Acórdão nº 256/21 de Tribunal Constitucional (Port, 29 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Maria José Rangel de Mesquita
Data da Resolução29 de Abril de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

3.ª Secção

Relatora: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), em que é recorrente A. e recorrido o Condomínio B., foi pelo primeiro interposto recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (Lei do Tribunal Constitucional, adiante designada pela sigla LTC), do acórdão proferido por aquele Tribunal da Relação em 18 de junho de 2020 (cf. fls. 207-236), no qual foi julgado improcedente o recurso interposto pelo executado e embargante, ora recorrente, de sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca da Madeira, Juízo de Execução do Funchal – Juiz 1 em 8 de novembro de 2019 (cf. fls. 150-167-verso), que julgou parcialmente procedentes os embargos de executado e decidiu que a execução deveria prosseguir os seus termos, deduzidas as quotas de condomínio de março de 2013 e de julho de 2017 a março de 2018 e os juros de mora que incidissem sobre as mesmas.

2. Na Decisão Sumária n.º 154/2021 (cf. fls. 276-295), ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, decidiu-se não conhecer do objeto do recurso, com os seguintes fundamentos (cf. II – Fundamentação, 5. e ss.):

«II – Fundamentação

5. Mesmo tendo o recurso sido admitido por despacho do Tribunal a quo, com fundamento no n.º 1 do artigo 76.º da LTC, essa decisão não vincula o Tribunal Constitucional, conforme resulta do n.º 3 do mesmo preceito legal.

6. Cabendo aos recorrentes delinear o objeto do recurso (norma ou interpretação normativa cuja constitucionalidade pretendem ver apreciada), a aferição do preenchimento dos requisitos de que depende a admissibilidade de recurso para o Tribunal Constitucional e, bem assim, a delimitação do objeto do recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade devem ter por base o invocado no requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional e reportar-se à decisão recorrida (ou decisões recorridas), tal como identificada(s) pelo recorrente no requerimento de interposição de recurso e que fixam o respetivo objeto – in casu, o Acórdão do TRL de 18/6/2020 (cf. fls. 207-236), no qual foi julgado improcedente o recurso interposto pelo executado e embargante, ora recorrente, confirmando a sentença do Tribunal de primeira instância então recorrida (sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca da Madeira, Juízo de Execução do Funchal – Juiz 1 em 8/11/2019, a fls. 150-167-verso), que julgou parcialmente procedentes os embargos de executado e decidiu que a execução deveria prosseguir os seus termos deduzidas as quotas de condomínio de março de 2013 e de julho de 2017 a março de 2018 e juros de mora que incidissem sobre as mesmas.

6.1 Nos termos do requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional (supra transcrito em I, 2.), pretende o recorrente ver apreciadas questões de constitucionalidade reportadas a interpretações do artigo 726.º, n.º 2, alínea b), do Código de Processo Civil (CPC), que assim dispõe:

«Artigo 726.º

Despacho liminar e citação do executado

1 - O processo é concluso ao juiz para despacho liminar.

2 - O juiz indefere liminarmente o requerimento executivo quando:

a) Seja manifesta a falta ou insuficiência do título;

b) Ocorram exceções dilatórias, não supríveis, de conhecimento oficioso;

c) Fundando-se a execução em título negocial, seja manifesta, face aos elementos constantes dos autos, a inexistência de factos constitutivos ou a existência de factos impeditivos ou extintivos da obrigação exequenda de conhecimento oficioso;

d) Tratando-se de execução baseada em decisão arbitral, o litígio não pudesse ser cometido à decisão por árbitros, quer por estar submetido, por lei especial, exclusivamente, a tribunal judicial ou a arbitragem necessária, quer por o direito controvertido não ter caráter patrimonial e não poder ser objeto de transação.

3 - É admitido o indeferimento parcial, designadamente quanto à parte do pedido que exceda os limites constantes do título executivo ou aos sujeitos que careçam de legitimidade para figurar como exequentes ou executados.

4 - Fora dos casos previstos no n.º 2, o juiz convida o exequente a suprir as irregularidades do requerimento executivo, bem como a sanar a falta de pressupostos, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 2 do artigo 6.º.

5 - Não sendo o vício suprido ou a falta corrigida dentro do prazo marcado, é indeferido o requerimento executivo.

6 - Quando o processo deva prosseguir, o juiz profere despacho de citação do executado para, no prazo de 20 dias, pagar ou opor-se à execução.

7 - Se o exequente tiver alegado no requerimento executivo a comunicabilidade da dívida constante de título diverso de sentença, o juiz profere despacho de citação do cônjuge do executado para os efeitos previstos no n.º 2 do artigo 741.º.

8 - Quando deva ter lugar a citação do executado, a secretaria remete ao agente de execução, por via eletrónica, o requerimento executivo e os documentos que o acompanhem, notificando aquele de que deve proceder à citação.»

6.2 São duas as questões de constitucionalidade, assim enunciadas:

A) «é inconstitucional, por violação do artigo 20.º, do artigo 204.º e do artigo 205.º, todos da Constituição da República Portuguesa, a interpretação normativa do artigo 726.º, n.º 2, al. b), do C.P.C, no sentido de a falta de certeza, a falta de exigibilidade e a falta de liquidez da obrigação exequenda constante do requerimento executivo não fundamentar a rejeição da execução», sendo que a mesma «constitui uma compressão intolerável dos direitos e interesses legalmente protegidos do embargante» (cf. requerimento de interposição de recurso, em especial, 3.º, 4.º, 11.º e 12.º);

B) «é inconstitucional, por violação do artigo 20.°, do artigo 204.° e do artigo 205.°, todos da Constituição da República Portuguesa, a interpretação normativa do artigo 726.°, n.º 2, al. b), do C.P.C, no sentido de o requerimento executivo poder vir a considerar-se sanado de todos os vícios de que enferma pela junção de documentos no apenso de oposição à execução e a que o requerimento de oposição à execução não se pôde reportar por inexistirem no momento da dedução da oposição à execução e ainda assim os vícios do primeiro requerimento executivo não poderem fundamentar a rejeição da execução», o que «constitui uma compressão intolerável dos direitos e interesses legalmente protegidos do embargante» (cf. idem, em especial, 6.º, 7.º e 13.º).

7. O recurso de constitucionalidade foi interposto ao abrigo do disposto na alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º da LTC, sendo que, nos termos do artigo 280.º, n.º 1, alínea b), da Constituição da República Portuguesa, e do artigo 70.º, n.º 1, alínea b) da LTC, cabe recurso para este Tribunal das decisões dos tribunais «Que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo».

Segundo jurisprudência constante do Tribunal Constitucional, a admissibilidade do recurso apresentado nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC depende da verificação, cumulativa, dos seguintes requisitos: ter havido previamente lugar ao esgotamento dos recursos ordinários (artigo 70.º, n.º 2, da LTC); tratar-se de uma questão de inconstitucionalidade normativa; a questão de inconstitucionalidade normativa haver sido suscitada «durante o processo», «de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer» (artigo 72.º, n.º 2, da LTC); e a decisão recorrida ter feito aplicação, como sua ratio decidendi, das dimensões normativas arguidas de inconstitucionalidade pelo recorrente (vide, entre outros, os Acórdãos deste Tribunal n.ºs 618/98 e 710/04 – também disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt).

Faltando um destes requisitos, o Tribunal não pode conhecer do recurso.

Vejamos quanto a cada uma questões colocadas nos presentes autos.

A) Primeira questão

8. A primeira questão reporta-se à «interpretação normativa do artigo 726.º, n.º 2, al. b), do C.P.C, no sentido de a falta de certeza, a falta de exigibilidade e a falta de liquidez da obrigação exequenda constante do requerimento executivo não fundamentar a rejeição da execução.

8.1 Perante o TRL, assim foi apresentada a questão:

«DO ERRO DE JULGAMENTO CONSUBSTANCIADO NA DECISÃO DE NÃO TER EXISTIDO INEPTIDÃO DO REQUERIMENTO EXECUTIVO E DE NÃO HAVER FALTA DE TÍTULO EXECUTIVO

10°

O embargado alegou no douto requerimento executivo a existência de uma suposta dívida por parte do embargante, eventualmente a título de quotas de condomínio, no montante de 4.910,61 euros (quatro mil novecentos e dez euros e sessenta e um cêntimos), sem que o embargado tivesse possibilitado quer ao embargante e quer ao Tribunal recorrido sindicar como chegou o embargado ao cálculo daquele valor de 4.910,61 euros e não de outro qualquer valor.

11°

Ou seja, o embargado no requerimento executivo, que aqui se dá por integralmente reproduzido, não indicou:

11.1) quais foram os orçamentos anuais eventualmente aprovados ou não em assembleias gerais de condóminos no edifício do condomínio embargado para fazer face a que despesas do prédio.

11.2) qual é a permilagem da fracção do embargante e da respectiva esposa,

11.3) qual é a fórmula matemática do cálculo da quota de condomínio a apurar em função de eventual orçamento anual alegadamente aprovado ou não em assembleia geral de condóminos e em função do critério de repartição das despesas.

11.4) qual é o suposto critério de repartição...

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