Acórdão nº 351/11.9BEALM de Tribunal Central Administrativo Sul, 29 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelANA PINHOL
Data da Resolução29 de Abril de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACÓRDÃO I.

RELATÓRIO A FAZENDA PÚBLICA recorre da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que julgou procedente a impugnação judicial que S.......

e S.......

instauraram contra o acto de indeferimento do recurso hierárquico que deduziram na sequência de indeferimento de reclamação graciosa que apresentara com vista à anulação da liquidação de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares (IRS) n.°………., respeitante ao ano de 2007.

Nas alegações de interposição de recurso a recorrente formulou as seguintes conclusões: «- Salvo o devido respeito, a Fazenda Pública não pode deixar de constatar que os fundamentos infra elencados, apontam no sentido da improcedência da posição defendida pelos ora impugnantes.

-Desde logo porque os ora Impugnante, não cumpriram com as suas obrigações declarativas.

-Todavia, vêm os supra identificados contribuintes, impugnar o despacho, proferido pela Exma. Senhora Directora de Serviços do IRS, na parte em que indeferiu o recurso hierárquico apresentado da decisão de indeferimento da reclamação graciosa deduzida contra o acto de liquidação oficiosa de IRS n.º ……….. e o acto de liquidação de juros compensatórios n. º…………. , relativos ao ano de 2007, bem como os referidos actos de liquidação oficiosa.

-Alegam os ora impugnantes, e em síntese útil, que o Ofício-Circulado n º 20142, de 03/12/2009, é ilegal e, ainda, que a decisão do recurso hierárquico não procedeu a uma correcta interpretação do regime jurídico aplicável ao caso em apreço, pedindo, a final, a anulação do despacho proferido pela Ex.ma Senhora Directora de Serviços do IRS, com as demais consequências legais, designadamente a anulação do acto de liquidação oficiosa e respectivos juros compensatórios.

-Não obstante, quanto a nós, o "thema decidendum", na enunciação que lhe é conferida na douta petição inicial (PI), também possa ser reconduzido à questão de saber se os ora Impugnantes vinham cumprindo, pontualmente, com as suas obrigações declarativas.

-Pontualmente. Ou seja, ponto por ponto. Sendo certo que, no caso que ora nos ocupa, tal facto não resulta evidenciado nos autos, atenta a não entrega, em tempo, da declaração anual em causa.

-Porque o advérbio “pontualmente”, do n.° 1, do artigo 406.°, do Código Civil Português, aplicável ex-vi alínea d) artigo 2.°, da Lei Geral Tributária (LGT) é aí empregado mais no sentido amplo de que o cumprimento deve coincidir ponto por ponto, em toda a linha com a prestação a que o devedor se encontra adstrito, extraindo-se da regra da pontualidade a conclusão de que a prestação debitória deve ser realizada integralmente e não por partes não podendo o credor ser obrigado a aceitar o cumprimento parcial, conforme artigo 763.° do mesmo diploma legal.

-Nesta perspectiva, salvo o devido respeito, tal como resulta dos autos, a verdade é que a prestação tributária, ora posta em crise, não foi cumprida, no sentido amplo, ou seja, em toda alinha, porque, na verdade, os recorrentes, ora Impugnantes, não apresentaram a declaração modelo 3 e respectivos anexos a que estavam obrigados, de acordo com o artigo 57.°do.CIRS, referente ao exercício de 2007.

-Daí que hajam sido notificados, por carta registada, nos termos do n.° 3, do art.º 38.°, do CPPT, para o seu domicilio fiscal, para no prazo de 30 dias cumprirem a obrigação em falta, não o tendo feito.

-Consequentemente, como decorre dos autos, conforme o preceituado na alinea b), do n.° 1 e no n.° 3, do artigo 76.°, do código do IRS, ao Serviço de Finanças outra alternativa não se lhe depararia que a de proceder à elaboração da declaração oficiosa, relativamente ao ano de 2007, com os elementos que a então Direcção- Geral dos Impostos dispunha.

-Razão pela qual, as deduções foram efectuadas de acordo com o n.° 3, do artigo 76.°, do código do IRS. Ou seja apenas as deduções previstas na alínea a) do n.°1, do artigo 79.°, e no n.° 3, do artigo 97.°, ambos do código do IRS, na redacção em vigor à data dos factos. Ou seja, foram efectuadas aquelas que legalmente eram aceites, atenta a situação em análise.

-Tendo sido efectuada uma declaração oficiosa para cada um dos cônjuges, mas a reclamação graciosa foi deferida parcialmente de forma a considerar os recorrentes como casados, considerar o rendimento bruto do casal, as deduções especificas e as retenções na fonte.

-Por outro lado, o Oficio-Circulado n.° 20142 de 3-12-2009, vem esclarecer os procedimentos a adoptar pelos Serviços, em caso de apresentação de reclamação graciosa pelos sujeitos passivos, a quem foram efectuadas liquidações de IRS realizadas nos termos previstos no artigo 76°, n.° 3, do CIRS, em vigor à data dos factos.

-Como no caso, num eventual pedido de revisão da liquidação através do mecanismo da reclamação graciosa, somente poderão ser objecto de revisão os seguintes aspectos: 1. Estado civil, do sujeito passivo, invocando que é casado; 2. Rendimento bruto e correspondente dedução específica (com excepção dos rendimentos da categoria e, aos quais se aplica sempre o coeficiente mais elevado previsto no n.° 2, do artigo 31°, conforme o disposto no artigo76° n.^ 2); 3. Retenções na fonte e pagamentos por conta .

-Daí que a reclamação graciosa haja sido deferida parcialmente, de forma a considerar, na liquidação de IRS de 2007, dos ora Impugnantes, os elementos passíveis de serem considerados, estado civil dos recorrentes, rendimento bruto e correspondente dedução especifica, retenções na fonte e pagamentos por conta.

-Por conseguinte, relativamente às deduções efectuadas, foram consideradas aquelas que legalmente são aceites no âmbito da situação em análise. Daí o indeferimento do Recurso Hierárquico.

-Resultando, assim, claro, que assim não sucederia se a obrigação tributária tivesse sido cumprida “pontualmente”, nos termos do n.° 1, do artigo 406.°, e conforme artigo 763.°, ambos do Código Civil Português, aplicável ex-vi alínea d) artigo 2.°, da Lei Geral Tributária, conforme artigo 763.° do mesmo diploma legal.

-Daí que, salvo o devido respeito, a Administração Fiscal haja procedido, relativamente às liquidações, ora postas em crise, de conformidade com o respectivo suporte legal, à data aplicável. E por conseguinte, em nossa modéstia opinião, nada havendo a censurar nas mesmas, antes se devem manter na ordem jurídica dos aqui Impugnantes, para todos os efeitos legais.

-Tudo porque, face ao disposto no artigo 57°, do Código do IRS, os ora Impugnantes estão obrigados à apresentação, anual, da declaração de IRS Modelo 3, tout court. No caso está em causa a falta da entrega da declaração referente ao ano de 2007, de nada servindo vir a Entidade empregadora dizer que o contribuinte em questão não procedeu à entrega da referida declaração de IRS, Modelo 3, por este ou por aquele motivo.

-Nada disso. Estamos perante o cumprimento de uma obrigação fiscal do contribuinte, não de terceiros. Isto é, perante uma obrigação, no caso fiscal, propter personam. Sem prejuízo da apresentação de eventual declaração de substituição, desde logo, entre outros motivos, por existirem declarações de IRS mais complexas que outras, o que pode levar ao cometimento de erros ou distracções susceptíveis de gerar graves consequências mais tarde, como a aplicação de coimas com um valor bastante elevado.

-E foi por ter consciência que erros e dificuldades podem acontecer, designadamente ao cidadão comum, que o legislador criou a figura da declaração de substituição do IRS, conforme n.° 3, do artigo 59.° do CPPT.

-Todavia, na douta Sentença, ora sob recurso, o Tribunal "a quo", julgou a impugnação procedente, não obstante reconhecer que a declaração oficiosa respeitou a disciplina legal no momento em que foi emitida, mas, ainda assim, impunha-se que a Administração Tributária o fizesse em conformidade com o que então preceituava o artigo 76.° do CIRS, por, em seu entender, o disposto no supracitado artigo 76.°, n.° 1, alínea b) e n.° 3 do CIRS, não excluir a correcção de acordo com os elementos apresentados pelo contribuinte em sede de reclamação da liquidação oficiosa, disposição legal que no caso dos autos, a Administração Fiscal nas suas decisões de indeferimento da reclamação graciosa e do recurso hierárquico optou por ignorar. E ainda porque as circulares administrativas emanadas pela Administração Tributária são vinculativas apenas para os respectivos serviços pois, face à lei, os procedimentos definidos, designadamente o “direito circulado" da Administração Fiscal não pode derrogar o princípio da legalidade tributária, não vinculando os contribuintes e os Tribunais.

-Decisão com a qual, salvo o devido respeito, que é muito, a Fazenda Pública não pode concordar, desde logo, atenta a situação de incumprimento da obrigação fiscal subjacente à declaração oficiosa e subsequente reclamação graciosa (RG) e recurso hierárquico (RH) da liquidação oficiosa.

-Situação de incumprimento de uma obrigação propter personam, ora posta em crise, a qual, como decorre da aludida RG e do aludido RH, não foi cumprida, no sentido amplo, ou seja, em toda a linha, porque os ora impugnantes, não apresentaram a declaração modelo 3 e respectivos anexos a que estavam obrigados, de acordo com o artigo 57.°do CIRS, referente ao exercício de 2007, não obstante terem sido notificados para o efeito.

-Acresce que esta matéria foi alvo de apreciação por parte da Administração Fiscal (AF), nomeadamente pela Direcção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, Divisão de Administração II, em sede de Recurso Hierárquico (RH), e pelo Serviço de Finanças de Palmela, em sede de Reclamação Graciosa.

-Daí que, salvo o devido respeito, não possa deixar de se nos afigurar que a liquidação oficiosa, ora impugnada, efectuada conforme o preceituado na alínea b), do n.° 1 e no n.° 3, do artigo 76.°, na redacção à data em vigor, de nenhum vício padece, por se entender correcto o entendimento da Administração Fiscal, vertido no Recurso Hierárquico, devendo, em consequência, as liquidações...

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