituído para tutelar interesses muito distantes e até desinteressados da temática da tributação directa que aqui nos atém; 10. A que acresce a circunstância de que da ausência de tal elemento não decorre qualquer prejuízo, como bem se compreende, para a substância económica da relação efectivamente existente entre as partes — no caso em apreço, entre a impugnante, agora recorrente, e a A.....; 11. Nao pode, então, pretender-se fundar na não emissão da licença de utilização do imóvel em causa a negação do exercício do direito à dedução em apreço, uma vez que é inquestionável — e a Administração fiscal não a questiona — a existência de uma locação cujos efeitos económicos se produzem nos termos normais, e tal cominação se revelaria manifestamente desproporcionada face à natureza e substância das operações; 12. Aliás, caso assim não se entendesse, estaríamos, naturalmente, perante uma incompreensível prevalência da forma sobre a substância quando é justamente o contrário que a lei pretende; 13. Em suma, há, de facto, uma locação de um bem imóvel (“fracção D”), vertida num contrato reduzido a escrito pelas partes, que configura um verdadeiro contrato de arrendamento na medida em que houve a entrega de um bem locado, a sua ocupação com carácter de permanência e o pagamento das rendas, 14. Pelo que não pode o Tribunal a quo partindo de uma mera exigência formal de índole administrativa, sem qualquer aplicação teleológica aos intentos das normas fiscais mobilizadas, retirar os efeitos propostos — desconsiderar a dedução de imposto validamente efectuada e, consequentemente, liquidá-lo adicionalmente; 15. Tal importaria não só uma interpretação da lei sem fundamento — da sua letra e, principalmente, do seu espírito — como redundaria ainda numa incomportável violação do princípio fiscal (basilar) da capacidade contributiva; 16. No caso em apreço importa relevar que, sob o ponto de vista fiscal, dúvidas não restam de que face à substância económica da locação do imóvel, não pode a recorrente ser obrigada a suportar imposto para além do que a lei obriga — designadamente, pela inadmissibilidade das deduções efectuadas, e cujos fundamentos substanciais estão demonstrados; 17. Assim, os actos tributários impugnados são ilegais por violação do disposto nos art.

os 9.° e 12.° do CIVA, Decreto-Lei n.° 241/86 de 20 de Agosto, do princípio da substância sob a forma e da capacidade contributiva; 18. A que acresce também a ilegalidade da liquidação de juros compensatórios por violação do disposto no art.° 89.° do CIVA e do art.° 35.° da LGT.

PELO QUE: 19. A sentença proferida pelo Tribunal a quo deve ser anulada por erro de julgamento quanto à análise da matéria de facto e por errada interpretação do direito aplicável e, concomitantemente, devem ser anulados os actos tributários impugnados.

TERMOS EM QUE DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE, REVOGANDO V. EXAS. A DECISÃO DE PRIMEIRA INSTÂNCIA, E, CONSEQUENTEMENTE, ORDENANDO A ANULAÇÃO DOS ACTOS TRIBUTÁRIOS IMPUGNADOS, COM TODAS AS DEMAIS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS.” *** A Recorrida optou por não apresentar contra-alegações.

*** A Digna Magistrada do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

*** Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

*** II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: “Com interesse para a decisão, considera-se provada a seguinte factualidade constante dos autos:

  1. O impugnante é uma sociedade anónima que se dedica à actividade de promoção imobiliária, enquadrado em IVA no regime normal mensal, tendo solicitado, em 20.03.2006, a renúncia à isenção de IVA ao abrigo do disposto nos n°s 4 e 6, do art° 12° do CIVA, o qual mereceu despacho de deferimento pelo Chefe de Finanças de Lisboa 3, devidamente notificado ao interessado, tendo-se emitido o correspondente certificado comprovativo Cfr documento de fls 107 a 109, e Ofício de fls 110 e Certificado de fls 111, dos autos.

  2. Tendo apresentado a respectiva declaração periódica do mês de Abril do ano de 2006 , em que deduziu a totalidade do IVA suportado na construção do prédio urbano mencionado supra, requereu o reembolso do imposto nos termos do art° 22° do CIVA, em resultado da situação de crédito de imposto então apurado, tendo sido processado o reembolso de imposto solicitado - cfr fls 119, dos autos e informação elaborada pelos serviços de fls 147 a 155, do P.A apenso C) Na sequência do reembolso do imposto referido supra, foi efectuada uma acção inspectiva ao sujeito passivo, tendo-se elaborado o respectivo relatório final e despacho de correcção do IVA dedutível e apurado o imposto em falta, por se ter considerado que apenas poderia deduzir o imposto até à concorrência do imposto liquidado correspondente ao imóvel em causa, em resultado de os documentos de suporte ao pedido de reembolso dizerem respeito a um contrato- promessa de arrendamento e não o contrato definitivo, não sendo permitido solicitar o reembolso de imposto antes da celebração do contrato de locação, sendo que até essa data apenas poderá ser deduzido o imposto até à concorrência do referido imposto liquidado relativo ao mesmo imóvel- cfr Relatório da I.T. de fls 139 a 146 do P.A. apenso .

  3. Em 20.02.2007, foi emitida a nota de liquidação de imposto em falta e de juros compensatórios apurados - cfr nota de liquidação adicional do imposto e de juros compensatórios, de fls 36 e 37, dos autos.

  4. Dá-se aqui por reproduzido o contrato - promessa de arrendamento celebrado pelo sujeito passivo com a sociedade A....., relativo ao prédio urbano a que foi concedido o certificado a que se refere a alínea a), supra, assim como o Acordo e Declaração subscrito pelas partes, em 30.10.06. - cfr documento de fls 75 a 106 e de fls 113 a 115 e de fls 117e 118, dos autos.

  5. Da liquidação referida supra foi deduzida reclamação graciosa em 27.07.07, a qual mereceu despacho de indeferimento proferido em 27.02.09. -cfr fls 2 e segs do Proc. Recl. Gracioso anexo.

*** A decisão recorrida consignou como factualidade não provada o seguinte: “Dos factos com interesse para a decisão da causa e constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.” *** Mais ficou consignado como motivação da matéria de facto o...

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