Acórdão nº 0292/08.7BEBJA de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA DO CÉU NEVES
Data da Resolução29 de Abril de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO A…………, S.A, melhor identificada nos autos, intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Beja, acção administrativa comum, sob a forma de processo ordinário, contra EDIA – Empresa de Desenvolvimento e Infra-Estruturas do Alqueva, S.A., peticionando a condenação desta a pagar-lhe a quantia de 1.452.685,74€, correspondente à soma de 1.198.089,98€, respeitante a prejuízos e €254.595,76, relativa a juros vencidos, acrescida de juros vincendos, até efectivo e integral pagamento.

Mais requer a A., nos termos do art.º 560º, nºs 1 e 2, do Código Civil (CC), que sejam capitalizados os juros vencidos há mais de um ano, bem como, sejam capitalizados os outros juros assim que perfizerem um ano, sobre todos se passando a contar novos juros.

Com a apresentação de PI aperfeiçoada, a Autora requereu a intervenção principal provocada da B............, S.A..

* Por Despacho-Saneador do TAF de Beja foi, entre o mais, rejeitado o incidente de intervenção principal provocada e, consequentemente, foi absolvida a Réu da instância, por ilegitimidade activa da Autora.

* Interposto recurso pela A. A............ para o TCAS, veio este, por acórdão proferido em 02.07.2020, a revogar o assim decidido em sede de 1ª instância, afirmando que, pese embora a existência de uma situação de litisconsórcio necessário, a excepção de ilegitimidade activa «era passível de suprimento por via da intervenção principal provocada (…)» e que «[c]onsequentemente, o requerimento … para a intervenção principal provocada … tinha de ter sido deferido» [arts. 28º, 325º, 326º, nº 1, al.- a), do anterior CPC - atuais arts. 30º, 33º e 318º, nº 1, al. a), do CPC/2013], porquanto «[d]os autos, designadamente da prova produzida, não resulta certo e ineludível que a B............ divirja da Autora relativamente ao objecto desta acção», já que diversamente «dos factos provados resulta que o consórcio apresentou à Ré, reclamação referente ao ressarcimento dos sobrecustos e que promoveu junto do INCI a tentativa de conciliação. Nada mais resulta provado nos autos, designadamente que a B............ divirja da Autora ou, sequer, que tenha assentido ou conformando-se com o auto de conciliação, aceitando-o expressamente» e que a «dedução do incidente de intervenção principal, como forma de resolver a dificuldade do autor em se apresentar em juízo juntamente com os seus associados, é também solução aplicável no processo administrativo» atenta admissão inserta no nº 8 do art. 10º do CPTA.

* E é desta decisão do TCA Sul que a R/recorrente EDIA – Empresa de Desenvolvimento e Infra-Estruturas do Alqueva, S.A., interpôs o presente recurso de revista, para o que alegou e apresentou as seguintes conclusões: «1) O presente recurso vem interposto do douto acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul que considerou parcialmente procedente o recurso interposto pela ora recorrida A............ e considerou que a excepção de ilegitimidade activa, em sede de litisconsórcio necessário, é passível de suprimento por via da intervenção principal provocada” contrariando a decisão do TAF de Beja que considerou que, no caso em apreço, uma vez que a B............ se desinteressou do procedimento a ilegitimidade não podia ser suprida por intervenção principal provocada.

2) A A. ora recorrida, intentou a presente acção contra a Ré e alegando que a B............, depois do auto de não conciliação, não pretendeu continuar o procedimento, indicou-a como contra interessada.

3) Na sequência de despacho dando conta que não havia naquela acção figura de contrainteressada, numa segunda petição, pese embora, manter a sua legitimidade singular, a Autora requereu a intervenção principal da B.............

4) O que está em causa, é a questão de saber, se a ilegitimidade activa, em sede de litisconsórcio necessário, pode ou não ser suprida pela intervenção principal provocada, quando o chamado a intervir já não pode exercer, por si, o direito que é chamado a exercer, no caso em apreço, porque se desinteressou do seu exercício conforme declara quem requer essa intervenção e já passou o prazo para, por si, interpor a acção a que é chamado.

5) Nos termos do nº 1, do artº 150º, do CPTA, só excepcionalmente cabe revista dos acórdãos proferidos, em segunda instância pelos Tribunais Centrais Administrativos, admitindo tal recurso apenas quando esteja em causa uma questão de relevância jurídica ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

6) A jurisprudência tem-se debruçado sucessivas vezes sobre a questão do suprimento da legitimidade por via do chamamento através da intervenção principal provocada, mas em nosso entender nunca o fez numa situação que revista as vicissitudes e as singularidades deste caso.

7) A situação sub judice traz à colação elementos particulares relevantes, designadamente a apreciação do suprimento da ilegitimidade activa por via da intervenção principal provocada, em litisconsórcio necessário, quando o chamado já não tem condições para, por si, estar em juízo e quando é o próprio requerente que pretende a intervenção que afirma que ele perdeu o interesse em agir.

8) Uma pronúncia neste caso, deixaria a jurisprudência mais rica e assim contribuiria para a melhor aplicação do direito e enriquecimento da jurisprudência.

9) Termos em que, salvo melhor entendimento, deve considerar-se preenchido o pressuposto da relevância jurídica previsto no nº 1, do artº 150º, do CPTA.

10) Assim como se deve considerar preenchido o pressuposto da necessidade da admissão do recurso para uma melhor aplicação do direito previsto no nº 1, do artº 150º, do CPTA.

11) A Ré entende que a decisão do TAF de Beja não é merecedora da censura feita pelo Acórdão do Tribunal Central Administrativo e que essa censura resulta do facto de este não ter dado o devido relevo às especificidades e singularidades de que se reveste o caso em apreço.

12) O TAF de Beja deu como assentes, entre outros, os factos A) a K) que aqui se dão por reproduzidos.

13) A decisão da primeira instância ponderou o deferimento da requerida intervenção principal provocada para suprir a ilegitimidade activa da autora, mas acabou por concluir pelo indeferimento com fundamento em que a B............, em face do auto de não conciliação, se desinteressou e no prazo de interposição não intentou a competente acção.

14) Entendeu o Tribunal a quo, que essas circunstâncias fariam com que a decisão de admitir o chamamento se traduzisse num acto inútil, uma vez que a chamada B............ não poderia estar em juízo porque não era parte legítima por não ter interesse em agir, nos termos do disposto no artº 55º do CPTA.

15) A aceitação do auto de não conciliação por parte da B............ determina a impossibilidade de se virem a repercutir na sua esfera jurídica outros efeitos que não sejam os decorrentes exactamente dessa aceitação.

16) A intervenção principal provocada no âmbito de consórcios externos não deve ser aceite para sanar todas as eventuais ilegitimidades, tem sido esse o entendimento da jurisprudência.

17) A exigência de procuração especial prevista no nº 2, do artº 14º do DL nº 231/81 de 28.07, no âmbito da representação em juízo, seria injustificada se a intervenção principal provocada sanasse todas as ilegitimidades.

18) Tal entendimento, aliás, tem sido afastado pela nossa jurisprudência, como é exemplo a decisão proferida pelo STA em 20.09.2011 no âmbito do proc. nº 0556/11, do qual resulta: “Do exposto resulta que, in casu, o apontado regime específico do contrato de consórcio externo leva a que a falta de interesse em demandar das três identificadas empresas consorciadas, determina a ilegitimidade da autora e que essa ilegitimidade não possa ser sanada com a intervenção principal provocada daquelas, pois que só na convergência real e actual da vontade das consorciadas a decisão da acção pode produzir o seu efeito útil normal”.

19) A possibilidade de sanar a ilegitimidade activa depende sempre da situação em concreto em apreciação, não existindo um direito abstracto e inelutável de um dos membros requerer a intervenção dos restantes numa qualquer demanda.

20) Na situação sub judice, é a própria Autora, nos termos em que configura o seu direito e a obrigação da Ré, que alega que a chamada não tem interesse em demandar a Ré pois desinteressou-se “não pretendeu continuar o procedimento”.

21) A não pretensão da chamada em demandar a Ré torna-a parte ilegítima nesta acção sem possibilidade de sanação, através do incidente do chamamento à demanda, pois que a presente acção é inútil para a chamada em face do seu desinteresse provado, sendo a utilidade da mesma para a chamada um pressuposto essencial para a admissão de um incidente de intervenção principal provocada.

22) E é em face deste enquadramento fáctico que o TAF de Beja concluiu pelo indeferimento da requerida intervenção principal provocada, uma vez que o chamamento seria um acto inútil.

23) A jurisprudência citada no acórdão recorrido, nomeadamente, a do STA, dá conta de ilegitimidade activa quando apenas um elemento do consórcio demanda e é inexorável quanto à sua ilegitimidade, admitindo apenas a intervenção principal provocada quando a tal não se opõe a natureza da relação jurídica.

24) A jurisprudência tem entendido que há ilegitimidade insanável por via de intervenção principal provocada na impugnação de actos administrativos em que esteja em causa a adjudicação de um contrato de empreitada quando há desinteresse de um dos consortes, porque não haveria obrigatoriedade de assinar o contrato e sendo a prestação infungível não podia ser realizada por outrem, havia inutilidade no chamamento.

25) Ora, pensamos que sem forçar, no caso em apreço, jamais seria possível apurar os alegados sobrecustos que a autora invoca sem a intervenção da sua consorciada que, segundo declara a própria autora, realizou 41,9% dos trabalhos da...

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